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Doença do trato urinário inferior felino: um estudo retrospetivo

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Academic year: 2021

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I

Doença do Trato Urinário Inferior Felino:

Um estudo retrospetivo

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Paula Alexandra Queiraz Esteves

Orientador: Professora Doutora Felisbina Luísa Pereira Guedes Queiroga

Coorientador: Doutor Paulo Artur Azevedo Teixeira Pimenta

Composição do Júri:

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Vila Real, 2016

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II

Agradecimentos

À Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, na figura do seu excelentíssimo reitor, professor António Fontainhas Fernandes, o meu mais sincero agradecimento.

À professora doutora Felisbina Queiroga por toda a orientação e apoio prestado na realização desta dissertação de mestrado.

Um agradecimento a toda a equipa do Hospital Veterinário de Trás-os-Montes por tão bem me terem recebido nas suas instalações e por todos os ensinamentos, simpatia e amizade.

Um agradecimento especial à minha família pelo amor, amizade e apoio incondicional. Mãe, pai e Carolina, sem vocês isto não seria possível.

Ao André Cordeiro por toda a paciência e apoio ao longo destes anos. Obrigada! Ao André Gomes pelas fantásticas visitas a Vila Real e pelas noites de música e animação.

À Joana Anselmo pela extraordinária paciência para comigo e por toda a amizade e apoio.

Às minhas colegas de estágio pela partilha de conhecimentos, risadas e brincadeiras. Em especial à Sara pelas noites de convívio.

Às minhas companheiras de curso com quem vivi momentos inesquecíveis. Ana Dias (Vi), Ana Rita Alves e Ana Rita Gaspar obrigada por toda a partilha de conhecimentos e pela amizade e carinho.

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III

Resumo

A Doença do Trato Urinário Inferior Felino (DTUIF) engloba um conjunto de doenças que afeta o trato urinário inferior dos gatos. Esta doença está associada a uma diversidade de entidades nosológicas, fatores de risco, sinais clínicos e tratamentos. Os objetivos desta dissertação visam compreender a influência de vários fatores no desencadear da doença, descrever o leque de sinais clínicos apresentados pelos animais e definir e acompanhar os meios de diagnóstico, os seus resultados e o tratamento e prevenção realizados durante o período de estágio.

Durante o estágio foram acompanhados 31 animais com sinais de DTUIF que compareceram à consulta no Hospital Veterinário de Trás-os-Montes no período de 31 de agosto de 2015 a 24 de março de 2016. Destes, existe uma predominância de animais do sexo masculino, sem raça definida, sedentários, que habitam exclusivamente no interior e são alimentados com ração seca. A média de idades foi de 6,3 anos e a de peso de 4,3 kg. A maioria dos gatos convivia com outros animais e apenas interagia com os seus proprietários à noite ou fins de semana. É ainda de referir que alguns deles foram sujeitos a situações de stresse anteriores ao episódio de DTUIF. A hematúria, disúria e polaquiúria foram os sinais clínicos mais frequentes, assim como a periúria e o aumento do tempo de permanência na caixa de areia. Dos animais em estudo, 10 manifestavam recidivas e 12 apresentaram-se à consulta obstruídos e com sinais de obstrução como prostração, anorexia e vómitos. Na análise de urina, as alterações mais observadas foram a presença de proteinúria, hematúria e uma densidade urinária igual ou superior a 1050. No exame do sedimento urinário grande parte dos animais apresentou piúria, hematúria e cristalúria de estruvite. O diagnóstico definitivo não foi conseguido em 29% dos casos, sendo a cistite idiopática felina o diagnóstico mais comum (42%), seguida de urolitíase (19%), infeção do trato urinário (6%) e alterações comportamentais (3%). A maioria dos animais foi tratada com antibiótico e anti-inflamatório não esteroide e a todos foi aconselhado o tratamento dietético. O internamento foi necessário em 14 casos e, destes, 12 foram algaliados. O tratamento cirúrgico foi efetuado apenas uma vez. A doença evoluiu favoravelmente na maioria dos animais, porém, 23% apresentaram recidivas. Estes resultados estão de acordo com os diversos estudos publicados acerca da DTUIF e esta é um diagnóstico diferencial importante a ter em conta na presença dos sinais clínicos supracitados.

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IV

Abstract

The Feline Lower Urinary Tract Disease (FLUTD) covers a group of diseases which affect the feline lower urinary tract. This disease is associated to a diversity of nosological entities, risk factors, clinical signs and treatments. The purpose of this essay is to understand the influence of several factors in the appearing of the disease, describe the range of the clinical signs observed in the animals, and define as well as go along with the diagnosis methods, the results and the treatments and prevention carried out during the internship.

This study concerns 31 animals that were observed with FLUTD signs during the consultations in the veterinary hospital “Hospital Veterinário de Trás-os-Montes” from August 31st 2015 to March 24th 2016. Among these animals, most were male with no defined breed, they were sedentary and living exclusively indoors, as well as fed with dry nutrition. Their average age was 6.3 years and their average weight was 4.3 kg. Most of the cats lived together with other animals and interacted with their owners only at night at the weekend. Besides, some had had situations of stress, prior to the FLUTD episode. The haematuria, dysuria and pollakiuria were the most frequent clinical signs, as well as the periruria and the increase in the time which was spent in the litter box. Among the animals in study, 10 were with recurrences, and 12 came to consultation obstructed and with obstruction signs such as prostration, anorexia and vomits. In the urine exam, the most frequent alterations observed were the presence of proteinuria, haematuria and a urine specific gravity equal or superior of 1050. In the sediment exam most of the animals have pyuria, haematuria and crystalluria of struvite. The complete diagnosis was not achieved in 29% of the cases, making the feline idiopathic cystitis the most frequently found (42%), followed by urolithiasis (19%), urinary tract infection (6%) and behavioral disorders (3%). Most of the animals were treated with antibiotic and nonsteroidal anti-inflammatory and a diet treatment was advised to all. Hospitalization was necessary in 14 cases, of which 12 had to use a urinary catheter. Surgery occurred only once. The disease evolved satisfactorily in most animals, nonetheless 23% with recurrences. These results conform to the several studies on FLUTD so far published, and this is a differential diagnosis that ought to be taken into consideration when the clinical signs previously mentioned are observed.

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V

Índice geral

Resumo ... III Abstract ... IV Índice de figuras ... VII Índice de gráficos ... VII Índice de tabelas ... VIII Lista de abreviaturas, siglas e símbolos ... IX

I - Revisão Bibliográfica ... 1

I.I. Abordagem geral à Doença do Trato Urinário Inferior Felino (DTUIF) ... 1

1. Introdução ... 1 2. Etiopatogenia ... 1 3. Fatores de risco ... 2 4. Diagnóstico ... 4 4.1. Anamnese ... 4 4.2. Exame físico ... 5 4.3. Sinais clínicos ... 5 4.4. Exames complementares ... 6

I.II. Entidades nosológicas integradas na DTUIF ... 13

1. Cistite Idiopática Felina ... 13

2. Urolitíase ... 14

3. Tampões uretrais ... 16

4. Infeção do Trato Urinário ... 17

5. Outras ... 19

I.III. Abordagem terapêutica à DTUIF ... 21

1. Tratamento da obstrução urinária ... 21

2. Tratamento da Cistite Idiopática Felina ... 24

3. Tratamento da urolitíase ... 29

4. Tratamento da ITU ... 33

5. Tratamento cirúrgico ... 34

I.IV. Prognóstico da DTUIF ... 36

II - Objetivos ... 37

III - Materiais e métodos ... 38

(6)

VI

V – Discussão ... 56 VI – Conclusões ... 66 VII - Referências bibliográficas ... 67

(7)

VII

Índice de figuras

Figura 1 – Refratómetro, gentilmente cedida pelo HVTM.. ... 39

Figura 2 - Tiras reativas, gentilmente cedida pelo HVTM . ... 40

Figura 3 – Aparelho de hemograma (esquerda) e bioquímica (direita), gentilmente cedida pelo HVTM. ... 41

Figura 4 - Presença de hematúria após algaliação, gentilmente cedida pelo HVTM ... 48

Figura 5 - Imagem ecográfica que evidencia a presença de urolitíase, gentilmente cedida pelo HVTM ... 52

Figura 6 - Exemplo de um animal internado sujeito a fluidoterapia e algaliação, gentilmente cedida pelo HVTM ... 54

