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Atuação da rede de proteção nos processos de destituição do poder familiar: Vara da Infância e Juventude da Comarca da Capital/ SC - ano 2018

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ATUAÇÃO DA REDE DE PROTEÇÃO NOS PROCESSOS DE

DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR:

VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DA CAPITAL/

SC

– ANO 2018

Florianópolis 2019

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Isabel Cristina Soro Melo

ATUAÇÃO DA REDE DE PROTEÇÃO NOS PROCESSOS DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR:

VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DA CAPITAL/ SC – ANO 2018

Trabalho Conclusão do Curso de Graduação em Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para a obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dra. Josiane Rose Petry Veronese

Florianópolis 2019

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Este trabalho é dedicado aos meus amigos de graduação e aos meus queridos pais.

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AGRADECIMENTOS A Deus, pelas graças concedidas.

À Josiane Rose Petry Veronse, minha orientadora, pela confiança, pelos ensinamentos e pelos apontamentos preciosos para a conclusão desse trabalho.

Às amizades construídas ao longo da graduação, em especial aos meus amigos queridos: Amannda, Kris, Páthilla, Susanna, Matheus, Murillo, Bruno e Lucas.

À minha dupla de EMAJ e parceira durante toda a graduação, Gabriela.

Aos meus colegas de equipe da Vara da Infância e Juventude, que durante os dois anos de estágio me inspiraram a escrever sobre o tema dessa pesquisa. Em especial à magistrada Dra. Brigitte por permitir o uso das informações que viabilizaram o estudo de caso.

Aos meus pais, madrasta querida e minha irmã Júlia pelo auxílio e amor durante toda a caminhada.

Aos meus amigos de infância por todos esses anos de amizade, e por serem motivo de orgulho pelas pessoas fortes e talentosas que se tornaram.

Aos amigos que Deus colocou em meu caminho através da Igreja Luterana: Felipe, Roberta, Mateus, Camilla, Daniel.

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RESUMO

O presente trabalho objetivou analisar de forma pragmática a garantia do direito de crianças e adolescentes e dos princípios dispostos na Lei n° 8.069/1990, quando da aplicação da medida de proteção de acolhimento institucional. A medida tem incidência nos casos em que os direitos das crianças e adolescentes estiverem ameaçados ou violados, em razão de ação, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis. O acolhimento institucional tem como pilar os princípios da provisoriedade e excepcionalidade, devendo o Estado promover as políticas públicas necessárias que visem o retorno da criança acolhida ao convívio familiar de origem, ou, em último caso, encaminha-las para família substituta. Dessa forma, para falar sobre as Políticas Públicas que atendem a crianças e adolescentes quando dos direitos violados, o trabalho destacou dois importantes diplomas no âmbito social: o Plano Nacional de Assistência Social e o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Por meio do estudo de tais diplomas, em conjunto com o Estatuto da Criança e do Adolescente o trabalho apresentou as possibilidades de encaminhamentos para atendimentos junto a rede de proteção. Ao analisar os encaminhamentos realizados nos processos de destituição do poder familiar com medida de acolhimento institucional, observando quais instituições da rede de proteção os pais e as crianças acolhidas foram atendidos, o estudo concluiu que houve investimento no retorno das crianças à família de origem e a adequada atuação da rede de proteção. A metodologia utilizada foi a dedutiva, tendo em vista o estudo dos processos de destituição do poder familiar em que houve a aplicação da medida específica de proteção do acolhimento institucional.

Palavras-chave: Estatuto da Criança e do adolescente. Acolhimento institucional. Direito à convivência familiar e comunitária. Rede de proteção.

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ABSTRACT

The goal of this work was to pragmatically analyze the guarantee of children and adolescents’ rights with regard to the Law 8.069/1990 and its principles, especially with respect to the application of protection measures and institutional care. Such measures apply in cases in which children and adolescents’ rights are being threatened or violated due to action, omission or abuse of the parents or legal guardians. Institutional care is based on the principles of exceptionality and provisionality and it’s the State’s responsibility to promote the necessary public policies that will allow the children to return to their original families or, at least, their placement in surrogate families. In this way, to discuss the Public Policies that attend the children and adolescents whose rights are violated, this work highlighted two important social diplomas: The National Plan for Social Assistance and the National Plan for the Promotion, Protection and Defense of the Rights of Children and Adolescents to Family and Community Living. Through the study of such diplomas, together with the Statute of the Child and Adolescent, the work presented the different possible ways of assistance within the protection network. By analyzing the procedures followed in processes of family power destitution with institutional reception measures, observing which protection network institutions the parents and the children were attended by, the study concluded that there was an improvement on the procedures aiming the children’s return to their original families and an adequate performance of the protection network. The methodology used was the deductive one, in view of the study of the processes of destitution of the family power in which the specific measure of protection of the institutional reception was applied.

Keywords: Statute of Children and Adolescents. Institutional care. Right to live among family members and community. Protection network.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 A DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR E O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL COMO MEDIDA DE PROTEÇÃO NO BRASIL ... 13

2.1 HISTÓRICO ... 13

2.2 O PODER FAMILIAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ... 16

2.2.1 Código Civil de 1916... 17

2.2.2 Código de Menores 1927 e 1979 ... 18

2.2.3 Constituição Federal de 1988 ... 19

2.2.4 Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069 de 1990... 20

2.2.5 Código Civil de 2002... 21

2.3 PODER FAMILIAR – CARACTERÍSTICAS E CONCEITO ... 22

2.4 SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR ... 24

2.5 O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL COMO MEDIDA DE PROTEÇÃO E O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA ... 28

2.5.1 Medidas de Proteção previstas na Lei 8.069/90. ... 30

3 A POLÍTICA DE ATENDIMENTO E ASSISTÊNCIA SOCIAL ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES ... 37

3.1 POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – PNAS ... 39

3.1.1 A política pública de assistência social ... 40

3.1.2 Princípios e diretrizes da Política Nacional de Assistência Social ... 41

3.1.3 Proteção Social Básica... 42

3.1.4 Proteção Social Especial ... 44

3.2 PLANO NACIONAL DE PROMOÇÃO, PROTEÇÃO E DEFESA DOS DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA ... 46

3.2.1 A violação de direitos da criança e do adolescente no contexto da família ... 48

3.2.2 Programas de auxílio e proteção à família ... 50

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3.3 SINAIS VITAIS – CONHECIMENTO QUE DÁ PODER PARA

TRANSFORMAR... 55

4 ESTUDO DA ATUAÇÃO DA REDE DE PROTEÇÃO NOS PROCESSOS DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR ... 59

4.1 ESTUDO DE CASO: “MARIA”, “MARA” E “JOÃO” ... 60

4.2 ESTUDO DE CASO: “PÉROLA” ... 63

4.3 ESTUDO DE CASO “PAULA” ... 66

4.4 ESTUDO DOS CASOS CONCRETOS ... 68

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 79

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1 INTRODUÇÃO

O Direito da Criança e do Adolescente, no Brasil, passou ao longo da história por um processo de transformação, sobretudo no conceito da infância, a qual deixou de ser uma preocupação no âmbito privado da família e da Igreja, tornando-se uma questão de cunho social. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, os novos entendimentos quanto à proteção dos direitos das crianças e adolescentes foram acolhidos, ratificando a Convenção sobre os Direitos da Criança no cenário internacional.

