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PERCEPÇÕES CONTEMPORÂNEAS SOBRE A INCLUSÃO EDUCACIONAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

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Contemporânea Contemporary Journal 2(1): 439-456, 2022 ISSN: 2447-0961

Artigo

PERCEPÇÕES CONTEMPORÂNEAS SOBRE A INCLUSÃO EDUCACIONAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

CONTEMPORARY PERCEPTIONS ON THE

EDUCATIONAL INCLUSION OF DISABLED PERSON

Recebimento do original: 25/01/2022 Aceitação para publicação: 01/02/2022

Matheus Wisdom Pedro de Jesus

Mestrando em Educação e Contemporaneidade (UNEB). Psicopedagogo, Neuropsicopedagogo, Especialista em Educação Especial e Inclusiva, Transtorno do Espectro Autista, Neuropsicologia e Gestão e Coordenação Educacional. Pedagogo e Licenciado em Letras com Inglês. Psicopedagogo da APAE Salvador. Membro do Grupo de Pesquisa Pensamento e Contemporaneidade (UNEB). E-mail: matheuswisdom@gmail.com

Sueli Ribeiro Mota Souza

Pós-Doutorado na Università degli Studi di Firenze. Doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia, Mestrado em Sociologia pela Universidade Federal da Bahia, Graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia. Professora/pesquisadora Plena da Universidade do Estado da Bahia- UNEB atuando no Departamento de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade (Campus I) da Universidade do Estado da Bahia- UNEB. Membra do Grupo de Pesquisa Pensamento e Contemporaneidade (UNEB). E-mail: sumota.uneb@gmail.com

RESUMO: O objetivo do presente é artigo é compreender o processo de inclusão da pessoa com deficiência a partir de percepções contemporâneas. Propõe-se, também, a discutir o conceito de integração e inclusão na sociedade trazendo reflexões sobre as

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contribuições de políticas públicas que podem favorecer o processo de inclusão. O tema-problema em torno das discussões foi: como compreender o processo de inclusão da pessoa com deficiência a partir de percepções contemporâneas? Para tanto, são trazidos questionamentos sobre como a inclusão socioeducacional do indivíduo com deficiência pode ser percebida nos diversos âmbitos sociais.

Empregou-se, para a metodologia a pesquisa de caráter qualitativo, com uma revisão de literatura pautada em discussões reflexivas de caráter fenomenológico. A análise nos mostra que, por meio de um denso processo de conscientização e efetivação de políticas públicas, mesmo frente aos desafios, é possível melhorar a qualidade da inclusão em sociedade; todavia, ainda existem entraves atitudinais que precisam ser superados enquanto ação coletiva. Assim, colocado, ao final, uma análise reflexiva da dissociação entre integração e inclusão e como a inclusão pode ser feita no âmbito socioeducacional favorecendo o desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência.

Palavras-chave: Deficiência. Educação Inclusiva. Percepções Contemporâneas.

ABSTRACT: The purpose of this article is to understand the process of inclusion of disabled person from contemporary perceptions. It also discusses the concept of integration and inclusion in society, bringing reflections on the contributions of public policies that can favor the inclusion. The theme-problem surrounding the discussions was: how to understand the process of inclusion of people with disabilities from contemporary perceptions? Thus, questions are raised about how the socio-educational inclusion of disabled people can be perceived in the various social spheres. The research methodology was qualitative, with a literature review based on reflective discussions through phenomenology. The analysis shows us that, through a dense process of awareness and implementation of public policies, even in the face of challenges, it is possible to improve the quality of inclusion in society; however, there are still attitudinal barriers that need to be overcome with collective action. Thus, placed, at the end, a reflective analysis of the dissociation between integration and inclusion and how inclusion can be done in the socio-educational scope, favoring the biopsychosocial development of the disabled person.

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Keywords: Deficiency. Inclusive Education. Contemporary Perceptions.

INTRODUÇÃO

A trajetória da pessoa com deficiência vem sendo conduzida de forma conflituosa em suas relações sociais, em especial no que se trata do período de integração e que agora necessita de fato, incluir – em especial quando se abrange os aspectos socioeducacionais.