Figura 7 - Exemplo de um animal algaliado, gentilmente cedida pelo HVTM ... 54

Índice de gráficos

Gráfico 1 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao sexo………42

Gráfico 2 – Distribuição dos animais em estudo quanto à raça………...42

Gráfico 3 – Distribuição dos animais em estudo quanto à idade……….43

Gráfico 4 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao peso………43

Gráfico 5 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao estado reprodutivo………..44

Gráfico 6 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao estilo de vida………..44

Gráfico 7 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao comportamento………..45

Gráfico 8 – Análise estatística relativa à atenção dada pelos proprietários aos animais em estudo ……..………...45

Gráfico 9 – Distribuição dos animais em estudo quanto à alimentação………..46

Gráfico 10 – Análise estatística relativa à frequência de limpeza da caixa de areia utilizada pelos animais em estudo……….46

Gráfico 11- Distribuição dos animais em estudo quanto à presença de obstrução………..48

Gráfico 12 – Análise estatística relativa aos sinais clínicos encontrados nos animais em estudo ………...49

Gráfico 13 - Análise estatística relativa à presença de leucócitos na análise do sedimento urinário………...50

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VIII

Gráfico 14 - Análise estatística relativa à presença de eritrócitos na análise do sedimento urinário………...51 Gráfico 15 – Análise estatística relativa à composição dos cristais………51 Gráfico 16 - Análise estatística relativa ao diagnóstico da DTUIF nos animais em estudo……52 Gráfico 17 – Análise estatística relativa ao tratamento aplicado nos animais em estudo………53 Gráfico 18 – Análise estatística relativa ao tempo de internamento nos animais internados…..54

Índice de tabelas

Tabela 1 - Diagnósticos em gatos com sinais clínicos de DTUIF, adaptada de Dorsch et al., 2014……….. 12 Tabela 2 – Lista de parâmetros incluídos no estudo………...………38 Tabela 3 – Análise estatística referente ao convívio com outros animais dos gatos em estudo………47 Tabela 4 – Análise estatística referente às situações de stresse a que os animais em estudo foram sujeitos……….. 47 Tabela 5 – Análise estatística relativa à análise de urina. Frequência absoluta (n) e relativa (%) da densidade, pH e presença de proteínas e sangue na urina dos animais em estudo………50

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IX

Lista de abreviaturas, siglas e símbolos

%, Por cento ®, Marca registada

CIF, Cistite Idiopática Felina

DTUIF, Doença do Trato Urinário Inferior Felino HVTM, Hospital Veterinário de Trás-os-Montes ITU, Infeção do trato urinário

Kg, Quilograma LR, Lactato de Ringer NaCl, Cloreto de sódio

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I - Revisão Bibliográfica

I.I. Abordagem geral à Doença do Trato Urinário Inferior Felino

(DTUIF)

1. Introdução

A Doença do Trato Urinário Inferior Felino (DTUIF), anteriormente denominada de Síndrome Urológico Felino, designa um conjunto de doenças que afetam o trato urinário inferior dos gatos. Buffington (2011) apelida a DTUIF de “Pandora Syndrome”, porque as suas causas e consequências são multifatoriais e a doença é extremamente frustrante para o clínico, proprietário e animal. Os sinais clínicos apresentados não são específicos de uma doença em particular, sendo que os mais comuns são a hematúria, polaquiúria, disúria, estrangúria e periúria (Chew e Buffington, 2016). Segundo DiBartola e Westropp (2014e), em aproximadamente dois terços dos gatos jovens e de meia-idade que apresentam estes sinais clínicos não se consegue chegar a um diagnóstico definitivo, por isso denomina-se de Cistite Idiopática Felina (CIF) ou Doença Idiopática do Trato Urinário Inferior Felino.

O diagnóstico mais comum contido na DTUIF é a CIF. No entanto, muitas outras doenças são também responsáveis por este tipo de quadro clínico, como por exemplo urolitíase, infeção do trato urinário (ITU), malformações anatómicas, neoplasias, alterações comportamentais e problemas neurológicos (Gerber, 2008; Dorsch et al., 2014). A semelhança de sinais clínicos encontrados deve-se à resposta limitada e previsível do trato urinário inferior perante uma agressão (Osborne et al., 2014).

Deste modo, a DTUIF é um grande desafio para o médico veterinário, sendo que a existência de uma boa relação entre o clínico e o proprietário do animal é de extrema importância para garantir o sucesso diagnóstico e terapêutico (Dowers, 2012).

2. Etiopatogenia

A incidência de uma doença é definida como a taxa de aparecimento de novos casos de doença na população em risco de a contrair (Osborne et al., 2014). A DTUIF é muito comum em gatos, mas a sua incidência é desconhecida. Em 1985 era estimada uma taxa de incidência de 0,85% a 1% por ano nos Estados Unidos e Reino Unido. No entanto, estes valores não refletem a situação atual devido à sua antiguidade e ao facto de se basearem apenas nos sinais

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clínicos apresentados pelos animais (Bartges e Kirk, 2006). Hostutler et al. (2005) referem que a incidência global mais recentemente estimada nos Estados Unidos e Reino Unido é de aproximadamente 1,5%.

Segundo Burns (2014) a DTUIF é responsável por 7% a 8% da entrada de gatos nos hospitais veterinários. O aparecimento desta doença é mais comum em gatos entre os 2 e os 6 anos de idade, sendo que é raro em animais com idade inferior a 1 ano ou superior a 10 anos. Cerca de 50% dos animais apresentam recidivas (Hostutler et al., 2005).

A CIF é o diagnóstico mais comum, representando aproximadamente 65% dos casos de DTUIF (Kruger et al., 2014). Seguem-se a presença de cálculos urinários, os tampões uretrais, a ITU, os defeitos anatómicos, as alterações comportamentais e as neoplasias (Westropp, 2007b; Appleton, 2012). Gerber et al. (2005) realizaram um estudo europeu com 77 gatos. As conclusões não foram muito diferentes das já descritas, no entanto verificaram-se algumas variações. Nesse estudo, a CIF ocorreu em 57% dos casos, a presença de cálculos urinários em 22%, os tampões uretrais em 10%, a ITU em 8% e 3% não obtiveram um diagnóstico. Em 2014, na Alemanha, Dorsch et al. realizaram um estudo com 302 gatos onde verificaram que 55% dos casos de DTUIF se deviam a CIF, 19% a ITU, 10% a tampões uretrais e 7% a urolitíase. Sævik

et al. (2011) realizaram um estudo na Noruega com resultados semelhantes.

Apesar de os diferentes estudos apresentaram ligeiras variações nas percentagens de ocorrência dos diversos diagnósticos possíveis, pode aferir-se quais são realmente os mais comuns e esses serão abordados ao longo desta dissertação.

3. Fatores de risco

A DTUIF é uma doença multifatorial e são muitos os fatores de risco descritos. Estes podem ser divididos em fatores ambientais, nutricionais e intrínsecos ao animal (Forrester, 2007b).

A idade, sexo, raça, estado reprodutivo e condição corporal são fatores intrínsecos ao animal que estão relacionados com o aparecimento de DTUIF (Pusoonthornthum et al., 2007; Appleton, 2012). Como referido anteriormente, animais com idades compreendidas entre os 2 e 6 anos têm maior probabilidade de desenvolver a doença. Os gatos com idades entre os 4 e 10 anos apresentam maior risco de aparecimento de urolitíase, obstrução uretral e CIF. Já a partir dos 10 anos estão mais sujeitos a ITU e neoplasias (Hostutler et al., 2005; Burns, 2014). Em relação ao sexo, os machos são os mais afetados, assim como animais castrados, sedentários e com excesso de peso (Cameron et al., 2004; Defauw et al., 2011; Lund et al., 2015). A

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obstrução uretral ocorre maioritariamente em machos devido à conformação da sua uretra (Lund et al., 2015). Forrester (2007b) refere ainda que os cálculos de estruvite estão associados a animais mais novos e os de oxalato de cálcio aparecem em animais significativamente mais velhos. Segundo Westropp (2013) e Forrester (2007), há um maior risco de aparecimento de cálculos de estruvite em raças específicas como Persa, Himalaia, Azul Russo, Chartreux, Oriental de pelo curto e Ragdoll. Já raças como Birmanês, Britânico de pelo curto, Exótico de pelo curto, Oriental de pelo curto, Havana, Himalaia, Persa, Ragdoll e Scottish Fold são mais suscetíveis à formação de cálculos de oxalato de cálcio. Por outro lado, raças como Siamês, Birmanês e Mau Egípcio estão mais sujeitas à ocorrência de cálculos de urato de amónio.

