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Luto antecipatório : possíveis implicações e percepções da morte

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Academic year: 2021

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LUTO ANTECIPATÓRIO: POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES E PERCEPÇÕES DA MORTE

Pâmela Einsfeld

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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

ÁREA DE CONHECIMENTO DAS HUMANIDADES CURSO DE PSICOLOGIA

LUTO ANTECIPATÓRIO: POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES E PERCEPÇÕES DA MORTE

Trabalho apresentado como requisito parcial para a aprovação na disciplina PSI0519AC – Trabalho de Conclusão de Curso II, sob a orientação da Profª. Dra. Tânia Maria Cemin.

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SUMÁRIO RESUMO ... 7 INTRODUÇÃO ... 8 OBJETIVOS ... 11 Objetivo geral ... 11 Objetivos específicos ... 11 REVISÃO DE LITERATURA ... 12 Conceituando luto ... 12 Luto antecipatório ... 17

Percepções culturais acerca da morte ... 22

Luto antecipatório e percepções acerca da morte ... 24

MÉTODO ... 27 Delineamento ... 27 Fontes ... 27 Instrumentos ... 28 Procedimentos ... 28 Referencial de Análise ... 29 RESULTADOS ... 30 DISCUSSÃO ... 38 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 48

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LISTA DE TABELAS

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AGRADECIMENTOS

Com o encerramento desse ciclo, deparo-me também com a ideia de novos começos, construções que possivelmente se estenderão ao longo de toda a minha vida, na profissão em que escolhi com tanto amor. E, neste espaço que me é concedido, quero agradecer àqueles que puderam fazer parte de tantos momentos ao longo da graduação, de alguma forma me acompanhando até aqui, marcando o início, então, deste contínuo processo de construção.

À minha família e, em especial, aos meus pais, emociono-me ao tentar descrever com palavras o quanto agradeço pelo suporte e confiança que me foram direcionadas ao longo desses cinco anos. Quanto crescimento me foi oportunizado pela dedicação dessas pessoas. E por isso, com todo meu amor, quero lhes dizer, muito obrigada! Por atenderem a tantos dos meus caprichos, pelas vezes em que abdicaram de desejos próprios, a fim de satisfazer os nossos. Também, pela paciência, que nem sempre foi tanta, com os momentos difíceis e semanas com humores conturbados. Se hoje estou aqui, dedicando o melhor de mim pela profissão que me encanta a cada dia mais, devo a vocês. Vocês, que tão pouco sabiam sobre ela, e hoje se orgulham junto comigo a cada nova conquista, sempre me motivando a seguir adquirindo conhecimentos sobre aquilo com que me identifico. Que Deus siga abençoando nossa família, da mesma forma e com tudo que tem nos proporcionado até hoje!

Também, para aqueles que não tem vínculo familiar, mas da mesma forma me acompanham desde muito antes do percurso acadêmico, faço uso deste espaço para agradecer às amizades construídas ao longo de tantos anos, que durante a graduação compreenderam faltas, ansiedades e receios, acolhendo tantas inseguranças. Não farei menção de nomes, na certeza de que cada um saiba o espaço que ocupa em minhas conquistas até aqui, se fazendo presentes, mesmo que nem sempre fisicamente. Entretanto, das amizades de tantos anos, quero agradecer de forma singular a ele, que hoje, além de um amigo, também é meu companheiro, que com toda sua bondade, amor e paciência, tem lidado com cada circunstância que permeia o término deste ciclo. Por me possibilitar compartilhar cada conquista e angústia, da graduação à formatura, facilitando cada passo desse processo e me oportunizando vivenciar tanto afeto, carinho e cuidado, sou imensamente grata.

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Conduzo, também, meus agradecimentos à Psicologia, enquanto ciência que tanto nos auxilia na arte de ser, também, humano. Por tudo que tenho vivenciado na rede pública de saúde, pelas experiências que o curso nos proporciona dentro da própria universidade e pelos excelentes profissionais que nos conduzem nessa construção, dedico minha gratidão. Aproveito, diante disso, para direcionar meu muito obrigada à professora Tânia Maria Cemin, pelas angústias acolhidas, pelo auxílio e disponibilidade presentes, também, em tantos outros momentos da trajetória acadêmica.

O período de graduação nos proporciona, então, junto de tais novas experiências, novos vínculos e afetos. Somos constantemente afetados por aqueles que impactam em nossa vida. E por tantos novos impactos, também quero agradecer. Com o encerramento desse processo, retorno para minha cidade, sentindo-me privilegiada pelas pessoas que aqui deixo, na certeza que sempre terei para onde e por quem retornar. Pelos tantos encontros, por todas as trocas que me foram proporcionadas, muito obrigada! Que enquanto profissionais possamos seguir nos afetando positivamente, como tem sido até esse momento, inclusive no acolhimento das angústias desse temido estudo que lhes será apresentado.

A todos vocês, e também àqueles que por ventura não se sentiram diretamente agradecidos, reforço com todo meu amor, minha mais sincera gratidão.

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RESUMO

A elaboração de um luto antecipatório pode ser determinada por diferentes variáveis, sendo manifestada e vivenciada de forma única para cada indivíduo. Há fatores pessoais, sociais e culturais envolvidos nesse processo de elaboração de uma perda. Assim, sendo este o foco do presente trabalho, tem por objetivo geral identificar possíveis implicações em um luto antecipatório, frente às diferentes percepções da morte. Por objetivos específicos, são apresentados: a caracterização do luto, privilegiando o luto antecipatório; a apresentação de percepções culturais acerca da morte; além de traçar possíveis relações entre o luto e as diferentes percepções acerca da morte. Foram analisados recortes de cenas do filme “pronta para amar”, os quais foram agrupados em categorias que envolvem: o contexto em que a personagem estava inserida no período anterior ao adoecimento; manifestações apresentadas por ela durante a elaboração de sua morte; o processo de aceitação; e as diferentes percepções das pessoas do seu convívio, acerca da aproximação da sua morte. A partir disso, relacionou-se as categorias propostas com aspectos teóricos, considerando possíveis implicações de um luto antecipatório, frente às percepções que se manifestam. A linha teórica na qual foi embasado o trabalho em questão é a Psicanálise, abordando alguns autores como Sigmund Freud, Melanie Klein, Murray Parkes e Kübler-Ross, buscando estabelecer maior entendimento acerca da forma com que se dá a elaboração de um luto considerado esperado, aspectos do desenvolvimento que influenciam nesse processo, além dos estágios que podem estar associados. Considera-se que a elaboração de um luto será efetivada, então, a partir das variáveis envolvidas no processo de morte, vínculo e características individuais do enlutado, não apresentando um padrão para sua resolução.

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INTRODUÇÃO

Considerando a importância de abordar temas que ainda são apontados como tabus em nossa sociedade, compreende-se que falar sobre morte e luto ainda vem sendo um dos assuntos mais conjurados atualmente. Apesar de ser um momento natural do ciclo vital de todo ser humano, devendo ser compreendido como tal, é importante ressaltar que isso não torna mais fácil o processo de elaboração de um luto. Conhecer e estudar temas envolvendo situações do cotidiano de unidades hospitalares, luto e cuidados paliativos vem despertando interesse desde o início da graduação, compreendendo a importância do olhar do profissional de Psicologia acerca das implicações envolvidas em tais processos de fim da vida. Neste sentido, também com a realização do Estágio em Clínica Ampliada I e II em ambiente hospitalar (Hospital Geral), foi possível perceber, na prática, a necessidade de assistir pacientes em fase terminal, suas possíveis vontades e receios acerca deste momento, podendo fornecer uma escuta, assim como assistência sobre sua rede de apoio.

Adentrar em um luto antecipatório, muitas vezes, evidencia resistência em função das crenças e percepções pré-estabelecidas culturalmente ao longo dos anos. Essa percepção pode, muitas vezes, envolver uma não aceitação da morte de um ente ou pessoa próxima, como resultado de tais imposições da sociedade, acarretando em lutos complicados e outras prováveis consequências emocionais e psíquicas para aqueles que ficam.

