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A excursão linear como instrumento do processo ensino-aprendizagem em geografia física.

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A EXCURSÃO LINEAR COMO INSTRUMENTO DO

PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

EM GEOGRAFIA FÍSICA

LINEAR EXCURSIONS AS AN INSTRUMENT OF THE TEACHING AND

LEARNING PROCESS IN PHYSICAL GEOGRAPHY

Lucivânio Jatobá1

Alineaurea Florentino Silva2

1 Prof. Adjunto do curso de Mestrado Profi ssional em Ensino de Ciências Ambientais (PROFCIAMB) da UFPE. Doutor em Desenvol-vimento e Meio Ambiente pela UFPE. Líder do Grupo de Pesquisa: Estruturação e Dinâmica Atual de Paisagens, na área de Geociên-cias. E-mail: lucivaniojatoba@uol.com.br.

2 Pesquisadora da Embrapa Semiárido, Doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente. E-mail: alineaurea.silva@embrapa.br. Artigo recebido em dezembro de 2019 e aceito para publicação em março de 2020.

RESUMO: No presente artigo, objetivou-se analisar a importância da excursão linear como

instrumento didático no ensino de Geografi a, para análise interdisciplinar das paisagens, fornecer material didático à preparação e realização de uma excursão linear, enfatizando dimensões conceituais de Geologia, Geomorfologia, Climatologia e Pedologia, de maneira integrada, apresentar um exemplo de excursão linear, realizada pelos autores, abrangendo uma ampla área da parte oriental do Estado de Pernambuco, e mostrar exemplos da possibilidade de se estabelecer, no campo, as bases da interdisciplinaridade na interpretação de elementos do quadro natural. São sugeridas diversas estratégias de ensino empregadas numa excursão linear realizada no Estado de Pernambuco.

Palavras-chave: Ensino de Geografi a Física. Excursão didático-pedagógica. Interdisciplinaridade.

Semiárido. Paisagens naturais.

ABSTRACT: This paper aims to analyze the importance of linear excursion as a didactic

instrument in geography teaching, for interdisciplinary analysis of landscapes, provide didactic material for the preparation and realization of a linear excursion, emphasizing conceptual dimensions of Geology, Geomorphology, Climatology and Pedology, in an integrated way, present an example of linear excursion, performed by the authors, covering a wide area of the eastern part of Pernambuco State, and show examples of the possibility of establishing, in the fi eld, the basis of interdisciplinarity in the interpretation of elements of the natural framework. Several teaching strategies employed in a linear excursion in the state of Pernambuco are suggested.

Keywords: Physical Geography Teaching. Didactic-pedagogical excursion. Interdisciplinarity.

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INTRODUÇÃO

A Geografi a, como vem sendo dito há muitas décadas, é uma só. Contudo, por imposição meramente didática, faz-se necessária uma divisão que se materializa, por um lado, em Geografi a Física e, por outro, Geografi a Humana e Econômica. Foi assim que se aprendeu na faculdade, há algumas décadas, quando se fazia a Graduação em Geografi a, e os principais mestres, fortemente infl uenciados pela Geografi a Clássica francesa, ensinavam. Essa divisão, já naquela época (décadas de 1960, 1970), era questionada, como se representasse um antagonismo entre natureza e sociedade (ANDRADE, 1981), uma polaridade que “descaracterizaria”, “despersonalizaria” a Geografi a.

A Geografi a Física, vista sob o prisma da Geografi a Clássica, busca analisar, em sua essência, a estruturação natural das paisagens, as relações dialéticas entre elementos que compõem a paisagem e os fatores que explicam a gênese e a evolução daqueles (JATOBÁ; SILVA, 2017). A verticalização dos conhecimentos da dialética da paisagem natural demanda estratégias e métodos de ensino particulares e, às vezes, singulares. Neste particular, ganha destaque uma estratégia de ensino que permite ao aprendiz desse ramo das geociências observar e interpretar, como se estivesse num enorme laboratório natural, em escala de 1:1, as paisagens, sobretudo no que concerne aos aspectos físico-geográfi cos que as compõem. Essa estratégia é o que aqui se denomina “excursão linear”, muito empregada pela Geografi a Clássica.

É mediante a participação na excursão linear que o estudante terá a oportunidade de realizar uma observação direta da dinâmica da natureza atualmente percebida, mas também um reconhecimento de marcas deixadas na paisagem por processos diversos (paleoclimáticos, fi togeográfi cos, tectônicos, pedológicos, etc) que, em geral, são abordadas teoricamente em sala de aula de forma fragmentada.

O trabalho de campo, que se realiza num “laboratório” em campo aberto, pode ser feito, efi cientemente, mediante a excursão linear, que consiste numa espécie de uma aula em movimento em que são estudados diversos aspectos ambientais ao longo de uma área percorrida. Não busca, portanto, vencer uma dada distância para chegar a determinado local com a fi nalidade de analisar certo fenômeno natural. Essa modalidade de excursão reveste-se de uma particular importância para a quebra do excesso de exposição oral que, muitas vezes, passa a ser a única estratégia de ensino nas aulas dos ramos da Geografi a Física.

Buscou-se atingir, neste artigo, os seguintes objetivos: a) analisar a importância da excursão linear como instrumento didático para uma análise interdisciplinar das paisagens; b) fornecer um material didático à preparação e realização de uma excursão linear, enfatizando dimensões conceituais de Geologia, Geomorfologia, Climatologia e Pedologia, de maneira integrada; c) apresentar um exemplo de excursão linear, realizada pelos autores, abrangendo uma ampla área da parte oriental do Estado de Pernambuco, compreendida entre a Região Metropolitana do Recife e o município de Brejo da Madre de Deus (Agreste Central), d) mostrar exemplos da possibilidade de se estabelecer, no campo, as bases da interdisciplinaridade na interpretação de elementos do quadro natural.

