DEPARTAMENTO DE MATEM ´ATICA
CLASSIFICAC
¸ ˜
AO DOS RA LOOPS
Mariana Garabini Cornelissen Hoyos
Orientador: Prof. Dr. Francisco C´esar Polcino Milies
Tese apresentada ao Instituto de Ciˆencias Exatas, da Universidade de Federal de Minas Gerais, como parte dos requisitos para obten¸c˜ao do t´ıtulo de “Doutor em
Matem´atica - ´Area de Concentra¸c˜ao: ´Algebra”.
`
N˜ao poderia deixar de registrar aqui, meus sinceros agradecimentos a todos que contribu´ıram, direta ou indiretamente, para a realiza¸c˜ao dessa tese de doutorado. Como foram cinco anos de trabalho, infelizmente, n˜ao vou conseguir me lembrar e nem t˜ao pouco citar nesse peda¸co de papel o nome de todos os envolvidos...
Primeiramente, gostaria de agradecer ao meu marido Miguel, pela paciˆencia, apoio e incentivos constantes durante toda essa jornada. N˜ao posso deixar de agrade-cer tamb´em aos meus amados pais, respons´aveis por tudo isso, e aos meus irm˜aos queridos, incluindo o Andrey.
A todos os professores, funcion´arios e colegas do Departamento de Matem´atica da UFMG, com carinho especial ao Prof. Michel Spira.
`
A Pontif´ıcia Universidade Cat´olica de Minas Gerais, pelo apoio financeiro na reta final desse trabalho. Aos professores e funcion´arios do Departamento de Matem´atica da Universidade Federal de Vi¸cosa, institui¸c˜ao da qual fui docente durante o segundo ano de realiza¸c˜ao dessa tese, pelo apoio. E tamb´em ao CNPq - Conselho Nacional de Pesquisa - pela bolsa recebida no in´ıcio de meu doutoramento.
Resumo
Nesse trabalho, fizemos uma classifica¸c˜ao completa dos grupos indecompon´ıveis fini-tamente gerados, cujo quociente pelo seu centro ´e isomorfo ao produto direto de dois grupos c´ıclicos de ordem prima p. Como aplica¸c˜ao desse resultado, no caso p = 2, classificamos os RA loops indecompon´ıveis finitamente gerados, generalizando as-sim, a classifica¸c˜ao feita em 1995, por C´esar Polcino Milies, Eric Jespers e Guilherme Leal, para o caso finito. Ainda nessa tese, provamos uma extens˜ao do Teorema de Perlis Walker: seG´e um grupo abeliano finitamente gerado eH ´e outro grupo qual-quer com lQG≃ lQH ent˜ao G≃ H. Como consequˆencia desse resultado, estudamos tamb´em o problema do isomorfismo para ´algebras de RA loops sobre os racionais. Mostramos que se L1 e L2 s˜ao RA loops finitamente gerados ent˜ao lQL1 ≃ lQL2 se, e somente se, L1 / L′1 ≃ L2 / L′2 e ∆(L1, L′1) ≃ ∆(L2, L′2), onde L′i ´e o subloop de
Li gerado pelo conjunto de todos comutadores e associadores, e ∆(Li, L′i) ´e o n´ucleo
da aplica¸c˜aolQLi →lQ(LLi′
In this work, we provide a complete classification of finitely generated indecom-posable groups whose quotient by its center is isomorphic to the direct product of two cyclic groups of prime order p. Applying this result to the case p = 2, we classify all the finitely generated indecomposable RA loops, further generalizing the classification done in 1995, by Eric Jespers, Guilherme Leal and C´esar Polcino Milies for the finite case. Still in this thesis, we prove an extension of the Perlis-Walker Theorem: if G is a finitely generated abelian group and H is another group such that lQG ≃ lQH, then G ≃ H. As a consequence of this result, we also study the isomorphism problem for rational RA loop algebras. We show that, if L1 and L2 are finitely generatedRA loops then lQL1 ≃lQL2, if, and only if, L1 / L′
1 ≃ L2 / L′2 and ∆(L1, L′
1)≃∆(L2, L′2) where L′i is the subloop of Li generated by the set of all
commutators and associators and ∆(Li, L′i) is the kernel of the maplQLi →lQ(LLi′
Sum´
ario
Introdu¸c˜ao 2
1 Preliminares 4
1.1 An´eis Alternativos . . . 4
1.2 Loops . . . 8
1.3 Loops de Moufang . . . 10
1.4 Exemplos de Loops de Moufang . . . 11
1.5 An´eis de Loop . . . 13
1.6 RA Loops . . . 15
1.7 Caso Finito . . . 17
2 Classificando Grupos 19 2.1 Teorema da Decomposi¸c˜ao . . . 19
2.2 Teoremas de Classifica¸c˜ao . . . 25
2.3 Classifica¸c˜ao dos Grupos . . . 42
3 Classificando Loops 43 3.1 RA Loops Indecompon´ıveis . . . 43
3.2 Constru¸c˜ao de RA Loops Finitamente Gerados . . . 46
3.3 Teorema de Classifica¸c˜ao . . . 50
3.4 Fam´ılias de Loops N˜ao Isomorfos . . . 54
3.5 Fam´ılias de Loops Indecompon´ıveis . . . 58
4 Sobre Isomorfismos 67 4.1 Caso Finito . . . 67
4.2 Uma extens˜ao do Teorema de Perlis-Walker . . . 69
4.3 Um resultado sobre Isomorfismo . . . 72
Referˆencias Bibliogr´aficas 73
Se usarmos os elementos de um grupo G como base para um m´odulo livre sobre um anel R comutativo, associativo e com unidade, e estendermos a opera¸c˜ao de multiplica¸c˜ao deGpara o m´odulo atrav´es das leis distributivas, obteremos um anel associativo, chamado anel de grupo de G sobre R e denotado por RG. Podemos repetir a mesma constru¸c˜ao, come¸cando com um loop L ao inv´es de um grupo G. A id´eia da n˜ao exigˆencia da associatividade e da constru¸c˜ao de an´eis de loop ou ´algebras de loop, foi devida `a R. H. Bruck. Em 1944, ele publicou um trabalho mostrando que existe uma vers˜ao do Teorema de Maschke num contexto n˜ao as-sociativo. Ele mostrou que sobre um corpo de caracter´ıstica 0, ou caracter´ıstica positiva relativamente prima `a ordem do grupo multiplicativo de um loop finito 1, a ´algebra de loop ´e uma soma direta de ´algebras simples.
Um pouco antes disso, na d´ecada de 30, surgiram dos trabalhos de Ruth Moufang, os an´eis alternativos. S˜ao an´eis n˜ao associativos que satisfazem duas identidades im-portantes: a identidade alternativa `a direita, (yx)x=yx2, e a identidade alternativa `a esquerda,x2y=x(xy). Os estudos de Moufang estavam voltados para a estrutura multiplicativa de um anel de divis˜ao alternativo. Assim como os elementos n˜ao nulos de um corpo formam um grupo multiplicativo, os elementos n˜ao nulos de um anel de divis˜ao alternativo formam um loop de Moufang com a multiplica¸c˜ao.
Nessa tese, estaremos interessados em RA loops, que foram definidos em 1980, por Edgar G. Goodaire, como sendo aqueles loops cuja ´algebra de loop sobre qual-quer anel comutativo, associativo, com unidade e caracter´ıstica diferente de 2 ´e alternativo. A descoberta de que determinada classe de ´algebras de loops satisfazia
1Mult(L) = grupo multiplicativo de um loop L = subgrupo do grupo sim´etrico em L gerado
pelas transla¸c˜oes `a direita e `a esquerda.
3
importantes identidades, como as identidades alternativas `a direita e `a esquerda, tornou o estudo dessas ´algebras bastante significativo.
Em 1986, Orin Chein e Edgar G. Goodaire deram uma descri¸c˜ao completa dos RA loops. Eles mostraram que todos os RA loops podem ser descritos atrav´es de um caso particular de uma constru¸c˜ao conhecida de loops de Moufang. Mostraram tamb´em que os RA loops s˜ao “quase” grupos (eles possuem um subgrupo normal de ´ındice 2) e s˜ao “quase” comutativos (o subloop comutador ´e de ordem 2).
Todo RA loop ´e o produto direto de um RA loop indecompon´ıvel por um grupo abeliano. Em 1995, Eric Jespers, Guilherme Leal e C. Polcino Milies, classificaram os RA loops indecompon´ıveis finitos descrevendo assim completamente a classe dos RA loops finitos. Eles mostraram que qualquer RA loop dessa forma pertence a uma de 7 fam´ılias distintas de loops. Nesse trabalho, generalizaremos as id´eias desses autores e daremos uma descri¸c˜ao completa dos RA loops indecompon´ıveis finitamente gerados. Mostraremos que existem 16 fam´ılias n˜ao isomorfas de tais RA loops.
Preliminares
O objetivo desse cap´ıtulo ´e apresentar algumas defini¸c˜oes b´asicas e tamb´em alguns resultados j´a conhecidos sobre loops, que ser˜ao necess´arios para o entendimento desse trabalho. Todas as demonstra¸c˜oes n˜ao apresentadas nesse cap´ıtulo podem ser encontradas em [7].