Os fatores ambientais são de extrema importância, pois os gatos são muito sensíveis a variações no seu habitat. A introdução de novos animais em casa, o convívio com outros gatos, qualquer alteração na caixa de areia e animais confinados ao interior da casa são importantes fatores de risco para o aparecimento de DTUIF (Buffington et al., 2006b; Defauw et al., 2011; Horwitz, 2014). Num estudo que envolveu 13 gatos com DTUIF e 12 gatos saudáveis, Westropp et al. (2006) concluíram que a permeabilidade da bexiga em gatos com DTUIF é mais elevada nos períodos de stresse. Por isso mesmo este pode ser um fator determinante na génese da doença, sendo fulcral o maneio ambiental da mesma.

A alimentação seca, com baixo teor de humidade, e a diminuição da ingestão de água são descritos como fatores de risco nutricionais para o aparecimento de DTUIF (Forrester, 2007b; Gerber, 2008). Quando comparados com a alimentação seca, os alimentos húmidos são associados a um menor número de recidivas da doença. Contudo, não se pode fazer uma associação direta entre a DTUIF e a alimentação seca, já que cerca de 90% dos proprietários alimentam os seus animais com alimento seco ou com uma combinação de alimento seco e húmido e a incidência descrita de DTUIF é inferior a 1,5% (Forrester, 2007b). Forrester (2007) descreve que a alcalinização da ração, a presença de um teor moderado de proteína, baixo teor de gordura e alto teor de fibras, cálcio, fósforo, magnésio e cloreto são considerados fatores de risco para o aparecimento de cálculos de estruvite. Concomitantemente, salienta ainda que animais que vivem exclusivamente no interior de casa e os que são alimentados com rações ácidas ou com acidificantes urinários, de baixo teor de potássio, sódio, proteína e humidade, teor moderado de gordura e hidratos de carbono possuem maior risco para o desenvolvimento de cálculos urinários de oxalato de cálcio.

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4. Diagnóstico

Todas as doenças associadas à DTUIF originam apresentações clínicas semelhantes. O diagnóstico deve ser feito de forma rigorosa, metódica e cuidadosa, pelo que deve incluir uma anamnese completa, um exame físico pormenorizado, uma boa interpretação dos sinais clínicos e o recurso a exames complementares apropriados.

4.1. Anamnese

A anamnese deve ser o mais completa possível. Deste modo, é imprescindível que sejam recolhidos todos os dados referentes ao animal, nomeadamente o nome, idade, raça, sexo, estado reprodutivo e peso para se proceder à correta identificação do animal (Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014c).

De seguida devem ser colocadas todas as perguntas que possam contribuir para um diagnóstico mais preciso e correto. O proprietário deve ser questionado sobre a principal razão pela qual trouxe o seu animal ao veterinário e todas as alterações que possa ter observado no seu comportamento. Adicionalmente, é de extrema importância determinar a duração do problema, se já existiram recorrências e quais os tratamentos anteriormente aplicados. Todos os pormenores são importantes, por isso, nesta fase, a atenção deve ser centrada no proprietário (Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014c).

Ao mesmo tempo devem ser recolhidas todas as informações sobre o ambiente onde o animal habita, tais como a presença de outros animais, o número e tipo de caixas de areia, se o animal tem acesso ao exterior, se pode ter ingerido tóxicos ou se houve alguma situação de stresse que possa ter despoletado o problema (Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014c).

A alimentação também é um dado significativo, sendo necessário saber qual a ração dada ao animal e se houve, recentemente, alguma alteração. O proprietário deve ainda ser questionado sobre o número de vezes que alimenta o seu animal, bem como a quantidade de alimento que lhe oferece por dia (Westropp et al., 2005; Senior, 2006; DiBartola e Westropp, 2014c).

No caso da DTUIF, é fulcral saber se ocorreram mudanças na ingestão de água, no volume e frequência da micção e nas características da urina. Deste modo, é fundamental questionar sobre a presença de hematúria, disúria, polaquiúria, periúria ou se o seu animal deixou de ir ou passa mais tempo na caixa de areia. Para um questionário mais completo,

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se imprescindível aferir sobre a presença de vocalizações excessivas ou alterações no comportamento normal do animal (Westropp et al., 2005; Senior, 2006; DiBartola e Westropp, 2014c).

4.2. Exame físico

Após a anamnese, é obrigatório realizar um exame físico completo de modo a recolher o máximo de informação possível sobre o estado do animal. Este exame deve ser iniciado pelo registo da temperatura corporal do animal para que este valor não seja influenciado pelo stresse associado à manipulação. De seguida, é indispensável examinar as mucosas, a cavidade oral, os olhos e os ouvidos e fazer uma correta palpação do animal para detetar qualquer alteração a nível dos gânglios, rins ou bexiga. O exame retal, vaginal, a avaliação do pénis e a palpação dos testículos também não devem ser esquecidos (Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014c).

A bexiga deve ser avaliada quanto ao grau de distensão, dor, espessura da parede e presença de massas intramurais, como neoplasias, ou intraluminais como cálculos ou coágulos. A sua palpação deve ser realizada antes e depois do esvaziamento, pois uma bexiga cheia pode ocultar a presença de massas ou cálculos urinários (Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014c).

A apresentação da DTUIF pode ser obstrutiva ou não obstrutiva. No exame físico, um gato não obstruído aparenta estar saudável, e a sua bexiga encontra-se pequena e fácil de esvaziar por compressão manual. Dependendo dos casos, a parede da bexiga pode estar espessada e pode, ou não, ser dolorosa à palpação. Pelo contrário, animais obstruídos apresentam dor à palpação abdominal e uma bexiga cheia, distendida, cujo esvaziamento por compressão manual é difícil ou impossível. Neste caso, a palpação deve ser cuidadosa, já que a pressão intravesical pode levar à rotura da bexiga. (Westropp et al., 2005; Kahn e Line, 2010; DiBartola e Westropp, 2014c).

4.3. Sinais clínicos

Os sinais clínicos de DTUIF são variadíssimos e dependem da condição clínica, isto é, se a mesma é, ou não, obstrutiva. Os sinais mais frequentes são a hematúria, poliúria, oligúria, periúria, polaquiúria, disúria e anúria (Bell e Lulich, 2015; Chew e Buffington, 2016). Na consulta, quando o animal se encontra obstruído manifesta-se ansioso e com dor à palpação

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abdominal. Outros sinais de obstrução passam por esforço e incapacidade para urinar, micção em locais inapropriados, vocalização durante a micção, lamber a genitália externa e um pénis congestionado e fora do prepúcio. Se o animal não for tratado atempadamente podem surgir sinais de azotemia pós-renal, tais como anorexia, prostração, desidratação, fraqueza, vómitos, hipotermia ou, em casos mais graves, colapso, acidose ou bradicardia. Quando não tratada, esta condição pode levar à morte do animal. A DTUIF pode originar problemas renais como a doença renal crónica ou insuficiência renal secundária a pielonefrite ascendente. Já na presença de outras doenças concomitantes podem aparecer outros sinais clínicos associados (Westropp

et al., 2005; Mathews, 2007; Drobatz, 2009; DiBartola e Westropp, 2014c; O’Brien, 2014).

4.4. Exames complementares

Os exames complementares são essenciais para chegar a um correto diagnóstico. O ideal é começar por uma avaliação hematológica do animal, com a realização de um hemograma e de um perfil bioquímico completo para detetar qualquer alteração. A análise da urina é fundamental nestes casos, bem como a sua cultura. Exames imagiológicos como a radiografia, a ecografia, a uretroscopia e a cistoscopia também podem ser realizados. Pode ainda ser necessário recorrer à análise dos cristais ou cálculos urinários presentes (Senior, 2006; Moore, 2007; Dorsch et al., 2014). No entanto, o clínico está, muitas vezes, limitado pelas condições financeiras do proprietário do animal, pelo que apenas os exames mais importantes, como a análise de urina e a radiografia abdominal, são realizados.

Se não é possível recolher urina estéril devido ao tamanho reduzido da bexiga ou ao comportamento do animal, o diagnóstico é feito através das informações relatadas na anamnese, do exame físico e sinais clínicos apresentados pelo animal e da resposta ao tratamento (Labato, 2009).