Para cada cultura, o processo de morrer é concebido de forma única, com significados que permitem a cada grupo elaborar e compreender este momento, podendo fazer uso inclusive de símbolos e/ou rituais como parte de tal processo. No que se refere à nossa sociedade ocidental atual, entende-se que as simbologias grupais estão se esvaindo, tornando cada vez mais individual a percepção sobre a vivência do luto, até mesmo, muitas vezes, deixando um silêncio para aquele que está partindo. Acontecendo isto, acaba-se por negligenciar possíveis sentimentos que emergem tanto no indivíduo quanto nos familiares envolvidos neste momento (Giacomin, Santos & Firmo, 2013).

Para Rodriguez (2014), este é um importante aspecto a ser abordado, manifestando-se principalmente no período anterior à morte e encontrado até mesmo na falta de atribuição da palavra ao paciente, geralmente sendo a família quem passa a tomar

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decisões por ele, sem considerar suas vontades. Este pode ser um fator que gera estresse para todos e, a partir disto, a autora cita Rando (2000), que apresenta três áreas de um programa de cuidados paliativos, sendo elas o apoio ao luto antecipatório, ao cuidador e ao luto depois da morte, a fim de colaborar com os processos envolvidos no luto. A família, juntamente com o paciente, necessita ser amparada neste momento, relacionando ao que Nelson et al. (2010), também citado por Rodriguez (2014), afirmam sobre a existência de benefícios na preparação de cada fase do luto ao valorizar a comunicação entre os membros. É necessário, então, um olhar para a singularidade de cada relação, a importância da realização de determinados rituais de despedida, sendo função da equipe de saúde intervir no sentido de fornecer apoio e escuta, proporcionando um ambiente confortável para atingir tais objetivos.

Em se tratando do luto, especificamente, Fernandes et al. (2016) trazem que a intervenção do psicólogo se faz extremamente importante em função das possíveis reações que o processo pode estabelecer e emergir no paciente e rede de apoio, sendo necessário que este possa estar apto a conduzir tais estados de possível angústia e sensação de fracasso, que colocam os indivíduos frente ao significado de sua existência. Com isto, as autoras enfatizam, ainda, que estão envolvidos os aspectos culturais acerca da morte, considerando as crenças de cada indivíduo diante do morrer e quais suas atitudes frente à finitude. É notório o sofrimento que a consciência sobre a morte tem causado no ser humano, isto interferindo inclusive na qualidade vida do indivíduo. Assim, é possível ressaltar a necessidade de que sejam realizados estudos e práticas que possam abranger um olhar mais humanizado, que priorize o respeito e a prevenção das relações e valores socioculturais que estão envolvidos no processo de morte e luto, nos cuidados paliativos (Fernandes et al., 2016).

Ondere Neto e Lisboa (2017) citam autores como Lindemann (1944), ao abordar o conceito de luto antecipatório, que afirma que este consiste na separação de um membro em consequência de uma grande possibilidade de morte e, assim, para que possam lidar com a perda, utiliza esse tipo de luto como meio de encarar o provável óbito. Já para Kübler-Ross (1998), que apresenta o processo de elaboração de um luto a partir do desenvolvimento de cinco estágios a serem ultrapassados, caracteriza o luto antecipatório em um contexto específico, havendo o envolvimento de doença. Assim, tal fenômeno pode ocorrer por ambas as causas e, até mesmo, acarretar no que explicita Boss (1999),

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citado por Ondere Neto e Lisboa (2017), considerando como perda ambígua, quando há a incerteza em relação à morte.

Fernandes et al. (2016) remetem que a maioria das pessoas dispõe de recursos para se adaptar às transições da vida, incluindo o luto, porém alguns indivíduos apresentam uma maior vulnerabilidade, podendo acarretar no desenvolvimento de problemas futuros por um luto complicado ou não elaborado. Assim, relaciona-se a importância também dos cuidados paliativos para o auxílio na elaboração desse luto, colocando-se como modalidade de cuidado e alívio aos sintomas, além do suporte fornecido ao paciente e sua rede de apoio. Considerando o crescimento da abordagem do tema, faz-se importante investigar a produção de conteúdo envolvido na temática, a fim de contribuir para um melhor entendimento sobre a mesma, visto que estes são temas de interesse multidisciplinar. Portanto, compreendendo a relevância do tema abordado, juntamente com as repercussões que podem estar associadas, delimita-se o problema de pesquisa: Quais as possíveis implicações em um luto antecipatório frente às diferentes percepções das pessoas acerca da morte?

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OBJETIVOS Objetivo Geral

Identificar possíveis implicações em um luto antecipatório frente às diferentes percepções das pessoas acerca da morte.

Objetivos Específicos

Caracterizar o conceito de luto, privilegiando o luto antecipatório.

Apresentar aspectos fundamentais acerca de percepções culturais sobre a morte. Traçar possíveis relações entre luto e percepções culturais acerca da morte.

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REVISÃO DE LITERATURA Conceituando Luto

A morte é compreendida, ainda, como sendo um acontecimento relacionado a vários aspectos negativos, geralmente associados a um horror e/ou temor. O que vem sendo modificado, ao longo do tempo, é a forma com que se convive e lida com a morte (Kübler-Ross, 1998). Apesar de se ter consciência do fato de que as pessoas morrem, ainda há crenças e comportamentos no sentido de pressupor a imortalidade do ser humano. Assim, apenas quando se sofre alguma perda significativa, coloca-se em questão a ideia de viver para sempre, e só então é possível aceitar que possa ocorrer uma próxima morte (Parkes, 2009).

Para Kovács (1992), “em termos de função, a morte se caracteriza pela interrupção completa e definitiva das funções vitais de um organismo vivo, com o desaparecimento da coerência funcional e destruição progressiva das unidades tissulares e celulares.” (p. 10). Segundo a autora, desde os primeiros meses de vida a morte se faz presente. As primeiras ausências, como o entendimento de que a mãe não é onipresente para o bebê, são concebidas como uma representação da morte por meio dessa perda e separação da mãe. Esta experiência tem como consequência a sensação de desamparo, ao mesmo tempo em que esta mãe é acolhedora e transmite conforto. As vivências de morte, então, são experienciadas ao longo de todo o desenvolvimento, alterando apenas as formas com que se apresentam em cada fase do ciclo vital.

Para Freud (1917/1974), é possível pensar o processo de luto como a reação frente à perda de um ente querido - ou objeto de amor. Esse objeto amado passa a não existir mais, necessitando de um teste de realidade que possibilite retirar toda libido direcionada para aquele objeto. Assim, o teste de realidade empenha o ego na tarefa de desistir do objeto, permitindo que este seja compreendido como morto, e fornecendo ao ego incentivo para continuar a viver e superar essa perda. No luto, então, o ego consegue libertar sua libido do objeto perdido, seguindo um sistema em que os esforços são possibilitados de seguir do pré-consciente até a consciência, como é esperado que ocorra. É este caminho que bloqueia o disparo para uma disposição patológica, como a melancolia, em que a perda do objeto é percebida como sendo retirada da própria consciência, tornando o ego vazio, enquanto no luto, é o mundo que se torna pobre e desinteressante.

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Freud (1917/1974) afirma, também, que há características semelhantes em casos de melancolia e de luto, pontuando aspectos como a cessação de interesse pelo mundo externo, perda da capacidade de amar e a inibição de toda e qualquer atividade. Na melancolia, porém, acrescenta-se o aspecto da diminuição acentuada da autoestima, que não ocorre de forma tão intensa no luto, podendo até mesmo nem se apresentar. A perda de interesse pelo mundo externo acaba gerando uma necessidade de substituição do objeto perdido, que não é mais evocado. Com isto, o enlutado passa a vivenciar um mundo desconhecido, necessitando ajustar-se a esse novo ambiente e a si mesmo neste novo momento, sem a pessoa amada.