1.1
An´
eis Alternativos
Um anel (n˜ao necessariamente associativo) ´e uma tripla (R,+,·) onde (R,+) ´e um grupo abeliano,·´e uma opera¸c˜ao bin´aria fechada emRe valem as leis distributivas: a(b+c) = ab+ac e (a+b)c=ac+bc.
Se al´em disso, (R,+) ´e um m´odulo sobre um anelAcomutativo e associativo tal queα(ab) = (αa)b =a(αb),α∈A,a, b∈R, ent˜ao (R,+,·) diz-se uma ´algebra (n˜ao necessariamente associativa) sobre A.
Duas importantes fun¸c˜oes na teoria de an´eis n˜ao associativos s˜ao ocomutador e oassociador que s˜ao definidas, respectivamente, por:
[a, b] =ab−ba e
[a, b, c] = (ab)c−a(bc).
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 5
SeX, Y, Z s˜ao subconjuntos de R, denotaremos por XY ={xy|x∈X, y ∈Y}, [X, Y] ={[x, y]|x∈X, y ∈Y} e [X, Y, Z] ={[x, y, z]|x∈X, y ∈Y, z ∈Z}.
Defini¸c˜ao 1.1 Um anel R ´e alternativo se
[x, x, y] = 0, identidade alternativa `a esquerda e
[y, x, x] = 0, identidade alternativa `a direita para todos x, y ∈R.
Qualquer anel associativo ´e alternativo, mas a rec´ıproca n˜ao ´e verdadeira. O primeiro exemplo de um anel alternativo que n˜ao ´e associativo foi descoberto por J.T.Graves em 1843 e ´e o anel dos n´umeros de Cayley.
Seja H(IR) = {a+bi+cj+dk | a, b, c, d∈ IR, i, j, k indeterminadas} a ´algebra dos quat´ernios hamiltonianos, com a soma de dois elementos feita coordenada a coordenada e a multiplica¸c˜ao feita atrav´es da distributividade e da tabela abaixo:
· 1 i j k
1 1 i j k
i i −1 k −j j j −k −1 i k k j −i −1
Tabela 1.1: Tabela de multiplica¸c˜ao para 1, i, j, k nos quat´ernios.
O anel dos n´umeros de Cayley ´e o seguinte conjunto:
onde a soma ´e dada por
(a+bl) + (c+dl) = (a+c) + (c+d)l e a multiplica¸c˜ao ´e da seguinte forma
(a+bl)(c+dl) = (ac−db) + (da¯ +b¯c)l,
onde a, b, c, d s˜ao quat´ernios e se q = a1 + a2i +a3j + a4k ∈ H(IR) definimos ¯
q=a1−a2i−a3j −a4k.
Em particular, temos que
bl·dl =−db¯ a·dl= (da)l bl·c= (b¯c)l.
Esse conjuntoCdos n´umeros de Cayley ´e uma ´algebra de divis˜ao n˜ao comutativa, alternativa e n˜ao associativa, de dimens˜ao 8 sobre IR. Na verdade, IR, lC, H(IR) e C
s˜ao as ´unicas ´algebras de divis˜ao alternativas de dimens˜ao finita sobre os n´umeros reais ([7], Corol´ario I.4.13).
Proposi¸c˜ao 1.2 Qualquer anel alternativo tamb´em satisfaz a identidade flex´ıvel [x, y, x] = 0.
Demonstra¸c˜ao: Se trocarmosxporx+zna identidade alternativa `a esquerda, e usarmos o fato de que o associador ´e uma fun¸c˜ao linear de cada um dos seus argumentos, obtemos:
0 = [x+z, x+z, y] = [x, x, y] + [z, x, y] + [x, z, y] + [z, z, y].
Como por hip´otese, o anel ´e alternativo, segue que [x, x, y] = [z, z, y] = 0, o que implica que [x, z, y] =−[z, x, y]. Analogamente, trocando ypor y+z na identidade alternativa `a direita, segue que [x, y, z] = −[x, z, y]. Logo, [x, y, z] = [z, x, y]. Em
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 7
O nome alternativo vem do fato de que em um anel alternativo, o associador ´e uma fun¸c˜ao alternativa, isto ´e, para qualquer permuta¸c˜aoσ de 1,2,3, temos que
[aσ(1), aσ(2), aσ(3)] =sgn(σ)[a1, a2, a3],
ondesgn(σ) =
½
1, seσ ´e par;
−1, caso contr´ario.
Teorema 1.3 Em qualquer anel alternativo, as seguintes identidades s˜ao verdadeiras:
1. [x2, y, z] =x[x, y, z] + [x, y, z]x 2. [xy, x, z] = [y, x, z]x
3. [yx, x, , z] =x[y, x, z]
4. ((xy)x)z =x(y(xz)), identidade de Moufang `a esquerda 5. ((xy)z)y=x(y(zy)), identidade de Moufang `a direita 6. (xy)(zx) = (x(yz))x, identidade de Moufang mediana.
O pr´oximo teorema nos d´a uma outra caracteriza¸c˜ao para os an´eis alternativos.
Teorema 1.4 (Teorema de Artin Generalizado) Se a, b e c s˜ao elementos de um anel alternativo que se associam em alguma ordem, ent˜ao o subanel gerado por a, b, c´e associativo.
Como em um anel alternativox2y =x(xy) eyx2 =x(xy) s˜ao identidades v´alidas, segue o resultado abaixo, que ´e uma consequˆencia direta do teorema anterior e tamb´em uma propriedade fundamental dos an´eis alternativos:
1.2
Loops
Defini¸c˜ao 1.6 Um loop ´e um par (L, .) onde L ´e um conjunto n˜ao vazio, (a, b)7→a·b ´e uma opera¸c˜ao bin´aria fechada em L que possui um elemento identi-dade bilateral 1 e com a propriedade que dados a, c ∈ L existe um ´unico b ∈ L tal quea·b=ce dados b, c∈L existe um ´unico a∈L tal que a·b=c.
Portanto, um loop ´e um conjunto com uma opera¸c˜ao n˜ao necessariamente asso-ciativa, onde todo elemento tem um inverso `a direita e um inverso `a esquerda n˜ao necessariamente iguais. Claramente, todos os grupos s˜ao exemplos de loops. Podemos citar como exemplo de um loop que n˜ao ´e um grupo, o loop de Cayley, denotado porM16(Q8), que ´e um subconjunto do anel dos n´umeros de Cayley,C, definido na se¸c˜ao anterior.
Seja{1, i, j, k, l, il, jl, kl}a base usual dos n´umeros de Cayley. Usando as rela¸c˜oes al·bl=−¯ba
a·bl= (ba)l al·b = (a¯b)l.
para a, b∈ {±1,±i,±j,±k}, obtemos a Tabela 1.2 abaixo:
. 1 i j k l il jl kl
1 1 i j k l il jl kl
i i −1 k −j il −l −kl jl j j −k −1 i jl kl −l −il k k j −i −1 kl −jl il −l
l l −il −jl −kl −1 i j k il il l −kl jl −i −1 −k j jl jl kl l −il −j k −1 −i kl kl −jl il l −k −j i −1
Tabela 1.2: Tabela de Multiplica¸c˜ao para a base dos n´umeros de Cayley
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 9
de um elemento s˜ao iguais e a multiplica¸c˜ao ´e n˜ao associativa pois (ik)l=−jl
i(kl) =jl.
Daqui em diante, omitiremos a nota¸c˜ao da opera¸c˜ao bin´aria do loopLe escreve-remos apenas “o loop L” ao inv´es de “o loop (L,·)”. Tamb´em, a partir de agora, escreveremosab ao inv´es de a.b para denotar o produto dos elementos a e b de um loop. E para expressarmos o produto n˜ao necessariamente associativo de mais de dois elementos de um loop, usaremos parˆenteses e pontos para indicar a ordem da multiplica¸c˜ao; por exemplo, (a.xy)b indicar´a o produto (a(xy))b.
Defini¸c˜ao 1.7 Sejam a, b e c elementos de um loop L. O comutador de a e b ´e o ´
unico elemento (a, b) de L tal que
ab= (ba)(a, b)
e o associador de a, b e c´e o ´unico elemento (a, b, c) de L tal que (ab)c= (a.bc)(a, b, c).
SeX, Y eZ s˜ao subconjuntos de um loopL, denotaremos por (X, Y) e (X, Y, Z), respectivamente, o conjunto de todos os comutadores da forma (x, y) e todos os associadores da forma (x, y, z) onde x∈X, y ∈Y ez ∈Z.
Um subloopHde um loop L´e um subconjunto deLque com a opera¸c˜ao bin´aria de L ´e tamb´em um loop. Como, para h ∈ H, a equa¸c˜ao hx = h tem uma ´unica solu¸c˜ao emL, segue que os elementos identidade de H e L s˜ao iguais.