4.4.1. Hematologia e bioquímica sérica

A hematologia e bioquímica são a base de qualquer diagnóstico. Idealmente, todos os animais deveriam fazer análises de rotina para descartar a presença de doenças. O hemograma é importante para avaliar o estado geral do animal. A nível bioquímico, devem ser analisados diversos parâmetros como a glicose, ureia, creatinina, proteínas totais, cálcio, fósforo, albumina, bilirrubina, colesterol, triglicéridos, fosfatase alcalina (FA), alanina aminotransferase (ALT) e aspartato aminotransferase (AST) (DiBartola e Westropp, 2014d).

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A maioria dos animais com DTUIF não apresenta alterações a nível hematológico ou bioquímico, a não ser que esteja presente outra doença concomitante ou que o animal se encontre obstruído. Lee e Drobatz (2003) realizaram um estudo com 223 gatos obstruídos no qual a maioria apresentava alterações analíticas ligeiras. No entanto, 12% contavam já com múltiplos distúrbios metabólicos, com perigo para a vida do animal. Por sua vez, Beer e Drobatz (2016) realizaram um estudo com o objetivo de caracterizar os parâmetros clínicos em gatos com anemia severa associada à obstrução urinária. Esse estudo envolveu 17 gatos com obstrução e anemia grave e 30 com obstrução e sem anemia ou com anemia ligeira. Os autores concluíram que a existência de obstruções urinárias prévias e uma maior duração dos sinais clínicos são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de anemia severa em gatos obstruídos. Além disso, os animais que apresentavam anemia foram mais gravemente afetados, apresentando menor pressão arterial, acidose metabólica mais acentuada e valores mais elevados de ureia e creatinina. Bartges et al. (2004) referem que a hipercalcemia pode ser encontrada em cerca de 35% dos gatos com urolitíase de oxalato de cálcio.

O aumento da ureia e creatinina consequente à DTUIF, azotemia pós-renal, só é detetado quando se perde 75% da função renal, o que implica um prognóstico mais grave já que o fluxo urinário de ambos os rins está comprometido (Drobatz, 2009; Ford e Mazzaferro, 2012; Drobatz e Saxon, 2012).

4.4.2. Análise e cultura de urina

A colheita de urina deve ser feita antes de qualquer tratamento e pode ser realizada durante a micção, por algaliação ou por cistocentese. A cistocentese é o método de recolha preferencial porque previne a contaminação da amostra pelas bactérias presentes na uretra distal ou trato genital. Além disso, é bastante bem tolerada pelos animais e é de fácil execução, a não ser que a bexiga se encontre vazia. Nos animais com hematúria pode ser útil analisar também urina recolhida durante a micção espontânea, visto que a cistocentese pode acrescentar eritrócitos à amostra devido ao trauma envolvido na recolha (Gerber, 2008; DiBartola e Westropp, 2014d).

A amostra de urina deve ser analisada nos 15 a 30 minutos após a colheita. Se não for possível, deve ser refrigerada para evitar a contaminação bacteriana e autólise. É necessário ter em atenção que a refrigeração pode levar à formação de cristais, originando falsos positivos. Antes de realizar a análise, a urina refrigerada deve ser aquecida à temperatura ambiente (Bartges e Kirk, 2009; Burns, 2014; Bell e Lulich, 2015). A análise de urina é dividida em 3

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partes: a avaliação das propriedades físicas, das propriedades químicas e do sedimento (Forrester, 2004; DiBartola e Westropp, 2014d).

Das propriedades físicas da urina fazem parte a aparência e a densidade específica. A urina normal é amarelada, límpida e com odor amoniacal. O exame visual da urina pode fornecer indicações importantes como a presença de sangue ou alterações na sua concentração. A densidade específica deve ser medida por refratometria, pois este é o método mais fiável. Este parâmetro é influenciado pela alimentação do animal. Animais que comem ração seca apresentam densidades mais elevadas quando comparados com animais alimentados com rações húmidas. (Forrester, 2004; DiBartola e Westropp, 2014d).

Já as propriedades químicas são avaliadas através de tiras reativas. Destas fazem parte o pH, proteínas, glicose, corpos cetónicos, bilirrubina, urobilinogénio e hemoglobina. A presença de alterações em qualquer um destes parâmetros deve ser cuidadosamente avaliada. O pH normal da urina dos gatos varia entre 5,5 e 7,5, mas estes valores são influenciados pela dieta do animal, pela presença de infeções bacterianas e pelo tipo de urólito presente. Na DTUIF, é comum encontrar proteinúria, hematúria e alterações no valor de pH da urina (Forrester, 2004; DiBartola e Westropp, 2014d).

A avaliação do sedimento é fundamental no diagnóstico de DTUIF (Bartges e Kirk, 2009; Lulich, 2014b). A análise do sedimento urinário deve ser realizada em amostras frescas, porque os cilindros e elementos celulares degeneram rapidamente à temperatura ambiente. A urina deve ser previamente centrifugada e corada. No sedimento é avaliada a presença de eritrócitos, leucócitos, células epiteliais, cilindros, cristais e microrganismos. Eritrócitos e leucócitos ocasionais são considerados normais no sedimento urinário. No entanto, valores superiores a três células por campo de grande aumento são considerados patológicos, quando a amostra é recolhida por cistocentese. As células escamosas e epiteliais de transição podem ser encontradas no sedimento urinário, mas têm pouca importância diagnóstica. A presença de cilindros está relacionada com processos patológicos a nível renal. Diferentes tipos de cristais podem ser encontrados na urina, sendo que os de estruvite e oxalato de cálcio são os mais comuns. A cristalúria não é sinónimo de doença, mas representa um importante fator de risco para o aparecimento de cálculos urinários. A presença de cristais é mais significativa em animais com história de urolitíase, obstrução urinária ou cristalúria persistente. A urina normal é estéril, a presença de microrganismos como bactérias, leveduras ou fungos representa contaminação e pode, ou não, indicar uma ITU (Burns, 2014; DiBartola e Westropp, 2014d; Bell e Lulich, 2015). Swenson et al. (2011) realizaram um estudo onde concluíram que o uso

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da coloração de Wright modificada melhora, significativamente, a sensibilidade, especificidade e eficiência na deteção de bacteriúria em gatos.

A cultura de urina é o método de eleição para o diagnóstico definitivo de ITU (Lulich e Osborne, 2004). Os resultados da análise de sedimento como a hematúria, piúria e bacteriúria sugerem a presença de ITU, mas esta só pode ser confirmada com a realização de uma cultura de urina. A ausência destas alterações não garante que não existe infeção, daí a importância deste meio complementar de diagnóstico (Burns, 2014).

A recolha de urina para cultura deve ser feita por cistocentese. Pode, também, ser realizada por algaliação ou compressão manual da bexiga. No entanto é necessário ter em conta a contaminação que pode advir destes métodos. Tal como para a análise de urina, a amostra deve ser processada no máximo até 30 minutos após a colheita. Se for refrigerada, o tempo de refrigeração não deve exceder as 12 a 24 horas (Lulich e Osborne, 2004; Westropp et al., 2005; DiBartola e Westropp, 2014d).

Há circunstâncias em que a terapia antimicrobiana pode ser iniciada antes dos resultados da cultura de urina. No entanto, a amostra de urina para cultura deve ser recolhida antes de qualquer tratamento. Se o animal estiver a ser tratado com um antibiótico, este deve ser interrompido 3 a 5 dias antes da cultura para minimizar a inibição do crescimento bacteriano. Além disso, esta interrupção facilita a diferenciação entre bactérias contaminantes inócuas e patogénicas. A correta identificação das bactérias presentes permite uma escolha mais adequada do antibiótico a aplicar. Para que esta escolha seja o mais acertada possível, devem ser realizados testes de sensibilidade aos antibióticos (Bartges, 2004 e 2005; Lulich e Osborne, 2004).

A cultura de urina também pode ser realizada durante o tratamento do animal. Assim, é possível verificar se a escolha do antibiótico foi adequada e se está a ser eficaz. Além disso, permite a deteção precoce de resistências bacterianas e pode ser utilizada como justificação para a interrupção de tratamentos potencialmente tóxicos. Para esta finalidade, a cultura de urina deve ser realizada 3 a 5 dias após o início da terapia, sempre que ocorra recorrência dos sinais clínicos ou alterações laboratoriais durante o tratamento e imediatamente antes de interromper o mesmo. No período de vigilância, a cultura de urina deve ser feita 7 a 14 dias, 1 a 2 meses e 3 a 6 meses após a interrupção do tratamento e sempre que os sinais clínicos reapareçam (Bartges, 2004 e 2005; Lulich e Osborne, 2004).