1 A EXCURSÃO LINEAR

Existem dois grandes tipos de excursão geográfi ca, que são planejados e executados utilizando-se métodos e técnicas de ensino diversos. O primeiro tipo é aquele que pode

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ser designado como a excursão pontual, ou seja, uma excursão que objetiva examinar e explicar um determinado fato geográfi co, às vezes situado a uma distância considerável do ponto inicial (faculdade) do trajeto. Exemplifi cam-na: visita a uma caverna desenvolvida em terrenos calcários; observação de uma usina que produz álcool ou reconhecimento de um terreno submetido outrora a uma tectônica quebrantável, que gerou uma área de falha de rejeito direcional, etc. O segundo tipo é o que se conhece como excursão linear.

A excursão linear não objetiva vencer uma dada distância, como salientado anteriormente, para que o aluno possa reconhecer, ouvir as informações fornecidas pelo(s) docente(s), e depois analisar um determinado aspecto da natureza. Ao contrário, é uma aula em movimento. No ponto inicial dessa excursão, os professores passam a explicar as diversas dimensões conceituais que serão verifi cadas na paisagem. Ela demanda, portanto, uma dimensão atitudinal que consiste na permanente atenção dos alunos participantes ao que é verifi cado e explicado ao longo dos diversos trechos estabelecidos.

A excursão linear permite, entre outras coisas, que o aluno possa compreender uma série de conceitos de Geografi a Física e de Geociências afi ns (Pedologia, Geologia Geral, Hidrologia etc), além de desenvolver uma dimensão atitudinal importante, que é o respeito à natureza. O estudante que participa de uma excursão linear consegue experienciar um processo de aprendizagem, mediante o descobrimento dos fatos e incrementar a admiração à natureza.

Essa modalidade de excursão que, como foi dito, é uma aula em movimento, exige dos docentes um amplo conhecimento dos temas e processos vislumbrados ao longo do trajeto previamente escolhido, por exemplo, os processos tectônicos, as consequências deles na paisagem e as marcas deixadas no relevo e na litomassa. As perguntas dos alunos sobre essa complexidade de processos são inevitáveis ou podem até ser estimuladas, tais como: “Qual justifi ca que vocês apresentam para o fato de que sob um mesmo domínio

morfoclimático sejam observados colinas, pontões e até superfícies aplainadas?”

Os conhecimentos que os alunos adquirem durante uma excursão tem um duplo signifi cado, ou seja, por uma parte referem-se às particularidades dos objetos e fenômenos geográfi cos observados, e por outra refl etem conceitos gerais sobre um determinado tema (NICOLAU, 1991).

2 A FASE PREPARATÓRIA DA EXCURSÃO LINEAR

A preparação detalhada de uma excursão linear é condição sine qua non para que se tenha êxito com essa atividade extraclasse. Essa fase exige diversas dimensões de ensino, e poderá ser realizada em conjunto com os alunos, em aula específi ca para esse fi m, que englobam dimensões conceituais, procedimentais e atitudinais, além dos objetivos geral e específi cos. Na aula de preparação à excursão linear, o professor deverá inicialmente expor o roteiro geral a ser seguido, as BRs e as rodovias estaduais (se for o caso) que serão atravessadas, as principais bacias hidrográfi cas, as cidades ou distritos, direções do percurso etc.

Em seguida, e de maneira bem esquemática, o professor analisará as razões da escolha desse roteiro geral estabelecido. Algumas indagações poderão guiar esse momento do processo preparatório: O que ele tem de especial para a (s) disciplina(s) que tratará (ão) das dimensões conceituais dos fatos que serão observados? Ele pode ser dividido em trechos específi cos? Que critérios estabelecem-se para a existência dessa divisão? Não se deve esquecer de projetar um slide, feito facilmente com o Google Earth, com o roteiro geral e os trechos em que este foi dividido.

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2.1 As dimensões conceituais

Para uma excursão de Geografi a Física, sugerem-se, entre outras, as seguintes dimensões conceituais:

- Identifi cação, no campo, de corpos litológicos diversos (migmatitos, milonitos, gnaisses, formações sedimentares, granitos, etc) e os efeitos destes na gênese e evolução do relevo das áreas percorridas;

- Observação das condições climáticas ambientais atuais e as transições (se existirem), além de suas infl uências sobre outros elementos paisagísticos, por exemplo o solo, o tipo e profundidade do elúvio, processos erosivos, formações vegetais, etc.;

- Identifi cação de ações predatórias dos seres humanos sobre o meio ambiente;

- Reconhecimento das interferências de condições paleoclimáticas e as marcas deixadas por essas na paisagem ( pedimentos embutidos em áreas quentes e úmidas; superfícies pediplanadas dissecadas); - Verifi cação das manifestações tectônicas pretéritas e seus efeitos na compartimentação do relevo;

2.2 As dimensões procedimentais

As dimensões procedimentais consistem nas seguintes estratégias de ensino, que deverão ser empregadas pelos alunos:

- Reconhecimento extensivo dos aspectos altimétricos, mediante o emprego do altímetro e/ou GPS dos diversos trechos, sobretudo dos talvegues dos rios principais;

- treinamento em campo do emprego de mapas geológicos, cartas topográfi cas, cartas imagens de radar (SRTM), mapas geomorfológicos e pedológicos, nos quais estão contidos os diversos trechos do roteiro geral da excursão.

- observação e análise de cortes de estrada para interpretação da estrutura subsuperfi cial das paisagens.

- utilização de bússola para identifi car roteiro e localizar fatos observados (uma colina, uma superfície de erosão, uma área extensivamente dissecada etc).