Consequentemente, para entender essas questões, faz-se necessário trazer reflexões que justifiquem ações e norteiem as perspectivas de inclusão contemporâneas. A partir disso, o tema-problema do artigo é: como compreender o processo de inclusão da pessoa com deficiência a partir de percepções contemporâneas?

O estudo realizado, quanto a abordagem, foi baseado por meio de pesquisa qualitativa-teórica que procura captar o conceito de uma totalidade e não com enfoque em conceitos específicos e sem representatividade numérica. No que diz respeito aos procedimentos metodológicos, foi utilizado o caráter bibliográfico-explicativo com revisão de literatura e apropriou-se da fenomenologia como pano de fundo para explicar questões relacionadas a educação inclusiva e discussões sobre a temática sem o objetivo de exaurir (GERHARDT;

SILVEIRA, 2009).

Para a fundamentação teórica foram elencados como principais autores Diniz (2007), Dussel (2003), Freire (1998), Goffman (1981),

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Piccolo e Mendes (2012), Ribas (2003), Santos (2003), além de documentos, declarações e leis importantes para a inclusão da pessoa com deficiência como a Declaração de Salamanca (1994) e a Lei Brasileira de Inclusão (2015).

O artigo está estruturado em outras três seções. Inicialmente se discorre brevemente sobre a fenomenologia e as percepções envoltas à educação inclusiva, posteriormente é apresentado entraves da inclusão socioeducacional da pessoa com deficiência e, ao final, são trazidas reflexões sobre como a inclusão é percebida na contemporaneidade. Neste último, está posta uma análise sobre quais avanços já foram conquistados e os muitos outros que ainda podem ser alcançados por aqueles que se engajam na luta pelos direitos da pessoa com deficiência.

Os resultados, como serão vistos posteriormente, permitem afirmar que há sim possibilidades de melhorias, avanços, conquistas que favoreçam a pessoa com deficiência através de políticas públicas significativas que, somadas as leis e decretos já existência podem corroborar positivamente para o processo de inclusão pleno e efetivo.

A fenomenologia como ponte para reflexões iniciais sobre educação inclusiva

Contemplar discussões sobre a educação inclusiva e como as pessoas com deficiência estiveram à margem da sociedade durante a contemporaneidade envolvem percepções de cercada de vivências de quem convive com o processo e tem suas interpretações acerca das lutas, desafios, conquistas através de políticas públicas e, sobretudo, das novas possibilidades de trabalho, educação, saúde, moradia e

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garantia direitos que as mesmas trouxeram. A partir desses pressupostos, podemos pensar na Fenomenologia como guia norteador deste artigo, visto Rojas (2006:3) afirmar que:

A fenomenologia basicamente se guia pelos caminhos da experiência, e assim sugere uma tomada reflexiva da vivência, abrindo possibilidades de observar as coisas como elas se manifestam. Trazendo à consciência novos olhares, para permitir um redimensionamento dos fazeres. (ROJAS, 2006, p. 3).

Para o autor, a Fenomenologia proporá uma análise crítico- reflexiva da situação a ser analisada e uma observação mais precisa e cuidadosa do fenômeno, tendo em vista que se exige um olhar apurado sobre como como o movimento inclusivo no embate entre segregação e inclusiva acontece no momento em que se pesquisa para que haja novas formas de pensar, refletir e agir. Sobre isso, o estudo do fenômeno que envolve as percepções fenomenológicas sobre inclusão e exclusão analisará as situações como inacabadas e acontecendo no período em que se busca maior compreensão da temática (Dartigues, 2008).