Defini¸c˜ao 1.8 O subloop comutador-associador de um loop L ´e o subloop
L′ =<(L, L, L),(L, L)>
1.3
Loops de Moufang
As pr´oximas defini¸c˜oes est˜ao relacionadas com a classe de loops que discutiremos nesse trabalho.
Defini¸c˜ao 1.9 Um loop L tem a propriedade do inverso se todo x ∈ L tem um ´
unico inverso bilateral, que denotaremos por x−1, e se, todos x, y ∈L satisfazem
x−1(xy) = y, propriedade do inverso `a esquerda e
(yx)x−1 =y, propriedade do inverso `a direita.
Observe que o loop de Cayley, citado no in´ıcio da se¸c˜ao anterior, ´e um exemplo de um loop que possui a propriedade do inverso.
O resultado abaixo ´e essencial para a pr´oxima defini¸c˜ao e sua demonstra¸c˜ao pode ser encontrada em [7].
Teorema 1.10 Em qualquer loop as seguintes identidades s˜ao equivalentes:
1. ((xy)x)z =x(y(xz)), identidade de Moufang `a esquerda 2. ((xy)z)y=x(y(zy)), identidade de Moufang `a direita 3. (xy)(zx) = (x(yz))x, identidade de Moufang mediana.
Se L ´e um loop satisfazendo qualquer uma dessas identidades acima, ent˜ao L tem a propriedade do inverso e tamb´em satisfaz:
(yx)x = yx2, identidade alternativa `a direita x(xy) = x2y, identidade alternativa `a esquerda (xy)x = x(yx), identidade flex´ıvel.
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 11
O nome Moufang ´e em homenagem `a Ruth Moufang, que foi quem introduziu esses loops em um artigo sobre geometria em 1935 ([13]).
Portanto, em um loop de Moufang, todo elemento possui um ´unico inverso bi-lateral e as seguintes identidades s˜ao verdadeiras:
• x−1(xy) = y
• (yx)x−1 =y
• ((xy)x)z =x(y(xz))
• ((xy)z)y=x(y(zy))
• (xy)(zx) = (x(yz))x
• (yx)x=yx2
• x(xy) = x2y
• (xy)x=x(yx).
1.4
Exemplos de Loops de Moufang
Como o anel dos n´umeros de Cayley,C, definido na primeira se¸c˜ao desse cap´ıtulo, ´e um anel alternativo, segue pelo Teorema 1.3 que esse anel satisfaz as identidades de Moufang. O loop de Cayley,M16(Q8), ´e um subconjunto deC e, portanto, M16(Q8) ´e um loop de Moufang.
Veremos agora outros importantes exemplos de loops de Moufang, que n˜ao s˜ao grupos, com os quais iremos trabalhar.
Sejam G um grupo n˜ao abeliano, go ∈ G um elemento central, g 7→ g∗ uma
involu¸c˜ao (antiautomorfismo de ordem 2) de G tal que go∗ = go e gg∗ pertence ao
opera¸c˜ao bin´aria deG para L da seguinte forma: g(hu) = (hg)u
(gu)h = (gh∗)u (gu)(hu) = goh∗g
para todog, h∈G. Denotaremos Lpor M(G,∗, go).
Proposi¸c˜ao 1.12 M(G,∗, go) com a opera¸c˜ao definida acima ´e um loop de
Moufang.
Demonstra¸c˜ao:Claramente a opera¸c˜ao bin´aria definida acima ´e fechada em L e possui 1G como elemento identidade bilateral.
Dados gu, hu ∈L existe um ´unico elemento x ∈ L tal que gu.x =hu. De fato, basta tomarx= (g−1h)∗. Agora, dadosgu, h∈L, o elementox= (hg
o−1g−1)∗u´e tal
quegu.x=h. Se g, hu∈L ent˜ao tomando x= (hg−1)u segue que g.x=hu. Logo, mostramos que dadosa, c∈Lexiste um ´unicob∈Ltal quea.b=c. Analogamente, conseguimos mostrar que dados b, c ∈ L existe um ´unico a ∈ L tal que a.b = c. Portanto L = M(G,∗, go) ´e um loop. Observe que L n˜ao ´e um grupo, pois, caso
contr´ario, para quaisquer g, h ∈ G ter´ıamos (gh)u = g(hu) = (hg)u, o que implica em gh = hg. Portanto, G seria um grupo abeliano, o que contradiz nossa escolha deG.
Vamos mostrar agora que a identidade 1 do Teorema 1.10 ´e verdadeira em L. Para tal, calcularemos ambos os lados da referida igualdade e mostraremos que esses lados s˜ao iguais. Temos duas possibilidades para cada elemento: x =g ou x=gu, y = h ou y = hu e z = m ou z = mu, o que nos d´a um total de 8 possibilidades de identidades que ter´ıamos que mostrar que s˜ao verdadeiras. Mostraremos para 3 casos, pois todas as outras s˜ao an´alogas.
Suponhamos primeiramente que x=gu, y =hu e z =mu. Assim,
((gu . hu)gu)mu= (goh∗g . gu)mu= (ggoh∗g)u . mu=gom∗ggoh∗g =go2m∗gh∗g
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 13
Agora, suponhamos x=gu, y =h e z =mu. Ent˜ao,
((gu . h)gu)mu= ((gh∗)u . gu)mu = (gog∗gh∗)u . mu= (mgog∗gh∗)u
gu(h(gu . mu)) =gu(hgom∗g) = g(hgom∗g)∗u= (gg∗mgo∗h∗)u
Como gg∗ ´e central e g
o∗ = go, segue que g comuta com g∗ e, portanto, as duas
equa¸c˜oes acima s˜ao iguais.
Sex=gu, y =h e z =m, temos que:
((gu . h)gu)m = ((gh∗)u . gu)m=gog∗gh∗m
gu(h(gu . m)) =gu(h .(gm∗)u) = gu .(gm∗h)u=go(gm∗h)∗g =goh∗mg∗g.
Lembrando novamente quegg∗ ´e central em G, obtemos a igualdade. ¥
Loops de Moufang desse tipo foram descobertos por Orin Chein ([3]). O menor loop de Moufang que n˜ao ´e um grupo ´e o M(S3,∗,1), onde S3 ´e o grupo sim´etrico de ordem 6 e a involu¸c˜ao emS3 dada por g∗ =g−1 para todo g ∈S3 ([2]). Podemos notar que seQ8´e o grupo dos quat´ernios de ordem 8, ent˜ao M(Q8,−1,−1) ´e o loop dos n´umeros de Cayley.
1.5
An´
eis de Loop
Defini¸c˜ao 1.13 O anel de loop de L com coeficientes em um anel R, denotado por RL, ´e o R-m´odulo livre de base L com multiplica¸c˜ao dada pela extens˜ao da multiplica¸c˜ao de L atrav´es das leis distributivas.
Assumiremos que o anel dos coeficientes R tem unidade e identificaremos o elemento 1l deRL com o elementol do loopL. Dessa forma, podemos pensar em L como subconjunto de RL e o elemento identidade de L ´e o elemento identidade desse anel de loop RL.
Os elementos deRL s˜ao da forma RL ={X
l∈L
com as opera¸c˜oes de soma e multiplica¸c˜ao dadas por
X
l∈L
αll+
X
l∈L
βll =
X
l∈L
(αl+βl)l
(X
l∈L
αll)(
X
l∈L
βll) =
X
l∈L
(X
hk=l
αhβk)l.
O resultado abaixo fornece condi¸c˜oes equivalentes para que o anel de loop de L = M(G,∗, go), o loop de Moufang que constru´ımos na se¸c˜ao anterior, seja um
anel alternativo.
Teorema 1.14 Seja R um anel comutativo, associativo e com unidade e seja L=M(G,∗, go) um loop de Moufang constru´ıdo a partir de um grupo n˜ao abeliano
G, conforme a se¸c˜ao anterior. S˜ao equivalentes:
1. RL satisfaz a identidade alternativa `a esquerda, [x, x, y] = 0. 2. RL satisfaz a identidade alternativa `a direita, [y, x, x] = 0. 3. g+g∗ pertence ao Z(RG), o centro de RG, para cada g ∈G.
4. Se car(R) 6= 2, ent˜ao para cada g ∈ G, h−1
gh ∈ {g, g∗} para todo h ∈ G; se
car(R) = 2, ent˜ao, para cada g ∈G, ou g =g∗ ou h−1gh∈ {g, g∗} para todo
h∈G.
Nessa tese, trabalharemos somente com an´eis de loopRL, onde o anel dos coefi-cientesR tem caracter´ıstica diferente de 2. Assim, de acordo com o teorema acima, fixaremos nossa aten¸c˜ao nos grupos G n˜ao abelianos que possuem uma involu¸c˜ao g 7→g∗ tal que h−1gh∈ {g, g∗}, para todo g, h∈G. Assim, estaremos encontrando
condi¸c˜oes suficientes para queRL com L=M(G,∗, go), seja um anel alternativo.
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 15
Observe que essa defini¸c˜ao implica que quadrados s˜ao sempre centrais em um loop de Moufang que satisfaz a propriedadeLC. Portanto, os comutadores tamb´em s˜ao centrais nesses loops, pois (x, y) =x−2(xy−1)2y2.