A cultura de urina deveria ser, idealmente, realizada em todos os animais com sinais de DTUIF, porém, nem sempre é possível. Por isso, está indicada para todos os animais cujos

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sinais sejam recorrentes, que tenham idade superior a 10 anos, que apresentem densidade urinária inferior a 1030 ou que já tenham sido sujeitos a uretrostomia perineais ou algaliações. Qualquer falha na realização da cultura de urina ou na interpretação dos seus resultados pode originar erros quer no diagnóstico quer na terapêutica a aplicar (Lulich e Osborne, 2004; Bartges, 2005; DiBartola e Westropp, 2014d).

Apesar de a recolha de urina por cistocentese se revelar a mais apropriada, é possível que ocorra contaminação bacteriana pela pele do animal, pela perfuração do intestino durante o procedimento ou pelo manuseamento da amostra. Por isso, embora qualquer microrganismo isolado na cultura seja provavelmente significativo, apenas a presença de mais de 10000 unidades formadoras de colónias de bactérias por mililitro é considerada clinicamente relevante (Bartges, 2004; DiBartola e Westropp, 2014d).

Eggertsdóttir et al. (2007) realizaram um estudo com 134 gatos noruegueses com o objetivo de detetar a presença de bacteriúria em gatos com DTUIF. Os autores concluíram que a bacteriúria pode ter sido subdiagnosticada ao longo dos anos e que a realização da cultura de urina é essencial nos animais com sinais de doença do trato urinário.

4.4.3. Imagiologia

O diagnóstico de CIF é um diagnóstico de exclusão. Por este motivo, além da análise e cultura de urina, também a imagiologia possui extrema importância na procura de um diagnóstico assertivo. A exclusão de urolitíase, de neoplasias ou de alterações anatómicas só é conseguida com recurso a este tipo de exames complementares.

4.4.3.1. Radiologia - Em animais com DTUIF uma radiografia abdominal que inclua todo o aparelho urinário é importante para determinar a causa da doença. Uma visão global do abdómen pode detetar cálculos urinários, tampões uretrais, corpos estranhos e, ainda, alterações a nível dos rins, ureteres, coluna caudal e estrutura óssea. No entanto, resultados negativos não excluem a presença de cálculos urinários, coágulos, neoplasias e defeitos anatómicos. Os cálculos urinários mais radiopacos são os de oxalato de cálcio e estruvite. Paralelamente, existem outros tipos de cálculos que são radiotransparentes, como os de urato de amónio. Neste caso, o recurso a ultrassonografia e a radiografias contrastadas, como a urografia excretora e a uretrocistografia, pode ser útil. A utilização destes exames complementares é, ainda, especialmente indicada para animais com idade superior a 10 anos, cujo diagnóstico de CIF é pouco provável (Lulich, 2007b; Westropp, 2007b; Burns, 2014).

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4.4.3.2. Ecografia - A ultrassonografia é uma técnica minimamente invasiva que permite a avaliação da bexiga. Contudo, a sua utilidade está limitada pelo tamanho da bexiga e porque a maior parte da uretra se encontra sob a pélvis óssea. Por isso, no momento da realização da ecografia a bexiga deve estar distendida para facilitar a visualização de qualquer alteração que possa estar presente. Esta técnica permite avaliar a parede e conteúdo da bexiga detetando espessamentos ou irregularidades na parede, cálculos urinários, massas e coágulos. Quando este exame não fornece um diagnóstico definitivo deve seguir-se a realização de uretroscopia ou de cistoscopia (Forrester, 2004; Westropp et al., 2005; Gerber, 2008).

4.4.3.3. Uretroscopia - O recurso à uretroscopia raramente é realizado no diagnóstico de DTUIF. Se, aquando da realização dos exames supracitados, não se retirar nenhuma conclusão definitiva, a utilização desta técnica pode ser útil. Em animais com episódios recorrentes a uretroscopia deve ser aconselhada, uma vez que permite detetar a presença de massas, coágulos ou estenoses uretrais. Se mesmo assim não se encontrarem alterações significativas deve realizar-se uma cistoscopia (Forrester, 2004; Westropp, 2006).

4.4.3.4. Cistoscopia - A cistoscopia não é um exame de rotina no diagnóstico de DTUIF. Esta técnica é utilizada para detetar causas menos comuns quando os resultados radiográficos, ecográficos e da cultura de urina são negativos e quando o tratamento médico e ambiental não é eficaz. A cistoscopia permite observar cálculos, divertículos uretrais, ureteres ectópicos e pólipos. É ainda de salientar que esta técnica permite avaliar o grau de gravidade da hemorragia, edema, friabilidade e fibrose que possa estar presente na parede da bexiga. Se necessário, pode realizar-se uma biópsia de bexiga para histopatologia e cultura (Forrester, 2004; Westropp, 2006 e 2007b).

As duas últimas técnicas têm como desvantagens a necessidade de anestesia, a contaminação e trauma do trato urinário inferior e a dificuldade de realizar o procedimento em gatos machos (Bartges, 2004).

Na DTUIF, um diagnóstico correto pode exigir a realização de diversos exames complementares. É primordial analisar cada um individualmente e incorporá-lo na história clínica do animal. Tudo isto representa um verdadeiro desafio para o médico veterinário, pois

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nem sempre é possível a realização de todos os exames necessários. Por um lado, muitos são os proprietários que apresentam graves restrições financeiras. Por outro, o próprio comportamento do animal condiciona a realização de exames complementares. Na tabela 1, encontra-se um resumo com os principais diagnósticos desta doença e que outros se devem excluir de modo a encontrar o diagnóstico mais correto e assertivo.

Tabela 1 - Diagnósticos em gatos com sinais clínicos de DTUIF, adaptada de Dorsch et al., 2014.

Diagnóstico Definição Exclusão

CIF Diagnóstico de exclusão.

Cálculos urinários identificados em radiografia ou ecografia.

Cultura de urina positiva com crescimento bacteriano significativo.

Evidência de neoplasia na radiografia ou ecografia.

ITU bacteriana

Crescimento bacteriano significativo em amostras de urina obtidas por cistocentese

ou por algaliação.

Cálculos urinários identificados em radiografia ou ecografia.

Evidência de neoplasia na radiografia ou ecografia.

Tampões uretrais

Deteção de tampões uretrais na algaliação.

Cálculos urinários identificados em radiografia ou ecografia.

Cultura de urina positiva com crescimento bacteriano significativo.

Evidência de neoplasia na radiografia ou ecografia.

Urolitíase

Cálculos urinários identificados em radiografia

ou ecografia.

Evidência de neoplasia na radiografia ou ecografia.

Cultura de urina positiva com crescimento bacteriano significativo.

Neoplasia Identificação de uma massa na radiografia ou ecografia.

Cálculos urinários identificados em radiografia ou ecografia.

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I.II. Entidades nosológicas integradas na DTUIF

1. Cistite Idiopática Felina

A CIF pode ser obstrutiva ou não obstrutiva sendo que a obstrução uretral é muito mais comum em gatos machos. A sua apresentação pode ainda ser aguda ou crónica e os sinais clínicos associados são autolimitantes, podendo desaparecer em 2 a 7 dias, com ou sem tratamento, em 85% dos gatos (DiBartola e Westropp, 2014e).

Esta doença resulta de interações complexas entre a bexiga, o sistema nervoso, as glândulas adrenais e o ambiente onde o animal vive (Westropp, 2007b). Na sua fisiopatologia está envolvido o sistema endócrino, através da libertação de cortisol pelas glândulas adrenais, e o sistema nervoso simpático, pela libertação de catecolaminas, norepinefrina e epinefrina (Buffington e Pacak, 2001; Buffington et al., 2002; Westropp e Buffington, 2004). Westropp

et al. (2003) realizaram um estudo com 11 gatos saudáveis e 20 com CIF cujos resultados

revelaram um tamanho significativamente mais pequeno das glândulas adrenais e uma diminuição da resposta à ACTH nos animais doentes.