2.3 As dimensões atitudinais

A excursão linear é de grande utilidade para desenvolver no aluno determinadas dimensões atitudinais. Dimensões atitudinais signifi cam ter uma opinião sobre um problema ambiental observado durante o trajeto e estabelecer ações específi cas para às ciências enfatizadas durante a aula em movimento. Signifi cam, ainda, processos, em geral complexos, que são produzidos na relação do estudante com o objeto de estudo. De acordo com Gargallo (2000), as dimensões atitudinais referem-se a um conjunto de tendências para enfrentar as situações, os acontecimentos, os objetos e os fenômenos.

Mencionam-se as seguintes dimensões atitudinais que poderão ser desenvolvidas nos alunos participantes de uma excursão linear:

- desenvolvimento do hábito de pesquisa em campo. - contribuição ao processo de socialização dos estudantes. - estabelecimento do hábito de divisão de tarefas.

- desenvolvimento da capacidade de estabelecer em campo hipóteses para interpretação da dinâmica de paisagens.

- ampliação da capacidade para proceder anotações minuciosas das observações realizadas em campo.

- compreensão de que o conhecimento da natureza e do meio ambiente se faz essencialmente com a interdisciplinaridade.

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3 MATERIAIS, EQUIPAMENTOS E MÉTODOS DE ENSINO UTILIZADOS NA EXCURSÃO

Para que o trabalho de campo seja realizado com mais efi ciência, solicita-se aos alunos que levem para a excursão os seguintes materiais e equipamentos:

- cartas topográfi cas em escalas diversas; - mapas geológicos em escalas diversas;

- mapa com dados climáticos (temperatura e precipitação, em especial); -mapas de solos em escalas diversas;

-caderneta de campo, contendo uma tabela a ser preenchida, com as seguintes informações: quilometragem do ônibus, altitudes e observações;

-altímetro ou GPS, para o controle da altimetria dos trechos percorridos e das paradas realizadas; - câmera fotográfi ca (celular);

- martelo de geólogo;

- folhas de papel A4 em branco, para realização de esboços de paisagem. - lápis 6B, para desenho de paisagens;

- fi cha de trabalho de campo, contendo questões previamente estabelecidas pelos professores para serem respondidas no campo, durante as paradas realizadas.

- trena para medir a espessura de camadas do solo;

- água para fazer uma avaliação da textura do solo em campo;

- água oxigenada, caso seja importante verifi car presença de matéria orgânica no solo, visível a olho nu.

Entre esses materiais mencionados, merece destaque a caderneta de campo. A caderneta de campo é um instrumento indispensável para ser usado em qualquer modelo de excursão geográfi ca ou de trabalho de campo. É algo simples que consiste num quadro como o apresentado a seguir, com um exemplo hipotético de preenchimento pelo aluno.

Quadro 1. Exemplo de caderneta de campo a ser preenchida durante a excursão linear. KM (DO

ÔNIBUS)

ALTITUDE

(em metros) OBSERVAÇÕES

0340 10 Início da excursão. Horário de saída: 7h30. O professor explicou em linhas gerais o roteiro que será seguido e a Geologia Geral da área.

0349 35

Observamos uma variação do relevo, que passou a ser mais colinoso. Vimos diversos depósitos de lixo abandonados sobre as calçadas das ruas. O professor salientou a infl uência das rochas sobre a mudança de relevo.

0360 140

Vimos o aparecimento de uma escarpa de falha em terrenos graníticos. Solos pouco desenvolvidos na área. Cobertura vegetal bastante degradada. Fazer fotos da área.

0390 280

Aparecimento de espesso elúvio com uma camada superior de colúvio. Vegetação natural preservada. Paisagem consideravelmente dissecada (clima mais úmido?).

A fi cha de trabalho de campo, também considerada essencial para uma excursão linear, deverá ser utilizada apenas durante as paradas realizadas ao longo do percurso. É o momento em que o aluno irá demonstrar o que realmente aprendeu nas aulas teóricas prévias. Eis um modelo sugerido para essa fi cha:

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UFPE . CURSO DE CIÊNCIAS AMBIENTAIS

PROF. DR. LUCIVÂNIO JATOBÁ

FICHA DE TRABALHO DE CAMPO DA DISCIPLINA ANÁLISE GEOMORFOLÓGICA NOME DO PARTICIPANTE__________________________________________________________ DATA____/______/2017 N° DA PARADA_______ LOCALIZAÇÃO__________________________ ________________________________________________________________________________ 1-O DOMÍNIO CLIMÁTICO DA ÁREA

____________________________________________________________________________________

2- O CLIMA EXERCE ALGUMA INFLUÊNCIA SOBRE A MORFOGÊNESE DO RELEVO DA ÁREA? ( ) SIM ( ) NÃO

POR QUE? EVIDÊNCIAS:

________________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________

3- QUAL O TIPO DE INTEMPERISMO DOMINANTE?

________________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________

4- QUAL O TIPO DOMINANTE DE ROCHA NA ÁREA?

________________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________

5- A ROCHA ENCONTRA-SE: ( ) MUITO ALTERADA ( ) INALTERADA ( )POUCO ALTERADA. 6- HÁ EVIDÊNCIA DE ELÚVIO? ( ) SIM ( ) NÃO

7- HÁ EVIDÊNCIAS DE COLÚVIO? ( ) SIM ( ) NÃO

8-HÁ INFLUÊNCIAS ESTRUTURAIS NA ÁREA SOBRE O RELEVO? ( ) SIM ( ) NÃO. SE EXISTEM, QUAIS SÃO ESSAS INFLUÊNCIAS?

________________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________

9-QUAL O TIPO DE VERTENTE DOMINANTE NA ÁREA?