Sob a égide da Constituição Federal de 1988, implementou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhecendo um novo direito àqueles que passam a ser considerados sujeitos de direitos, titulares de direitos fundamentais e, que por sua situação peculiar de desenvolvimento, merecem prioridade absoluta sob as lentes da proteção integral. Tanto a Constituição Federal quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhecem que os pais além de direitos, também tem deveres para com os seus filhos, sendo uma forma de exercício do poder familiar.

O artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, elenca como deveres dos pais em relação aos filhos promover-lhes o sustento, a guarda e a educação. Por sua vez, o artigo 24 do mesmo diploma, dispõe que o descumprimento injustificado dos deveres acarretará na perda ou suspensão do poder familiar.

A destituição do poder familiar, somente ocorre por ato judicial, em procedimento contencioso, devendo verificar-se a falta de condições absoluta dos pais em prover o sustento e educação de seus filhos.

Assim, reconhecendo a importância da garantia dos direitos inerentes à condição peculiar de desenvolvimento de crianças e adolescentes, a Lei 8.069/1990 elenca em seu artigo 98 a tutela de crianças e adolescentes que se encontram com seus direitos ameaçados ou violados. Àqueles que se encontrarem no rol do mencionado artigo, deve-se aplicar as medidas de proteção dispostas no artigo 101.

Dentre as medidas previstas no artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o presente trabalho se propõe a analisar especificadamente o acolhimento institucional, a qual tem como princípios a excepcionalidade e a provisoriedade, tendo em vista que apesar de proteger crianças e adolescentes em situações de ameaça ou violação de direitos, também

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promove o afastamento da família e da comunidade, mitigando o direito à convivência familiar. Além disso, deve ser utilizada como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo possível o retorno, para colocação em família substituta.

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que a pobreza não é, por si só, motivo para afastamento da criança ou do adolescente do convívio familiar. Assim, o Estado passa a ter a responsabilidade de atuar nos casos de vulnerabilidade social, auxiliando as famílias para que elas tenham condições necessárias para que possam cumprir seu dever. Nesse sentido, além das medidas protetivas aplicáveis a crianças e adolescentes, o artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece medidas que podem ser aplicadas aos pais.

As políticas públicas de atenção à família devem ser implementadas de forma articulada, frente a necessidade de que crianças e adolescentes tenham garantido o seu desenvolvimento no seio familiar. Proporcionar a proteção integral, com todas as suas exigências e complexidades na prática é tarefa complicada e que nenhuma pessoa ou instituição conseguirá isoladamente cumprir. Assim, é preciso unir esforços e organizar uma “rede de proteção”, compreendido como àqueles atores envolvidos na garantia e promoção dos direitos das crianças e adolescentes.

Dessa maneira, o sistema de garantias de direitos, disposto na Parte Especial do Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo que a política de atendimento aos direitos de crianças e adolescentes está sustentada em quatro linhas gerais: políticas sociais básicas, políticas de assistência social, proteção especial e políticas de garantias de direitos.

As diretrizes, princípios, orientações, atendimentos, além de estarem previstos na Lei 8.069/1990, também estão previstos em outros textos normativos, a exemplo do Plano Nacional de Assistência Social e o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa de Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária.

Por meio do estudo de tais diplomas, compreende-se melhor quem são os atores do sistema de garantias de direitos, percebendo a atuação das instituições, entidades, programas e serviços de atendimento dentro dos processos de destituição do poder familiar em que houveram a aplicação da medida protetiva de acolhimento institucional. Ao analisar a atuação da rede de proteção nos processos, percebeu-se os encaminhamentos realizados aos pais para as políticas de assistência social, assim como o papel atuante do Conselho Tutelar como o órgão capaz de zelar pelos direitos das crianças e adolescentes.

Isto posto, o presente estudo se justifica ante a importância de refletir sobre a efetiva proteção de direitos das crianças e adolescentes durante os processos de destituição do poder

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familiar, principalmente quanto ao direito do convívio familiar e o investimento no retorno das crianças acolhidas institucionalmente ao seio familiar de origem, analisando a provisoriedade e excepcionalidade da medida protetiva.

Destaca-se que é dever da família promover as medidas necessárias para o retorno da criança à família, mas de igual forma, o Estado, através de políticas públicas, deve desenvolver serviços, programas e projetos locais de atendimento de acordo com a vulnerabilidade identificada.

Nesse contexto, problematiza-se: nos processos de destituição do poder familiar em que os filhos estão acolhidos em casas lares, as instituições de atendimento social atuam em rede, investindo na assistência à família para que esse infante possa retornar ao seio familiar?

A partir desta questão, pretendeu-se testar a seguinte hipótese: os encaminhamentos realizados dentro dos processos de destituição do poder familiar, para atendimentos junto à rede de proteção, potencializam a família como uma entidade de referência, fortalecendo vínculos entre seus membros, orientando-as sobre as dinâmicas de negligência e violações de direitos, trabalhando os problemas verificados com vistas ao desacolhimento institucional.

Consistiu em objetivo principal deste trabalho, analisar, sob a matriz pragmática, analisar as instituições de atendimento da Grande Florianópolis, procurando entender a atuação e função de cada uma delas, indo além da temática do Direito ao abordar questões importantes da Psicologia e do Serviço Social na atuação do ramo do Direito da Criança e Adolescente na sua complexidade multidisciplinar.

Demais, são objetivos específicos: 1 - verificar as instituições de proteção social que atuam no cuidado das crianças e adolescentes com direitos violados. 2 - analisar durante o processo de destituição do poder familiar e o período em que o infante esteve acolhido institucionalmente a eficácia da atuação das instituições de apoio e atendimento às famílias.

Este trabalho se subdividiu em capítulos. No primeiro capítulo será explanado o conceito de poder familiar no contexto histórico, mostrando como inicialmente era um encargo dado somente ao pai, e após muitas lutas sociais e evolução do ordenamento jurídico, transformou-se tanto em um dever como em uma obrigação imposto ao pai e a mãe de forma igualitária. Ainda no primeiro capítulo, falou-se sobre o direito de crianças e adolescentes ao convívio familiar e comunitário, e o acolhimento institucional como medida protetiva à crianças e adolescentes com direitos ameaçados ou violados.

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O segundo capítulo, por sua vez, teve o enfoque nas políticas públicas de assistência social e o sistema de garantias de direitos previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Além dos dispositivos sobre o assunto na Lei n° 8.069/1990, o capítulo abordará dois diplomas importantes na consolidação dos direitos e garantias das crianças e dos adolescentes, quais sejam: Plano Nacional de Assistência Social e o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Ao abordar o primeiro plano, falou-se sobre a assistência social como uma política pública e a proteção social básica e a proteção social especial, especificando os objetivos de cada uma. Por sua vez, ao versar sobre o segundo, discutiu-se sobre a importância do investimento em políticas públicas de atenção à família.

O último capítulo, por meio do estudo de caso de processos com vistas à destituição do poder familiar ajuizados na Vara da Infância e Juventude da Capital, ao narrar o caso, procurou-se identificar a atuação da rede de proteção, apontando os encaminhamentos realizados, assim como a compreensão da importância do Conselho Tutelar como o órgão encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. Averiguou-se também a excepcionalidade e a provisoriedade da medida específica de proteção de acolhimento institucional, compreendendo os motivos que levaram a sua aplicação, o tempo de acolhimento e o desfecho do processo.