Na bexiga de gatos com CIF têm sido identificadas alterações epiteliais, histológicas e uma diminuição da excreção de glicosaminoglicanos. A diminuição de excreção de glicosaminoglicanos reduz o efeito protetor do epitélio permitindo a entrada de constituintes da urina como os iões de cálcio e potássio que causam inflamação. Além disso, estes iões podem estimular os neurónios sensoriais na submucosa, o que, após a interpretação cerebral, é associado à dor (Buffington, 2011). As alterações histológicas não são específicas. Porém, pode existir um epitélio intacto ou danificado manifestando edema da submucosa, dilatação dos vasos sanguíneos da submucosa com presença de neutrófilos marginais, hemorragia da submucosa e um aumento da infiltração de mastócitos. Buffington (2004) realizou um estudo onde provou a concomitância de CIF e outras doenças. Isto sugere que as alterações encontradas na bexiga serão mais uma consequência do que origem desta doença.

Cameron et al. (2004), Westropp et al. (2006), Westropp (2006), Kruger et al. (2008) e Chew e Buffington (2016) defendem que o stresse está relacionado com o aparecimento de CIF como fator causador ou exacerbador.

A CIF é semelhante à Cistite Intersticial Humana, tendo sido colocada a hipótese de que a causa, uma inflamação neurológica exacerbada pelo stresse, seja a mesma para ambas as doenças. Na medicina humana, 90% das pessoas afetadas são mulheres, ao contrário do que acontece com os gatos, em que não há distinção sexual. Contudo, são muitas as semelhanças

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encontradas, como por exemplo a presença de uma urina estéril, neovascularização, edema e ulceração da mucosa da bexiga e uma redução da produção de glicosaminoglicanos (Hostutler

et al., 2005; Westropp et al., 2005; Gerber, 2008; Kruger e Osborne, 2009).

2.

Urolitíase

Os cálculos urinários são concentrações policristalinas compostas, maioritariamente, por cristaloides orgânicos ou inorgânicos e uma quantidade reduzida de matriz orgânica. A urolitíase é comum em gatos, e cerca de 98% dos cálculos urinários ocorre no trato urinário inferior (Bartges, 2012). Os cálculos de estruvite e oxalato de cálcio são os mais comuns e representam 85% dos casos de urolitíase (Bartges, 2012). Existem outros tipos de cálculos urinários, como os de urato de amónio, cistina, sílica, fosfato de cálcio ou até mistos, mas representam menos de 20% dos casos de urolitíase nestes animais (Westropp et al., 2005; Bartges, 2012; DiBartola e Westropp, 2014b).

A formação de cálculos ocorre devido a alterações na composição da urina que promovem a supersaturação de uma ou mais substâncias. Se estas não forem solubilizadas ou excretadas podem precipitar e organizar-se, levando à formação de cristais e, posteriormente, cálculos urinários. A sua formação, dissolução e prevenção envolve processos físicos complexos. A supersaturação da urina, o efeito dos inibidores e promotores da cristalização, agregação e crescimento de cristais e os efeitos da matriz orgânica são os principais fatores a ter em conta na urolitíase. A formação de cálculos é imprevisível, estando envolvidos fatores fisiológicos e patológicos (Bartges et al., 2004; Bartges e Kirk, 2006).

Diez (2006) realizou um estudo entre os anos de 1994 e 2005 onde verificou um aumento significativo da percentagem de cálculos de oxalato de cálcio, de 26% em 1994 para 54% em 2005, e uma diminuição acentuada dos de estruvite, de 66% para 43%. Cannon et al. (2007) realizaram um estudo com o objetivo de avaliar a tendência da composição dos cálculos urinários em gatos e concluíram que a percentagem de cálculos de estruvite (44%) era mais elevada do que os de oxalato de cálcio (40%). Nos anos anteriores a este estudo, verificou-se um aumento da concentração de cálculos de oxalato de cálcio em relação aos de estruvite. Deste modo, é de ressalvar que estas conclusões permitem evidenciar que as tendências têm vindo a mudar ao longo dos anos (Houston, 2007; Lulich e Osborne, 2007; Picavet et al., 2007; Osborne, 2008 e 2010; Hunprasit et al., 2014).

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2.1. Cálculos de estruvite – O aparecimento de cálculos de estruvite pode ocorrer

devido a fatores dietéticos e metabólicos, todavia a sua etiologia ainda não está bem definida. Para que a sua formação seja plena a urina tem de estar saturada de magnésio, amónio e iões fosfato (fosfato amoníaco magnesiano ou estruvite). Cerca de 50% dos cálculos urinários são constituídos no seu todo, ou em parte, por estruvite, sendo que podem ser formados em urina estéril ou induzidos por infeção bacteriana (Matsumoto e Funaba, 2008; Westropp, 2012).

Os cálculos de estruvite estéreis são encontrados com igual frequência em machos e fêmeas e atingem maioritariamente animais entre 1 e 10 anos de idade. O risco de formação de cálculos de estruvite diminui a partir dos 6 a 8 anos. Este tipo de cálculos urinários é muito influenciado pelo maneio dietético. A sua prevenção envolve a manutenção do pH da urina a valores inferiores a 6,8, aumentando o volume da urina e diminuindo a excreção de magnésio, amónio e fósforo (Bartges e Kirk, 2006; Bartges, 2012; DiBartola e Westropp, 2014b).

Os cálculos urinários induzidos por infeção bacteriana são mais comuns em gatos com idade inferior a 1 ano e superior a 10 e em animais imunodeprimidos. O aparecimento destes cálculos é menos frequente e a sua formação ocorre devido à presença de bactérias urease positivas, principalmente os Staphylococcus spp.. Este tipo de cálculos urinários já não está tão relacionado com a alimentação do animal, sendo que a sua prevenção deve ser feita tratando a ITU e impedindo a sua recorrência (Bartges e Kirk, 2006; Bartges, 2012).

2.2. Cálculos de oxalato de cálcio - A formação de cálculos de oxalato de cálcio

acontece quando a urina está saturada de oxalato e cálcio. Estas alterações na concentração dos iões concomitantemente com alterações das proteínas da urina conduzem à formação e crescimento de cristais de oxalato de cálcio (Bartges e Kirk, 2006).

A hipercalcemia é descrita como um fator de risco para o aparecimento deste tipo de cálculos urinários, visto que aumenta a excreção de cálcio e provoca um aumento da quantidade de cálcio na urina. Este aumento é um fator de risco significativo, mas não necessariamente a causa da formação de cálculos de oxalato de cálcio, já que a hipercalciúria pode resultar de uma excessiva absorção de cálcio a nível intestinal, da reabsorção renal de cálcio ou de uma mobilização exagerada deste mineral do esqueleto ósseo. O consumo de dietas acidificantes, de modo a controlar a formação de cálculos de estruvite, tem sido associado com o aumento da excreção urinária de cálcio, representando, assim, um fator de risco para o aparecimento de

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cálculos de oxalato de cálcio. A acidificação da urina altera a função e concentração dos inibidores da agregação, formação e crescimento de cristais (Bartges e Kirk, 2006).

Os cálculos de oxalato de cálcio representam cerca de 40% dos casos de urolitíase. No entanto, não existem protocolos médicos para a sua dissolução, sendo a sua remoção por via cirúrgica. O maneio médico e nutricional deve ser considerado para impedir a recorrência, já que esta ocorre num número significativo de gatos 2 anos após o episódio inicial, caso não sejam tomadas medidas preventivas. As metas nutricionais incluem a redução de cálcio e das concentrações de oxalato na urina, a promoção de grandes concentrações e atividade dos inibidores de cálculos urinários, a diminuição da acidez da urina e a presença de uma urina diluída. O aumento do volume da urina é um dos pilares da terapia preventiva da urolitíase por oxalato de cálcio (Bartges e Kirk, 2006; Sparkes, 2006a).

2.3. Cálculos de urato de amónio - O urato é o terceiro mineral mais comum encontrado em cálculos urinários, representando 5% a 8% dos casos de urolitíase em gatos (Bartges e Kirk, 2006). A sua formação ocorre devido à supersaturação da urina em urato e amónio. As alterações de metabolismo ou a presença de doença hepática levam ao aparecimento destes cálculos urinários, que afetam, maioritariamente, animais com menos de 5 anos. A dissolução não é possível em animais cuja doença hepática não seja tratada e resolvida. A remoção cirúrgica continua a ser o tratamento de eleição para a urolitíase de urato de amónio (Appel et al., 2010; DiBartola e Westropp, 2014b).