Klein (1940/1996), ao apresentar as relações do luto com o desenvolvimento da posição depressiva, também traz estudos acerca do teste de realidade. Considerando a relação que este tem com os processos mais antigos da mente, em que o luto arcaico, envolvido no processo de desmame, passa a ser evocado ao longo de todas as perdas vividas posteriormente. Assim, o teste de realidade é considerado um instrumento de extrema importância na superação do luto para as crianças. Os sentimentos depressivos no bebê atingem seu auge no desenvolvimento do processo de desmame, caracterizando a posição depressiva. É o seio da mãe, juntamente com as representações deste para a criança, que desencadeiam o luto, à medida em que o bebê compreende que perdeu todas essas representações. Assim, a criança sente preocupação e pesar pela perda dos objetos “bons”, que serão superados desde que haja um desenvolvimento normal.

Estudos de Klein (1940/1996) apresentam, então, que a resolução da perda do seio da mãe possibilitará ao indivíduo a habilidade de recuperar-se de um luto posterior, visto que a perda de uma pessoa amada ativa novamente a posição depressiva infantil. Para a autora, o luto não envolve apenas a perda de um objeto bom externo, mas também, provoca no inconsciente a sensação de perda de um objeto bom interno. A dor envolvida na perda da pessoa amada é expandida pelas fantasias inconscientes do indivíduo, que passa a compreender os objetos internos “maus” como dominantes de seu mundo interno, fazendo com que este corra risco de desintegrar-se. Klein (1940/1996), ainda, considera que exista um impulso de reinstalar a pessoa amada no ego novamente, acrescentando ao que é apresentado por Freud (1917/1974), ou seja, compreende que não há apenas a necessidade de reincorporar o objeto perdido, mas também deve haver uma reinstalação dos objetos bons que estão internalizados no indivíduo. O desenvolvimento mental necessita do processo de idealização dos objetos bons, à medida em que o indivíduo

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enlutado possa se sentir aliviado, recordando qualidades acerca da pessoa que perdeu. O processo de retomada da confiança ao externo acontece lenta e gradualmente, e, é a partir disso, que o indivíduo conseguirá apontar que a pessoa amada que morreu não era perfeita, sem colocar em questão a confiança e o amor que sente por essa pessoa.

Worden (2013) identifica que em muitos estudos ainda não há a concepção da vivência do luto como singular a cada indivíduo. Os processos a serem realizados ao longo do luto, apesar de serem semelhantes em todas as mortes, são experiências pessoais e únicas, assim como a forma com que o sujeito se adapta a esses processos. O autor cita o argumento de Engel (1961), de que

o luto representa um afastamento do estado de saúde e bem-estar, da mesma forma como a cura é necessária no campo fisiológico para levar o corpo de volta ao equilíbrio homeostático, e é igualmente necessário um período para o enlutado retornar ao estado similar de equilíbrio psicológico. (p. 3)

Assim, Worden (2013) pontua que a adaptação frente à determinada perda se dará de melhor forma para algumas pessoas do que para outras, considerando que há uma diversidade de sentimentos e comportamentos envolvidos, geralmente comuns à situação de perda. Para compreender as distintas formas de lidar com o luto, é preciso estabelecer um entendimento acerca dos fatores que influenciam nesta vivência, o que o autor caracteriza a partir de sete mediadores. O primeiro diz respeito a quem era a pessoa que morreu, identificando qual era o grau de parentesco ou relacionamento do enlutado com esta pessoa. O segundo mediador é apresentado pela natureza do vínculo existente, envolvendo questões sobre força e segurança do apego, ambivalência no relacionamento, conflitos com a pessoa que morreu e possibilidade de relacionamentos que funcionavam com dependência, por parte do enlutado com a pessoa que partiu. O mediador de número três é direcionado à forma como a pessoa morreu, onde ocorreu geograficamente, se ocorreu de forma repentina, violenta, entre outros fatores associados. Antecedentes históricos são o quarto mediador na compreensão da vivência do luto, buscando identificar se o enlutado já sofreu outras perdas anteriormente e como lidou. O quinto mediador são as variáveis de personalidade, como idade e gênero, estilo de enfrentamento frente à situações traumáticas, tipo de apego envolvido, força do ego, além de suas crenças. Variáveis sociais são o sexto mediador, buscando compreender o apoio emocional direcionado ao enlutado, atentando para possíveis ganhos secundários que ele possa

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estabelecer, a partir do suporte que lhe é fornecido. Como sétimo, e último mediador, apresentam-se os estressores concorrentes, caracterizados por outros fatores e/ou crises que surgem e influenciam o processo de luto.

Por outro lado, Kübler-Ross (1998) aborda o processo de luto por meio de cinco estágios. O primeiro estágio reconhecido pela autora é de negação, marcado também pelo isolamento, que são defesas usadas por quase todos nos primeiros estágios da doença, ou logo em seguida de sua confirmação. Este funciona como um para-choques ao receber notícias impactantes, possibilitando que o paciente se recupere, em seu tempo. A negação é considerada uma defesa temporária, que poderá ser substituída por uma aceitação parcial do quadro em pouco tempo. O segundo estágio é caracterizado pela raiva, em que a negação é substituída por sentimentos como revolta e raiva, além de ser uma fase muito marcada pela pergunta: “por que eu?”. Em função da projeção que é propagada pela raiva, esse estágio é mais difícil de lidar do que o anterior, principalmente para os familiares e equipe de saúde responsável, por ser um período permeado de queixas acerca de tudo e todos. O que poucas pessoas compreendem acerca desse momento, é o que pode estar desencadeando tanta raiva por parte do paciente, sem considerar as interrupções abruptas e tantas coisas inacabadas na vida do paciente por consequência do diagnóstico. Com isso, ainda, pode-se entender uma busca por atenção e por saber que sua existência permanece tendo valor para sua rede de apoio, e, quando isso for compreendido, o paciente será genuinamente respeitado, geralmente abrindo mão de tais queixas e exigências. A barganha é o terceiro e menos conhecido estágio, embora igualmente útil - por um tempo mais curto. Ela se dá como uma tentativa de estabelecer um adiamento da morte através de promessas, geralmente feitas com Deus e mantidas em segredo, buscando alguma forma de recompensa, estabelecida a partir de uma meta. Do ponto de vista psicológico, tais promessas podem estar associadas a uma culpa ou temores do paciente, o que passa a exigir um trabalho multidisciplinar acerca da forma com que isto impacta para o paciente. O quarto momento vivenciado no processo de luto é a depressão, quando não existem mais meios que permitam negar a sua doença, em que os sentimentos descritos até aqui darão espaço para um intenso sentimento de perda, que será apresentado com diferentes aspectos para cada paciente. Neste sentido, a depressão é um instrumento para a preparação do paciente que está prestes a perder tudo e a todos que ama. Serve, também, como uma maneira de externalizar a forma como se sente nesse momento, possibilitando que ele aceite mais facilmente a situação, elaborando-a. A autora ressalta

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que apenas alcançam este estágio os pacientes que foram capazes de superar angústias e ansiedades anteriores. Como quinto, e último estágio, a autora identifica a aceitação, em que o paciente não sente mais raiva ou depressão em relação ao seu quadro. Mas, apesar de não estar permeado por esses sentimentos negativos, não deve ser compreendido como um momento de felicidade. Este é caracterizado como um período em que a luta do paciente chega ao fim e este é capaz de encontrar certa paz e aceitação. Geralmente, é um momento em que a família necessita de ajuda e apoio, considerando que podem fornecer apenas sua presença, como certeza de que não haverá abandono para com o paciente até o fim. Neste momento, é preciso ter cuidado ao encorajar o paciente a seguir lutando, como se a aceitação fosse um sinal de desistência ou covardia, tornando a experiência penosa para todos. Cabe ressaltar que, em todos os estágios, geralmente, a única coisa que persiste é a esperança, a sensação de que há um sentido ou uma compensação para tudo isso (Kübler-Ross, 1998).

Também, no que se refere à relação do desenvolvimento na forma com que se lida com as perdas, Parkes (2009) apresenta a importância dos vínculos estabelecidos na infância para o processo de elaboração de um luto. Assim, o autor identifica que o impacto emocional de perdas posteriores são menores para aqueles que experienciaram as dificuldades de vínculos desorganizados, considerando as expectativas negativas que elaboraram na infância. Por outro lado, o estabelecimento de vínculos seguros na infância gera muita proteção a reações negativas, principalmente acerca de eventos considerados traumáticos, como os lutos. Assim, pode-se compreender que tais situações acontecem apenas aos outros, sugerindo que esse indivíduo não disponha de recursos emocionais para lidar, da forma esperada, com o impacto de uma perda próxima. Partindo dessa premissa, o estabelecimento de vínculos seguros, possibilita sentimentos de segurança em relação ao externo, podendo causar maiores abalos frente a situações traumáticas.

