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O EMISSÁRIO SUBMARINO COMO SOLUÇÃO PARA O TRATAMENTO DE EFLUENTES

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O E

MISSÁRIO

S

UBMARINOCOMO

S

OLUÇÃOPARAOTRATAMENTODE

E

FLUENTES

Santos, Davide1 e Vieira, Paula2

1. NOTA HISTÓRICA

Os primeiros emissários submarinos surgiram em Inglaterra no século XIX e foram criados para resolver problemas de ordem estética (gorduras e sólidos flutuantes) nas zonas balneares, possuindo um comprimento suficiente apenas para tal.

A relação que se estabeleceu entre o aumento da morbilidade dos banhistas e as zonas de descargas de esgotos levou à construção de emissários mais longos tendo estes passado a ser encarados como uma resposta para problemas de ordem sanitária (contaminação microbiana das águas). Esta solução tinha como objectivo aproveitar a capacidade depuradora do meio para degradar a matéria orgânica e destruir os organismos patogénicos que existiam nas águas residuais urbanas. Era também a forma mais eficaz de resolver o problema da deposição (leia-se “desembaraçar-se”) dessas águas em grandes aglomerados populacionais.

Com o advento da industrialização, as águas residuais foram contaminadas com outros compostos que vieram alterar a sua qualidade de uma forma significativa e persistente, já que estes novos poluentes (e.g. metais pesados) são conservativos e criam problemas mutagénicos na fauna e flora em torno do difusor do emissário devido à deposição nos sedimentos e à sua difícil ou impossível biodegradibilidade.

2. EMISSÁRIOS SUBMARINOS – FORMA DE TRATAMENTO OU DESTINO FINAL?

A designação “emissário submarino” refere-se à descarga no mar de águas residuais que já sofreram

um determinado grau de tratamento numa ETAR3. Uma vez descarregadas, essas águas residuais

são submetidas aos processos naturais do meio receptor de diluição e/ou degradação.

O mar tem uma grande capacidade de assimilação de poluentes biodegradáveis (excepto em algumas zonas de maior sensibilidade). Assim, estes constituintes do esgoto além de serem diluídos após a descarga são degradados e gradualmente desaparecem do meio.

Os constituintes conservativos do esgoto não são degradados e a sua concentração no meio líquido diminui apenas por efeito de diluição. Porém, e uma vez que não desaparecem, estes compostos acumulam-se no sedimento marinho aumentando aqui a sua concentração ao longo do tempo. São já bem conhecidos os efeitos negativos deste processo sobre a flora e a fauna marinhas.

Após a descarga os teores bacteriológicos diminuem por diluição e morte dos microrganismos. A sua morte é devido a (Mitchel, 1974) :

• Acção bactericída da radiação UV4 do espectro solar

• Factores físico-químicos ( efeitos osmóticos, pH , temperatura, toxicidade química do meio)

• Sedimentação;

• Deficiência de Nutrientes; • Toxinas algais e bacterianas;

• Predação por microrganismos do meio receptor.

Apenas os constituintes não conservativos e bacteriológicos da água residual, diminuem após a descarga no mar através de um emissário submarino. Se considerarmos que uma “forma de tratamento” é um processo que promove a diminuição da carga poluente de uma água pode dizer-se que um emissário é uma forma de tratamento apenas em relação a estes dois tipos de contaminantes. No que diz

1 Lic. em engª civil, assistente na Escola Superior de Tecnologia da Universidade do Algarve. 2 Lic. em engª química, estagiária de investigação no Núcleo de Engenharia Sanitária do LNEC. 3 ETAR – Estação de Tratamento de Águas Residuais.

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respeito às espécies conservativas, o emissário não exerce nenhum tratamento e constitui somente um modo de deposição final no oceano.

Mesmo no caso dos poluentes não conservativos, para que o emissário seja considerado um processo de tratamento, é necessário que haja manutenção do equilíbrio ecológico do meio receptor. Ou seja, a carga poluente descarregada deve ser suportada pela capacidade de autodepuração do ecossistema e devem ser cumpridas as normas de qualidade mínimas para os diferentes usos do meio (recreio com contacto directo ou indirecto, cultura de bivalves, pesca). Esta condição é cumprida através da definição (com base em balanços mássicos dos poluentes) do correcto grau de pré-tratamento efectuado na ETAR e do correcto dimensionamento do emissário propriamente dito (comprimento total e características do difusor). Estes dois aspectos podem ser balanceados para se encontrar a solução economicamente mais viável (em termos de custos de capital e de custos de operação), o aumento do comprimento do emissário implica uma diminuição no grau de tratamento em ETAR uma vez que a capacidade de depuração do meio conseguirá ser responsável por um maior grau de “complemento de tratamento”. Em geral, a solução mais económica atribui um maior peso ao emissário, i.e. , é preferível instalar um emissário com um maior comprimento e efectuar um tratamento em ETAR menos exigente (WRC, 1990).