3. Tampões uretrais

Os tampões uretrais são a causa mais comum de obstrução uretral em gatos. Estes são constituídos por uma matriz orgânica, da qual fazem parte mucoproteínas, albumina e globulina e por uma matriz inorgânica, os cristais. Na sua maioria, os cristais envolvidos são de estruvite, mas qualquer tipo cristal pode ficar preso na matriz. A composição específica da sua matriz ainda não foi completamente determinada, podendo também ser composta por tecido morto, sangue, células inflamatórias, secreção prostática e pela mucoproteína Tamm-Horsfall proveniente das células tubulares renais. Em resposta a um estímulo inflamatório ou a uma irritação da mucosa, as suas células libertam muco em excesso na bexiga e uretra, o que contribui para a formação de tampões uretrais (Houston, 2003; Lulich e Osborne, 2012).

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Matsumoto e Funaba (2008) publicaram um estudo onde revelaram a importância do péptido cauxin que acelera a formação de cristais de estruvite. Cauxin é excretado na urina dos gatos, sendo que a sua excreção é superior nos machos e aumenta com a idade em animais a partir dos 3 meses. A castração dos machos diminui a excreção deste péptido. Com este estudo, o aumento da excreção de cauxin passou a ser considerado um fator de risco para o aparecimento da urolitíase de estruvite e, consequentemente, dos tampões uretrais.

Os tampões uretrais causam obstrução quando a matriz orgânica se solta da parede vesical devido a fenómenos de inflamação. Esta inflamação pode ter causas idiopáticas, neurogénicas ou ser secundária a infeção, a neoplasia ou à presença de cálculos urinários (Gunn-Moore, 2003).

4. Infeção do Trato Urinário

O trato urinário inferior possui uma variedade de mecanismos de defesa para evitar a ocorrência de infeções. A primeira linha de defesa é o fluxo unidirecional da urina, que é conseguido através do peristaltismo uretral, das pregas longitudinais presentes na uretra proximal, das zonas de alta pressão no interior da uretra e do seu comprimento. Além disto, a mucosa tem propriedades antimicrobianas intrínsecas e uma barreira de defesa constituída por uma camada de glicosaminoglicanos (Gerber, 2007; Lister et al., 2009 e 2011).

As ITU’s ocorrem devido a falhas nos mecanismos de defesa do hospedeiro que permitem a entrada, adesão, multiplicação e permanência de um determinado número de agentes patogénicos numa porção do trato urinário (Bartges, 2004). Maioritariamente, as ITU’s ocorrem devido à presença de bactérias. Todavia, fungos e vírus também podem estar envolvidos neste tipo de infeção. Concomitantemente, é de ressalvar que estas infeções podem afetar uma única porção do trato urinário, como o rim, ureter, bexiga, uretra, próstata e vagina, ou várias simultaneamente, sendo estas menos frequentes em gatos do que em cães (Bartges, 2004; Gerber, 2007; Osborne et al., 2014).

As ITU’s bacterianas podem ser classificadas de acordo com várias definições. Sykes e Westropp (2013), por exemplo, classificam-nas em simples ou não complicadas, complicadas, recorrentes, refratárias, recidivantes, reinfeções e bacteriúrias subclínicas. A ITU simples é uma infeção esporádica da bexiga que ocorre num indivíduo aparentemente saudável e sem alterações na anatomia do trato urinário. A ITU denomina-se complicada quando está presente uma anormalidade anatómica ou funcional do trato urinário que predispõe à ITU persistente, recorrente ou à ausência de resposta ao tratamento. Quando ocorrem três ou mais episódios de

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ITU num período de 12 meses, diz-se que a ITU é recorrente. Quando, apesar de se ter administrado o tratamento adequado, se isola o mesmo microrganismo mais do que uma vez a ITU é apelidada de refratária. A ITU recidivante ocorre quando se isola o mesmo microrganismo num período de 3 meses de aparente resolução da infeção, entre culturas positivas. Caso se proceda a um isolamento de um microrganismo diferente num período de 6 meses de aparente resolução de uma infeção prévia, diz-se que ocorreu uma reinfeção. A bacteriúria subclínica é a presença de bactérias na urina, confirmada pela realização de uma cultura de urina, sem, no entanto, existirem sinais de doença do trato urinário inferior (Sykes e Westropp, 2013; DiBartola e Westropp, 2014a).

Nesta ordem de ideias, as infeções bacterianas são mais comuns em gatos mais velhos, com idade superior a 10 anos, e a incidência aumenta com a idade. Enquanto nos animais mais velhos a ITU pode afetar 10% dos gatos, em animais mais jovens atinge apenas 1% a 3% (Gerber, 2007; Osborne et al., 2014). A presença de cálculos urinários, de urina diluída e a realização prévia de algaliações, uretrostomias perineais e cistotomias aumentam a possibilidade de aparecimento de ITU (Forrester, 2007b; Labato, 2009; DiBartola e Westropp, 2014a; Osborne et al., 2014).

Relativamente ao agente patogénico, a Escherichia coli é a bactéria mais frequentemente encontrada nas ITU’s, seguida de Staphylococcus spp., Proteus, Klebsiella,

Enterococcus spp, Streptococcus spp., Pasteurella e Pseudomonas (Labato, 2009; Lister et al.,

2009 e 2011; DiBartola e Westropp, 2014a). Lister et al. (2007) realizaram um estudo para investigar a prevalência das bactérias no trato urinário inferior em gatos na Austrália. No seu estudo, isolaram Escherichia coli em 37,3% dos casos, Enterococcus faecalis em 27%,

Staphylococcus felis em 19,8%, Proteus spp. em 4,7%, Enterobacter spp. em 2,4%, Pseudomonas aeruginosa em 1,6%, Staphylococcus aureus em 1,6%, Staphylococcus intermedius em 1,6%, Streptococcus bovis em 1,6%, e Klebsiella pneumoniae em 0,8%.

Apenas 20% a 30% das infeções envolvem mais do que uma estirpe bacteriana. As ITU’s recorrentes, que não respondem aos antibióticos mais comuns, devem-se muitas vezes a tumores ou pólipos vesicais, cálculos urinários, pielonefrites ou prostatites. Mais raramente estão envolvidas doenças como a insuficiência renal crónica, Diabetes Mellitus, hiperadrenocorticismo ou o tratamento prolongado com corticosteroides (Bartges, 2005 e 2006; Labato, 2009; DiBartola e Westropp, 2014a). Bailiff et al. (2006) realizaram um estudo com 141 gatos diabéticos e verificaram que a ITU é frequente nestes animais, sendo importante uma

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vigilância atenta com exames de rotina, como a análise do sedimento urinário ou cultura de urina.

A ITU bacteriana pode originar graves consequências para o animal. Além da disfunção do trato urinário inferior com a presença de disúria, polaquiúria, incontinência urinária, danos no músculo detrusor e na uretra, a ITU pode levar também a prostatites, infertilidade, urolitíase de estruvite, insuficiência renal, pielonefrite, septicemia e anemia crónica (Lulich e Osborne, 2004).

As infeções víricas e fúngicas são extremamente raras. Os vírus têm sido considerados como agentes causadores da DTUIF desde 1960. Já foram isolados o calicivírus felino, retrovírus, herpesvírus bovino e o vírus formador de sincício na urina de gatos com sinais de DTUIF. No entanto, a sua relação com a presença de infeção ainda não esta bem documentada (Barsanti et al., 1996; Bartges, 2005; Kruger et al., 2008). Os fungos podem também originar ITU, sendo que Candida spp. é o mais associado a este tipo de infeção (Bartges, 2005; Kruger

et al., 2008). A infeção por fungos pode ser primária, confinada ao trato urinário, ou secundária

resultante de uma infeção sistémica ou disseminada com o aparecimento de fungos na urina. Os animais mais velhos e as fêmeas possuem maior risco de desenvolver este tipo de infeção. (Pressler, 2011).

5. Outras

5.1. Alterações anatómicas

As alterações anatómicas podem ser congénitas ou adquiridas, sendo as primeiras as mais comuns. Num estudo com 22 mil gatos com DTUIF, as alterações anatómicas foram responsáveis por menos de 1% dos casos (Forrester, 2007). Destacam-se as anomalias do úraco, nomeadamente o úraco persistente e o divertículo vesico-uretral. Este último é referido como sendo uma consequência da DTUIF e não uma causa. O estreitamento uretral e o mau posicionamento da uretra são também descritos como causadores de DTUIF (Lekcharoensuk, 2001; Forrester, 2007; Osborne et al., 2014).