Segundo Kovács (1992), em algumas fases do processo de luto pode haver identificação com a pessoa que morreu, podendo gerar desconforto no sujeito enlutado, ao se perceber realizando atividades que eram do gosto daquele que partiu. Outra forma de identificação que pode ocorrer com a perda é a manifestação dos sintomas da pessoa que morreu, sugerindo que esta ainda esteja presente de alguma forma. A ordem patológica ou considerada esperada nestes aspectos, é determinada pela frequência com que se manifestam, levando em conta, também, o grau e perda de contato com a realidade com que estes comportamentos são apresentados. O período de elaboração do luto pode,

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ainda, acarretar problemas relacionados ao sono e à alimentação, além de quadros somáticos e doenças graves após o luto, sendo características particulares de cada pessoa neste processo que podem facilitar ou dificultar sua elaboração. Assim, o tempo de luto também varia, podendo até mesmo nunca terminar, envolvendo intensa tristeza e solidão. A perda será enfrentada de acordo com as características de personalidade pertencentes ao enlutado antes mesmo da pessoa morrer, compreendendo o nível de vínculo e investimento afetivo que existia nessa relação. Conforme o grau de investimento, será concomitante a intensidade de energia necessária para desligar-se da pessoa, sendo um fator que pode agravar e dificultar a reorganização do enlutado. As causas e circunstâncias em que se deu a perda também têm forte impacto na elaboração do luto.

O luto tende a desaparecer após determinado tempo, sem que deixe significativas alterações no enlutado. Enquanto está sendo desenvolvido, o luto normal absorve energias do ego, mas é capaz de superar a perda do objeto ao ser finalizado, desenvolvendo-se como um processo prolongado e gradual. Para que seja iniciado um processo de elaboração do luto, é necessário identificar a importância do objeto perdido para o ego, considerando que as lembranças e lamentos evocados, surgem de fontes inconscientes diferentes. Assim, apesar de ser caracterizado como um momento discrepante do que é considerado habitual na rotina das pessoas, o luto não deve ser entendido como tendo cunho patológico, visto que esse momento doloroso é considerado um evento esperado, quando o luto é concluído e superado, o ego passa a ser desimpedido novamente (Freud, 1917/1974).

Luto antecipatório

Até aqui, foram abordadas questões acerca da caracterização do processo de um luto considerado como normal ou esperado, dentro de seus estágios e fases reconhecidas, compreendendo a singularidade de cada indivíduo para seu enfrentamento. Mas, para além do luto normal, busca-se priorizar o entendimento acerca do luto antecipatório. Para isso, faz-se necessária uma consideração e diferenciação acerca dos demais tipos de luto, sendo os principais deles: luto complicado, luto adiado e luto não-reconhecido.

O luto complicado, para Shah e Meeks (2012), citados por Rodriguez (2014), é caracterizado por incredulidade em relação à morte, envolvendo recorrentes sentimentos de raiva e outras emoções dolorosas, apontando para a possível presença de sintomas

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depressivos, uma vez que também depende de fatores relacionados à personalidade e à vida do enlutado. Citados pela mesma autora, Lobb et al. (2010) identificam sintomas como angústia de separação, saudade e busca pela pessoa que morreu. Outros sintomas e sentimentos negativos, envolvendo preocupação e raiva, podem levar o enlutado a experienciar sintomas somáticos de quem faleceu. Rodriguez (2014) apresenta que o contrário acontece no luto adiado, ou luto inibido, em que o indivíduo passa a evitar contato com a realidade da perda. Possivelmente irá acarretar em sofrimento somente tempos depois de ocorrer o falecimento, considerando que, durante o processo, o enlutado passa a focar apenas em atividades de restauração.

Para Doka (2002), citado por Worden (2013), o luto não-reconhecido refere-se a perdas que não são aprovadas no meio social, ou seja, se o enlutado estabelece um estilo de vida alternativo, que não é reconhecido publicamente, este geralmente passa a ser banido dos rituais envolvidos na despedida da pessoa que faleceu. Também citado pelo autor, Lazare (1979) relaciona ao luto não-reconhecido dois tipos de perdas, as que são socialmente negadas, não sendo concebidas como perdas para a sociedade, e o luto não autorizado, em que as perdas não são socialmente expressas. As perdas caracterizadas desta forma, geralmente, carregam algum tabu para a sociedade, tornando difícil para o enlutado até mesmo falar sobre sua perda e sentimentos acerca da morte. Diferenciando-se dos demais lutos, então, o luto antecipatório é caracterizado esDiferenciando-sencialmente por ocorrer antes do efetivo acontecimento da morte, possibilitando dar início ao enfrentamento e vivências em relação ao processo de luto durante este período.

O termo luto antecipatório foi usado pela primeira vez por Lindemann, no ano de 1944, para definir uma reação de pesar pela existência de uma ameaça de morte, gerada por uma experiência de separação, com base em experiências de esposas de soldados convocados para batalhas (Fonseca, 2001; Fonseca, 2004; Aguiar, 2005; citados por Santos, Yamamoto & Custódio, 2017). Aguiar (2005), citado por Santos et al. (2017), identifica que o luto antecipatório é estabelecido com base em fatores fisiológicos, psicológicos e sociais, a fim de que o paciente e seus familiares possam se reorganizar, reajustando a visão que tem de si mesmo e dos outros. Os fatores fisiológicos apresentam-se através da saúde física do enlutado, envolvendo aspectos relacionados à energia disposta sobre esse luto, consequências em seu tempo de descanso, alimentação e até no uso de medicamentos. Os fatores psicológicos têm relação direta com o significado da pessoa e do vínculo que está sendo perdido com a morte desta, assim como, envolve as

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características próprias do enlutado, e da doença/tipo de morte que possam estar o abalando. Concomitante aos demais, os fatores sociais apresentam as características que o paciente tem acerca da sua própria doença e da morte, as reações por parte da família sobre a doença e morte iminente de um ente querido e, ainda, os fatores socioeconômicos e ambientais envolvidos nesse processo.

Conforme a família tem oportunidade de manter-se presente e acompanhar o adoecimento junto com o paciente, o luto antecipatório é capaz de prover tempo para elaborar a perda, possibilitando que sejam finalizadas pendências – subjetivas ou concretas – entre o paciente e membros da família. Assim, o enfrentamento da perda é beneficiado pela elaboração do luto com antecedência (Kovács, 1992). Mas, apesar de apresentar aspectos facilitadores, o período anterior à morte de um ente querido, também, pode levar os familiares a preocupar-se com o futuro e com a nova vida, gerando estresse, ao passo em que deixam de incluir o paciente, na tomada de decisões, por exemplo (Rodriguez, 2014).

Para Clukey (2008), citado por Rodriguez (2014), há um conjunto de transições emocionais e cognitivas que surgem como resposta a uma perda esperada. São elas:

1) a tomada de consciência da morte iminente; 2) o cuidar, para que o familiar encontre maneiras de dar conforto ao ente querido que está morrendo; 3) a presença que se resume em estar junto fisicamente e testemunhar decisões; 4) a encontrar significado por meio da percepção das perdas que ocorrem no dia-a-dia; 5) a transição como um processo gradual representado por alterações da relação com a pessoa que está morrendo. (p. 34)

Para Rodriguez (2014), cada uma das etapas, assim como as pessoas envolvidas, necessitam de suporte, considerando que são momentos complicados e as etapas podem ocorrer de forma muito rápida. Associando aos estágios do luto de Kübler-Ross (1998), afirma que não é possível estabelecer um luto antecipatório de forma genuína até que seja ultrapassado o estágio de negação. Fonseca (2001), citado por Santos et al. (2017), corrobora com a ideia ao considerar que, geralmente, o paciente e sua família encontram-se estagnados em relação aos acontecimentos, negando a tal ponto a doença que é possível que acreditem na recuperação do paciente.