Caracterizaremos agora os gruposG, n˜ao abelianos, que possuem uma involu¸c˜ao satisfazendo a alternativa (4) do Teorema 1.14, no caso de caracter´ıstica diferente de 2.
Teorema 1.16 Seja G um grupo n˜ao abeliano. As seguintes afirma¸c˜oes s˜ao equivalentes:
1. G tem uma involu¸c˜ao g 7→ g∗ com a propriedade que h−1gh ∈ {g, g∗} para
todos g, h∈G.
2. G tem a propriedade LC e um ´unico comutador n˜ao identidade.
3. G/Z(G)≃C2×C2, ondeZ(G) ´e o centro do grupoG eC2 ´e um grupo c´ıclico de ordem 2.
Para tais grupos G, a involu¸c˜ao ´e dada por g∗ =
½
g, se g ´e central;
sg, caso contr´ario. onde s ´e o ´unico comutador n˜ao identidade de G.
Vimos na se¸c˜ao anterior que se G ´e n˜ao abeliano ent˜ao o loop de Moufang L=M(G,∗, go) ´e n˜ao associativo e portanto,RL´e tamb´em n˜ao associativo. Usando
os Teoremas 1.14 e 1.16 o Corol´ario abaixo ´e imediato.
Corol´ario 1.17 Seja R um anel comutativo, associativo, com unidade e carac-ter´ıstica diferente de 2. SejaL o loop M(G,∗, go)onde G´e um grupo n˜ao abeliano,
g 7→g∗ ´e uma involu¸c˜ao emG, e g
o ´e algum elemento central de G. Ent˜ao o anel de
loopRL´e um anel alternativo e n˜ao associativo se, e somente se,G/Z(G)≃C2×C2. Nesse caso, a involu¸c˜ao em G´e dada como no Teorema 1.16.
1.6
RA Loops
Defini¸c˜ao 1.18 Um RA loop ´e um loop L cujo anel de loop RL sobre um anel R comutativo, associativo, com unidade e caracter´ıstica diferente de 2, ´e alternativo, mas n˜ao associativo.
O nome RA loop deriva das iniciais das palavras em inglˆes Ring Alternative loop.
Como um anel alternativo satisfaz as identidades de Moufang e o anel de loop RL contem o loop L, segue que todo RA loop ´e um loop de Moufang. Al´em disso, temos o seguinte resultado que ser´a muito usado posteriormente.
Proposi¸c˜ao 1.19 Se L ´e um RA loop ent˜ao
• L′ =<(L, L),(L, L, L) >, o subloop comutador-associador de L, ´e um grupo
central de ordem 2.
• L tem a propriedade LC.
O ´ultimo resultado dessa se¸c˜ao nos mostra que os loops da forma M(G,∗, go)
introduzidos na Se¸c˜ao 1.4 como exemplos de loops de Moufang, descrevem, na ver-dade, toda a classe de RA loops.
Teorema 1.20 (Descri¸c˜ao de um RA loop) Se L ´e um RA loop com subloop comutador-associador L′ ={1, s}, ent˜ao L=M(G,∗, g
o), onde G ´e qualquer grupo
contendo o centro de L e dois elementos n˜ao comutativos de L, go ´e um elemento
central de G e a involu¸c˜ao g 7→g∗ ´e definida por
g∗ =
½
g, se g ∈Z(G); sg, se g /∈Z(G).
Reciprocamente, para qualquer grupo n˜ao abeliano G com a propriedade LC, um ´
unico comutador n˜ao identidade s, uma involu¸c˜ao ∗, o loop M(G,∗, go) ´e um RA
loop para qualquer go∈Z(G), onde ∗ ´e dada como acima.
CAP´ITULO 1. PRELIMINARES 17
1.7
Caso Finito
Em 1995, Eric Jespers, Guilherme Leal e C. Polcino Milies classificaram os grupos finitosG tais que G/Z(G)≃C2×C2, onde Z(G) denota o centro do grupoG e C2 ´e um grupo c´ıclico de ordem 2.
Teorema 1.21 Existem apenas 5 tipos de grupos G finitos e indecompon´ıveis tais queG/Z(G)≃C2×C2, a saber:
1. G1 =< x, y, t1 |x2 =y2 =t12
m1
= 1> 2. G2 =< x, y, t1 |x2 =y2 =t1, t12
m1
= 1 > 3. G3 =< x, y, t1, t2 |x2 =t12m1
=t22m2
= 1, y2 =t2 > 4. G4 =< x, y, t1, t2 |x2 =t1, y2 =t2, t12m1
=t22m2
= 1> 5. G5 =< x, y, t1, t2, t3 |x2 =t2, y2 =t3, t12m1
=t22m2
=t32m3
= 1> onde s= [x, y] =t12m1−1
, t1, t2, t3 s˜ao centrais, m1, m2, m3 ≥1.
Como consequˆencia do resultado acima, os autores obtiveram a classifica¸c˜ao dos RA loops indecompon´ıveis finitos.
Teorema 1.22 Qualquer RA loop finito indecompon´ıvel pertence a uma das sete classes listadas abaixo que s˜ao n˜ao isomorfas duas a duas.
1. L1 =< x, y, t1, u|x2 =y2 =u2 =t12
m1
= 1> 2. L2 =< x, y, t1, u|x2 =y2 =u2 =t1, t12
m1
= 1 > 3. L3 =< x, y, t1, t2, u|x2 =u2 = 1, y2 =t2, t12
m1
=t22m2
= 1 > 4. L4 =< x, y, t1, t2, u|x2 =u2 =t1, y2 =t2, t12
m1
=t22m2
= 1> 5. L5 =< x, y, t1, t2, t3, u|x2 =t2, y2 =t3, u2 = 1, t12
m1
=t22m2
=t32m3
= 1> 6. L6 =< x, y, t1, t2, t3, u|x2 =t2, y2 =t3, u2 =t1, t12
m1
=t22m2
=t32m3
7. L7 =< x, y, t1, t2, t3, u, w | x2 = t2, y2 = t3, u2 = w, w2
r
= 1, t12m1
= t22m2
= t32m3
= 1>
ondet1, t2, t3, w s˜ao centrais e m1, m2, m3, r ≥1.
Cap´ıtulo 2
Classificando Grupos
Vimos no cap´ıtulo anterior, que para atingirmos nosso objetivo de classificar os RA loops indecompon´ıveis finitamente gerados, ´e necess´ario classificar os grupos finitamente gerados cujo quociente pelo seu centro ´e isomorfo ao produto direto de dois grupos c´ıclicos finitos de ordem dois. Nesse cap´ıtulo faremos uma classifica¸c˜ao um pouco mais geral: vamos descrever todos os grupos finitamente gerados cujo quociente pelo seu centro ´e isomorfo ao produto direto de dois grupos c´ıclicos de ordemp, onde p´e um inteiro primo qualquer.
2.1
Teorema da Decomposi¸c˜
ao
Seja G um grupo finitamente gerado com centro denotado por Z(G). Nessa se¸c˜ao mostraremos que seG/Z(G)≃Cp×Cp, onde Cp denota um grupo c´ıclico de ordem
primap, ent˜aoGse decomp˜oe de uma maneira bem particular. Antes, precisaremos de dois lemas.
Lema 2.1 ([11], Lema 1.1) Seja G um grupo tal que G/Z(G)≃Cp×Cp. Ent˜ao
o subgrupo comutador G′ =h[x, y]|x, y ∈Gi ´e c´ıclico de ordem p.
Demonstra¸c˜ao: Considere x, y, z ∈ G. Denotando o comutador de x e y por [x, y] =x−1y−1xy e a conjuga¸c˜ao por [x, y]z
=z−1x−1y−1xyz, ´e f´acil ver que:
[x, y] = [y, x]−1 (2.1)
[xy, z] = [x, z]y[y, z] e [x, yz] = [x, z][x, y]z. (2.2) Como, por hip´otese,G/Z(G) ´e abeliano, segue que G′ ⊂Z(G) e, nesse caso:
[xy, z] = [x, z][y, z] e [x, yz] = [x, z][x, y]. (2.3)
Se G/Z(G) ≃ Cp ×Cp ent˜ao existem x, y ∈ G tais que G = hx, y, Z(G)i com
xp, yp ∈ Z(G). Portanto, G′ = h[xnymai, xrysbj] | a, b ∈ Z(G), n, m, r, s, i, j ∈ INi.
Mas, pela equa¸c˜ao (2.3) acima, segue que [xnymai, z] = [xnym, z][ai, z] = [xnym, z],
poisai ∈Z(G). Logo, podemos escrever:
G′ =h[xnym, xrys]|0≤n, m, r, s < pi
Usando as equa¸c˜oes (2.1) e (2.3) novamente, obtemos:
[xnym, xrys] = [xn, xrys][ym, xrys] = [xn, ys][xn, xr][ym, ys][ym, xr] = [x, y]ns[xn, xr][ym, ys][y, x]mr
= [x, y]ns[xn, xr][ym, ys][x, y]−mr Agora, [xn, xr] = [x, x]nr
= 1 e [ym, ys] = [y, y]ms
= 1. Ent˜ao, [xnym, xsyr] = [x, y]ns
[x, y]−mr = [x, y]ns−mr o que implica queG′ ´e c´ıclico, gerado por [x, y].