5.2. Alterações comportamentais

Uma alteração no comportamento do animal pode levar ao aparecimento de DTUIF. O diagnóstico de micção inadequada associada a alterações de comportamento é feito após exclusão de todas as causas médicas. No entanto, é possível que a DTUIF conduza a uma micção inadequada, secundária a uma alteração de comportamento, por aversão, por exemplo,

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à caixa de areia. Assim sendo, existe uma associação significativa entre gatos com história de DTUIF e a manifestação de alterações comportamentais (Lulich, 2007b; Forrester, 2007b).

Qualquer alteração na caixa de areia, como o tipo de caixa, o tipo de areia e a sua localização ou ainda a alteração do habitat normal do gato, como a adição de um novo animal em casa ou a chegada de um novo membro à família, pode levar a alterações comportamentais uma vez que estes animais são muito sensíveis a qualquer variação do meio. O stresse resultante destas situações é um fator de risco para o aparecimento de DTUIF, tornando vital a realização de uma anamnese completa e rigorosa (Lulich, 2007b; Kirk et al., 2015). No entanto, torna-se necessário distinguir entre o comportamento de marcação com urina e a micção inadequada. Tynes et al. (2003) referem que a marcação com urina em gatos castrados não está relacionada com a DTUIF e que é fulcral ouvir atentamente as queixas e indicações do proprietário do animal.

5.3. Neoplasias

As neoplasias do trato urinário são pouco comuns em gatos. O tipo mais comum é o carcinoma das células de transição, seguido por outros tumores epiteliais malignos, sarcomas, tumores benignos e linfomas (Forrester, 2007). O carcinoma das células de transição pode estar associado a ITU’s e ocorre em animais mais velhos, com disúria e hematúria persistentes. Esta neoplasia pode aparecer como um tumor isolado ou ser secundária a inflamação crónica. A castração e idade superior a 10 anos são fatores de risco para o aparecimento de neoplasias (Lekcharoensuk, 2001; Gunn-Moore, 2003; Forrester, 2007b).

5.4. Traumatismo

Num estudo de Lekcharoensuk (2001) o traumatismo foi responsável por 2% dos casos de DTUIF e não foi encontrada associação com raças específicas, idade ou sexo. As lesões traumáticas a nível lombar ou sagrado podem originar uma disfunção do neurónio motor inferior levando ao aparecimento de DTUIF. Quando isto acontece, manifesta-se uma retenção urinária, arreflexia do detrusor e, consequentemente, incontinência urinária. O prognóstico varia com a gravidade da lesão (Westropp et al., 2005).

5.5. Causas iatrogénicas

Lekcharoensuk (2001) realizou um estudo onde as causas iatrogénicas foram diagnosticadas em 0,6% dos gatos com DTUIF. Este autor menciona ainda que machos

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castrados e animais com idades compreendidas entre os 2 e os 7 anos foram os mais afetados por esta causa. Uma das principais causas iatrogénicas para o aparecimento de DTUIF é algaliação. Embora esta técnica seja fundamental no tratamento de DTUIF obstrutiva, a colocação da algália pode originar traumatismo no trato urinário inferior, deixando este suscetível a colonização por bactérias e, consequente, infeção (Westropp et al., 2005).

I.III. Abordagem terapêutica à DTUIF

O tratamento de casos de DTUIF revela-se também desafiante para o médico veterinário devido às diferentes entidades nosológicas envolvidas e às respostas individuais de cada animal. A terapia deve ser individualizada e adaptada a cada caso clínico. É recomendada uma abordagem multimodal que inclui a identificação e tratamento da causa subjacente e o maneio médico, dietético, ambiental e comportamental. Geralmente a DTUIF é autolimitante, sendo que cerca de 85% dos casos se resolvem em 2 ou 3 dias sem tratamento, principalmente em casos de CIF (DiBartola e Westropp, 2014e). Contudo, 40% dos animais afetados sofrem recorrências dentro de um ano (Burns, 2014). Esta doença é dolorosa para o animal e pode conduzir a obstruções urinárias. Além disso, causa stresse e pode originar alterações comportamentais, pelo que o tratamento é sempre recomendado (Gunn-Moore, 2003; Westropp

et al., 2005).

1. Tratamento da obstrução urinária

A obstrução uretral é uma emergência médica e representa 10% de todos os casos de emergências em gatos (Westropp et al., 2005). Pode manifestar-se devido a uma obstrução física por cálculos urinários, tampões uretrais e neoplasias ou ser idiopática (Cooper, 2015). Gerber et al. (2008) realizaram um estudo com 45 gatos obstruídos onde verificaram que 29% dos casos ocorreram devido a urolitíase, 18% a tampões uretrais e 53% dos animais apresentavam obstrução idiopática.

Os gatos machos, sedentários, com peso excessivo e os animais que vivem exclusivamente no interior da casa e cuja ingestão de água é reduzida são mais propensos a desenvolver obstrução (Segev et al., 2011; Cooper, 2015). O diagnóstico é feito com base na história clínica do animal e no exame físico, no qual está patente a incapacidade de urinar, a vocalização excessiva e a presença de uma bexiga firme e dolorosa à palpação abdominal. A obstrução uretral está associada a taxas de sobrevivência de 90% a 95% e de recorrência em

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14% a 40% dos casos (Segev et al., 2011). Os fatores de risco relacionados com a recorrência incluem o tamanho da algália e o tempo de algaliação, o uso de agentes antiespasmódicos, a idade do animal e o seu estilo de vida (Westropp et al., 2005; Segev et al., 2011; Cooper, 2015). O principal objetivo do tratamento é a reposição do fluxo urinário (Drobatz, 2009; Ford e Mazzaferro, 2012). Assim, o primeiro passo deve ser a colocação de um cateter intravenoso para administrar fluidos ou medicação. A analgesia deve ser realizada logo que possível e é necessário recolher uma amostra de sangue para a realização de análises (Lulich, 2014a). A estabilização do animal é o mais importante. Porém, além de aliviar a obstrução, o tratamento deve ser instituído para resolver a possível azotemia e alterações eletrolíticas e ácido-base que possam estar presentes. Os distúrbios metabólicos graves como a hipercalemia e acidose metabólica devem ser corrigidos de imediato. O essencial para a resolução destes problemas é a fluidoterapia (Little, 2007; Drobatz, 2009; Ford e Mazzaferro, 2012).

Apesar de a fluidoterapia ser imprescindível para a resolução da obstrução urinária e das suas consequências, a escolha do fluido a utilizar revela-se complicada. O cloreto de sódio (NaCl) foi considerado o fluido de eleição por ter um maior efeito de diluição do potássio, o que se torna útil na resolução da hipercalemia. No entanto, este é uma solução acidificante que pode exacerbar a acidose metabólica. Por outro lado, a escolha de fluidos mais equilibrados em eletrólitos pode levar a um agravamento da hipercalemia (Riser, 2005; Cooper, 2015).

Drobatz e Cole (2008) realizaram um estudo onde compararam o uso de NaCl 0,9% e o de uma solução equilibrada de eletrólitos (Normosol R: cloreto, acetato e gluconato de sódio, cloreto de potássio e magnésio) em gatos com obstrução urinária. Os resultados deste estudo demonstraram que não há diferenças na evolução clínica dos animais nem na redução das concentrações séricas de potássio. No entanto, verificaram que as alterações ácido-base foram corrigidas mais rapidamente nos animais tratados com Normosol R. Por sua vez, Cunha et al. (2010) compararam o uso de NaCl 0,9% e Lactato de Ringer (LR) em 14 animais obstruídos. Os autores chegaram à conclusão de que qualquer um dos fluidos é seguro e eficaz, mas o uso de LR revelou-se mais eficiente na regularização do equilíbrio ácido-base e de eletrólitos. Com base nestes estudos depreende-se que o tipo de fluido não tem um impacto clinicamente relevante na resolução da obstrução urinária e das suas consequências metabólicas.

Outro ponto importante da fluidoterapia é a escolha da taxa adequada a cada animal. Muitos animais chegam à consulta extremamente descompensados, e a taxa de choque (50-55 mililitros/Kg/hora) pode ser a mais apropriada para a estabilização do animal. Em situações menos graves é utilizada a taxa de manutenção (2-3 mililitros/Kg/hora), sendo importante

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Tabela 1 - Diagnósticos em gatos com sinais clínicos de DTUIF, adaptada de Dorsch et al., 2014
Tabela 2 – Lista de parâmetros incluídos no estudo.
Gráfico 1 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao sexo.
Gráfico 4 – Distribuição dos animais em estudo quanto ao peso.
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Referências

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