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Segundo Santos et al. (2017), ainda, o processo de luto antecipatório, quando bem sucedido, pode acarretar em maturidade para o indivíduo, considerando que, mesmo no luto que se desenvolve como esperado, há um intenso esforço para adaptar-se à nova realidade, exigindo do indivíduo mecanismos adaptativos, que o permitam se reajustar frente à perda. Assim, na maioria dos casos consegue-se alcançar uma resolução a partir da aceitação das novas condições em que se vive. Relacionando, também, com os estágios do luto desenvolvidos por Kübler-Ross (1998), a aceitação permite ao enlutado perceber, de fato, a realidade que está vivenciando, podendo considerar e conceber sua vida sem o ente, ao alcançar uma reestruturação racional e emocional. Porém, ao citar Marques (2015), os autores identificam que há, também, fatores impeditivos na resolução do luto, como aspectos circunstanciais, históricos, de personalidade e sociais. Tais fatores podem gerar o desenvolvimento de um luto complicado e, consequentemente, a possível não resolução do processo.

Assim, considera-se tanto o luto antecipatório para quem permanece e está prestes a perder um ente querido, como para aquele que está morrendo, que com a morte, irá perder todos os vínculos estabelecidos em vida, de apenas uma só vez. A antecipação destas perdas pode levar a um isolamento e afastamento do indivíduo, como forma de conseguir lidar com a situação. Um problema do luto antecipatório, é que este dura um período, muitas vezes, indeterminado. Quando muito longo, o enlutado pode tender a isolar-se emocionalmente, acarretando em consequências no relacionamento com a pessoa que irá partir, pelo distanciamento que pode ocorrer no convívio. Por outro lado, pode gerar comportamentos de desapego emocional, aproximando-se ao máximo da pessoa na intenção de evitar sentimentos de culpa, gerados por uma ambivalência do enlutado em relação à pessoa que está morrendo, passando a cuidar de modo excessivo do paciente, causando até mesmo dificuldades para a equipe de saúde (Worden, 2013).

O período que precede a morte tem muito impacto no luto subsequente, podendo ser vivenciado de forma que traga benefícios ao enlutado. Este deve ser encorajado, também, a cuidar de suas próprias questões que possam ter ficado inacabadas diante da situação. Tais pendências não dizem respeito apenas a trâmites legais acerca da morte, mas, também, a assuntos que devem ser abordados, possibilitando ao enlutado expressar os sentimentos que emergem diante da situação, antes que a pessoa morra. Contudo, evidências e estudos acerca das implicações de um luto antecipatório no luto pós-morte ainda variam. Alguns apontam uma significativa melhora ao lidar com a perda em pessoas

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que tiveram esse anúncio da aproximação da morte, enquanto outros, não apresentam as mesmas conclusões, identificando que o luto antecipatório não é um facilitador para o enfrentamento do processo de luto. Com base nisto, é preciso retomar o fato de que o luto é multideterminado, ou seja, mediado por diversos fatores, podendo contribuir na forma com que se dará o luto, não devendo ser analisada apenas a variável da oportunidade de elaborar um luto pré-morte (Worden, 2013).

Apesar do crescimento das pesquisas na área do luto antecipatório e seus efeitos no luto pós-morte, concomitantemente crescem as divergências de resultados, aumentando o grau de incerteza acerca de suas implicações. Também, estudos foram realizados no sentido de divergir da noção de luto antecipatório estabelecida inicialmente por Lindemann. Identifica-se que, no processo de elaboração do luto antecipatório, há a necessidade de um mecanismo adaptativo, considerando que o aviso prévio da morte abranda reações que, geralmente, se apresentam de forma mais grave e intensa dentro do processo de luto. O luto antecipatório, então, possibilita um período para lidar com questões inacabadas, sendo compreendido como facilitador para a vivência do processo de morrer, permitindo que os sobreviventes se prepararem, inclusive, frente a ajustes sociais necessários. Assim, a oportunidade de separação emocional, iniciada em um período anterior à perda, pode ter impacto positivo no luto pós-morte, sem acarretar em prejuízos na sua afiliação com o momento presente (Zisook, 2000; Kramer, 1996-1997; citados por Raynolds & Botha, 2006).

Por outro lado, há estudos identificando implicações negativas do luto antecipatório, podendo ser compreendido como um fator de risco para as vivências iniciais do processo de luto. Isso se justifica por empobrecer o ajustamento necessário a partir do momento em que ocorre a morte real, causando estranhamento, visto que já houve uma preparação para esse momento. Com isto, o enlutado pode não apresentar melhoras em relação àqueles que não tiveram um aviso prévio da morte (Levy, 1991; citado por Raynolds & Botha, 2006). Cabe ressaltar, ainda, o que é apresentado por Santos et al. (2017) acerca do fim do processo de luto

Torna-se importante salientar de que não há um “fim do luto”. O que existe, é o final de um processo de elaboração. Esse momento pode ser percebido quando o enlutado já consegue fazer planos sem a pessoa que morreu, por exemplo, dando uma continuidade à sua vida, podendo

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pensar de forma menos dolorosa no ente perdido, sem os sintomas físicos e comportamentais do luto, superando muitas vezes o sentimento de culpa que vem acompanhando o indivíduo durante o processo. (p. 14) Pontuou-se, até o momento, questões acerca da conceituação do processo de luto, considerando a forma com que este se dá a partir de uma possibilidade de perda, privilegiando o entendimento da elaboração do luto antecipatório. Segue-se apresentando relações entre o processo de morrer e as percepções culturais acerca destes, compreendendo possíveis impactos gerados na vivência do luto por questões culturalmente perpetuadas.

Percepções culturais acerca da morte

Cada cultura estabelece uma compreensão e conceituação acerca do que é estabelecido como doença e saúde, classificando as doenças conforme determinados critérios próprios, fazendo-se importante ressaltar que essa organização acerca dos conceitos não é universal. A partir das classificações de doenças de cada cultura, são estabelecidos diagnósticos e, posteriormente, formas de tratamento, fornecendo teorias etiológicas acerca de cada grupo em específico (Langdon & Wiik, 2010).

Oliveira (2002), citado por Souza e Santos (2015), enfatiza que as doenças são experiências que não devem ser concebidas puramente como uma alteração biológica, mas junto de uma construção cultural, de forma concomitante. Considera-se que a causa de uma enfermidade possa ser um mesmo agente para todo o mundo, mas a forma com que se dará o tratamento e a percepção acerca da doença terão variações conforme a cultura na qual a pessoa está inserida. O autor resgata, ainda, o termo illness, que é compreendido como “a resposta subjetiva dos indivíduos e os membros de sua rede social à situação de doença, uma resposta que engloba aspectos individuais, sociais e culturais à experiência de estar doente” (p. 52). Desta forma, considera-se que há influência dos sentimentos, expressões e tratamento das doenças, a partir da interação com o meio social. Souza e Santos (2015), citam também Menezes (2004), que amplia o entendimento de saúde e doença exposto anteriormente, abrangendo a morte em seus estudos. A autora compreende o processo de morrer como um evento que é construído socialmente, da mesma forma, sendo experienciado de diferentes maneiras por cada

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cultura. Isto se dá conforme o significado atribuído à morte, sendo que estes variam, ainda, de acordo com o momento histórico e contextos socioculturais em que ocorre. A autora relaciona o papel da medicina nas transformações do “lugar” da morte, considerando que com seus progressos técnicos, conseguiu diminuir, de forma significativa, muitas taxas de mortalidade – possibilitando que se prolongue a vida –, ao mesmo tempo em que as medidas preventivas sobre as doenças representam um afastamento da morte na consciência dos indivíduos.

Cada religião e filosofia, desde sempre, buscaram uma explicação sobre a origem e qual o destino do homem. Cada indivíduo, a partir de suas vivências e tradições perpetuadas culturalmente, estabelece uma representação da morte para si, atribuindo características e formas a ela. Existem registros, desde o tempo das cavernas, representando a morte como uma perda e ruptura, mas também, como um fascínio e possibilidade de descanso. Apesar das representações internalizadas em cada indivíduo acerca da finitude da vida, o homem sempre buscou a imortalidade. Através de simbolismos, tenta vencer a morte ao matar monstros, sendo esta uma vitória que não é passível de ser atingida pelo homem enquanto ser mortal, mas apenas por heróis (Kovács, 1992).