A intencionalidade em trazer (des)caminhos que proponham reflexões sobre o movimento inclusivo que debate com o modelo de segregação social imposto torna-se evidente nas percepções fenomenológicas sobre educação inclusiva. A partir dos conceitos de Epoché trazidos por Husserl1, as próximas sessões são delineadas com reduções fenomenológicas e suspensão de juízo que colocam em pauta o real sentido da inclusão e como ela manifesta-se – ou não –

1 Termo de etimologia grega que tem significado de “parar” ou “obstruir”. Para Husserl, a Epoché é uma quebra do pensamento comum natural alterando, por vezes, o sentido de observar as coisas ao redor. Em fenomenologia, é percebida como uma ferramenta que suspende julgamento de uma aparente verdade inabalada.

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dada as construções sociais históricas que interferem diretamente na modernidade.

A pessoa com deficiência: uma análise socioeducacional

Nessa seção será exposta percepções que contemplem uma análise socioeducacional atual da pessoa com deficiência. A ideia do escrito é deixar de atribuir a deficiência apenas a questões biomédicas e sim encará-la como um fato social recorrente que, da mesma forma em que qualquer um pode tê-la, a sociedade como um todo também pode criar estratégias para incluir a pessoa com deficiência.

Nota-se de acordo com o modelo de sociedade atual que, apesar dos inúmeros avanços em múltiplas áreas concernentes à conscientização e políticas públicas para as pessoas com deficiência, que grande parte da população possui – em grande maioria – uma visão tecnicista antiquada em relação a o que seria a deficiência e o que é incapacidade sob uma ótica depreciativo-preconceituosa. A priori, é importante saber o que a deficiência segundo a nossa constituição que, consequentemente, embasa-se do modelo médico para defini-la. A partir da Lei Brasileira de Inclusão 13.146/15 em seu artigo 2º do capítulo I podemos entender deficiência como:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

De acordo com a citação acima, a identificação de uma deficiência é atrelada instantaneamente a uma suposta limitação em

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realizar determinada ação, seja ela de ordem sensorial, mental, intelectual e física. Consequentemente, a terminologia “deficiente”

abrangeria muitas áreas nas quais o indivíduo pode apresentar suposta anormalidade ou problemas na execução de determinada função comumente realizada na sociedade; isso incluiria falar, ouvir ou locomover-se. Sobre isso, Ribas (2003:10) é preciso em afirmar que que a pessoa com deficiência é

[...] qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência congênita ou não, em suas capacidades físicas e mentais (RIBAS, 2003, p. 10).

Para o autor, ser deficiente comprometeria três grandes áreas do desenvolvimento humano: “incapacidade”, impedimento e deficiência. Logo, a pessoa com deficiência seria aquela que necessitaria de suportes físicos, tecnologia assistiva, comunicação alternativa ou outro recurso para conseguir ter uma vida dentro dos padrões estabelecidos como normais na sociedade.

Apesar de a deficiência estar interligada com a perda de algo, de forma alguma ela deve ser encarada do ponto de vista da incapacidade por inteiro do indivíduo com deficiência. O que a sociedade espera do sujeito com deficiência enquanto cidadão ativo com direitos e deveres? Entender o que é deficiência envolve descontruir esse viés construído desde a tenra idade da humanidade até a nossa sociedade preocupada com o desempenho social do sujeito que atenda as suas exigências. A deficiência, nesse aspecto, pode e deve ser encarada como outra forma de olhar o mundo, de reconhecer que determinadas habilidades ainda que importantes, não constituem o individuo como todo, uma vez que não pode ser

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mensurada a possibilidade de inclusão e acessibilidade da pessoa com deficiência por conta desses fatores. A sociedade que ainda avalia os seus membros sob esse ângulo, ainda não está preparada para conviver com as possibilidades de saberes, de aprendizados e de ressignificações do quanto pode ser conhecido por incluir a pessoa com deficiência.

Diniz (2007) aponta a deficiência como um corpo com lesão que encontra uma estrutura social oprimente e que segrega e humilha o deficiente. Nesse sentido, é plausível considerar o que afirma Dussel (1993:44), quando pontua que

A “conquista” é um processo militar, prático, violento que inclui dialeticamente o Outro como o “si-mesmo”. O Outro, em sua distinção, é negado como Outro e é sujeitado, subsumido, alienado a se incorporar à totalidade dominadora como coisa, como instrumento, como oprimido (...)