A metodologia utilizada foi a dedutiva, tendo em vista o estudo dos processos de destituição do poder familiar, em que as crianças foram acolhidas institucionalmente, e houve acompanhamento e atuação da rede de proteção, analisando os encaminhamentos realizados, a aderência ou não da família durante todo o processo. E, através do estudo do processo e da intervenção da rede, procura-se entender e esclarecer os motivos que levaram - ou não - a destituição do poder familiar. Para sustentar o estudo da rede de proteção durante o processo, os conceitos jurídicos e o procedimento do processo de destituição do poder familiar, utilizar-se-á de artigos publicados sobre o tema, obras literárias e doutrinárias.

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2 A DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR E O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL COMO MEDIDA DE PROTEÇÃO NO BRASIL

A destituição do Poder Familiar é um assunto que exige muita discussão por todos aqueles que convivem com o assunto. Atores do direito, psicólogos e assistentes sociais lidam diariamente com a complexidade do tema que, ao longo do tempo, vem sofrendo modificações.

Uma importante mudança aconteceu com a promulgação da Lei n° 12.010/2009, a qual alterou no Estatuto da Criança e do Adolescente a expressão “Pátrio Poder” passando a vigorar o termo “Poder Familiar”. Se antes o poder era concentrado na figura paterna, com a ideia de chefia pelo marido, o poder familiar traz um novo olhar para a entidade familiar, compreendendo-se como o exercício igualitário entre o pai e a mãe a ser exercido com vistas ao melhor interesse da criança.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8.089/1990) consagra a Doutrina da Proteção Integral, estabelecendo em seus artigos 3, 4 e 22 os direitos e as garantias individuais, dispondo também sobre os deveres e obrigações dos pais. A Destituição do Poder familiar tem o lugar de resguardar o desenvolvimento integral da criança e do adolescente, uma vez que é medida aplicada aos pais que não cumprem o disposto no Estatuto.

2.1 HISTÓRICO

Na Roma Antiga, com a influência da religião, a família era compreendida como um pequeno corpo organizado que tinha seu chefe e seu governo. Nessa época antiga, a figura do pai, além de carregar consigo a responsabilidade de ser aquele que protege a família, também era considerado o tronco dos descendentes, o depositário dos ritos misteriosos do culto de modo que toda a religião estava com ele.

Nessa concepção, a palavra pater trazia consigo significado religioso e jurídico. Na linguagem jurídica, o termo era empregado àquele homem que não dependia de outro homem, tendo então autoridade sobre uma família: pater familias. Coulanges em sua obra “A Cidade Antiga”, enumera os direitos que compunham o poder paterno em três categorias: chefe religioso, senhor da propriedade e juiz.

Como chefe religioso, o pater familias tinha o direito de no ato de nascimento do bebê, o reconhecer ou o rejeitar, sem que isso afrontasse os princípios básicos da família.

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Entendia-se que para que essa criança fizesEntendia-se parte do Entendia-seio familiar, não bastava Entendia-ser filho biológico, era necessário também o consentimento do pater para que fosse então associada à religião doméstica e aceita pelo pai. Ainda dentro desse contexto, como não era necessário a filiação biológica para obter o consentimento do chefe, era permitido ao pater adotar um estranho ao lar doméstico.

A propriedade não era concebida como um direito individual, mas sim como um direito de família, e então de titularidade do pater famílias, o pai, o qual assumia também o poder de senhor da propriedade. Sobre o lugar do filho e da mulher no seio familiar, afirma Coulanges 1,

que o filho estava nas mesmas condições que a mulher: não possuía coisa alguma. Não podia adquirir coisa alguma, os frutos do seu trabalho, os lucros do comércio eram devidos ao pai. Se um testamento era feito em seu favor por algum estranho, o pai, e não ele, receberia o legado. Nessa concepção, por ser o pater detentor das posses da família, podia inclusive vender o filho como instrumento de trabalho, gerador de renda, por ser ele considerado propriedade do pai.

De toda a família, somente o pai podia comparecer diante do tribunal da cidade; a justiça pública existia apenas para ele. Para os filhos e para a mulher a justiça dentro do lar, estampado na figura do pater, o qual assumia o papel de um juiz. Podia condenar à morte, castigar e julgar os filhos e a mulher. O direito de justiça exercido pelo chefe de família dentro da sua entidade familiar, era completo e sem apelação, pois ninguém estava acima do pater famílias.

Compreender a história do significado de tal termo, nos dá a ideia da autoridade e do poder que o pai exerceu por muito tempo na família, e do sentimento de respeito que se ligava a ele, como chefe da família, dono da propriedade e juiz das decisões.

Ao longo do tempo, como consequência da reconfiguração dos valores sociais advindos da urbanização, da revolução industrial e do feminismo, o rigor do pater famílias tornou-se mais brando, abandonado o patriarcalismo, em que a mulher e o filho ganharam espaço no seio familiar. Nessa nova perspectiva, novos assuntos começaram a ser discutidos, a exemplo do próprio termo pater familias, o qual foi renomeado para “poder familiar”.

Segundo Rizzini, em sua obra “O Século Perdido”, em meio às grandes transformações econômicas, políticas e sociais do século XIX, o conceito da infância adquire novos significados; a criança deixa de ser objeto de interesse e de preocupação no âmbito privado da família e da Igreja, para tornar-se uma questão de cunho social. Entende a autora que com as transformações ocorridas no século XIX, os confrontos entre dogmas e ideologias

1 (2006, p. 135).

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possibilitaram a revolução nas mentalidades. Com isso, a criança começa a ocupar um lugar importante na família e na sociedade, e a infância passa a ser considerada como um “valioso patrimônio de uma nação”.

Sob esse novo olhar, velar pelas crianças, vigiando-as para que não se desviem, passa a ser parte de uma missão eugênica. O costume de abandonar os filhos, especialmente o abandono moral, relacionado às classes menos favorecidas da sociedade, passa a ser altamente condenável, uma vez que essa espécie de abandono gerava consequências dentro da comunidade: vadiagem, mendicância e criminalidade. A soberania do pater familias perde seu caráter de inquestionável e passa a ser mensurado pelo Estado.

No Brasil, os reflexos dessa visão aconteceram no final do século XIX, em que o país buscava consolidar-se como uma nação, entendendo-se que para isso seria necessária uma missão saneadora e civilizadora. Se por um lado a criança representava o futuro da nação, por outro era fundamental que ela fosse devidamente educada para tornar-se útil para a sociedade. Destaca Rizzini2 a importância do papel da medicina higienista nesse processo, pois ela

ensinava as famílias como educar e vigiar seus filhos, sendo que “aqueles que não pudessem ser criados por suas famílias, tidas como incapazes ou indignas, seriam de responsabilidade do Estado”.