______________________________________________________________________ 10-QUAL A EXPLICAÇÃO PARA A FORMA DESSE TIPO DE VERTENTE NA ÁREA? - A ÁREA APRESENTA ALGUM PROBLEMA AMBIENTAL QUE SE DESTACA? ( ) SIM ( ) NÃO

11- HÁ PARTICIPAÇÃO ANTRÓPICA NESSE PROBLEMA?

EXPLIQUE:_________________________________________________________________________ 12- QUE TIPO DE SOLO DOMINA NA ÁREA?

13- NUMA FOLHA DE PAPEL OFÍCIO FAÇA UM ESBOÇO DA PAISAGEM OBSERVADA E IDENTIFIQUE OS ELEMENTOS MORFOLÓGICOS VERIFICADOS

A metodologia empregada durante a excursão consiste das seguintes estratégias de ensino: - exposição oral feita pelos professores dentro do ônibus e nas paradas realizadas, sempre voltada para a interdisciplinaridade, associando os conteúdos das disciplinas Geomorfologia, Climatologia e Pedologia. O aluno fará uma síntese dessa exposição na caderneta de campo, localizando o ponto em que ocorreu a parada. São apresentadas, ainda, questões simples que deverão ser respondidas pelos alunos, com o ônibus em movimento ou nas paradas;

- interpretação de mapas geológicos, pedológicos e climáticos e comparação com a realidade observada no trajeto;

- questionamentos aos alunos para a geração de discussões acadêmicas no ônibus ou nas paradas. - utilização de um quadro branco dentro do ônibus e nas paradas para ilustrações e explicações de fatos observados, como exemplifi cado na fi gura 1 abaixo:

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Ilustração de Lucivânio Jatobá em excursão no ano 2018 com alunos de Ciências Ambientais da UFPE.

Figura 1. Emprego de quadro branco como ferramenta complementar ao ensino em trabalho de campo Eis alguns exemplos de questões encaminhadas à turma pelos docentes:

a) Por que no trecho anterior, em pleno domínio tropical úmido (Zona da Mata), o manto de intemperismo é bem mais profundo do que neste trecho semiárido?

b) Nesta paisagem que é observada à nossa direita há algum indício de falhamento geológico? c) Neste ambiente existem marcas signifi cativas da degradação ambiental? Quais? d) Nesta paisagem há indicadores das condições climáticas ambientais? Quais?

O aluno deverá ter em mãos, pelo menos, um mapa geológico e outro pedológico para ser analisado e comparado com o que está sendo visto nas paisagens contempladas na parada. É um treinamento por demais efi caz para a interpretação da realidade físico-geográfi ca no campo. Ainda, durante excursão, o professor de Pedologia, numa parada previamente escolhida, que reúna boas condições para ser didaticamente bem explorada, abordará conceitos que serão úteis ao entendimento de diversos elementos necessários à compreensão do solo. Para tanto, ele deverá:

- mostrar as diferenças entre colúvio, elúvio e rocha inalterada;

- identifi car, no corte de estrada, um perfi l de solo do local, solicitando a dois alunos o auxílio para, com uma trena, medirem a profundidade do solo e de seus horizontes; - observar, com os alunos, inicialmente, a altura do perfi l do solo, compreendida desde a superfície vegetada (superior) até o material de origem, a rocha;

- indicar camadas e horizontes do solo visíveis no perfi l encontrado, delimitando-os com o martelo de geólogo;

- mencionar as diferentes cores do solo, nos vários horizontes, se houver essa diferenciação, relacionando-as com processos pedológicos conhecidos, anteriormente explorados em sala de aula, como Redução, Oxidação, Presença de Ferro, Latossolização etc;

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- coletar um pouco de material do solo de duas ou três camadas para umedecer com água e encontrar a textura delas, nesse caso mostrando claramente as diferenças entre as diversas texturas encontradas;

- indicar possíveis tipos de solo para aquele perfi l observado, levando em consideração o relevo local, o clima, material de origem visto no mapa geológico, materializando, portanto, a interdisciplinaridade tão necessária à análise integrada do solo;

- comentar sobre as atividades que podem ser desenvolvidas no solo visualizado, indicando possíveis alternativas e potencialidades, algo muito importante para a Geografi a Agrária. 4 UM EXEMPLO DE EXCURSÃO LINEAR

No curso de graduação em Ciências Ambientais, do Centro de Biociências da Universidade Federal de Pernambuco, os autores vêm realizando uma excursão linear de caráter indisciplinar, com conteúdos de Geomorfologia, Climatologia, Geologia Geral e Pedologia, para alunos do primeiro e segundo períodos. Essa experiência, que tem trazido ótimos resultados para os discentes e boa aceitação por estes, será examinada, com certo grau de detalhes, a seguir.

4.1 A escolha do roteiro

O roteiro escolhido para ser seguido pela excursão situa-se na porção centro-oriental do Estado de Pernambuco e atravessa as Regiões de Desenvolvimento (RD) assim designadas: RD1-Metropolitana, RD2 Mata Sul e RD3-Agreste Central, estabelecidas pelo Governo do Estado de Pernambuco (FREITAS; SANTOS, 2011).

Os critérios adotados para a defi nição dos percursos citados foram: a) a variedade de elementos componentes das paisagens, principalmente a litomassa, as marcas de manifestações tectônicas pretéritas, os solos e os compartimentos locais e regionais de relevo; b) as singularidades paisagísticas existentes; c) facilidade de acesso d) a existência de bons cortes de rodovias que permitem uma observação razoável da estrutura subsuperfi cial de paisagens; e) as variações de tipos climáticos e formações vegetais; f) a ocorrência de áreas de degradação ambiental, notadamente no Bioma Caatinga.