E, comoyp ∈Z(G), segue que [x, yp] = [x, y]p
= 1. Assim, |G′ |=p. ¥
Lema 2.2 Seja U um grupo abeliano livre de posto n. Ent˜ao todo subgrupo V 6= 0 de U tamb´em ´e livre de posto k ≤n. Al´em disso, existem bases {u1, u2, . . . , un} de
U e {v1, v2, . . . , vk} de V, tais que vi =uǫii para algum inteiro positivo ǫi.
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 21
Teorema 2.3 Um grupo finitamente gerado G ´e tal que G/Z(G) ≃ Cp ×Cp se,
e somente se, G pode ser escrito na forma G = H × K onde K ´e um grupo abeliano finitamente gerado e H ´e um grupo n˜ao abeliano indecompon´ıvel tal que H = hx, y, Z(H)i, onde Z(H), o centro de H, pode ser escrito como Z(H) = ht1i × hz2i × hz3i, com o(t1) = pm1, m1 ≥ 1 e o(z
i) = pmi, mi ≥ 0
ou o(zi) = ∞, i = 2,3, s = [x, y] = x−1y−1xy = tp
m1−1
1 , xp ∈ ht1i × hz2i, yp ∈ ht1i × hz2i × hz3i.
Demonstra¸c˜ao: Suponhamos primeiramente que G/Z(G) ≃ Cp×Cp. Logo,
existem elementos x, y ∈ G tais que G = hx, y, Z(G)i, com xp, yp ∈ Z(G). Como
Z(G) ´e um grupo abeliano finitamente gerado, podemos escreverZ(G) = A×B×F ondeA ´e um p-grupo, p n˜ao divide |B| eF ´e o produto direto de um n´umero finito de grupos c´ıclicos de ordem infinita.
Podemos assumir que xp, yp ∈ A × F. De fato, suponha que xp = hb com
h ∈ A×F e b ∈ B, bn = 1. Como a aplica¸c˜ao g 7→ gp ´e um automorfismo de B,
podemos encontrar um elementoγ ∈B tal que γp =bn−1. Fazendo x′ =γx vemos
que x′p
= (γx)p = γpxp =bn−1hb= h ∈A×F. Analogamente podemos encontrar y′ tal que G=hx′, y′, Z(G)i e x′p
, y′p ∈A×F.
Assim, supondo G = hx, y, A×Fi ×B, com xp, yp ∈ A×F, temos pelo Lema
2.1 que G′ = hsi ⊂ Z(G) ´e um p-grupo, donde s ∈ A. Encontraremos agora uma
decomposi¸c˜ao de A na qual s= [x, y] perten¸ca ao primeiro fator.
Seja A = ht1i × ht2i ×. . .× htki, com o(ti) = pmi, uma decomposi¸c˜ao de A na
quals se escreve como um produto com um n´umero m´ınimo de fatores, digamos s=ta1
1 t
a2
2 . . . t
al
l
com l≤k. Como
1 = sp =tpa1
1 . . . t
pal
l =t pm1
1 . . . t
pml
l
segue pela escolha da decomposi¸c˜ao queai =pmi−1 e
s =tp1m1−1. . . tplml−1. Suponhal >1 e m1 ≥m2. Ent˜ao,
A=ht1i × ht2i ×. . .× htki=ht1i × ht pm1−m2
com s ∈ htp1m1−m2t2i × . . .× htki j´a que s = (tp
m1−m2
1 t2)p
m2−1
. . . tplml−1. Mas isso contradiz nossa escolha da decomposi¸c˜ao deA. Portanto, l = 1 e s=t1pm1−1 ∈ ht1i.
Sejaxp =ta1
1 ta22. . . t
ak
k f ondef ∈F. Sepdivide ai ent˜aotaii n˜ao ´e um gerador de
htiidondeti−ai tamb´em n˜ao ´e gerador. Logo, podemos substituirxporx′ =xt
−ai p
i de
tal forma quex′p
n˜ao tenha componente emhtii. Repetindo esse processo, podemos
assumir que xp =ta1
1 t
a2
2 . . . tammf onde ht ai
i i=htiie o(t2)≥o(t3)≥. . .≥o(tm).
Sef = 1, ent˜aoxp =ta1
1 ta22. . . tamm e
ht2i × ht3i ×. . .× htmi=hta22i × ht
a3
3 i ×. . .× ht
am
m i=
=hta2
2 t
a3
3 . . . tammi × ht a3
3 i ×. . .× htammi.
Trocando t2 por ta2
2 . . . tamm, obtemos xp ∈ ht1i × ht2i.
Se f 6= 1, xp = ta1
1 t
a2
2 . . . tammf, denote t a2
2 . . . t
ak
k f por f′. Assim, xp ∈
ht1i × hf′i, hf′i ⊆ F. Pelo Lema 2.2, existe uma base {u1, u2, . . . , u
l} para F e
outra base{v1} para hf′ital que v1 =uα
1 para algum α∈IN. Lembre-se que
Z(G) = ht1i × ht2i ×. . .× htki × hu1i × hu2i ×. . .× huli
e reordenando, se necess´ario, podemos escrever
Z(G) = ht1i × hu1i × ht2i ×. . .× htki × hu2i ×. . .× huli
ondexp ∈ ht1i × hu1i, o(u1) =∞.
Em ambos os casosxp pertence no m´aximo aos primeiros dois fatoresht1i × hz2i
deZ(G).
Suponha agora que xp ∈ ht1i × ht2i, o(t
i) = pmi, i = 1,2. An´alogo ao que
fizemos comxp, podemos assumir que yp =tb1
1 t
b2
2 t
b3
3 . . . tbnnfy onde todos os tibi’s s˜ao
geradores do subgrupo htii. Reordenando, se necess´ario, podemos tamb´em supor
queo(t3)≥o(t4)≥. . .≥o(tn).
Sefy = 1 ent˜ao yp =tb11t2b2tb33. . . tbnn e
ht3i × ht4i ×. . .× htni=htb33i × ht
b4
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 23
=htb3
3 t
b4
4 . . . tbnni × ht b4
4 i ×. . .× htbnni.
Trocando t3 por tb33t
b4
4 . . . tbnn conclu´ımos queyp ∈ ht1i × ht2i × ht3i.
Mas, se fy 6= 1, denotamos tb33t4b4. . . tbnnfy por fy′; assim, yp ∈
ht1i × ht2i × hf′
yi. Novamente, por 2.2, existe uma base{u1, u2, . . . , ul}paraF e uma
base {v} para hf′
yi tal que v =u β
1 para algumβ ∈IN. Logo, yp ∈ ht1i × ht2i × hu1i e reordenandoZ(G) temos yp pertencendo no m´aximo aos trˆes primeiros fatores de
Z(G).
Agora suponha xp ∈ ht1i × hu1i, com o(u1) = ∞,
Z(G) =ht1i × hu1i × ht2i ×. . .× htki × hu2i ×. . .× huli.
Escrevemos ent˜aoyp =tb1
1 u
β1
1 t
b2
2 . . . tbnnfy ondefy ∈ hu2i × hu3i ×. . .× hulie
reorde-nando, se necess´ario, podemos supor queo(t2)≥o(t3)≥. . .≥o(tn).
Sefy = 1 trocamos o gerador t2 deZ(G) portb22. . . tbnn. Como
ht2i ×. . .× htni=ht2b2i ×. . .× htbnni=
=htb2
2 . . . tbnni × ht b3
3 i ×. . .× htbnni
segue queyp ∈ ht1i × hu1i × ht2i.
Sefy 6= 1, denotamos tb22. . . tbnnly por fy′ onde fy′ ∈F. Escrevemos
fy′ =uα
1.fy′′
com hf′′
yi ⊆ hu2i × hu3i ×. . .× huli. Logo existe uma base {v2, v3, . . . , vl} para o
grupo livre hu2i ×. . .× huli e uma base {w} para hfy′′i tal que w =v γ
2 para algum γ ∈IN. Portanto, yp ∈ ht1i × hu1i × hv2i.
Mostramos que em qualquer caso, yp ∈ ht1i × hz2i × hz3i. Consequentemente,
podemos escrever
G=hx, y,ht1i × hz2i × hz3ii ×K
onde K ´e um grupo abeliano finitamente gerado, o(t1) = pm1, o(z
i) = pmi ou ∞,
i= 2,3,s = [x, y] =t1pm1−1, xp ∈ ht
1i × hz2i e yp ∈ ht1i × hz2i × hz3i.
De acordo com o teorema acima, se G´e um grupo indecompon´ıvel, finitamente gerado comG/Z(G)≃Cp×Cp, ent˜ao G=hx, y, Z(G)i onde
• Z(G) = ht1i × hz2i × hz3i,
• o(t1) = pm1,m1 ≥1,o(z
i) =pmi,mi ≥0, ou o(zi) = ∞,i= 2,3,
• s = [x, y] =tp1m1−1,
• xp =tα1
1 z
α2
2 ,αi ≥0,i= 1,2
• yp =tβ1
1 z
β2
2 z
β3
3 , βj ≥0, j = 1,2,3.