Ambos os autores convergem nesse ideal por refletir socialmente acerca das condições que englobam as relações de dominância e dominado e, partindo das discussões sobre os excluídos da educação inclusiva, correlacionar com a deficiência o referido debate pode trazer elucidações sobre condições modernas que ainda são sub-humanas no referir-se às pessoas com deficiência diante da opressão e da alienação. Há, na sociedade, inúmeros eufemismos discriminatórios para referir-se a determinado grupo, é o caso de nomenclaturas como “aleijado”, “manco”, “retardado”, “pessoa portadora de necessidades especiais”, “pessoa especial”, dentre outros. Durante muito tempo esses termos pejorativos eram usados para referir-se a qualquer pessoa com deficiência. Ou seja, qualquer pessoa que fosse considerada “anormal” em seu cognitivo ou corpo

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físico tinha sobre si postos apelidos degradantes a fim de rotulá-los e pô-los como exclusivo frente às exigências da sociedade.

Compartilhada por muitas pessoas, a deficiência também passou a contribuir para o capitalismo, visto que os deficientes cumprem função econômica e uma função ideológica que os mantem em inferioridade. O modelo médico afirmava que a segregação, desemprego e baixa escolaridade que causavam a opressão, era resultado da inabilidade do corpo lesado para o trabalho produtivo, ou seja, ser deficiente era ter ineficácia social. Percepções sobre esse modelo, direciona-se ao pensar de Santos (2003:40), quando nos diz que

Há uma relação carnal entre o mundo da produção da notícia e o mundo da produção das coisas e das normas. A publicidade tem, hoje, uma penetração muito grande em todas as atividades, como na profissão médica, ou na educação. [...] Hoje, propaga-se tudo, e a política é, em grande parte, subordinada às suas regras. (SANTOS, 2003, p.40).

Para o autor, existem regras sociais que determina o lugar das pessoas e das coisas, com características próprias que por vezes nos remete à uma segregação inerente. Tratando-se das pessoas com deficiência, as vagas subalternas e de menor valor social são as que restam para esse público como finalidade de justificar uma inclusão que ainda se encontra distante do ideal esperado.

A segunda geração do modelo social inicia com as teóricas feministas e preocupavam os teóricos da primeira geração. Se as mulheres, por si só já eram um grupo segregado, como elas entrariam na luta pela deficiência? Elas entendiam que os primeiros teóricos faziam parte da elite dos deficientes, agora, contudo, deveria ser dada atenção também às mulheres cuidadoras que ajudam esses

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deficientes. Elas buscavam defender e emergir a crítica ao princípio da igualdade pela independência, a emergência do corpo com lesões e as discussões sobre o cuidado. Se os primeiros teóricos buscavam a eliminação de barreiras e independência para “normalizar” a vida dos deficientes, as feministas entendiam que alguns deles jamais teriam independência ou capacidade para o trabalho independente de quanto às barreiras fossem eliminadas. Logo, surge a ideologia da interdependência, baseada na ideia de que todo ser humano – deficiente ou não – precisa de outro. Nesse viés, as pessoas com deficiência precisariam e deveriam ser inclusas na sociedade, esta última, por sua vez, deveria propor meios para recebê-los adequadamente. Com esses avanços direcionados pelas feministas, muitas revisões de alguns pressupostos e políticas públicas também precisaram ser revistas.

Diniz (2007) aponta a deficiência na contemporaneidade como reclamando “o direito de estar no mundo” e exercendo o direito de querer ser incluso no meio socioeducacional. Necessário, além disso, o repensar de alguns estigmas – muitas vezes inconsciente – de associar deficiência à ineficácia ou inferioridade e sim encará-la como uma forma de diversidade humana e pluralidade de estilos de vida.