Bromberg (2000), citado por Cocentino e Viana (2011), identifica que o mito da imortalidade se apresenta em diversas culturas, através de crenças e realização de ritos, ou simbolicamente, expressando-se pela garantia de perpetuação que o indivíduo encontra em sua descendência e, ainda, por meio de criações. A ideia de manter-se esteticamente jovem pode ser considerada parte dessa crença, tanto que adiar a velhice estabelece um adiamento também de enfrentamento da morte, considerando a associação cultural da velhice à morte. Os autores citam, também, Picabia e Antequera-Jurado (2005), ao argumentar que a morte do idoso é concebida com mais facilidade do que quando ocorre em outros momentos do ciclo vital, apesar da morte não ser compreendida como um fenômeno esperado em um todo.

Segundo Kovács (1992), existem fatores sociais que têm dificultado o processo de elaboração do luto. A sociedade tem censurado a expressão de sentimentos, como a dor de uma perda associada a manifestações de fraqueza. Com isso, os próprios rituais têm sido marcados por uma ocultação do acontecimento da morte, perdendo o seu sentido de conforto aos enlutados. Além da relação entre cultura e morte, como condição da

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existência humana, outro fator que deve ser considerado socialmente são as concepções sobre as diferentes causas de morte. Cada tipo de morte, em específico, causa um impacto diferente em cada cultura e, em consequência, na forma como o luto será vivenciado (Freitas, 2013).

Luto antecipatório e percepções culturais acerca da morte

Ao estudar culturas e povos antigos, compreende-se que o homem sempre teve tendência a repugnar a morte, o que provavelmente continuará acontecendo. Isso porque no inconsciente a própria morte é inconcebível, e, se chegar a ocorrer, apenas poderá ser justificada por uma ação maligna a qual não se tem alcance, e não por qualquer causa natural. A morte é percebida como muito solitária e mecânica, sendo um dos aspectos que repelem os indivíduos de encará-la como processo natural. Há, ainda, a contribuição do avanço das tecnologias para o crescente medo de destruição por todas as criações que vêm sendo feitas e, por consequência, medo da morte. Esse crescente medo da morte, assim como da falta de controle que se tem sobre ela, é percebido sob o ponto de vista psicológico como uma forma do homem se defender, negando a realidade de sua própria morte por determinado tempo. É impossível pensar acerca da própria morte, ao passo em que se acredita em imortalidade (Kübler-Ross, 1998).

O processo de luto se dá pela elaboração de quatro tarefas. No luto antecipatório, o processo de luto inicia cedo, também envolvendo-as. A tarefa I provavelmente é a mais beneficiada pela antecipação da morte, pois diz respeito a aceitar a realidade de que a pessoa morrerá. Mas, é preciso considerar que, geralmente, a tomada de consciência acerca da perda pode alternar-se com negação acerca do acontecimento. A tarefa II é processar a dor do luto, considerando que, com a antecipação da perda, há uma gama de emoções associadas, principalmente a sintomas de ansiedade de separação, variando conforme o tempo de luto antecipatório e a proximidade com o indivíduo. Também, pode alterar conforme a ansiedade existencial, em função da tomada de consciência acerca da própria morte, por parte do enlutado. Estar perante uma pessoa deteriorando emerge a consciência de que este pode ser também o destino de qualquer indivíduo, assim como, ver os pais nesta situação coloca em questão o grau geracional que será o próximo a enfrentar a morte. Na tarefa III, é preciso ajustar-se a um mundo sem a pessoa que morreu. Com o luto antecipatório, o enlutado geralmente é capaz de fazer um “ensaio de papel” para avaliar as situações, refletindo sobre o que fará acerca delas quando a pessoa falecer,

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considerado um importante fator no enfrentamento da perda e do luto. Mas, para a sociedade, isto pode ser encarado como um comportamento inaceitável. Não é permitido que se planeje e fale sobre o que será feito após a morte, pois isso é um ato considerado insensível. A tarefa IV diz respeito à conexão estabelecida com a pessoa morta, após esse início da nova vida sem ela (Worden, 2013).

A elaboração de um luto se dá pelos mais variados fatores, incluindo questões biopsicossociais, mas, também, fatores socioculturais, os quais estão tendo forte impacto nesse processo, geralmente no sentido de dificultá-lo. Cada vez mais as pessoas têm negado a morte em função de um terror que ela propaga, além da falta de rituais que possam auxiliar na elaboração de um luto. O auxílio e escuta individual por parte da equipe de profissionais da saúde são de extrema importância, e também escassos. Permitir a expressão de sentimentos, nessas ocasiões, é fundamental para desenvolver e possibilitar a elaboração do luto. Porém, até mesmo as manifestações acerca da perda sofreram alterações ao longo do tempo, distinguindo-se em cada cultura, a partir de suas características próprias acerca de como a morte deve ser enfrentada, assim como, manejos e rituais necessários por parte dos enlutados (Kovács, 1992).

Raynolds e Botha (2006) citam Blank (1974), ao relacionar que um longo período de luto antecipatório pode concretizar o desfecho completo do luto, fazendo com que o enlutado sinta-se apto a retornar para suas atividades sociais logo após a morte. Com isto, podem surgir questões relacionadas à culpa, pela forma com que tais comportamentos são vistos diante da sociedade, geralmente compreendidos como inadequados para um período recente pós-morte.

Para Bowlby (1998), a aprendizagem por meio de observação permite uma transmissão cultural em relação a situações que devem ser evitadas e consideradas inseguras. Assim, Kovács (1992) apresenta que todas as culturas compreendem a morte de forma diferente, elaborando também formas variadas de combater sua intrusão, por meio de ritos, símbolos e cerimônias. Morin (1970), citado por Kovács (1992), analisa os ritos e crenças que se estabelecem em relação à morte, sendo tais ritos o que há de mais primitivo na sociedade, sempre muito associados às representações de morte.

Os ritos estabelecem um sentido enquanto facilitador da elaboração do luto (Kovács, 1992). Para Freitas (2013), eles são uma forma de restaurar a ordem que foi

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impactada pela morte, com todos sentimentos e estigmas que esta envolve. E, tanto para a antropologia quanto para a psicologia, a morte física não é suficiente para que a morte seja consumada, de fato. A morte se transformou em tabu por meados do século XIX, quando a família passou a esconder a gravidade do estado do doente, na tentativa de poupá-lo. Já no século XX, com os avanços na ciência, busca-se prolongar a vida ao máximo. Ainda que o paciente necessite de hospitalização e aparelhos para continuar vivendo, não é lhe dado, também, o direito à morte. Os ritos ocorrem no sentido de ocultar e neutralizar tudo que remeta à morte. Assim, há implicações, inclusive, na forma com que se compreende e elabora o luto, tendo cunho cada vez mais proibitivo, passa-se a ter uma concepção de experiência patológica. A expressão de sentimentos, cada vez menos, tem obtido lugar na cultura, sendo compreendida como uma perda de controle emocional, que por sua vez, não é apropriada. Essa anulação aos ritos da sociedade pode acarretar em dificuldades para que o enlutado vivencie o luto e, portanto, não consegue estabelecer uma ressignificação da perda e de sua vida.

Ao longo dos séculos, então, a morte e o processo de morrer se alteraram conforme cada cultura e os papéis sociais ocupados pelo ser humano em cada uma delas. Assim, a apropriação da morte é dada de diferentes formas. Os ritos, também, se dão nas mais diversas culturas, conforme o momento histórico e os modelos societários. Os rituais podem não ter o objetivo de privilegiar as pessoas em processo de luto e, por conseguinte, modifica as formas convencionais de enfrentá-lo. Assim, as atitudes frente à elaboração de um luto partem da experiência de cada um, juntamente com suas características de personalidade, não existindo um padrão na forma de elaborar a morte em qualquer idade (Doll, 2011; Doll & Py, 2007; citados por Silva et al., 2012).

