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A relação professor/aluno e o processo ensino aprendizagem em matemática

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Academic year: 2021

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A relação professor/aluno e o processo ensino aprendizagem em matemática

Rosemeri Vieira Dittrich

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I. Introdução

A experiência de sala de aula nos mostra que o aluno que num dia está empenhado em resolver exercícios e solucionar problemas, que faz perguntas e participa ativamente da aula, no dia seguinte pode bem apresentar-se de forma completamente diversa: mal consegue entrar na discussão, logo se cansa e abandona a aula. O professor, à frente, torna- se o guia de uma viagem indesejada. Não é inusual o recurso ao que bem se poderia denominar tratamento de choque: “prova na semana que vem: capítulos 1, 2, 3, 4 e 5”.

Reconquista-se o aluno para a aula, para a matemática, contudo, em boa parte dos casos, um aprendiz a menos.

Quando falamos em aprendizado nos referimos a um processo de duas vias: por um lado há o esforço do professor em apresentar sua disciplina, os problemas que devem ser confrontados, os instrumentos à disposição, a utilidade do que se ensina. Do outro lado, os alunos esforçam-se para entender, ouvem, perguntam, especulam sobre o que fazer, investigam, fazem comparações entre si. Há os momentos de inspiração e de entendimento, e há os momentos do trabalho de fixação, nos quais se busca criar uma espécie de hábito cognitivo associado ao processo de raciocínio matemático. Assim o processo de aprendizagem vai se construindo. Logo destacam-se alguns alunos: alguns positivamente, porque aprendem com facilidade, outros negativamente, porque parecem incapazes de entender os temas em discussão. De forma mais ou menos paralela surge uma divisão entre

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Mestranda, Programa de Pós-Graduação em Educação, linha de pesquisa: ensino de ciências e matemática.

Universidade de São Paulo.

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os que participam efetivamente das atividades e os que ficam de certo modo à margem, ainda que aparentemente envolvidos.

Frente a esse quadro, a questão que motiva minha pesquisa é a seguinte: quais são os fatores que produzem entre um número significativo de estudantes no ensino fundamental e médio uma atitude com relação à metamática de aversão, ou até mesmo, medo? Porque alguns alunos evitam a metamática a ponto de inviabilizarem o processo de ensino-aprendizagem?

Segundo Gómez Chacón (1997a, citação em 2003. p.23 ):

“Ao aprender matemática, o estudante recebe estímulos contínuos associados a ela – problemas, atuações do professor, mensagens sociais, etc. – que geram nele certa tensão. Diante destes estímulos reage emocionalmente de forma positiva ou negativa.

Essa reação está condicionada por suas crenças sobre si mesmo e sobre a matemática.

Se o indivíduo depara-se com situações similares repetidamente, produzindo o mesmo tipo de reações afetivas, então a ativação da reação emocional (satisfação, frustração, etc.) pode ser automatizada e se “solidificar” em atitudes. Essas atitudes e emoções influem nas crenças e colaboram para sua formação.”

Com essa perspectiva em mente, minha hipótese, inicial e parcial, para investigar o

processo de solidificação de atitudes negativas com relação à matemática, remete à relação

professor/aluno. Não obstante as pressões do sistema escolar, em sentido amplo, parece-me

que o professor tem boa parte da responsabilidade pela formação de estereótipos negativos

com relação à matemática. Como corolário desta afirmação argumento que o processo de

formação de professores, nos cursos de Licenciatura em Matemática, é central para que esta

dinâmica prático-simbólica hoje oposta à matemática possa ser revertida em favor de

formas de ensino-aprendizem mais efetivas.

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II. Argumentos

Quando comecei a ministrar aulas na rede estadual, em Curitiba, no Paraná, em 1998, sentia que o meu medo de não conseguir manter a disciplina em sala me levava a ser uma professora rígida e extremamente fechada. Preocupava-me mais com a quantidade do que com a qualidade do conteúdo, e de modo algum eu me permitia demonstrar qualquer afeição pelos alunos.