Compreendendo as perspectivas de inclusão na contemporaneidade: avanços importantes

Quando pensamos nas perspectivas e possibilidades de inclusão aplicada a deficiência precisamos recorrer a análises sistêmico- reflexivas sobre este objeto principal de estudo. Por exemplo, quem exclui? De onde parte o local da exclusão? Exclusão de quê? Quando falamos de deficiência, subentende-se que há um conceito implícito

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de normalidade. Para que possamos atribuir a alguém a terminologia de pessoa com deficiência, necessitamos simultaneamente dizer que há um grupo sem deficiência que julga a terminologia empregada.

Infelizmente, o emprego da palavra, como já dito, vem eclodido a partir da segregação, da marginalização e embutidos de preconceitos.

Em muitas culturas define-se por normal o que a maioria é ou os padrões que certo grupo majoritário estabelece como ser seguido.

Mas, quando falamos de maioria, minimizamos a diversidade ou a colocamos como minoritária frente a esse cenário. Dessa forma, cabe a reflexão: quem cria o conceito de normalidade? Normalidade pra quem? É necessário compreendermos que, se há uma tentativa de manter um padrão de pessoas, de cognição, de mobilidade ou de qualquer outro aspecto atrelado à deficiência, como a diversidade se articula com normalidade? É inimaginável entender essa relação conflituosa no contexto da luta pela inclusão da pessoa com deficiência na sociedade. A diversidade sobre a qual falamos é tão grande que, mesmo o termo “pessoa com deficiência” não contemplaria as muitas deficiências e as singularidades presentes em cada sujeito. Freire (1998), é enfático quando afirma que

Aceitar e respeitar a diferença é uma dessas virtudes sem o que a escuta não se pode dar. Se discrimino o menino ou menina pobre, a menina ou menino negro, o menino índio, a menina rica; se discrimino a mulher, a camponesa, a operária, não posso evidentemente escutá-las e se não as escuto, não posso falar com eles, mas a eles, de cima para baixo. Sobretudo, me proíbo [de] entendê-los. Se me sinto superior ao diferente, não importa quem seja, recuso-me [a]

escutá-lo ou escutá-la. O diferente não é o outro a merecer respeito é um isto ou aquilo, destratável ou desprezível.

(FREIRE, 1998, p. 136).

Nas reflexões empregadas nesses dois parágrafos introdutórios e coadunando com o pensar de Freire, percebe-se a necessidade de

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despir-se do conceito social empregado do que é a verdade absoluta para compreender o diferente e as diferentes. Afinal, quem se propõe a utilizar a ótica da pessoa com deficiência para definir a própria deficiência? Quem se dispôs a colocar-se no lugar do outro para definir agora do meu lugar de segregado o conceito de normalidade?

Se há muitos pontos de vista sob a mesma questão, por que apenas um conduz a sociedade enquanto outros são ignorados? Para compreendermos um pouco mais sobre essa análise é necessário entender as perspectivas de inclusão na sociedade atual, suas relações conflituosas, bem como os ganhos conquistados e as lutas ainda por vir.

Muitas declarações e leis emergiram ao final da década de 40 em prol da educação especial e dos princípios da inclusão. Algumas foram mais marcantes e serviram como base para outras mais recentes. Estudos mais direcionados sobre a deficiência iniciaram no período após a segunda guerra mundial e com a Declaração Universal dos Direitos Humanos que passa a reconhecer que:

Todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos [...] (Art. 1º), [...] sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação (Art.

2º) (Declaração, 1948, p.1)

Em seu Artigo 26º, item 1 a mesma Declaração continua

Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito (Declaração, 1948, p.1)

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De acordo com os dois artigos acima citados, não deveria haver distinção entre seres humanos e todos estão equiparados em ter e manter os mesmos direitos, inclusive quanto à educação. Esse foi um marco significativo na história da educação especial em virtude de que, mesmo sem as políticas públicas direcionadas, incluíram-se também os direitos da pessoa com deficiência junto a dos cidadãos sem deficiência. Além disso, com o término da segunda guerra mundial, muitas pessoas lesionadas passaram a retornar aos seus países o que exigiu que fosse repensado um modelo estratégico para que as mesmas tivessem seus direitos assegurados mesmo com algumas sequelas adquiridas, ainda que a priori as adaptações fossem direcionadas a cegos e mutilados.