O ponto inicial da excursão é o Campus da Universidade Federal de Pernambuco, na cidade do Recife, e o último ponto é o Distrito de Fazenda Nova, no município de Brejo da Madre de Deus, na RD Agreste Central (Figura 2). A distância entre esses dois extremos perfaz aproximadamente 198km. Utilizam-se, ao longo do trajeto, as rodovias BR232, BR 104 e PE 145. Tal roteiro permite a visualização de aspectos relevantes das paisagens da Zona da Mata e do Agreste pernambucanos, relativos a diferentes tipos climáticos, compartimentação do relevo e dos solos, características geológicas e marcas de processos paleoclimáticos ainda visíveis ao longo do trajeto, entre outros.

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Fonte: https://www.google.com.br/maps/. Acesso em: 14 dez. 2019

Figura 2. Roteiro da Excursão linear entre Recife-PE e Fazenda Nova - PE

São percorridos, na excursão proposta, trechos dos seguintes municípios pernambucanos: Recife, Jaboatão dos Guararapes, Moreno, Vitória de Santo Antão, Pombos, Gravatá, Bezerros, Caruaru e Brejo da Madre de Deus, que propiciam visualizar importantes efeitos de processos físico-geográfi cos elaboradores de paisagens.

4.2 Os objetivos estabelecidos

Os objetivos propostos para a excursão linear entre Recife/PE - Fazenda Nova/PE são os seguintes:

Geral:

- examinar a interação dialética entre os fatores responsáveis pela estruturação das paisagens em três Regiões de Desenvolvimento do Estado de Pernambuco: Região Metropolitana do Recife, Zona da Mata Sul e Agreste Central.

Específi cos:

- analisar as infl uências do clima sobre os principais componentes das paisagens da Zona da Mata e do Agreste pernambucanos;

- observar in loco as interferências da litomassa, da tectônica e dos processos morfoclimáticos pretéritos e hodiernos sobre a compartimentação do relevo ao longo do trajeto percorrido; - verifi car a ação dos processos pedogenéticos nas paradas previamente estabelecidas; - identifi car características dos solos decorrentes desses processos;

- compreender in locu as relações entre os fatores da pedogênese e a formação e evolução dos solos na Zona da Mata Sul e Agreste Central pernambucanos.

4.3 A divisão do percurso geral em trechos

Para facilitar o processo ensino-aprendizagem durante a excursão linear, e levando-se em conta aspectos paisagísticos que defi nem unidades de paisagem, o percurso geral foi subdividido nos seguintes trechos:

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4.3.1 Trecho 1. Recife - Pombos (Serra das Russas)

Esse trecho se situa basicamente na Zona da Mata Sul de Pernambuco e permite observar muitos temas importantíssimos que demandam a interdisciplinaridade, na prática. Com relação aos aspectos geológicos, o aluno poderá verifi car os depósitos quaternários contidos na unidade de relevo designada como Planície Flúvio-Marinha do Recife, contemplada logo no início da excursão, no câmpus da UFPE (Figura 3)

Fonte: Google Earth. Acesso em: 12 maio 2019

Figura 3. Trecho da Planície Flúvio-Marinha do Recife

Além dos terrenos fl úvio-marinhos quaternários, surgem manchas de um destacado depósito correlativo designado como Grupo Barreiras, de idade plio-pleistocênica (BIGARELLA; ANDRADE, 1964), ao longo da BR 232. A 7 km do ponto inicial da excursão, desponta na paisagem uma expressiva variação de formas de relevo, em decorrência da interação entre estrutura geológica (litomassa) e as condições climáticas atuais e pretéritas. Logo a seguir, a 9km do ponto inicial, aparece uma faixa de contato entre os terrenos plio-pleistocênicos referidos e os terrenos cristalinos e cristalofi lianos do Pré-Cambriano. A mudança verifi cada nas formas de relevo é brutal, com o aparecimento do Domínio morfoclimático do “mar de morros” (AB’SABER, 1967; JATOBÁ, 2001). Neste momento, os alunos são provocados a responder as seguintes questões: a) O que justifi ca a área plana e baixa, vista logo no ponto inicial da excursão? b) Por que o relevo se exibe de forma tão colinosa? c) Que processo de meteorização das rochas predomina? d) Os solos são muito ou pouco desenvolvidos? Por quê?

Entre os municípios de Jaboatão dos Guararapes e Moreno, na Região Metropolitana pernambucana, os alunos podem observar uma intensa mamelonização das paisagens e uma signifi cativa ação do intemperismo químico, resultantes das condições climáticas bastante úmidas e altas temperaturas (Figura 4). Profundos depósitos coluviais, solos bem desenvolvidos e elúvio bem avermelhados encontram-se explícitos ao longo desse trajeto (Figura 5).

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Ao passar defronte da paisagem indicada na Figura 4, os alunos são novamente questionados: O que, na opinião de vocês, justifi ca o topo plano dessas colinas no Domínio do mar de morros de Pernambuco?

Foto: Lucivânio Jatobá (2013)

Figura 4. Paisagem mamelonizada no município de Jaboatão dos Guararapes (PE). O topo das colinas

mostra-se plano

Foto: Alineaurea Florentino Silva, 2018.

Figura 5. Corte numa colina, visto da BR 232, no município de Jaboatão dos Guararapes. O contato entre

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A primeira parada ocorrida nesse trecho se verifi ca a 16km do ponto inicial, a uma altitude de 50m (Figura 6). A paisagem que se observa é muito rica, do ponto de vista didático, pois permite examinar, numa área de clima quente e úmido (As’, segundo a classifi cação de Koppen), os processos de meteorização dominantes, a estrutura subsuperfi cial do terreno, os solos, além de indícios marcantes de uma falha de rejeito direcional, que compõem uma unidade estrutural conhecida como Lineamento Pernambuco. Tal falha geológica irá aparecer constantemente até a cidade de Caruaru, no Agreste Central de Pernambuco.