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MÉTODO Delineamento

Para a realização deste estudo, optou-se por uma pesquisa bibliográfica qualitativa. Para Godoy (1995), tal forma de pesquisa fornece a possibilidade de estudar fenômenos e suas relações, em diversos ambientes, devendo ser analisado de forma integrada. Para isso, o pesquisador investiga o fenômeno, considerando todos os pontos de vista relevantes, coletando dados já disponíveis para análise da dinâmica do fenômeno a ser estudado.

Esta pesquisa foi desenvolvida a partir de um delineamento do tipo exploratório e interpretativo, visto que foi realizada uma busca por conteúdos que envolvam o processo de luto, privilegiando o luto antecipatório, e as percepções culturais acerca deste. Assim, foi uma pesquisa do tipo exploratório à medida em que proporcionou maior familiaridade com o tema, desenvolvendo uma visão mais ampla acerca deste; e interpretativa, compreendendo e articulando os fenômenos estabelecidos (Gil, 2008).

Fontes

A fim de melhor abordar e articular o tema escolhido para a realização do estudo proposto, foi utilizado um artefato cultural, ilustrando o processo de elaboração de um luto antecipatório, a partir do descobrimento de uma doença em estágio terminal – câncer de cólon. O filme analisado foi “Pronta para amar” (A little bit of heaven), dirigido por Nicole Kassel (2011).

O filme relata a história de Marley Corbett (Kate Hudson), uma mulher independente que vive o auge de sua promissora carreira profissional, muito desinibida e bem humorada, mas que tem extrema dificuldade para se envolver em relacionamentos afetivos. A jovem, ao realizar alguns exames com o médico Julian, em função de dores e desconfortos que vinha sentindo, é diagnosticada com câncer de cólon, causando mudanças extremas em sua vida. Marley se mostra decidida a encarar o diagnóstico, possibilitando a elaboração de um luto antecipatório, tanto para ela lidar com suas perdas durante o avanço da doença, como também para sua rede de apoio. Isso envolve, em determinado momento, a desistência da tentativa de tratamento que vinha realizando, ao perceber o sofrimento que este lhe causava, optando, então, por viver o tempo que lhe restava com qualidade.

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É conhecendo melhor o médico que a diagnosticou, que o filme passa a fazer jus à tradução de seu título, em que ela consegue sentir-se pronta para viver um relacionamento. Além do agora namorado, Marley tem mais três amigos muito próximos e os pais com quem se relaciona ao longo do filme. Os pais são divorciados, e Marley apresenta muito mais ligação com a mãe do que com seu pai. Ao longo do filme, é possível perceber as dificuldades enfrentadas por cada um na preparação para a morte de Marley; enquanto alguns tentam se manter próximos o quanto for possível, como forma de aproveitar o tempo com ela, outros lidam afastando-se.

Instrumentos

As informações analisadas, que dizem respeito a recortes de cenas do filme “Pronta para amar” (2011) e suas respectivas categorias, foram organizadas em uma tabela para melhor ilustrar e consultar tais dados. Para Laville e Dionne (1999), as tabelas têm objetivo de reunir os dados tratados de forma simples, integradas ao longo do texto, relacionando-as com o conteúdo abordado no decorrer deste.

Procedimentos

A partir dos conceitos e informações identificadas em livros e artigos referente aos temas de luto, priorizando o luto antecipatório, e as implicações de aspectos culturais acerca da elaboração deste, foi realizada a construção de uma revisão bibliográfica. Os artigos científicos foram buscados em base de dados como o portal Scielo e acervo de periódicos da Capes; já os livros foram utilizados da Biblioteca Central da UCS, de forma física e/ou virtual. Foram utilizados os seguintes descritores: luto; luto antecipatório; percepções culturais acerca da morte.

Com a escolha pela utilização de um filme como artefato cultural, este foi assistido diversas vezes, a fim de identificar as cenas que melhor estabelecem relação com o luto antecipatório e as percepções acerca da morte. Delimitando assim os critérios de inclusão, tomando como base o tema luto antecipatório, os recortes de cenas do artefato cultural escolhido, foram relacionados aos dados bibliográficos coletados, possibilitando sustentar os aspectos apresentados no filme. Com isto, então, realizou-se uma discussão, buscando responder ao problema de pesquisa.

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Referencial de análise

Para a realização do referencial foi utilizada a análise de conteúdo de Laville e Dionne (1999). Este referencial demanda estudo acerca do conteúdo, de forma precisa, com o objetivo de esclarecer determinadas características e atribuir significados, além de poder comparar e avaliar as ideias apresentadas, selecionando apenas o que for essencial (Laville & Dionne, 1999).

Neste sentido, foram utilizados recortes de cenas do filme “Pronta para amar” (2011), agrupando-os em categorias, com o objetivo de associá-las ao referencial teórico acerca do tema na discussão. O recorte de cenas é fundamental para que o pesquisador possa estabelecer as situações em relação às categorias. As categorias foram definidas a posteriori, utilizando-se do modelo aberto e da estratégia de emparelhamento, que visa associar os dados identificados ao modelo teórico, comparando-os (Laville & Dionne, 1999).

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RESULTADOS

Com base na análise do referencial teórico, obtido por meio de livros e artigos, foram selecionados recortes de cenas do filme “pronta para amar” que, posteriormente, foram agrupados em categorias, possibilitando responder ao problema de pesquisa. Apresenta-se os resultados dessa seleção, que relaciona as vivências de elaboração de um luto, tanto para a pessoa que irá morrer quanto para quem permanece, compreendendo o papel do luto antecipatório nesse processo, podendo facilitar – ou não. Os dados são apresentados através de uma tabela, na qual consta a organização das categorias de análise, possibilitando a interpretação dos mesmos.

Tabela 1

Categorias de Análise dos Recortes de Artigos Categorias | Sub Categorias | Recortes

I - Contexto A- Marley está em um bar, com os amigos comemorando sua apresentação no emprego, causando reconhecimento à ela em seu departamento, como aumento de salário. Neste momento eles bebem, jantam, falam sobre as possibilidades que Marley tem com a nova condição financeira. Uma noite de muitas risadas, revelação de que Renee está grávida novamente, encerrando com uma ligação de Marley para que Doug (um parceiro) fosse até sua casa. Doug passa a demonstrar interesse em progredir com a forma de relação que os dois estavam tendo, ao que Marley recua e acaba rompendo para não dar seguimento nisto.

Trata-se de uma jovem mulher independente, que mora sozinha com seu cachorro, bem-sucedida no trabalho, contando com os amigos Sarah, Renee e Peter para celebrar suas conquistas. Marley não acreditava que o amor ou um relacionamento sério pudessem trazer qualquer benefício para ela, nunca criando vínculos com os parceiros com quem se envolvia.

B- Ao comunicar os amigos acerca de seu diagnóstico de câncer de cólon, em estágio terminal, a cena apresenta a situação em que o médico informa Marley acerca de sua doença. Neste momento, Julian (o médico) sugere que se pense acerca do que pode ser feito a partir do diagnóstico. Marley questiona sobre a possibilidade de apenas remover o tumor, mas, considerando que este já vinha se espalhando

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por todo o cólon, não há chances de realizar tal procedimento. Ao informar sobre suas possibilidades – iniciar um tratamento imediatamente ou a morte –, o médico comunica de uma forma que incomoda Marley, pelo tom de insensibilidade. Assim, ela toma um posicionamento de crítica para com Julian, usando de ironia e grosseria para repreendê-lo acerca da forma com que noticiou um diagnóstico com tamanha gravidade. Marley não consegue falar sobre a morte nesta cena, censurando apenas o uso da “palavra com M”, pelo médico; o que também justifica sua irritação com Julian. II -Manifestações

da elaboração de sua morte

C- Em uma conversa com seu chefe, Marley é informada que tem direito à um seguro em função de sua doença. Nesta cena, então, ao receber o valor desse benefício, Marley leva a mãe e seus amigos para o shopping, não desejando comprar nada novo para si, mas para eles. Inicialmente, entende-se que este é um momento de descontração, onde todos parecem estar aproveitando e se divertindo com Marley, que também demonstra estabelecer ali um instante de qualidade de vida para si, fazendo algo pelas pessoas que gosta.