Em 1990, outro marco importante na história da educação especial e inclusiva acontecera, era a Declaração Mundial de Educação para Todos. Somada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, garantia igualdade a todos os indivíduos nos quesitos educacionais sem distinções quando diz que “a educação é um direito fundamental de todos” e consequentemente os países que aderiram comprometeram-se a promover a educação igualitária em seu território.

Nos anos subsequentes, a Declaração de Salamanca (1994) e a Declaração de Guatemala quatro anos após, serviriam como norteadores para a implantação de políticas públicas voltadas para a educação especial e tópicos relacionados à inclusão. A Declaração de Salamanca em sua introdução estabelece que

As escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras. Devem acolher crianças com deficiência e crianças bem-dotadas; crianças que vivem nas ruas e que trabalham; crianças de populações

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distantes ou nômades; crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos ou zonas desfavorecidas ou marginalizadas (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA p. 17-18)

Seguindo o princípio da equidade estabelecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, as escolas e instituições de ensino deveriam dispor-se a garantir o acolhimento e possibilitar condições para que todas as crianças aprendessem de forma igualitária. Ou seja, todos os indivíduos ali incluídos gozariam das mesmas oportunidades disponibilizadas para o seu desenvolvimento sem distinções. Em relação aos professores que atenderiam esse público a Declaração prossegue afirmando que

É preciso repensar a formação de professores especializados, a fim de que estes sejam capazes de trabalhar em diferentes situações e possam assumir um papel - chave nos programas de necessidades educativas especiais. Deve ser adoptada uma formação inicial não categorizada, abarcando todos os tipos de deficiência, antes de se enveredar por uma formação especializada numa ou em mais áreas relativas a deficiências específicas. (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA p. 28)

A declaração reafirma e entende que, para que a educação fosse de fato acontecer conforme previsto, os profissionais envolvidos nesse processo educacional também deveriam qualificar-se para melhor atendimento do público. Isso incluiria adaptações que promovesse a inclusão, metodologias diferenciadas quando isso fosse necessário e valorização das individualidades e potencialidades do sujeito dentro dos seus limites. Da mesma forma, a Declaração de Guatemala (1999), reafirma que a pessoa com deficiência tem os mesmos direitos que os outros cidadãos e não devem ser discriminadas – isso porque anteriormente muitos, por serem deficientes, não tinham seus direitos assegurados, tampouco eram considerados cidadãos como a grande maioria.

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No Brasil, um dos marcos importantes no que diz respeito ao direito da pessoa com deficiência encontra-se na Constituição de 1988 que, assim como os outros documentos, ressalta a importância do ensino gratuito e igualitário a todos, sem exceções. Nesse caso, a pessoa com deficiência, outrora marginalizada e excluída da sociedade e dos processos educacionais passa a ter direitos iguais que, ainda nos períodos mais remotos da inclusão, garantiria a integração do sujeito à sociedade.

Mais a frente, em concomitância com a Declaração de Salamanca e passando a vigorar no mesmo ano, encontramos a Lei de Diretrizes e Base da Educação-LDB 9394/96 – que rege a nossa educação até o presente momento. Essa lei vem reafirmar a inclusão da pessoa com deficiência no processo educacional na qual deve ser realizada na rede regular de ensino desde a educação infantil até o ensino. Abrem-se então precedentes para que, ainda com dificuldades, a pessoa com deficiência ingresse nos ambientes acadêmicos sem a discriminação que por muitos anos perdurou na sociedade.

Atualmente, as políticas públicas voltadas para as pessoas com deficiência no Brasil encontram-se devidamente estabelecidas e com o seu lugar reconhecido nacionalmente. Como ultima conquista, temos a Lei Brasileira de Inclusão 13.146/15. O intuito da LBI é garantir e assegurar os direitos da pessoa com deficiência em condições de igualdade para que ocorra a inclusão e o exercício da cidadania. A partir dela, a pessoa com deficiência pode consultar os seus direitos quanto à cidadania, educação, saúde, assistência social, previdência, trabalho, transporte, moradia e outros. Compreendendo as questões histórias que impossibilitavam essas conquistas, sem

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dúvidas estamos diante de um avanço considerável para a população brasileira que faz uso dela.