Os alunos, neste momento, são convidados a preencher a Ficha de Trabalho de Campo. Em geral, observa-se que os estudantes apresentam certo grau de difi culdades para esse preenchimento. A difi culdade mais comum é a separação entre elúvio e colúvio, seguida da identifi cação das evidências de que aqueles terrenos sofreram, no passado remoto, um violento movimento tectônico responsável pela falha de rejeito direcional. A ajuda dos professores para que os alunos superem esses obstáculos é indispensável.

Foto: Alineaurea Florentino Silva, 2019.

Figura 6. Foto do local da primeira parada da excursão, no município de Jaboatão dos Guararapes, Zona

da Mata Sul de Pernambuco

Esse corte verifi cado na colina permite que o professor responsável por fornecer as noções de Pedologia possa explorar bastante, em termos de exposição oral ao ar livre, os temas Elúvio, Colúvio, Solos, Meteorização das Rochas, Horizontes do solo e Fatores de Formação deste. Apesar de não ser um corte feito exclusivamente para análise de perfi l de solo, é possível verifi car o predomínio de intemperismo químico importante nos horizontes visualizados. É possível abordar, ainda nessa parada, aspectos relacionados aos fatores de formação dos solos em geral, como clima, relevo, material de origem, organismos e tempo. Como é um perfi l de solo profundo, muito alterado, subentende-se que subentende-seja um solo mais velho, que sofreu processo de intemperismo mais acentuado, certamente por estar situado num ambiente no qual o clima favoreceu esse processo, com alta pluviosidade e temperaturas elevadas durante todo o ano.

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As condições climáticas nesse ponto (clima As’), semelhantes às condições de países tropicais úmidos, produziram solos profundos, bem intemperizados, com amplos horizontes e camadas, aptos para a exploração agrícola. O horizonte superior, mostrado na foto com um vermelho mais suave, indicado como colúvio, ou seja, um material transportado e ali depositado, pode também exemplifi car uma possível migração de argila para camadas inferiores, mais escuras, o que ocorre normalmente em solos conhecidos como Argissolos, na linguagem pedológica moderna. O elúvio indicado na imagem pode ser exemplo desse horizonte que recebeu a argila do horizonte superior, num processo de iluviação.

Nessa ocasião, pode-se questionar aos alunos sobre a diferença entre os termos comumente empregados nas aulas de pedologia, designados como “camada” e “horizonte”. Pode-se exemplifi car em campo o termo “camada”, citando a camada arável, camada compactada, camada orgânica, diferentes dos “horizontes”, que são identifi cados e formados pela pedogênese e podem ser exemplifi cados como horizonte A, horizonte B, entre outros.

Nessa primeira parada, deve-se mostrar aos alunos que as colinas desenvolvidas em terrenos pré-cambrianos encontram-se atualmente desprovidas, em quase sua totalidade, da primitiva cobertura vegetal, representada por uma fl oresta latifoliada subperenifólia, denominada como Mata Atlântica (Figura 7). Pergunta-se então: a) Por que a Mata Atlântica foi devastada nessa área da Zona da Mata Sul? B) O que essa devastação acarretou em termos ambientais?

. Foto: Pedro Henrique da Silva, 2019.

Figura 7. Visualização da destruição da Mata atlântica, no município de Jaboatão dos Guararapes,

Região Metropolitana do Recife

A segunda parada verifi ca-se a 36 km do ponto inicial, numa altitude de 140m, no município de Vitória de Santo Antão, nas imediações da pedreira Itamatamirim (Figura 8). Nesse ponto da excursão, os professores analisam diversos elementos da paisagem, sobretudo a mesma falha de rejeito direcional, anteriormente observada e a pouca espessura exibida pelo manto de intemperismo. Um dado importante que é salientado nessa ocasião é que, mesmo a poucos quilômetros do litoral, há uma redução marcante de umidade e de precipitação média anual. Essa conjugação de elementos climáticos irá justifi car dois fatos destacados na parada: primeiro, a pouca espessura do manto de intemperismo e, segundo,

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os processos pedogenéticos operantes. Nesse momento, os alunos são indagados sobre a razão da frequência dos afl oramentos dos terrenos cristalinos, quando comparados com aqueles observados na primeira parada.

Foto: Alineaurea Florentino Silva, 2014.

Figura 8. Pedreira Itamatamirim, Vitória de Santo Antão-PE

O Lineamento Pernambuco, a partir deste ponto, torna-se bem visível ao longo da BR232, sempre exibindo afl oramentos inconfundiveis de milonitos, podendo ser facilmente identifi cados pelo aluno. A presença de milonitos inalterados, na escarpa artifi cial promovida pelas ações antrópicas para utilização do material litológico, denunciam inequivocamente a existência de um extenso falhamento de rejeito direcional.

Ao preencherem a Ficha de Trabalho de Campo, os alunos terão que mencionar quais são os principais indicadores petrográfi cos e geomorfológicos que induzem ao pesquisador suspeitar de uma falha na localidade e fazer um esboço da paisagem, indicando o maior número de elementos paisagísticos visualizados (plano de falha, rocha inalterada, manto de intemperismo, entre outros).

A terceira parada, que ocorre a 50 km do ponto inicial da excursão, objetiva examinar dois aspectos da paisagem: a dissecação de uma pretérita superfície de erosão e a interpretação de um perfi l de solo. É uma parada mais demorada, pois demanda um trabalho mais detalhado de Pedologia e Geomorfologia (Figura 9).

A paisagem adjacente a esse corte exibido na Figura 9 mostra indícios de que se trata de um pedimento pleistocênico, mas que foi dissecado pelo rio Tapacurá e afl uentes, quando se instalou, na área, um clima mais úmido que persiste até os dias atuais. Essa dissecação gerou colinas incipientes, resultando num relevo suavemente ondulado. Indaga-se aos alunos, nesta oportunidade: Por que se pode afi rmar que essa paisagem foi dissecada? O que justifi ca tal dissecação?