Apesar disso, Renee (amiga) acaba não se sentindo confortável diante da situação, tendo dificuldades de lidar com a doença de Marley e a maneira com que esta tem vivenciado o momento, retirando-se da loja. Ainda, a mãe de Marley tenta convencê-la a fazer compras para si também, comentando que todas suas roupas têm ficado largas e que Marley poderia vir a se sentir melhor com coisas novas, ao que ela reage de forma muito grosseira e agressiva em sua fala, verbalizando que a mãe não consegue enfrentar a realidade de sua doença e o fato de não estar ocorrendo progressos. Assim, apesar das tentativas de mostrar-se forte diante da situação, facilmente Marley se desestabiliza, manifestando reações negativas.

D- Marley reage de forma verbalmente agressiva com diferentes pessoas de seu círculo de vínculos, sugerindo desejo de afastá-las de alguma forma, isolando-se como possível estratégia para amenizar o sofrimento das pessoas próximas e, também, uma fuga momentânea da realidade vivenciada. No primeiro momento, Marley está em um zoológico com a filha de Renee (amiga), após sair de casa

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e deixar Julian dormindo, sem avisá-lo. Confuso com a situação, Julian procura Marley, que reage com certa repulsa, questionando-o acerca do tipo de pessoa que se apaixona por alguém que está morrendo. Faz isso repetidas vezes pedindo que ele a deixe em paz. Conforme Julian tenta se aproximar e, até, desculpar-se por incentivar tanto que Marley externalize seus sentimentos, parece fazer a raiva de Marley aumentar. Assim, ela o deixa ali e leva Cammie para casa.

Ao chegar na casa de Renee, percebe que há outras mulheres lá, conversando e rindo. Neste momento, passa a falar de forma irônica com a amiga, reforçando não ter uma doença contagiosa, para deixar de ser convidada, atribuindo o sofrimento de Renee com a aproximação de sua morte, por preocupar-se em não ter outra babá; esta não tenta argumentar, apenas concordando de forma sarcástica, e Marley se retira. Ao chegar no prédio em que mora, se depara com Peter (vizinho/amigo) conversando com um amigo. Peter, na tentativa de iniciar uma conversa, questionando acerca do passeio no zoológico e apresentando seu amigo, Matt, é surpreendido pela fala provocatória e ofensiva de Marley, reforçando para estes que está morrendo e, por isso, Matt poderia ficar com o seu apartamento para que os dois fossem vizinhos e amantes. Marley aparece de pijamas, andando de bicicleta enquanto bebe uma garrafa do que aparenta ser whisky, embriagada. Anda de forma desgovernada no meio da rua, enquanto carros tentam trafegar, buzinando para ela, que responde de forma agressiva e com palavrões. Todos esses comportamentos apresentados sugerem o desejo pelo afastamento das pessoas com quem estabelece algum vínculo, como uma forma de fugir da realidade da doença e do abandono para com estas pessoas.

III -Processo de aceitação

E- Marley e Julian estão em um passeio, após uma festa de médicos e pacientes, em que Julian convida Marley para acompanhá-lo. Neste momento, Marley questiona Julian acerca de suas crenças, ao que ele coloca sua opinião profissional em comparação com a pessoal e, em seguida, retorna a pergunta para ela. Marley verbaliza invejar quem estabelece uma crença, entendendo como uma ótima forma de viver sem tantos medos. A partir desse diálogo, Julian passa a incentivar que ela fale de seus medos, conseguindo externalizar preocupações acerca do momento que

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vivencia, além de falar – mesmo que indiretamente – sobre sua morte e aqueles que ficam quando isso acontecer, quando é questionada pelo médico sobre seus três maiores medos. Marley fala sobre sua mãe, seu cachorro, os cuidados para com eles e, por último, expressa sua vontade por beijá-lo. Marley, no momento anterior ao diagnóstico, evitava constantemente qualquer envolvimento afetivo com os parceiros. Mas, ao final desta cena, Marley e Julian se beijam, e passam a viver um romance.

F- Um dos sonhos de Marley era voar e, em um concurso que ocorria em uma rádio, sorteando um voo de asa delta, participou e venceu. Assim, estas cenas ocorrem após o momento em que ela e Julian voam, sendo um instante em que se percebe a prioridade de Marley por qualidade de vida, visto que já havia abandonado o tratamento que estava sendo testado, pela falta de progressos no quadro. Aqui, então, foram agrupadas duas cenas em que Marley manifesta preocupações acerca do bem estar, assim como planejamentos de pessoas próximas para após a sua morte, auxiliando, também, que estes possam pensar sobre. Marley e Julian estão em um parque, lanchando após o vôo. Nesta situação, Marley, que costumava ser fechada em relação aos seus sentimentos e conversas com mais seriedade, instiga que Julian pense/fale acerca do que fará quando ela partir, como uma forma de saber que ele ficará bem; mas, também, entende-se como uma forma de Marley tranquilizar à si mesma frente a aproximação de sua morte. No recorte seguinte, Marley está em seus últimos momentos de vida, ao ar livre com Sarah. Ela questiona sobre como a amiga está se sentindo, após perceber que não havia se preocupado com os sentimentos experienciados pelas outras pessoas desde que adoeceu, incentivando que Sarah pudesse falar sobre, ao que ela remete não estar bem e questionando o porquê de Marley não desejar não morrer.

G- Marley, ao andar de bicicleta bêbada, acaba sofrendo um acidente em que bate em um carro, ficando inconsciente por alguns instantes. Após ir para o céu achando estar morta, acorda disposta a retomar seus vínculos e viver o amor que sente por Julian. No instante após acordar da colisão com o carro, Marley vai imediatamente ao hospital procurar por Julian, falando

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sobre seus medos e traumas causados pela relação dos pais, que a impediu de confiar que alguém pudesse a amar, mas sentindo-se preparada para isso no momento, com ele. Ao sair do hospital, com a mãe, Marley relembra com ela momentos de sua infância, pontuando ter sido uma filha difícil, ao que a mãe atribui como sendo o papel dos filhos. Elas mantém uma conversa agradável, reaproximando-se também. Marley aproveita do momento para pedir a ajuda da mãe em seu funeral, manifestando seu desejo de participar da organização; verbaliza querer uma celebração. Ao ir para casa, Marley procura Peter, demonstra descontentamento em relação a alguns de seus comportamentos, mas também que irá sentir imensas saudades. Eles dançam, neste momento, como forma de selar essa reconciliação, divertindo-se.

O pai liga para Marley, na tentativa de poder encontrá-la para um jantar, sendo incentivada por Julian a dar uma chance de aproximação para o pai. Aceitando o convite, Marley e o pai não conseguem manter uma conversa ao longo do jantar, considerando que este é muito fechado para falar sobre o que está acontecendo, o adoecimento de Marley e a aproximação de sua morte. Incomodada, ela se retira do restaurante. O pai vai atrás dela, pedindo que diga o que ele deve fazer diante da situação, conseguindo neste momento verbalizar que a ama e sente-se impotente diante da doença da filha, não estando ao seu alcance contorná-la. Diante disso, Marley e seu pai conseguem reforçar o vínculo existente, que era tão distante entre os dois. Marley também vai até a casa de Renee para desculpar-se pelo seu comportamento. Renee, como já mencionado ao longo dos recortes, estabelecia muita dificuldade de lidar com a situação de adoecimento de Marley, visto que está grávida no mesmo momento. Marley fala sobre concordar não ser justo que Renee deva se sentir tão feliz e tão triste ao mesmo tempo. A amiga sequer consegue abrir a porta para Marley, o que não a impede de pedir desculpas e demonstrar compreensão para com ela e o momento que vivencia. Por último, neste recorte, junto com Julian, Marley vivencia seu sonho de voar.

IV - Percepções das pessoas com quem Marley convive

Mãe H- A mãe de Marley passa a estabelecer um comportamento muito protetor após a notícia do diagnóstico da filha. A partir disso, acaba deixando de escutar Marley e compreender suas vontades, invadindo

Referências

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