Muito ainda há de ser feito, é verdade. Porém, para os envolvidos no processo de inclusão na sociedade, importante é entender que a luta é diária, contínua e incansável. Sonhemos desde já com o dia em que não precisaremos falar em inclusão, pois todos serão cidadãos desde o nascimento dentro das suas singularidades, dentro da sua diversidade e não “apesar” de sua deficiência, mas

“com” a sua deficiência.

Considerações finais

Ao longo do texto, objetivou-se contemplar as percepções contemporâneas acerca do processo de inclusão da pessoa com deficiência. De forma específica, buscou-se compreender a luta pelo processo de inclusão da pessoa com deficiência a partir do conceito de deficiência a luz da fenomenologia e analisar as políticas de inclusão contemporâneas que podem favorecer a inclusão. Para tanto, utilizou-se a metodologia de caráter qualitativo e bibliográfico com reflexões pautadas na própria fenomenologia.

Na primeira seção foi trazido uma visão breve sobre a fenomenologia e suas possíveis contribuições enquanto pano de fundo para melhor discutir percepções contemporâneas a luz de questionamentos pertinentes sobre a inclusão da pessoa com deficiência. Posteriormente, o artigo trouxe uma análise socioeducacional do que seria a deficiência e como suas implicações sociais, bem como a necessidade de minimizar eventuais barreiras atitudinais que corroboram para um modelo segregador quanto a

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visão da pessoa com deficiência. Por fim, são analisadas algumas políticas públicas atuais que contribuem para o fortalecimento do movimento em prol da inclusão da pessoa com deficiência, especificamente da Declaração de Salamanca até a Lei Brasileira de Inclusão 13.146/15.

Considerando os argumentos expostos diante dos tópicos e a contemplação dos objetivos pré-determinados, ainda se fazem necessárias algumas pontuações. Por que ainda se fala tanto em inclusão quando todos possuem direitos iguais perante as leis? Qual a validação de constantemente novas políticas públicas para reforçar as anteriores? Quais entraves entre validação e efetivação? Necessário, ainda, expandir caminhos correlatos a este estudo que direcionem às respostas para os questionamentos pontuados acima como forma de melhor compreender as lacunas existentes na inclusão.

Percebe-se, mediante o exposto, que o trajeto a ser trilhado ainda é longo, mas que cada conquista efetivada, certamente é um ganho singular na luta da pessoa com deficiência pela inclusão socioeducacional.

REFERÊNCIAS

Brasil. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.

Brasília: Imprensa Oficial.

______. (1996). Lei nº 9.394, de 23 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto.

______. (1994). Declaração de Salamanca e linhas de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília: UNESCO.

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______. (2015). Lei n º 13. 146, de 06 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Brasília/DF.

Diniz, D. (2007). O que é deficiência. São Paulo: Brasiliense.

Dussel, E. (1993). 1492: o encobrimento do outro: a origem do mito da modernidade. Petrópolis: Vozes.

Freire, P. (1988). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

Gerhardt, T. E.; Silveira, D. T. (org). (2009). Métodos de Pesquisa. Coordenado pela Universidade Aberta do Brasil – UAB/UFRGS e SEAD/UFRGS. Porto Alegre: Editora da UFRGS.

Ribas, J. B. Cintra. (2003). O que são pessoas deficientes. São Paulo: Brasiliense.

ROJAS, J (2006). Efeitos de sentido e fenomenologia nas práticas educativas: linguagem, cognição e cultura. In: III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS QUALITATIVOS – V ENCONTRO DE FENOMENOLOGIA E ANÁLISE DO EXISTIR, 2006, São Bernardo do Campo. Anais. São Bernardo do Campo: Editora SE&PQ - Coeditora UMESP, v. 1, 2006, p. 1-10.

Santos, M. (2003). Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 10. ed. Rio de Janeiro: Record.

Referências

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