Lema 2.4 Usando a nota¸c˜ao acima, podemos supor que os expoentes αi, i= 1,2 e
βj, j = 1,2,3 pertencem a {0,1,2, . . . , p−1}.
Demonstra¸c˜ao: Suponha que wα ´e um fator de xp,w∈ {t
1, z2}.
Seo(w) =pmi ent˜ao troquexporx′ =
(
xwpmip−α, se α´e m´ultiplo de p ;
xwpmi−q, se α=pq+r, r ∈ {1,2, . . . , p−1}.
Seo(w) = ∞, troque x porx′ =
½
xw−pα, se α´e m´ultiplo de p ;
xw−q, se α=pq+r, r ∈ {1,2, . . . , p−1}.
Note que, em ambos os casos, seα ´e m´ultiplo dep ent˜ao x′p n˜ao contemwα e se
α n˜ao ´e m´ultiplo de p ent˜ao x′p contem um fatorwr, onde α=pq+r.
Repetindo esse processo tamb´em para os fatores de yp, podemos escolher
ele-mentos x′, y′ ∈G tais que α
i, βj ∈ {0,1, . . . , p−1}. ¥
Na pr´oxima se¸c˜ao, faremos uso indiscriminado desse lema in´umeras vezes e tamb´em do seguinte lema, cuja demonstra¸c˜ao ´e imediata por indu¸c˜ao.
Lema 2.5 Sejam x, y dois elementos n˜ao comutativos de um grupo G tais que [x, y]∈Z(G). Ent˜ao
(xayb)m =xmaymbsm(m−21)ab
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 25
Como caso particular do lema acima, temos que (xy)p =xpypsp(p2−1). Portanto,
sep= 2, (xy)2 =x2y2s=x2y2t2m1−1
1 e se p6= 2 ent˜ao (xy)p =xpyp, pois pelo Lema 2.1, sp = 1.
2.2
Teoremas de Classifica¸c˜
ao
Veremos nesta se¸c˜ao que qualquer grupo indecompon´ıvel finitamente gerado satis-fazendo a propriedade de que G/Z(G) ≃ Cp × Cp, pertence a um de nove tipos
distintos de grupos.
Na se¸c˜ao anterior, mostramos que o posto do centro de tais grupos ´e no m´aximo trˆes. Portanto, para descrever tais tipos de grupos, consideraremos separadamente essas trˆes possibilidades para o centro.
Teorema 2.6 Seja G um grupo indecompon´ıvel finitamente gerado e tal que G/Z(G) ≃ Cp ×Cp. Se posto (Z(G)) = 1, ent˜ao G pertence a um dos dois tipos
abaixo:
Tipo 1=hx, y, t1 |xp =yp =tpm1
1 = 1i Tipo 2=hx, y, t1 |t1pm1 = 1, xp =yp =t1i
onde, em cada caso, t1 ´e central, m1 ≥1 e s = [x, y] =tp1m1−1.
Denotaremos por Gi a fam´ılia de todos os grupos do Tipo i, i= 1,2.
Demonstra¸c˜ao: Suponha que G = hx, y, Z(G)i com Z(G) = ht1i e xp, yp ∈
Z(G). Pelo Teorema 2.3 segue que o(t1) = pm1. Nesse caso, G ´e finito e podemos
supor quexp = t
1a, yp =t1b com a, b ∈ {0,1, . . . , p−1}. Se p = 2, j´a foi mostrado em [[9], Proposi¸c˜ao 3.2] que G ∈ G1 ou G ∈ G2. Podemos supor, portanto, p 6= 2. Se a = b = 0 ent˜ao G ∈ G1 e se a = b = 1 segue que G ∈ G2. Se a = 0 e b 6= 0, troque x por x′ = xy; assim, (x′)p = (xy)p = xpyp = t1b. Se b = 1, temos que
G ∈ G2 e se b ∈ {2,3, . . . , p−1}, temos um caso particular de xp = t1a, yp = t1b com a, b ∈ {2,3, . . . , p−1}. Nesse ´ultimo caso trocamos x por x′ = xyn onde n ´e
tal que a+nb≡1 (mod p). Dessa forma, podemos supor que (x′)p =t1 e yp =t1b.
Agora, trocamosy pory′ = (x′)my onde m´e tal que b+m≡1 (mod p). Segue que
G=hx′, y′, Z(G)i com (x′)p = (y′)p =t1, o que implica que G∈ G
Observe que a troca de geradores feita acima ´e poss´ıvel pois,
G=hx, y, Z(G)i=hxy, y, Z(G)i=hxy2, y, Z(G)i=. . .=hxyn, y, Z(G)i
=hx′, y, Z(G)i=hx′, x′y, Z(G)i=hx′, x′2y, Z(G)i=. . .=hx, x′my, Z(G)i
ondex′ =xyn.
Proposi¸c˜ao 2.7 As fam´ılias G1 e G2 do Teorema 2.6 s˜ao fam´ılias de grupos in-decompon´ıveis. Al´em disso, grupos em fam´ılias diferentes n˜ao s˜ao isomorfos entre si.
Demonstra¸c˜ao: Seja G ∈ G1 ou G2 e suponhamos G decompon´ıvel. Pelo Teorema 2.3 segue queG=H×K, comHum grupo n˜ao abeliano, indecompon´ıvel, de centro n˜ao trivial eK um grupo abeliano. Logo,Z(G) = Z(H)×K o que implica queK ={1} pois posto (Z(G)) = 1. Portanto, G=H ´e indecompon´ıvel.
Suponhamos agora G1 = hx, y, t1 | xp = yp = t1pm1
= 1i ∈ G1 e G2 = hx, y, t1 | xp = yp = t1, t1pm′1
= 1i ∈ G2 com G1 ≃ G2. Como os elemen-tos de G1 ou G2 s˜ao da forma xaybt1c com xi e yj ∈ ht1i para i, j ≥ p, segue que
| G1 |= pm1+2 e | G2 |= pm′1+2. Mas, como estamos supondo G1 ≃ G2, segue que
m1 =m′1. Agora, note que exp(Z(G1)) =pm1 e exp(Z(G2)) = pm1+1, um absurdo.
Portanto, G1 6≃G2. ¥
Antes de estudarmos as outras duas possibilidades para o posto do centro de G, mostraremos o seguinte lema:
Lema 2.8 Seja G =hx, y, Z(G)i = H×K, onde xp, yp ∈ Z(G) e H, K s˜ao como
no Teorema 2.3. Ent˜ao existem y1, y2 ∈ H tais que y1 = yz e y2 = xz′ onde
z, z′ ∈Z(G).
Demonstra¸c˜ao: ComoG/Z(G)≃Cp×Cp e|Cp×Cp |=p2, podemos escrever
Gcomo a uni˜ao disjunta de classes laterais da forma xiyjZ(G), com 0≤i, j ≤p−1.
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 27
Considere ent˜aoxaybz1 e xnymz2 pertencentes a H onde z1, z2 ∈Z(G).
(xaybz1).(xnymz2) = xa+nyb+mz1z2sbn (xnymz1).(xaybz2) = xn+aym+bz1z2sam.
Como esses dois elementos n˜ao comutam, segue que am−bn 6≡ 0 (mod p). Portanto, o sistema linear abaixo tem solu¸c˜ao:
½
aα+nβ ≡0 (mod p) bα+mβ ≡1 (mod p). Logo existem α, β ∈IN tais que
y1 = (xaybz1)α.(xnymz2)β =yz ondez ∈Z(G). (Lembre-se de que s, xp eyp s˜ao centrais!)
Analogamente, existem α′, β′ ∈IN tais que
y2 = (xaybz1)α′
.(xnymz2)β′ =xz′
ondez′ ∈Z(G). ¥
Agora sim, veremos primeiro o que acontece quando o posto do centro de G ´e igual a 2.
Teorema 2.9 Seja G um grupo indecompon´ıvel, finitamente gerado e tal que G/Z(G) ≃ Cp ×Cp. Se posto (Z(G)) = 2, ent˜ao G pertence a um dos quatro
tipos abaixo:
Tipo 3=hx, y, t1, t2 |tp1m1 =tp2m2 = 1, xp = 1, yp =t2i
Tipo 4=hx, y, t1, t2 |tp1m1 =t2pm2 = 1, xp =t1, yp =t2i
Tipo 5=hx, y, t1, u1 |t1pm1 = 1, xp = 1, yp =u1i
Tipo 6=hx, y, t1, u1 |t1pm1 = 1, xp =t1, yp =u1i
Demonstra¸c˜ao: Suponhamos que G =hx, y, Z(G)i com Z(G) =ht1i × hz2i e xp, yp ∈Z(G). Pelo Teorema 2.3, segue queo(t1) =pm1 eo(z2) =pm2 ouo(z2) = ∞.