Em conclusão: se o emissário descarregar um efluente doméstico pode constituir uma forma de tratamento, se descarregar um efluente industrial (com poluentes conservativos) é apenas uma forma de destino final e se descarregar um efluente que resulta da mistura de efluentes domésticos e industriais – caso mais comum – pode ter as duas funções.

3. EMISSÁRIOS SUBMARINOS – QUE FUTURO ?

Quando se põe a questão acerca do futuro dos emissários submarinos pressupõe-se que se fala do seu futuro em função da alternativa “tratamento total em ETAR” localizada em terra e que descarrega os efluentes tratados num curso de água. Assim, para responder a esta questão tentaram-se avaliar as vantagens e desvantagens de uma e de outra solução. A tabela 1 apresenta-as resumidamente.

Nas tabelas 2 e 3 indicam-se percentagens residuais de poluentes não conservativos (CBO5,

N-amoniacal), conservativos (metais: Cr, Cu, Ni, Pb) e bacteriológicos (coliformes fecais e vírus) em diferentes tipos de tratamento. Na Fig.1 comparam-se as eficiências de remoção de vários tipos de ETAR com os emissários submarinos (apenas são referidos poluentes não conservativos).

Como se pode ver, o tratamento preliminar apenas remove sólidos de grande dimensões não sendo efectivo na remoção de nenhum poluente. No tratamento primário os sólidos em suspensão são removidos por sedimentação e consequentemente cerca de 10% da carga de coliformes e 40% em CBO são também reduzidos. O tratamento secundário apresenta uma remoção de CBO mais efectiva (95%), consegue efectuar já a redução de azoto amoniacal mas não apresenta ainda percentagens ideais de remoção de coliformes. As percentagens residuais de metais são também elevadas.

Como consequência destes factos não é significativo o benefício acrescentado com a construção de uma ETAR pré-emissário com um tratamento primário ou mesmo secundário em zonas de grande capacidade de depuração de CBO.

Come se pode ver pela Fig. 1 o tratamento por emissário consegue, relativamente a uma ETAR, uma redução muito mais drástica dos poluentes não conservativos sobretudo no que se refere aos parâmetros bacteriológicos. Portanto, numa zona de grande capacidade de depuração de CBO a solução ES6 parece

a mais viável para uma água residual sem poluentes conservativos.

Num esgoto com substâncias conservativas o uso de um emissário implicaria a instalação de uma ETAR a montante que efectuasse a sua remoção completa de modo a evitar os efeitos cumulativos no meio receptor. Tendo em conta os valores da tabela 2 uma tal ETAR teria de incluir tratamento físico-químico. Idealmente a solução seria outra: os efluentes industriais contaminados com este tipo de poluentes seriam tratados dentro da indústria (menor caudal a tratar) e à ETAR chegaria apenas um esgoto com características de esgoto doméstico.

5 CBO – Carência Bioquímica de Oxigénio. 6 ES – Emissário Submarino

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Portanto, em zonas de grande capacidade de depuração (como é o caso da costa ocidental portuguesa) a solução ES é perfeitamente viável se os poluentes conservativos forem eliminados7 dentro das unidades

industriais como começa a ser, aliás, a tendência actual (de acordo com a directiva 76/464/CEE).