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Foto: Rosalva Santos, 2017.

Figura 9. Interpretação de um perfi l de solos com a participação de alunos. Município de Vitória de Santo Antão (PE) O corte é muito rico, também, para ser explorado pela Pedologia. Pode-se, por exemplo, fazer uma escavação rápida no horizonte, revelando as cores reais que o perfi l de solo apresenta (SILVA; JATOBÁ, 2017). Nesse caso, como é um perfi l de menor espessura, usa-se a trena para fazer a medição do mesmo, conforme ilustrado na Figura 9. Após a medição do perfi l, é importante delinear os horizontes visíveis e, se possível, coletar um pouco de material de cada um destes, formando uma simulação de horizontes no chão, para melhor observação pelos alunos.

Nessas amostras de solo coletadas dos horizontes, pode ser realizada uma prática de textura, umedecendo e homogeneizando o material na mão, enquanto se observa a formação da massa e do que ela permite moldar. Caso seja possível moldar um fi lamento e fechar o mesmo, formando algo semelhante a um círculo, subentende-se que a textura dessa amostra é argilosa. Ao contrário, se não for possível formar esse fi lamento, chamado popularmente de “cobrinha”, pode-se julgar o solo como arenoso. E caso não forme o círculo, mas mesmo assim consiga-se o fi lamento, o solo possui textura média. Importante salientar para os alunos que essa textura do solo também é medida em laboratório, utilizando um triângulo textural para sua classifi cação.

Nessa parada, os alunos são advertidos para o fato de que não é possível afi rmar precisamente qual o tipo de solo apenas com essas rápidas observações. É necessária uma análise muito mais criteriosa pelo pedólogo para que possa ser classifi cado o perfi l do solo, mas alguns termos usados nesse trabalho serão úteis para o entendimento global da existência dos tipos de solo nas áreas onde são feitas as paradas.

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4.3.2 Segundo trecho

O segundo trecho abrange o espaço compreendido entre a escarpa de falha da Serra das Russas, no município de Pombos (PE), e a cidade de Caruaru (PE). O início desse trecho é importante para examinar a estrutura geológica, a compartimentação do relevo, as diferenciações climáticas, a cobertura vegetal e a variedade de solos. É o início do semiárido (clima BShs’), no qual se observa um ecótono, e do Agreste de Pernambuco, nesse percurso leste-oeste, ao longo da BR 232.

Salienta-se, na aula em movimento, que esse termo “serra” das Russas é uma impropriedade geomorfológica, haja vista que se trata de uma escarpa de falha, que dá início ao compartimento regional de relevo designado como Planalto3 da Borborema.

Pede-se que os alunos observem atentamente os extraordinários cortes de estrada que foram abertos para a duplicação da BR 232. E após essa observação, indaga-se: que marcas há nesse corte sugestivas de uma ação tectônica pretérita? Os milonitos, e o número muito grande de fraturas nessas rochas metamórfi cas, além da ruptura altimétrica verifi cada (250m para 500m, aproximadamente), seriam a resposta.

Nesse trecho é feita a quarta parada, ainda na escarpa de falha. É um local excelente para utilização de imagens SRTM na interpretação geológica e geomorfológica das paisagens. Solicita-se que os alunos se dirijam ao local da parada com uma imagem SRTM, previamente distribuída, na qual é possível ver os falhamentos e as feições de relevo existentes (Figura 10), mediante observação dos elementos texturais da imagem.

Fonte: Embrapa.

Figura 10. Quarta parada da excursão. Município de Gravatá (PE), Escarpa da “Serra” das Russas.

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Após a Serra das Russas, a 93 km do ponto inicial, numa altitude de 460m, realiza-se uma breve parada para que os alunos obrealiza-servem uma destacada paisagem de exceção que ocorre no trecho considerado. Trata-se de um maciço residual granítico (JATOBÁ, 2017) conhecido localmente como Serra Negra, no município de Bezerros, RD Agreste Central de Pernambuco. Ressalta-se para os alunos na oportunidade que essa “Ilha” de umidade em pleno domínio semiárido (LINS, 1989; JATOBÁ; SILVA, 2015) resulta da conjugação da altitude com a exposição do relevo aos fl uxos dos alísios de sudeste que ascendem o maciço residual, se resfriam adiabaticamente, originando no local maior nebulosidade e precipitações orográfi cas e defi nindo um clima local, segundo a escala geográfi ca dos climas, proposta por Max Sorre.

Entre os municípios de Gravatá e Caruaru, há notáveis exemplos de superfícies pedimentadas, pediplanadas e ocorrência de relevos residuais, conhecidos como inselbergues e cristas. Nesse espaço geográfi co percebem-se as infl uências do relevo, da litologia e do clima na formação dos solos. Nessa área há uma oportunidade excelente de visualização de dois grupos de solos: Neossolos Litólicos e os Planossolos, que exercem expressivas interferências nas atividades agropecuárias. É uma boa oportunidade de se fazer uma conexão dialética entre os conhecimentos pedológicos e a Geografi a Agrária, quando se acentua que o solo é um destacado elemento do sistema agrário.

No fi nal desse segundo trecho, na cidade de Caruaru, os alunos têm a oportunidade de visualizar um inselbergue granítico (Morro do Bom Jesus) que se mostra densamente ocupado, algo singular no mundo. A formação desse inselbergue, situado numa das poucas faixas sísmicas do Brasil, exemplifi ca a ação da erosão diferencial (um granito encaixado em rochas metamórfi cas), que gerou uma ampla superfície pediplanada nos terrenos metamórfi cos e deixou o relevo residual instalado em rochas mais resistentes (JATOBÁ, 1994).