Com o objetivo de salvar o país, e principalmente a sociedade de um problema social, inicia-se no país ações para “salvar” as crianças, surgindo nesse contexto a categoria do menor, entendido como a criança pobre e potencialmente perigosa. A dinâmica de intervenção envolvia diversos profissionais e instâncias, sendo criado em nome dos menores “um complexo aparato médico-jurídico-assistencial”. Sobre o assunto, esclarece Rizzini:

Será da medicina (do corpo e da alma) o papel de diagnosticar na infância possibilidades de recuperação e formas de tratamento. Caberá à Justiça regulamentar a proteção (da criança e da sociedade), fazendo prevalecer a educação sobre a punição. À filantropia – substituta da antiga caridade – estava reservada a missão de prestar assistência aos pobres e desvalidos, em associação às ações públicas. A composição desses movimentos resultou na organização da Justiça e da Assistência (pública e privada) nas três primeiras décadas do século XX. Com discursos e práticas que nem sempre se harmonizavam entre si, a conexão jurídico-assistencial atuará visando um propósito comum: “salvar a criança” par transformar o Brasil 3

2 RIZZINI, Irene. O século perdido. Editora Universitária Santa Úrsula, 2011. p. 28. 3 RIZZINI, Irene. O século perdido. Editora Universitária Santa Úrsula, 2011. p. 30

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Observa-se um caráter salvacionista no discurso, em que era preciso educar as crianças, mas não no sentido de propagar o conhecimento e sim de civiliza-la moralmente para que não virasse um problema social e caísse na criminalidade. Tal crítica é levantada por Irene Rizzini a qual compreende que a política não atendeu a intenção de resguardar as crianças, tendo o Estado dificuldades em conciliar educação com proteção, escrevendo que “a criança deveria ser educada visando-se o futuro da nação; no entendo, tais palavra, transformadas em ação, revelavam que, em se tratando da infância pobre, educar tinha por meta molda-la para a submissão”4

Percebe-se que há crianças que podem ser criadas pelos pais, com o pleno exercício do poder familiar, e outras famílias que, em razão de suas condições sociais e morais, necessitavam da intervenção e tutela do Estado. Contudo, apesar de esse exercício ser pleno, concedendo aos pais autoridade para a criação de seus filhos, não se trata de um poder absoluto, na medida em que, além de deveres também implica em obrigações. O não cumprimento de tais obrigações poderá implicar a interferência do Estado, como forma de promover a proteção da criança e do adolescente, a exemplo da destituição do poder familiar.

Atualmente permanece a atuação do Estado em face do exercício do poder familiar. Com as evoluções ocorridas no tempo, e a formação de um conceito fruto de uma construção social, o instituto do poder familiar passa a ser entendido como um misto de poder e dever imposto pelo Estado a ambos os pais, em igualdade de condições, direcionado ao interesse do filho menor de idade não emancipado, que incide sobre a pessoa e o patrimônio deste filho e serve como meio para mantê-lo, protegê-lo e educá-lo. A legislação brasileira refletiu acerca dessas discussões e evoluiu os conceitos e adaptou as leis, conforme será aprofundado no próximo tópico.

2.2 O PODER FAMILIAR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Como bem argumenta Josiane Rose Petry Veronese e Cláudia Maria Carvalho do Amaral em sua obra “Crianças Encarceradas”, “o poder familiar, nascido como instituto de direito privado, vem sofrendo transformações, fazendo públicas as funções do pai e da mãe, antes concebidos como internos e privados da família”5. A evolução do pensamento da

4 RIZZINI, Irene. O século perdido. Editora Universitária Santa Úrsula, 2011. P. 31.

5 AMARAL, Cláudia Maria Carvalho; VERONESE, Josiane Rose Petry. Crianças Encarceiradas. 1. ed. Rio de

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sociedade refletiu o modo de pensar sobre o lugar da criança e do adolescente no seio familiar, e as leis contribuíram e refletiram tais mudanças.

No presente tópico serão analisados as principais legislações brasileiras e o modo como tratava-se o tema e as modificações ocorridas.

2.2.1 Código Civil de 1916

O Código Civil de 1916, também conhecido como Código Beviláqua, foi instituído pela Lei n. 3.071, de 1 de janeiro de 1916. Antes, vigorava no ordenamento jurídico brasileiro as Ordenações Filipinas. O código de 1916 era a compilação de 2.046 artigos divididos em dois blocos: Parte geral (Das Pessoas, Dos Bens e Dos Fatos Jurídicos) e Parte especial (Do Direito de Família, Do Direito das Coisas, Do Direito das Obrigações e Do Direito das Sucessões).

O código em relação à família, não apresentou inovações, sendo um diploma marcado pela moral, tradição e por um modelo conservador de organização familiar, confirmando a estrutura patriarcal da sociedade. Isso fica visível no início do diploma ao dispor que a mulher casada é incapaz a atos da vida civil enquanto subsistir a sociedade conjugal6. Em relação ao

pátrio poder7, esse era exercido pela figura do pai com exclusividade, e, somente em 1962, com

a Lei n° 4.121/19628, em decorrência das lutas das mulheres por direitos, as mães ganharam o

direito de colaborar com o cônjuge no exercício do pátrio poder9.

Na vigência de tal diploma (Lei n° 4.121/1962) o pátrio poder incidia sobre os filhos, competindo aos pais dirigir-lhes a criação e educação, o dever de guarda, exigindo que lhes prestassem obediência, e respeitassem os serviços próprios de sua idade e condição. Além disso, também recaía o pátrio poder sobre os bens dos filhos, sendo inerente a tal poder o usufruto dos bens dos filhos. A possibilidade de suspensão e extinção do pátrio poder estava previsto nos artigos 392 a 395.

6 Lei n. 4.121, Artigo 6. São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: II – As mulheres

casadas, enquanto subsistir a sociedade conjugal.

7 Termo utilizado pelo Código Civil de 1916. 8 Lei n. 4.121, Estatuto da Mulher Casada.

9 Lei n. 4.121, Artigo 380. Durante o casamento, exerce o pátrio poder o marido, como chefe da família, e, na

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Interessante observar que a mulher que contraísse novas nupciais perdia os direitos do pátrio poder, havendo a oportunidade de recuperá-lo se ficasse viúva.

A Lei n° 3.071/1916 permaneceu vigente no país até janeiro de 2002, e durante esse tempo a sociedade foi se modificando, e o código foi sofrendo transformações. Cita-se como alterações significativas a exclusão do artigo que classificava a mulher como relativamente incapaz, e a inclusão do inciso IV no artigo 267, passando a prever a possibilidade do divórcio como modalidade da dissolução conjugal. Contudo, viu-se a necessidade da elaboração de um novo Código Civil, sobretudo após a vigência da Constituição Federal de 1988, a qual trouxe novos princípios que precisavam ser inseridos no Direito das Famílias e da Criança e do Adolescente.

2.2.2 Código de Menores 1927 e 1979

Sob a vigência do Código Civil de 1916, foi promulgado o Decreto nº 17.943-A, que instituiu o Código de Menores de 1927. O texto foi a primeira lei do Brasil dedicada à proteção da infância e da adolescência e previu que o adolescente é penalmente inimputável até os 17 anos e que somente a partir dos 18 anos poderia responder por seus crimes. O diploma consolidou as leis de assistência e proteção aos menores, visando a tutela do delinquente e abandonado, que tiver menos de 18 anos, devendo ser submetido pela autoridade competente às medidas de assistência e proteção 10.

O código previa mais de 200 artigos, que tratavam sobre a punição dos pequenos infratores, a repressão do trabalho infantil, dos castigos físicos exagerados, e a possibilidade de perda e de suspensão do pátrio poder. A possibilidade de perda do poder familiar, estava compreendida no sentido de que o Estado precisava ter poder para retirar de casa e internar nas escolas especiais os filhos que não recebiam dos pais a devida educação moral. Como tratado no primeiro tópico e explicitado por Rizzini, era um discurso salvacionista, pois era preciso salvar a infância abandonada e regenerar o adolescente.