Com o passar dos anos fui compreendendo que manter contato, ter amizade e dar crédito aos alunos poderia me ajudar a conduzir minhas aulas de maneira mais leve e que com isso ia ganhando a atenção e o respeito dos mesmos, ao contrário do que eu temia inicialmente. A qualidade das aulas aumentou significativamente e ao mesmo tempo, vínculos de amizade passaram a surgir entre a professora e seus alunos.

Inés Maria Gomes Chacón refere-se ao aspecto emocional do processo de ensino/aprendizagem logo na introdução do seu livro Matemática Emocional: os afetos na aprendizagem matemática. Abrindo o panorama da discussão que vai iniciar, a autora observa que:

“... Hoje há um crescimento da consciência coletiva sobre a necessidade de desentranhar os aspectos emocionais do conhecimento, nos quais possivelmente há de se buscar a raiz de muitos fracassos de nossa vida intelectual e, em particular, de nossa educação.” (2003, p.13).

Este ponto é de enorme relevância para minha pesquisa, pois parte importante do argumento que procuro desenvolver, caminha justamente na direção de articular conhecimento e emoção, sob a forma dos afetos desenvolvidos em sala de aula, tanto positiva quanto negativamente. Nisso, sigo ainda Gomes Chacon, que mais adiante destaca:

“A importância e a insistência dada ao tema dos afetos é hoje assumida e aceita

pelos professores, cada dia mais dispostos a reconhecê-las como elementos de valor

e interesse indiscutível no acompanhamento e na avaliação do processo de ensino

aprendizagem.” (Gomes Chacón 2003, p.26):

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Para alguns autores essa questão já ganhou relevância de forma clara. Citando um estudo de Célia Hoyles que investiga a relação entre a afeição pelo professor e o gosto pela matemática, Rômulo Lins (citado em Bicudo e Borba, 2004, p. 92-120), afirma:

“O resultado a que ela [Célia Hoyles] chegou era o de que com relação à Matemática, muito mais do que em outras disciplinas, havia uma forte correlação positiva entre gostar do professor e gostar da matéria, isto é, na grande maioria dos casos alunos se colocavam em “gostar do professor e gostar da matéria” ou em “não gostar do professor e não gostar da matéria”. Nos outros casos, cruzados, muitos poucos”.

Esse estudo parece sugerir, de forma talvez surpreendente, que a aversão à matemática talvez esteja relacionada mais com a postura do professor em sala de aula, ao seu modo de relacionamento com os alunos, do que com a matemática propriamente dita.

Este é um ponto que desejo explorar com particular atenção, pois essa hipótese parece-me apoiada de forma expressiva por minha própria experiência e por minha reflexão diante dos relatos dos meus alunos ao longo dos últimos anos. Pude ver alguns superando seus

“traumas”, até mesmo com relação a formulação de dúvidas em voz alta, um obstáculo tão comum ao processo de ensino/aprendizagem, através do contato mais humano que procurei ter com eles.

Em 2006, durante a defesa do Trabalho de Conclusão de Curso de uma de minhas alunas da Licenciatura em Matemática, no Complexo de Ensino Superior do Brasil - UniBrasil, pude constatar como a atuação do professor em sala de aula e sua relação com os alunos pode influenciar a vida escolar do educando e gerar uma emoção negativa diante da disciplina. Cleonice Francisca Boa Sorte, relata em seu trabalho o seguinte:

O tema Avaliação sempre foi um assunto espinhoso para mim. No último ano do

ensino médio vivi uma experiência triste no campo da avaliação. Acredito ter sido

avaliada injustamente por uma professora de Matemática, que desde o início do ano

dizia que me reprovaria no final do ano letivo. De fato ela cumpriu a sua promessa.