4.3.3 Terceiro trecho

O terceiro trecho, que corresponde à parte fi nal da excursão, está contido entre os municípios de Caruaru (PE) e Brejo da Madre de Deus (PE), ambos na RD Agreste Central de Pernambuco. Nessa parte da excursão destacam-se o predomínio de superfícies pedimentadas, pediplanadas, cristas residuais, escarpas de falha, campos de matacões, solos jovens (das classes dos Neossolos e Planossolos) e formações vegetais como caatingas hipo e hiperxerófi las. Nesse trecho faz-se absolutamente necessária a interdisciplinaridade.

As paisagens divisadas ao longo do trecho exibem marcas de atuação antrópica incorreta que resultou em devastação considerável das formações vegetais, contribuindo para a aceleração dos processos de erosão (erosão linear e erosão laminar), na dinâmica atual de paisagens. Esses aspectos são ressaltados pelos professores com a apresentação de diversas questões aos alunos, tais como: a) há indícios nas paisagens de degradação ambiental? b) os solos apresentam marcas de aceleração da erosão? c) quais impactos são causados pela excessiva retirada da vegetação natural?

A 146 km do ponto inicial numa altitude de 530m, na BR 104, no distrito de Rafael, município de Caruaru, foi realizada mais uma parada. Desta feita, para examinar localmente as paisagens dominantes num ambiente semiárido (BShs’) com índice pluviométrico médio anual em torno de 500 mm. Do ponto de vista geológico/geomorfológico, os alunos têm a oportunidade de visualizar escarpas de falha, inclusive com partes expostas do antigo espelho de falha (Figura 11).

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Foto: Pedro Henrique da Silva, 2019.

Figura 11. Relevo de cristas em estruturas falhadas visto da localidade Rafael, Caruaru (PE) As cristas residuais, que em alguns pontos chegam a altitudes que superam 900m, se interpõem aos fl uxos dos alísios de Sudeste. Ao descerem para a depressão sertaneja de Fazenda Nova, que apresenta altitudes médias em torno de 450m, geram condições climáticas locais de forte semiaridez. Assim, essa parte da excursão reveste-se de um particular destaque no tocante à interdisciplinaridade em trabalhos de campo. Pede-se aos alunos que façam um esboço de paisagem que contemple tal conjugação de conhecimentos de geociências distintas, a exemplo da relação entre relevo (Geomorfologia), estrutura litológica e tectônica (Geologia), circulação atmosférica e tipologia climática (Climatologia), compartimentação de solos (Pedologia) e, por último, diversifi cação de Caatingas (Fitogeografi a).

A excursão, ao se desenvolver ao longo da rodovia PE 145, no sentido leste-oeste, permitirá ao estudante a visualização de um dos mais signifi cativos campo de matacões do Brasil (Figura 12), que está fortemente relacionado com a litologia e as numerosas falhas e fraturas que ocorreram nos terrenos cristalinos e cristalofi lianos de idade pré-cambriana. Some-se a isso a possibilidade de observação in locu de Neossolos Litólicos e afl oramentos numerosos de granitos e granodioritos, exibindo uma textura grossa.

Quando surgem os inúmeros matacões existentes na região de Fazenda Nova, o professor de Geomorfologia destaca a importância que tem a rede de diáclases sobre a forma assumida por estes. A rede de diáclase ortogonal geralmente facilita a formação de matacões arredondados, já a rede de diáclases não ortogonal contribui para que surjam matacões angulosos (JATOBÁ, 1994).

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Foto: Pedro Henrique da Silva, 2019.

Figura 12. Relevo em estruturas falhadas, com grande número de matacões, visto da PE-145, Caruaru (PE)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A excursão linear no ensino da Geografi a é uma prática pedagógica indispensável à formação do geógrafo e do professor de Geografi a. Sem a realização dessa estratégia de ensino fi ca muito difícil a compreensão da dinâmica e da estruturação natural das paisagens, na escala de 1:1.

O trabalho de campo em Geografi a Física põe à disposição do aluno de Geografi a um laboratório vivo para a prática da interdisciplinaridade, trazendo benefícios essenciais para a boa formação do profi ssional da Geografi a, seja como professor ou pesquisador.

Mesmo com todo o avanço tecnológico verifi cado nas duas últimas décadas, com a criação de instrumentos cartográfi cos excepcionais, imagens de satélites, imagens SRTM e diversos softwares, a excursão ainda desempenha um papel insubstituível para a interpretação científi ca das paisagens em laboratório natural que é o campo.

A excursão linear entre Recife e Fazenda Nova, no município de Brejo da Deus, na região Nordeste do Brasil, tomada como um exemplo, mesmo perfazendo apenas 198 km de extensão, permite que se visualizem e se interpretem paisagens sob condições climáticas muito contrastantes, estruturas geológicas diversas e uma gama bem variada de classes de solos, demonstrando a importância da interdisciplinaridade na análise físico-geográfi ca de paisagens.

NOTA

3 Na verdade, a expressão planalto, empregada à Borborema, é uma impropriedade geomorfológica. Trata-se de um saldo entre diversas superfícies de erosão; não é um compartimento homogêneo, topografi camente referido. É mantido em respeito a toponímia regional.

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REFERÊNCIAS

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JATOBÁ, L.; SILVA, A. F. Estrutura e dinâmica atual de paisagens. Ananindeua, PA: Itacaiúnas, 2017. 107 p. il.

JATOBÁ, L.; SILVA, A. F. O Nordeste brasileiro: a convivência com a seca. Recife, PE: Bagaço, 2015, 60p. il. (Nosso mundo nosso tempo, 4). Ilustração: Sérgio Miguel.

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