TABELA 1 – Características de duas soluções de tratamento de águas residuais em zonas costeiras EMISSÁRIO SUBMARINO TRATAMENTO TOTAL EM ETAR

• Reutilização da água tratada Não permite Permite

• Valorização de resíduos Não permite Permite

• Balanço entre o grau de tratamento da ETAR e a capacidade assimilativa do meio receptor de modo a cumprir normas de qualidade

Permite, com maior margem de manobra que ETAR (porque além da capacidade de depuração do meio não ser tão limitada, pode-se ainda jogar com as características do emissário para procurar melhores condições de diluição)

Permite mas com menor margem que o ES uma vez que a capacidade depuradora do meio receptor é limitada

• Área exigida em terra Menor área Maior área

• Aspectos económicos 1. Custos envolvidos

2. Custos de monitorização do meio receptor

1. Custos de construção + custos de monitorização ecológica + custos relativos à ETAR de pré-tratamento 2. Elevados

1. Custos de construção + custos de operação

2. Reduzidos comparativamente com o ES.

• Risco de acumulação de poluentes conservativos no meio receptor

Grande, se não for efectuado um pré-tratamento que os remova do esgoto descarregado.

Também existe mas é mais fácil de monitorizar num meio receptor terrestre ou fluvial que no oceano.

• Contaminação de recursos marinhos (zonas de banhos, pesca, zonas conquícolas)

Sim Não

• Tamanho da linha de tratamento da ETAR

Menor (porque o meio receptor completa o processo de tratamento devido à maior capacidade de depuração).

Maior

TABELA 2 – Percentagens residuais de poluentes não conservativos (WRC,1990) Processo de tratamento Coliformes fecais Vírus CBO Amónia

Preliminar Primário Secundário leito percolador lamas activadas 100 90 1-50 1-50 100 36-71 32-60 1-10 100 60 5 5 100 100 25 25

TABELA 3 – Percentagens residuais de poluentes conservativos (WRC,1990) Processo de tratamento Crómio cobre Níquel chumbo

Preliminar Primário Secundário 100 80 60 100 60 20 100 60 50 100 70 40

Com a melhoria da qualidade de vida e das exigências de produção industrial, a capitação de água nas últimas décadas tem aumentado significativamente, embora a tendência actual seja a estabilização, devido à optimização que é feita nos consumos, especialmente na indústria.

Esta nova tendência está ligada ao facto de a água ser cada vez mais considerada como um recurso escasso.

A existência de uma menor quantidade e qualidade de água disponível face às exigências de consumo, implica necessariamente o recurso à reutilização das águas residuais tratadas. Especialmente no sul do país - Alentejo e Algarve – onde os períodos de chuva são cada vez mais curtos e de maior intensidade,

7 Quer em ETAR quer implementando no processo de produção tecnologias menos poluentes e/ou que

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a reutilização das águas residuais urbanas por exemplo na agricultura é uma opção (a agricultura utiliza 2/3 da água total consumida). A solução tratamento total em ETAR possibilita esta reutilização enquanto que no ES se desperdiçam recursos com o lançamento de água doce no mar. Assim, sob o ponto de vista de gestão de recursos hídricos, a solução ES seria posta de parte no futuro.

Tendo em conta que a concentração de coliformes é determinante para fixar o comprimento do emissário, em primeira análise seria desejável uma desinfecção à saída da ETAR tendo em vista a diminuição do comprimento do mesmo. Até algum tempo atrás a tecnologia disponível e economicamente viável para tal, era a cloragem. No entanto esta não deveria ser utilizada por duas razões:

•impacte negativo do cloro na vida aquática;

•formação de compostos organoclorados devido à presença de matéria orgânica.

As novas tecnologias de desinfecção, nomeadamente a ozonização8, tem vantagens relativamente à

cloragem:

•presença na água durante um curto espaço de tempo, logo não produzindo impactes negativos no meio receptor;

•não produção de compostos tão nocivos como a cloragem ; •maior poder de desinfecção.

Com a diminuição do custo de instalação e exploração destes equipamentos será de equacionar a possibilidade de fazer uma desinfecção final por ozonização, por forma a reduzir o comprimento do emissário assim como todos os custos associados.

No futuro terá que ser feita uma análise de custos para verificar se continua a ser mais económica a opção ETAR com pré-tratamento com desinfecção ou tratamento completo em terra.

De acordo com a legislação actual em vigor (directiva 91/271/CEE, já transposta para direito nacional através do decreto-lei 152/97, D.R. 139/97 de 19 de Junho) o recurso ao mar como meio receptor impõe, em função da dimensão da população, certas exigências mínimas de tratamento das águas a lançar por emissário. Este tratamento deve ser secundário9.