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Até hoje tento entender os seus métodos e o porquê dessa atitude. A avaliação tornou- se um terror para mim. Em matemática creio que grande parte dessa visão amedrontadora de avaliação tem a ver com a postura do professor. Naquela época prosseguir os estudos foi impossível, não havia estrutura psicológica, fato que acabou afastando-me da escola por muito tempo. Desde 2003 resolvi enfrentar as dificuldades e, principalmente, superar os obstáculos. [Em 2003 Cleoníce ingressou no curso de Licenciatura em Matemática, que continua cursando]

No relato de Cleonice podemos perceber duas coisas relevantes para nosso tema de discussão: em primeiro lugar, o quanto critérios objetivos e subjetivos se mesclam na relação professor/aluno, no caso, negativamente. Além disso, o quanto a instabilidade criada por relações emocionais não refletidas e devidamente trabalhadas pelo professor em sala de aula, podem acabar produzindo consequências de longo prazo do ponto de vista da relação do aluno com a disciplina, para além de ter consequências sobre seu desempenho escolar.

Para resumir este ponto, vale a pena destacar as palavas de Perrenound, que de forma simples mas significativa observou:

A principal ferramenta de trabalho do professor é sua pessoa, sua cultura, a relação que instaura com os alunos, individual ou coletivamente. Mesmo que a formação esteja centrada nos saberes, na didática, na avaliação, na gestão de classe e nas tecnologias, nunca se deve esquecer a pessoa do professor. (Perrenoud, 2001, p.176) III. Objetivos

O objetivo da minha pesquisa, portanto, é trabalhar questões de didática, com ênfase

no aspecto abertamente subjetivo do processo de ensino/aprendizagem - explorando de que

modo a postura do professor em sala de aula, seu modo de tratar os alunos, sua habilidade

para estabelecer relações e negociar conflitos e pontos de tensão, pode contribuir para que o

processo didático, em si mesmo, possa se desenvolver de forma mais efetiva. Tendo isso

em vista, meu objetivo é identificar fatores que levam estudantes de ensino fundamental e

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médio a terem aversão à matemática escolar, buscando, adicionalmente, formular contribuições ao processo de formação de professores, nos cursos de Licenciatura em Matemática, com vistas a estimular o desenvolvimento de práticas didáticas conscientes da importância de trocas intersubjetivas, entre o professor e seus alunos, no processo de ensino-aprendizagem.

IV. Metodologia

Como metodologia de pesquisa, em função do problema que pretendo investigar e das questões e objetivos que orientam a investigação, creio que a modalidade qualitativa é a mais adequada. Questionários rígidos e pré-determinados, úteis para outras situações, provavelmente esconderiam mais do que revelariam no contexto desta pesquisa.

Referências nesse sentido podem ser encontradas na excelente introdução à pesquisa

qualitativa oferecida por Bogdan e Biklen (1994). A princípio, portanto, faço opção pela

realização de entrevistas semi-estruturadas, por conta de seu carater flexível – que permite

aos envolvidos maior liberdade para formular suas respostas. Alunos e professores, de

ensino fundamental e médio, deverão ser entrevistados. Como forma de selecionar temas

relevantes para professores e alunos, creio que a realização de grupos focais pode ser útil –

seja com a formação de grupos compostos apenas por professores, apenas por alunos, ou

por ambos.

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Referências bibliográficas:

BOA SORTE, Cleonice F. Refletindo sobre as implicações da avaliação. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Matemática). Complexo de Ensino Superior do Brasil – Unibrasil, Curitiba, 2006.

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Portugal: Porto Editora, 1994.

CHACÓN, Inés Mª Gómes. Matemática Emocional: os afetos na aprendizagem matemática. Trad. Daisy Vaz de Moraes. Porto Alegre: Artmed, 2003.

LINS, Romulo Campos. Matemática, Monstros, Significados e Educação Matemática. In:

BICUDO, Maria Aparecida Viggiani; BORBA, Marcelo de Carvalho. (org) Educação Matemática pesquisa em movimento. São Paulo: Cortez, 2004.

PERRENOUD, Philippe. A Prática Reflexiva no Ofício de Professor Profissionalização e

Razão Pedagógica. Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.

Referências

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