Com o Golpe Militar em 1964, e as novas diretrizes dadas pela Constituição de 1967, instituía-se o novo Código de Menores, em 10 de outubro de 1979, consagrando a Doutrina do menor em situação irregular. Sobre o diploma, escreveu Veronese:

A Doutrina da Situação Irregular constituía um sistema em que o menor de idade era objeto tutelado pelo Estado, sobrelevando a responsabilidade da família. Em seu art. 2, considerava o menor em situação irregular aquele que se encontrava em seis

10 Artigo 1º do Decreto n. 17.943-A.

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situações distintas, quais sejam: (i) o menor abandonado (em saúde, educação e instrução); (ii) a vítima de maus-tratos ou castigos imoderados; (iii) os que se encontravam em perigo moral; (iv) os privados de assistência judicial; (v) os desviados de conduta; e, por fim, (vi) o autor de infração penal. Percebe-se que tal Doutrina reclama a proteção do Estado tanto para erradicação da irregularidade da situação em que se possa encontrar o infante ou adolescente, quanto para buscar meios eficazes de prevenção, com a constante preocupação da assistência, proteção e vigilância aos então chamados “menores”. (VERONESE, 2017, p. 5).

O Código de Menores de 1979 também era um instrumento de controle social, e por isso, como bem colocou a autora, buscava-se meios de prevenção e erradicação da irregularidade da situação em que a criança ou adolescente encontrava-se. A suspensão e a perda do pátrio poder também estavam previstas no texto nos seus artigos 44 e 45, dispondo que a perda ou suspensão de tal poder não exoneraria os pais do dever de sustentar os filhos. 2.2.3 Constituição Federal de 1988

O Brasil viveu na década de 1980 intensos movimentos sociais que visavam o reconhecimento de novos direitos, não sendo diferente para a construção e institucionalização do Direito da Criança e do Adolescente. A Carta Magna promulgada em 1988 acolheu os novos entendimentos quanto à proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes, acompanhou a Convenção sobre os Direitos da Criança no cenário internacional e implementou na totalidade o texto através do Decreto n° 99.710 de 1990.

A Doutrina da Proteção Integral, foi legitimada na Constituição de 1988 em seu artigo 227, ao dispor que: “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente e ao jovem 11, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, ao

lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão ”.

As garantias trazidas pelo dispositivo supramencionado passam a entender crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, os quais possuem particularidades por serem pessoas em estágio de desenvolvimento, merecendo, assim, um tratamento diferenciado. Sobre o tema, Veronese em sua obra “Direito da Criança e Adolescente”, destaca a atuação da Doutrina da

11 Emenda Constitucional n° 65 de 2010, a qual incluiu a categoria do jovem ao artigo 227 da Constituição

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Proteção Integral em três pontos. O primeiro é a implicação que a infância e a adolescência são admitidas como prioridade imediata e absoluta. O segundo é o entendimento do princípio do melhor interesse da criança ao considerar que cabe à família o dever de garantir proteção e cuidado. Nesse contexto, assume um papel importante também a comunidade na intervenção e responsabilização pelas crianças, e o Poder Público com a criação de instrumentos para assegurar os direitos. Por fim, a Doutrina da Proteção integral reconhece a família como o ambiente natural para o crescimento e bem-estar das crianças.

O artigo 227 da Constituição trouxe um rol de deveres outorgado pelo Estado aos pais para serem realizados em favor da criança e do adolescente, como uma forma do exercício do poder familiar. Esse poder assume um viés de irrenunciabilidade, o que significa, que são disposições fundamentais e que não podem ser renunciados, pois são inerentes ao poder familiar e constituem deveres fundamentais cuja mediação vertical se encontra no Estatuto da Criança e do Adolescente 12.

2.2.4 Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n° 8.069 de 1990.

Sob a égide da Constituição Federal de 1988 implementou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual reafirmou a Doutrina da Proteção Integral13. Surgiu, então, para àqueles

considerados sujeitos de direitos, titulares de direitos fundamentais inerentes à pessoa humana e, que por sua situação peculiar de desenvolvimento, merecem prioridade absoluta sob as lentes da proteção integral. Sobre a mudança de paradigma e o importante papel do Estatuto da Criança e do Adolescente, destaca Josiane Rose Petry Veronese:

A construção de um novo ordenamento jurídico que se ocupasse seriamente dos direitos da infância e da adolescência era de caráter imprescindível, pois havia uma necessidade fundamental de que estes passassem da condição de menores, de semicidadãos, para a de cidadãos, e mais, trouxe a grande possibilidade de construirmos o paradigma de sujeitos, em oposição à ideologia e de toda uma práxis que coisificava a infância. O Estatuto da Criança e do Adolescente tem a relevante função, ao regulamentar o texto constitucional, de fazer com que este último não se constitua em letra morta. Contudo, a mera existência de leis que proclamem os direitos sociais, por si só, não consegue mudar as estruturas, antes há que se conjugar aos direitos uma política social eficaz, que de fato assegure materialmente os direitos já positivados. 14

12 AMARAL, Cláudia Maria Carvalho; VERONESE, Josiane Rose Petry. Crianças Encarceiradas. 1. ed. Rio

de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 150.

13 Artigo 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.

14 VERONESE, Josiane Rose Petry. A Proteção Integral da Criança e do Adolescente no Direito Brasileiro.

Disponível em:

<https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/38644/003_veronese.pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 abril de 2019

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Nesse contexto, o Estatuto, ao longo dos seus mais de 270 artigos, dispõe sobre os direitos fundamentais, especifica as obrigações dos responsáveis para a efetivação dos direitos e garantias, prevendo as sanções ao seu não exercício bem como as modalidades de colocação em família substituta.

No âmbito social, traz normas sobre a política de atendimento, o qual envolve não só a atuação do Estado, mas sim um conjunto articulado de ações governamentais a fim de garantir uma rede de proteção àquelas crianças e adolescentes que necessitarem.

Em relação ao poder familiar, o artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente elenca como dever dos pais, em relação aos filhos, prover-lhes o sustento, a guarda e a educação. Por sua vez, o artigo 24 do Estatuto dispõe que o descumprimento injustificado dos supracitados deveres acarretará na perda ou suspensão do poder familiar. Os artigos mencionados então previstos no Estatuto no capítulo sobre a convivência familiar e comunitária, reafirmando os direitos e garantias da Constituição Federal.

A destituição do poder familiar, é importante ressaltar que não se trata de sanção aplicada aos pais, mas sim de preservação dos interesses e direitos da criança de crescer em um ambiente saudável, desenvolvendo-se física, mental e socialmente em condições de liberdade e de dignidade.15 Nesse sentido, sobre os pais que estão cumprindo medidas privativas de

liberdade e os efeitos da condenação: 16

O simples fato de o pai ou a mãe estarem cumprindo pena privativa de liberdade, sem que o crime praticado tenha relação direta com o filho, não justifica a invocação das hipóteses de suspensão e extinção do poder familiar previstas na legislação brasileira, porque a impossibilidade de prestar cuidados aos filhos, por motivo de aprisionamento, não basta para caracterizar as hipóteses legais.17

Com a entrada em vigor do Código Civil brasileiro de 2002, o Estatuto da Criança e do Adolescente teve seu ápice evolutivo, ao terminar de consolidar no ordenamento jurídico os avanços já iniciados.