Seja ¯G=G /hz2i=hx,¯ y,¯ t¯1i onde ¯xp,y¯p ∈ ht¯1i=Z( ¯G). Como ¯G ´e indecompon´ıvel (pois seu centro o ´e), usando o Teorema 2.6 temos
(1) ¯xp = ¯yp = ¯1 ou (2) ¯xp = ¯yp = ¯t1.
Se ¯xp = ¯yp = ¯1 temos quatro possibilidades para xp eyp:
(1.1) xp =yp = 1
(1.2) xp = 1, yp =z2a
(1.3) xp =z2a, yp = 1
(1.4) xp =z
2a, yp =z2b
onde, pelo Lema 2.4, podemos supor a, b ∈ {1,2, . . . , p −1}. Daqui em diante, faremos uso in´umeras vezes desse lema, sem fazer referˆencia ao mesmo.
No primeiro caso,G´e o produto diretohx, y, t1i×hz2i, que n˜ao ´e indecompon´ıvel. Se z2 = t2, com o(t2) = pm2, podemos supor p 6= 2, j´a que no caso p = 2, foi demonstrado em [[9], Proposi¸c˜ao 3.3] queG∈ G3ouG∈ G4. No caso (1.2), podemos trocart2 por t′
2 =t2a poisht2i=ht2ai; assimG∈ G3. O terceiro caso ´e sim´etrico ao anterior, trocando x por y. J´a no ´ultimo caso, troque x por x′ =xny onde n ´e tal
que an+b ≡ 0 (mod p). Podemos assumir portanto que x′p = 1 e yp = t2b. Mas
Z(G) =ht1i × ht2i =ht1i × ht2bi, pois b ∈ {1,2, . . . , p−1}. Trocando ent˜ao t2 por
t2b obtemos que G∈ G
3.
Suponhamos agoraz2 =u1 com o(u1) =∞. No caso (1.2), se p= 2 ent˜ao a= 1 donde G ∈ G5 e se p 6= 2, podemos supor que a ∈ {2,3, . . . , p−1}, pois, quando a = 1 temos G ∈ G5. Trocando y por y′ = yb onde b ´e tal que ab ≡ 1 (mod p)
podemos assumir que xp = 1 ey′p =u1, o que implica que G∈ G5. O terceiro caso
´e sim´etrico ao (1.2) e no ´ultimo caso, se p= 2 ent˜ao x2 =y2 =u1. Trocando y por y′ =xy, podemos supor y′2 =x2y2s =t2m1−1
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 29
x′ =xyn onde n ´e tal que a+nb ≡0 (mod p). Dessa forma, existe x′′ ∈G tal que
G=hx′′, y, Z(G)icom (x′′)p = 1 e yp =u1b, que pelo caso (1.2) implica queG∈ G5.
Se ¯xp = ¯yp = ¯t1, ent˜ao temos tamb´em quatro possibilidades para xp and yp:
(2.1) xp =yp =t1
(2.2) xp =t
1, yp =t1z2a (2.3) xp =t1z2a, yp =t1
(2.4) xp =t1z2a, yp =t1z2b
ondea, b∈ {1,2, . . . p−1}.
O caso (2.1) n˜ao pode ocorrer, sen˜ao G = hx, y, t1i × hz2i, o que contradiz nossa hip´otese da indecomponibilidade de G. Vamos analisar novamente as duas possibilidades paraz2: z2 =t2,o(t2) =pm2 ouz2 =u1,o(u1) =∞, em cada um dos
casos acima.
Suponhamos primeiramente que z2 = t2 com o(t2) =pm2. Nesse caso podemos
suporp6= 2, pois o casop= 2 j´a foi estudado em [[9], Proposi¸c˜ao 3.3]. No caso (2.2) trocandoy por y′ =xny onde n ´e tal que n+ 1 ≡0 (modp), podemos assumir que
xp = t1 e y′p = t2a. Fazendo t′
2 = t2a temos que G ∈ G4. O caso (2.3) ´e sim´etrico ao (2.2), bastando trocar x por y e no caso (2.4) trocando x por x′ = xny onde
n ´e tal que n + 1 ≡ 0 (mod p), podemos supor que x′p = t2a+nb, yp = t1t2b. Se
a+nb ≡ a′ (mod p) e a′ 6≡ 0 (mod p) ent˜ao trocamos y por y′ = x′m
y onde m ´e tal que b+m(a′) ≡ 0 (mod p). Assim podemos obter x′p = t
2a ′
, y′p = t
1; fazendo t′
2 =t2a ′
, obtemos queG∈ G4.
Mas se a′ ≡ 0 (mod p), ent˜ao podemos supor xp = 1, yp = t1t2b. Se m2 ≥ m1
ent˜ao Z(G) =ht1i × ht2i =ht1i × ht2bi =ht1i × ht1t2bi. Trocando t2 port′
2 =t1t2b, obtemosG∈ G3. Sem2 < m1, tomamost′1 =t1t2b. Assimht1i × ht2i=ht1t2bi × ht2i, onde s = (t1t2b)pm1−1
e, portanto, G = hx, y, t′
1i × ht2i ´e decompon´ıvel, o que ´e absurdo.
Fazendou′
1 =t1bu1 segue que Z(G) =ht1i × hu1i=ht1i × ht1bu1i dondeG∈ G6. O caso (2.3) ´e sim´etrico ao anterior. No ´ultimo caso, se p= 2 ent˜ao temos x2 =y2 = t1u1. Trocando x por x′ =xy podemos assumir que x′2 =t12
m1−1+2
e y2 =t 1u1; se m1 >1 ent˜ao, usando novamente o Lema 2.4, podemos supor x′2 = 1 e y2 =t1u1 o que implica que G ∈ G5 bastando trocar u1 por u′1 = t1u1; se m1 = 1 ent˜ao segue quex′2 =t1, y2 =t1u1, donde G∈ G
6 se trocarmos u1 por u′1 =t1u1. Agora, se p6= 2 e xp =t
1u1a, yp =t1u1b, trocamos x por x′ =xyn, onde n ´e tal quen+1≡0 (modp). Assim, existex′′ ∈Gtal quex′′p =u1a+nb. Sea′ =a+nb6≡0
(mod p), trocamos y por y′ = (x′′)my onde m ´e tal que b+ma′ ≡ 0 (mod p). Isso
implica que existey′′ ∈Gtal quey′′p =t
1 ex′′p =u1a ′
. Trocamos ent˜aox′′por (x′′)c
ondec´e tal que a′c≡1 (mod p). Finalmente, podemos obter geradores x′′′, y′′ ∈G
tais que x′′′p = u1, y′′p =t1, donde G∈ G6. Mas, se a′ ≡ 0 (modp), existe x′′′ ∈G
onde x′′′p = 1. Assim, trocando y por y′ = yd, onde d ´e tal que db ≡ 1 (mod p)
obtemosy′′∈Gtal que G=hx′′′, y′′, Z(G)i, comx′′′p = 1, y′′p =t1du1 o que implica
queG∈G5 bastando para isso trocar t1du1 por u′
1. ¥
Proposi¸c˜ao 2.10 As fam´ılias G3,G4,G5 eG6 do Teorema 2.9 s˜ao fam´ılias de grupos indecompon´ıveis. Al´em disso, grupos em fam´ılias diferentes n˜ao s˜ao isomorfos entre si.
Demonstra¸c˜ao: Primeiro mostraremos que os grupos das quatro fam´ılias apresentadas n˜ao s˜ao dois a dois isomorfos. Pela cardinalidade, temos que provar somente queG3 6≃G4 eG5 6≃G6, com Gi ∈ Gi, para 3≤i≤6.
Para mostrar que G3 6≃ G4, note que x ´e um elemento n˜ao central de ordem p em G3. Mostraremos que n˜ao existe tal elemento emG4. De fato, suponhamos que w = xaybt1ct2d ∈ G4, w /∈ Z(G4) e wp = 1. Se p = 2 ent˜ao j´a foi mostrado em
[[9], Proposi¸c˜ao 3.3] queG3 6≃G4. Assumimos, portanto, p6= 2. EmG4, temos que xp = t1 e yp = t2. Logo, wp = t1a+cpt2b+dp = 1 e como ht1i ∩ ht2i = {1}, obtemos
pm1 | (a+cp) e pm2 | (b+dp) o que implica que p | a e p | b. Usando novamente
o fato que em G4, xp = t1 e yp = t2 segue que w = t1a′ t2b′
t1ct2d ∈ Z(G4), uma
contradi¸c˜ao.
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 31
que emG5,x´e um elemento n˜ao central de ordemp. Mostraremos que todo elemento de ordem p em G6 ´e central. Suponhamos que w =xaybt1cu1d ∈ G6, w /∈ Z(G6) e
wp = 1. Se p6= 2 ent˜ao wp =t
1a+cpu1b+cp = 1. Masht1i ∩ hu1i={1} e o(u1) = ∞, o que implica queb=−dp e p|a. Portanto, w=t1a′+c
∈Z(G6), uma contradi¸c˜ao. Se p = 2, w2 = t1a+2c+2m1−1ab
u1b+2d = 1, o que implica que b = −2d e 2 | a donde
w∈Z(G6), outra contradi¸c˜ao.