Assim, a instalação de um emissário tem que cumprir, além das normas de qualidade mínimas do meio receptor, esta legislação demasiado restritiva para um país como Portugal onde a grande capacidade de depuração do oceano não justifica, em geral, um tratamento secundário a montante do emissário. Deste modo o cumprimento da directiva torna desnecessariamente onerosa a solução ES e há que efectuar uma avaliação de custos para verificar se ainda é mais económica do que completar o tratamento em terra. Isto refere-se ao caso dos poluentes não conservativos. Se pensarmos nos conservativos um tratamento secundário é notoriamente insuficiente.

8 Outra tecnologia possível são os UV, mas para grandes caudais é difícil a criação de condições para

penetração das radiações na água devido à elevada turvação da mesma.

9 Excepto no caso de populações menores que 10000 pop. eq. onde basta um “tratamento adequado” e

para 10000 a 150000 pop. eq. onde se admite um tratamento primário se demonstrar através de estudos específicos que esta solução não afecta negativamente o meio ambiente.

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FIG.1 – Comparação dos processos de tratamento primário e secundário com a descarga por emissário

submarino (WRC,1990)

Resumindo tudo o que foi dito até aqui, conclui-se que o que determina a opção ES/tratamento total em ETAR são os aspectos económicos ditados pelo balanço capacidade de depuração do meio versus carga poluente e pela gestão dos recursos hídricos.

Os emissários submarinos não terão futuro nas seguintes situações:

em zonas onde a gestão dos recursos hídricos apontar como indispensável proceder à reutilização da água e essa recuperação for possível (uma das razões da impossibilidade da reutilização tem a ver com a dificuldade de armazenamento da água tratada – complexo de lagoas ou subsolo10 – devido à falta de espaço nas grandes cidades – grandes produtores);

10 A injecção de água devidamente tratada no subsolo, pode ser utilizado para corrigir o problema das

cunhas salinas, devido à sobreexploração dos lençóis freáticos do litoral.

a) - eficiência de remoção de poluentes não conservativos em processos de tratamento primário e secundário

b) - eficiência de remoção de poluentes não conservativos na descarga por emissário submarino

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• em zonas sensíveis (baixa capacidade de depuração) onde sejam descarregados efluentes com elevada carga poluente pois provavelmente tem maior viabilidade económica o tratamento total em terra uma vez que mesmo com o emissário o grau de pré-tratamento tem já que ser elevado;

se são descarregados efluentes industriais ou domésticos com mistura de industriais e não forem impostas regras que impliquem a remoção total na unidade industrial11 dos poluentes

conservativos.

Bibliografia:

76/160/CEE - relativa à qualidade das águas balneares

76/464/CEE - relativa à poluição causada por determinadas substâncias perigosas lançadas

para o meio aquático da comunidade

79/923/CEE - relativa à qualidade das águas conquícolas

86/280/CEE - relativa aos valores limite e aos objectivos de qualidade para as descargas de

certas substâncias perigosas incluídas na lista I do Anexo da directiva 76/464/CEE (tetracloreto de carbono, DDT e pentaclorofenol)

88/347/CEE - altera Anexo II da 86/280 (aldrina, dialdrina, endrina, isoendrina, HCB, HCBD,

clorofórmio)

90/415/CEE - altera Anexo II da 86/280 (EDC,TRI,PER,TCB)

91/271/CEE - relativa a tratamento de águas residuais urbanas

Ambrósio, A. (1965). Pré-dimensionamento de um exutor submarino de esgoto de águas

residuais. Revista Técnica nº 348. P 513-533. IST.

D.L. 74/90 - normas de qualidade da água

Grace, Robert A. (1978). Marine Outfall Systems: Planning, Design and Construction. University of Hawaii at Manoa. Prentice-Hall Inc.

Metcalf & Eddy (1991). Wastewater engineering – treatment, disposal, reuse. McGraw-Hill. New York.

Mitchel, R.and Chamberlin, C. (1974). Factors Influencing the Survival of Enteric

Microorganisms in the Sea. Proceedings of International Symposium on Discharge of Sewage

from Sea Outfalls, London, 27/8 - 2/9. Pergamon Press.

Portaria 624/90 - normas de descarga de águas residuais provenientes de habitações isoladas,

de aglomerados populacionais e de todos os sectores da actividade humana

Portaria 809/90 - normas de descarga de águas residuais provenientes de matadouros e

unidades de processamento de carnes

WRC (1990). Design guide for marine treatment schemes.

11 Ou numa unidade de tratamento de efluentes industriais conjunta - consoante se revelar mais viável

Referências

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