2.2.5 Código Civil de 2002

15 Artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

16 D’Andrea (2011, p.61) apud AMARAL, Cláudia Maria Carvalho; VERONESE, Josiane Rose Petry. Crianças

Encarceiradas. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 61.

17 AMARAL, Cláudia Maria Carvalho; VERONESE, Josiane Rose Petry. Crianças Encarceiradas. 1. ed. Rio

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O projeto do novo código tramitou por mais de duas décadas, e, em janeiro de 2003, entrou em vigor. O código trouxe importantes mudanças sobretudo no ramo do Direito de Família ao incorporar mudanças sociais havidas no decorrer da vigência do Código Civil de 1916. Com a disposição constitucional que igualou homens e mulheres, antigos dispositivos desapareceram no novo código, a exemplo da possibilidade que os homens tinham de anular o casamento caso descobrissem que a mulher não era virgem à época do casamento 18.

A Lei n°10.406/02 igualou os direitos e deveres do homem e da mulher na chefia familiar e no comando da sociedade conjugal, desaparecendo a figura do homem como aquele que exercia com exclusividade tal papel. O artigo 1.612 da referida lei, contemplou o artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente ao prever que o poder familiar compete aos pais, sendo uma função que deve ser exercida por ambos os genitores.

Essa mudança não foi apenas de nomenclatura, mas também de uma alteração de um modelo social e familiar secularizado. Agora a mãe é colocada em nível de igualdade dos pais no exercício do poder familiar, e os filhos deixam de ser objeto de poder do seu genitor para ocupar o lugar de um sujeito de direitos, merecedor de um tratamento diferenciado pela sua condição peculiar de desenvolvimento. Outra mudança ocorrida com a vigência do Código Civil de 2002 foi a alteração da maioridade civil de 21 para 18 anos 19, passando a ser essa a

idade limite para a incidência do poder familiar.

Os artigos sobre o poder familiar estão previstos entre os artigos 1.630 e 1.638, os quais dispõe sobre o exercício, a suspenção e a extinção do poder familiar. Esses artigos já passaram por alterações durante o seu período de vigência, à exemplo da importante Lei Nacional de Adoção 20, que estabeleceu um prazo determinado para a tramitação das ações de destituição

do poder familiar.

2.3 PODER FAMILIAR – CARACTERÍSTICAS E CONCEITO

Como explicitado nos tópicos acima, o instituto do poder familiar sofreu mudanças ao longo do tempo, ao ganhar novo significado através das lutas sociais, e, além da alteração da nomenclatura, recebeu uma conotação protetiva em relação aos filhos, abandonando o patriarcalismo ao colocar a mulher em nível de igualdade dentro do seio familiar.

18 Artigo 219, IV, do Código Civil de 1916. 19 Artigo 5, do Código Civil de 2002. 20 Lei 12.010 de 2009.

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O poder familiar perdeu seu caráter absoluto do pater familias, transformando-se em um instituto de caráter protetivo, saindo da esfera exclusivamente privada para integrar o direito público. A gerência e criação dos filhos passa a ser de interesse do Estado, ao passo que entende que deve assegurar a proteção das novas gerações, os quais representam o futuro da sociedade. Nesse contexto, escreve Gonçalves21 que “o poder familiar é instituído no interesse dos filhos

e da família, não em proveito dos genitores, em atenção ao princípio da paternidade responsável insculpido no art. 226, §7, da Constituição Federal”.

Desse modo, trata-se de um munus público22 irrenunciável, indelegável e imprescritível.

O poder familiar é irrenunciável por se tratar de uma condição naturalmente imposta ao estado das pessoas, ou seja, pais são aqueles que dão a vida à uma criança, sendo seus ancestrais, e tal condição não pode ser renunciada nem mesmo alienada. A segunda característica explica-se, pois, se os pais não podem renunciar tampouco podem delegar o poder familiar ao passo que não podem transferi-lo a outrem uma obrigação de ordem pública23. Por fim, o poder familiar

também é imprescritível, pois dele os genitores não decaem pelo não exercício, somente podendo perde-lo nos casos previstos em lei.

Sobre o assunto, Josiane Rose Petry Veronese explica que o poder familiar é, por sua natureza, um complexo de direitos e deveres intransferível, irrenunciável, imprescritível e indisponível, não podendo ser objeto de simples abandono ou de transferência, salvo nesse último caso, por determinação judicial, haja vista a garantia constitucional do direito à convivência familiar conferido às crianças e aos adolescentes 24.

Vicente de Paula expõe que o poder familiar consiste em um feixe de direitos e deveres atribuídos aos pais, em nome da proteção dos filhos que, “se configura mais como um conjunto de deveres, do que uma reunião de direitos sobre os filhos, isto em razão da sua principal finalidade, que é garantir, na instância familiar, a criação e desenvolvimento das crianças e adolescentes”25.

21 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 6: Direito de Família. 13 ed. São Paulo:

Saraiva, 2016. p. 409.

22 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 6: Direito de Família. 13 ed. São Paulo:

Saraiva, 2016. p. 409.

23“Como conjunto de obrigações, tratando-se de ônus, o poder familiar é irrenunciável e indelegável” (JSTJ,

123/243).

24 VERONESE, Josiane Rose Petry; GOUVÊA, Lúcia Ferreira de Bem; SILVA, Marcelo Francisco da. Poder

Familiar e Tutela: à luz do novo Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente. p. 36.

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Assim, o poder familiar caracteriza-se pelo elo jurídico subjetivo que vincula pais e filhos numa relação de direitos e obrigações cuja finalidade é garantir o melhor interesse da criança e do adolescente. Os pais no exercício de tal poder, devem observar o cumprimento dos deveres e obrigações presentes na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil. À luz da proteção conferida às crianças e aos adolescentes nos diplomas supramencionados, a atividade de tal poder deve ser fiscalizada pelo poder público com vistas a garantir condições para o pleno desenvolvimento dos filhos ainda incapazes. 2.4 SUSPENSÃO, PERDA E EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR

Como demonstrado no tópico acima, os pais quando do exercício familiar, assumem responsabilidades e obrigações que, por ser o poder familiar um munus público, estão previstos nos diplomas legais brasileiros. O descumprimento de tais deveres pode acarretar em extinção, suspensão ou perda do poder familiar.

Os casos de extinção do poder familiar estão previstos no artigo 1.635 do Código Civil, entre os incisos I e IV, quais sejam: morte dos pais ou do filho; emancipação; maioridade e adoção. Tais hipóteses se operam em decorrência natural da verificação dos fatos jurídicos acima mencionados. Sobre as hipóteses dos incisos I a III, escreve Carlos Roberto Golçalves:

Com a morte dos pais, desaparecem os titulares do direito. A de um deles faz concentrar no sobrevivente o aludido poder. A de ambos impõe a nomeação de tutor, para se dar sequência à proteção dos interesses pessoais e patrimoniais do órfão. A morte do filho, a emancipação e a maioridade fazem desaparecer a razão de ser do instituto, que é a proteção do menor. 26

O autor Vicente de Paula chama atenção para a hipótese de adoção como extinção do poder familiar, sendo ela restrita à adoção consensual, com o consentimento dos pais, em procedimento de jurisdição voluntária, no qual não é necessária a decretação judicial da perda da autoridade parental. Explica o autor que a hipótese não é propriamente de extinção do poder familiar, mas sim de perda 27.

O artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente, confirmando o dispositivo 1.635 do Código Civil, elenca como deveres dos pais em relação aos filhos prover-lhes o sustento, a guarda e a educação. Por sua vez, o artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe que o descumprimento injustificado dos supracitados deveres acarretará na perda ou suspensão

26 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 6: Direito de Família. 13 ed. São Paulo:

Saraiva, 2016. p. 425

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do poder familiar. A perda do poder familiar é a hipótese do inciso V do artigo 1.634 do Código Civil 28.

A destituição ou perda do poder familiar é hipótese jurídica pré-estabelecida aos pais e depende de decisão judicial, em procedimento contencioso, garantidos o contraditório e a ampla defesa, nas hipóteses previstas no artigo 1.638 do Código Civil aliado ao artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente 29.

O rol do artigo 1.638 do Código Civil prevê que perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II – deixar o filho em abandono; III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente30. Com a promulgação da Lei n° 13.509/17, o artigo 1.638

passou a vigorar com mais um inciso, passando a ser também uma hipótese para destituição do poder familiar o pai ou a mãe que entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção.

Além da previsão de uma nova hipótese de destituição do poder familiar, a Lei n° 13.509/2017 alterou o prazo em relação a reavaliação das crianças e adolescentes que estiverem inseridos em programa de acolhimento institucional, passando a ser a cada 3 (três) meses. Tal avaliação é de extrema importância para a autoridade judiciária poder decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou pela colocação em família substituta31, tendo em vista que a lei também alterou o prazo máximo para permanência das

crianças e adolescentes em programa de acolhimento, não podendo se prolongar por mais de 18 meses 32.

A alteração mais recente do artigo 1.638 ocorreu com a publicação da Lei n° 13.715 de 24 de setembro de 2018, a qual dispõe sobre as hipóteses de perda do poder familiar pelo autor de determinados crimes contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar ou contra

28 Artigo 1635. Extingue-se o poder familiar:

V – por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.

29 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Destituição do poder familiar. p.44.

30 Artigo 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando

os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

31 Artigo 19, §1º, Lei 8.069/1990. 32 Artigo 19, §2º, Lei 8.069/1990.

(26)

filho, filha ou outro descendente33. O artigo 1.638 do Código Civil passou então a vigorar da

seguinte forma:

Artigo 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: Parágrafo único. Perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que: I – Praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar:

a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;

b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão; II – Praticar contra filho, filha ou outro descendente:

a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher;

b) estupro, estupro de vulnerável ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão.34

Por fim, a suspensão do poder familiar está prevista no artigo 1.637, sendo medida mais branda imposta aos pais que abusarem de sua autoridade, faltando a deveres a eles inerentes, ou arruinando os bens dos filhos. As circunstâncias previstas no caput35do referido artigo, são

casos que poderá acarretar na suspensão temporária do poder familiar, mediante decisão em processo judicial no trâmite previsto na Lei n° 8.069/1990. Por sua vez, o parágrafo único da mesma disposição da lei civil, prevê a suspensão automática do poder familiar, sem necessitar de decreto judicial, àquele pai ou mãe que for condenado por sentença penal transitada em julgado por crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

Ainda sobre a suspensão do poder familiar, essa também poderá servir como medida liminar nas ações para a destituição, dispondo o artigo 157 do Estatuto da Criança e do Adolescente que: “havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de reponsabilidade”.

Vicente de Paula ensina que a perda do poder familiar se diferencia da suspensão pois a perda sempre será decretada judicialmente, em processo específico para tanto, nos moldes do artigo 155 e ss. do Estatuto da Criança e do Adolescente, enquanto a suspensão poderá incidir automaticamente quando se der o reconhecimento de hipóteses previstas em lei36.

33 Preâmbulo Lei 13.715/2018.

34 BRASIL. Código Civil 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm. 35 Artigo 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando

os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.

(27)

Importante dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente sobre o tema, é o artigo 23, o qual dispõe que a falta ou a carência de recursos materiais não é motivo suficiente a ensejar a perda ou suspensão do poder familiar. Esse artigo é também um marco especial do Estatuto, pois o antigo Código de Menores, elencava como uma das hipóteses de perda do pátrio poder a insuficiência material da família. Agora, com o §1 do referido artigo, consagrou que a criança e o adolescente serão mantidos sempre que possível no seio familiar, sendo dever do Poder Público incluir as famílias carentes em programas oficiais de proteção, apoio e promoção.

Dessa forma, o instituto da perda do poder familiar é tratado no Estatuto da Criança e do Adolescente como medida excepcional, que só deve ser tratada em processo judicial após a verificação da falta de condições absoluta dos pais em prover o sustento e a educação de seus filhos. A destituição do poder familiar é medida drástica, e não tem pôr fim a punição dos pais, mas sim a preservação dos interesses e direitos da criança de crescer em um lar saudável, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade 37.

As consequências na esfera judicial e na vida social dos pais e das crianças destituídos do poder familiar são extremamente dolorosas: perder o poder familiar é o mesmo que deixar de ser pai ou mãe daquele a quem deu a vida. Por isso, ensina Vicente de Paula, é preciso definir os contornos jurídicos da ação, delineando os limites e esclarecendo a sua aplicação, de modo “a evitar a profusão de expropriações descriteriosas do poder familiar, violando direitos individuais, e o afastamento da criança de sua família natural como meio mais fácil e econômico para a solução do problema social da exclusão e do abandono ”. 38

O procedimento para a perda ou suspensão do poder familiar, está previsto na Lei n° 8.069/1090 em seus artigos 155 a 163, adotando uma sistemática própria. O microssistema do Estatuto da Criança e do Adolescente, objetivou nos artigos que dispõe sobre a matéria, simplificar e dar a necessária celeridade do feito, virando a efetivação do processo e a garantia da proteção integral à criança e ao adolescente submetidas ao poder familiar.

A ação judicial é de competência da Vara da Infância e Juventude, e são isentas de custas e emolumentos 39. A legitimidade ativa é do Ministério Público ou de quem tenha legítimo

37 Artigo 3 Estatuto da Criança e do Adolescente.

38 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Destituição do poder familiar. p.17. 39 Artigo 141 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

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interesse 40. Para Vicente de Paula, quem detêm o legítimo interesse para ingressar com a ação

de destituição do poder familiar, é aquele que têm “estreita relação entre o interesse pessoal do sujeito ativo e o bem-estar da criança ou adolescente vitimados pela conduta dos próprios pais”

41. Assim, são legitimamente interessados os ascendentes, colaterais e parentes por afinidade.

Roberto João Elias, chama atenção ainda, que “é obvio que um dos pais pode e deve requerer a destituição em relação ao outro, se houver motivo justificado” 42.

A legitimidade passiva é daqueles que detêm a autoridade parental sobre os filhos, ou seja, o pai e a mãe. Alerta Vicente de Paula que “não importa a natureza ou origem da relação de filiação. Sejam os filhos havidos ou não, do casamento, consanguíneos ou por adoção, o poder familiar se estabelece da mesma forma, com os mesmos direitos e deveres” 43.

Uma vez proposta a ação de destituição do poder familiar pelos legitimados, não se admite a desistência, pois o pedido envolve direitos e interesses que ultrapassam o poder de disponibilidade do autor: a proteção aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, reconhecidos pela Constituição Federal, que os qualifica, exigindo que a família, a sociedade e o Estado os assegurem, com prioridade absoluta 44. Em caso de o autor deixar de dar os

encaminhamentos necessários dentro do processo, poderá o Ministério Público, legitimado por excelência, assumir o polo ativo da demanda.

2.5 O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL COMO MEDIDA DE PROTEÇÃO E O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê medidas de proteção aplicáveis a crianças e adolescentes que estiverem com direitos ameaçados ou violados 45, seja por omissão ou ação

da sociedade ou Estado, ou por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável. Estabelece a Lei n° 8.069/1990 que ao serem aplicadas tais medidas, deverão ser levados em conta as necessidades pedagógicas, priorizando as medidas que fortaleçam os vínculos familiares e comunitários 46.

40 Artigo 155 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

41 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Destituição do poder familiar. p.74. 42 ELIAS, Roberto J. Comentário ao Estatuto da Criança e do Adolescente, p.35. 43 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Destituição do poder familiar. p.77. 44 ATAIDE JUNIOR, Vicente de Paula. Destituição do poder familiar. p.104. 45 Artigo. 98, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

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Além de tais preferências, ainda são elencados no parágrafo único do artigo 100 do Estatuto da Criança e do Adolescente princípios que regem a aplicação das medidas: I – condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos; II – proteção integral e prioritária; III – responsabilidade primária e solidária do poder público; IV – interesse superior da criança e do adolescente; V – privacidade; VI – intervenção precoce; VII – intervenção mínima; VIII – proporcionalidade e atualidade; IX – responsabilidade parental; X – prevalência da família; XI – obrigatoriedade da informação; XII – oitiva obrigatória e participação.

Tais princípios não devem nortear apenas a aplicação das medidas de proteção, mas sim todas as ações que envolvam crianças e adolescentes, sendo princípios basilares da consagração do Estatuto da Criança e do Adolescente. Interessante discorrer de forma mais aprofundada sobre o princípio do superior interesse da criança e do adolescente, pois entendo ser ele primordial quando das decisões nas ações de destituição do poder familiar.

Dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 100 que o superior interesse da criança é um princípio que rege a aplicação das medidas de proteção, devendo atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, considerando também a outros interesses legítimos 47. Assim, o Estado deve orientar-se por tal princípio

quando da implementação e execução de políticas públicas, pelo Estado-juiz no exercício da atividade de interpretação e utilização das leis. Esse princípio também deve orientar a família quando das decisões em relação as crianças e adolescentes 48.

Esclarecem Cláudia Maria Carvalho do Amaral Vieira Josiane Rose Petry Veronese que princípios, diferente das normas, são diretrizes que pretendem contribuir para a tomada de decisão, sobre o assunto escrevem:

O princípio do interesse superior da criança, expressa, assim, a noção de um processo dinâmico no qual as decisões que se tomam hão de ser constantemente revisadas não só para atender ao crescimento da criança e do adolescente, como também para atender à evolução da família e do grupo social em que interagem e aos aspectos da vida e de crescimento daqueles que ainda não chegaram à vida adulta. 49

Dentre as medidas de proteção aplicáveis, dar-se-á mais destaque no presente estudo à medida de acolhimento institucional.

47 Artigo 100, parágrafo único, inciso IV da Lei 8.069/90.

48 VERONESE, Josiane Rose Petry; VIEIRA, Cláudia Maria Carvalho do Amaral, Crianças Encarceradas, p.

140.

49 VERONESE, Josiane Rose Petry; VIEIRA, Cláudia Maria Carvalho do Amaral, Crianças Encarceradas, p.

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O Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu em seu artigo 19 o direito da criança e do adolescente de ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária. Em razão desse princípio, a medida de acolhimento institucional deve ser excepcional e em caráter provisório, obrigando a “preservação dos vínculos familiares e a integração em família substituta quando esgotados os recursos de manutenção na família de origem” 50.

2.5.1 Medidas de Proteção previstas na Lei n° 8.069/1990.

A Lei n° 8.069/1990 assegura que crianças e adolescentes gozam de todos os direitos fundamentais dispostos na Constituição Federal, sendo reconhecido ainda, com a consagração da Doutrina da Proteção Integral, crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e merecedores de condições especiais em razão do seu estado de desenvolvimento. Assim, a Lei n° 8.069/90 dispõe que é dever de todos zelar pela dignidade da criança e do adolescente, resguardando-os de qualquer tratamento desumano e violento51.

Sempre que os direitos reconhecidos no Estatuto forem ameaçados ou violados, seja por ação ou omissão da sociedade ou do estado; seja por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis, ou ainda em razão de sua conduta52, medidas de proteção à criança e ao

adolescente poderão ser aplicadas53.

Ensina Josiane Rose Petry Veronese que o artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente representou uma ruptura em relação ao extinto Código de Menores, o qual classificava crianças e adolescentes num quadro de patologia social: o carente, o delinquente, o abandonado, pois com isso, excluía a responsabilidade do Estado. Acrescenta, ainda, que ao adotar a Doutrina da Proteção Integral, a Lei n° 8.0639/90 “aponta que estaria com uma postura “irregular”, não a criança, o adolescente, mas todo e qualquer agente violador, inclusive e, ousaríamos dizer, que sobretudo, o próprio poder público”54.

Frente as hipóteses de violação de direitos da criança e do adolescente previstas no artigo 98, a autoridade competente poderá determinar, isolada ou cumulativamente, bem como

50 Artigo 92 e 100, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 51 Artigo 17, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

52 Hipótese em que crianças e adolescentes praticarem ato infracional. 53 Artigo 98, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

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substituí-las a qualquer tempo 55, observando os princípios do artigo 100, as medidas de

proteção previstas no artigo 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente, são elas: I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II – orientação, apoio e acompanhamento temporários; III – matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV – inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII – acolhimento institucional; VIII – inclusão em programa de acolhimento familiar e IX – colocação em família substituta.

Dentre as medidas protetivas previstas no artigo 100 do Estatuto da Criança e do Adolescente, dar-se-á mais atenção ao estudo da medida de acolhimento institucional, demonstrando seus efeitos.

Tal medida elencada no inciso VII do artigo 101, tem caráter provisório e excepcional, devendo ser utilizada como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo possível o retorno, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade 56. Além

de seu caráter excepcional, a Lei n° 8.069/1090 assegurou o direito à convivência familiar e comunitária, priorizando a família de origem.

Demonstrou-se com o histórico do ordenamento jurídico brasileiro referente a proteção e promoção dos direitos da criança e do adolescente, que frente à situação de pobreza e vulnerabilidade social, por muitos anos as previsões legais colocavam como resposta o afastamento da criança ou do adolescente do convívio familiar. A promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente rompeu com essa “solução”, passando a dispor essa como uma medida excepcional, estabelecendo, ainda, que a falta ou carência de recursos materiais não é motivo suficiente para o afastamento familiar 57.

Em consonância com a excepcionalidade da medida, o artigo 130 estabelece que, em casos de violência praticada por familiar ou responsável com o qual a criança ou adolescente

55 Artigo 99, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 56 Artigo 101, §1, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 57 Artigo 23, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Referências

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