Agora mostraremos que os grupos dessas quatro fam´ılias s˜ao indecompon´ıveis. SejaG=hx, y, Z(G)i um tal grupo com Z(G) =ht1i × hz2i. Se G´e decompon´ıvel, ent˜ao pelo Teorema 2.3 podemos escrever
G=H×K
onde K ´e um grupo abeliano n˜ao trivial e H ´e um grupo indecompon´ıvel n˜ao abeliano de centro Z(H) n˜ao trivial, j´a que s = [x, y] ∈ Z(H). Como o posto Z(G) = 2, Z(G) = Z(H)×K, com s ∈ Z(H) e sp = 1, segue que Z(H) ´e c´ıclico
finito de ordem potˆencia de p, ou seja, Z(H) = ht1az2bi, (t1az2b)p
r
= 1. Portanto, s=t1apr−1j
z2bpr−1j
onde pn˜ao divide j. Assim temos s =t1apr−1j
z2bpr−1j
=tp1m1−1. (2.4)
Se G pertence a G3 ou G4, ent˜ao z2 = t2 com o(t2) = pm2. Pela equa¸c˜ao acima segue que pm2 | bpr−1j, o que implica que r−1 ≥ m2 ou que b ´e m´ultiplo de p.
Pelo Lema 2.8 sabemos que existe y1 ∈ H tal que y1 = yz com z ∈ Z(G). Logo, y1p = ypzp = t2(t1αt2β)p ∈ H∩Z(G) ⊆ Z(H) e podemos escrever y1p = (t1at2b)n.
Assim
t1ant2bn=t1αpt21+βp. (2.5) Pela equa¸c˜ao (2.5), vemos que p n˜ao divide n e p n˜ao divide b, donde r−1≥ m2. ComoZ(H) ´e um fator direto deZ(G) de ordempr, e os fatores deZ(G) tem ordem
pm1 e pm2, segue que r =m1.
Afirmamos quea tamb´em n˜ao ´e m´ultiplo dep. Caso contr´ario, (t1at2b)pm1−1
= 1, o que ´e absurdo, pois o(t1at2b) = pr = pm1. Mas, pela equa¸c˜ao (2.5), segue que
pm1 | (αp−an) o que implica que p divide an. Como p n˜ao divide n, temos uma
Portanto, se Gpertence a G3 ou G4,G ´e indecompon´ıvel.
Agora suponhamos que G perten¸ca a G5 ou G6. Nesse caso, z2 = u1 com o(u1) = ∞. Assim segue pela equa¸c˜ao (2.4) que u1bpr−1j
= 1, donde b = 0. Logo Z(H) = ht1ai e a equa¸c˜ao (2.5) se torna t1an = t1αpu11+βp. Logo 1 +βp = 0 o que ´e absurdo pois β ´e um inteiro. Portanto, os grupos em G5 e G6 tamb´em s˜ao
indecompon´ıveis. ¥
Finalmente, veremos no pr´oximo teorema o que acontece quando o posto do centro de G ´e igual a trˆes. Nesse caso, o grupo G poder´a pertencer a uma de trˆes fam´ılias.
Teorema 2.11 Seja G um grupo indecompon´ıvel finitamente gerado e tal que G/Z(G) ≃ Cp ×Cp. Se posto (Z(G)) = 3 ent˜ao G pertence a um dos trˆes tipos
abaixo:
Tipo 7=hx, y, t1, t2, t3 |tp1m1 =t2pm2 =t3pm3 = 1, xp =t2, yp =t3i
Tipo 8=hx, y, t1, t2, u1 |tp1m1 =t
pm2
2 = 1, xp =t2, yp =u1i Tipo 9=hx, y, t1, u1, u2 |t1pm1 = 1, xp =u1, yp =u2i
onde, em cada caso, t1, t2, t3, u1, u2 s˜ao centrais, m1, m2, m3 ≥ 1 e s= [x, y] =t1pm1−1
.
Denotaremos por Gi a fam´ılia de todos os grupos de Tipo i, i= 7,8,9.
Demonstra¸c˜ao: Suponhamos que G = hx, y, Z(G)i com Z(G) =
ht1i × hz2i × hz3i e xp, yp ∈ Z(G). Pelo Teorema 2.3 segue que o(t1) = pm1,
m1 ≥ 1 e o(zi) = pmi ou o(zi) = ∞. Seja ¯G = G /hz3i = hx,¯ y,¯ t1,¯ z2¯i, onde
¯
xp,y¯p ∈ ht1¯i × hz2¯i=Z( ¯G). Se ¯G´e indecompon´ıvel ent˜ao, pelo Teorema 2.9, segue
que
(1) ¯xp = ¯1,y¯p = ¯z2 ou (2) ¯xp = ¯t1,y¯p = ¯z2.
Se ¯xp = ¯1 e ¯yp = ¯z2, ent˜ao temos quatro possibilidades paraxp, yp:
CAP´ITULO 2. CLASSIFICANDO GRUPOS 33
(1.2) xp = 1, yp =z2z3a
(1.3) xp =z3a, yp =z2
(1.4) xp =z3a, yp =z2z3b
ondea, b∈ {1,2, . . . , p−1}.
No primeiro caso, G=hx, y, t1, z2i × hz3i, o que ´e absurdo.
Suponhamos que zi = ti, com o(ti) = pmi, para i = 2,3. No caso (1.2), se
m2 ≥ m3, ent˜ao Z(G) = ht1i × ht2t3ai × ht3i e fazendo t′
2 = t2t3a temos que G ´e decompon´ıvel, uma contradi¸c˜ao. Se m2 < m3, ent˜ao trocamos t3 por t′
3 = t2t3a; assim G = hx, y, t1, t′3i × ht2i, o que tamb´em ´e uma contradi¸c˜ao. Logo, nessas condi¸c˜oes, o caso (1.2) tamb´em n˜ao pode ocorrer.
J´a no caso (1.3), fazendo t3a = t′
3 temos que G ∈ G7. No ´ultimo caso, se p = 2 j´a foi mostrado em [[9], Proposi¸c˜ao 3.4] queG∈ G7. Podemos assumir ent˜ao p6= 2. Trocando y por y′ = xny, onde n ´e tal que b+na≡ 0 (mod p), existe y′′ ∈ G tal
que (y′′)p =t2. Fazendo t3a=t′
3 segue que G∈ G7.
Suponhamos agora z2 = t2, com o(t2) = pm2 e z3 = u1 com o(u1) = ∞. Em
(1.2), se p= 2 temos que x2 = 1 e y2 =t2u1; trocando u1 por u′
1 =t2u1 segue que G=hx, y, t1, u′
1i × ht2i, absurdo. Se p6= 2, trocamos y pory′ =yb, ondeb´e tal que ab≡ 1 (mod p). Assim, existe y′′ ∈G tal que (y′′)p =t2bu1, o que tamb´em implica
que G´e decompon´ıvel, se trocarmos u1 por u′
1 = t2bu1. J´a no caso (1.3), trocando xpor x′ =xb, com ab≡1 (mod p), segue que G∈ G8.
No ´ultimo caso, se p = 2 temos x2 = u1 e y2 = t2u1; trocando y por x′ = xy
podemos supor y′2 =t12m1−1
t2. Se m1 = 1 ent˜ao x2 =u1 e y′2 =t1t2 o que implica que G ∈ G8 trocando t2 por t′2 = t1t2. Se m1 > 1, ent˜ao podemos supor y′2 = t2, donde tamb´emG∈ G8. Agora, se p6= 2, trocamosy por y′ =xny, onden ´e tal que
an+b ≡o ((mod p)) e trocamos tamb´emx porx′ =xc ondeac≡1 (modp). Dessa
forma, podemos assumir quey′p =t2 e x′p =u1 o que implica queG∈ G8.
Finalmente suponhamos zi = ui−1, com o(ui−1) = ∞, i= 2,3. No caso (1.2) se
trocarmos u1 por u′
(mod p), segue que G∈ G9.
No ´ultimo caso, tamb´em trocando x por x′ = xb, como em (1.3), e chamando
u′
1 =u1u2a, temos G =hx′, y,ht1i × hu1u2ai × hu2ii, com x′p =u2 e yp =u′1, o que implica que G∈ G9.
Agora, se (2) acontece, ent˜ao ¯xp = ¯t1 e ¯yp = ¯z2 e temos tamb´em outras quatro
possibilidades para xp, yp:
(2.1) xp =t1, yp =z2
(2.2) xp =t1, yp =z2z3a
(2.3) xp =t
1z3a, yp =z2 (2.4) xp =t1z3a, yp =z2z3b
ondea, b∈ {1,2, . . . , p−1}.
No primeiro caso, tamb´em temos G = hx, y, t1, z2i × hz3i decompon´ıvel, con-tradizendo nossa hip´otese.
Sezi =ti,o(ti) = pmi comi= 2,3, ent˜ao no caso (2.2) trocamost2 port′2 =t2t3a sem2 ≥m3 e, caso contr´ario, trocamos t3 port′
3 =t2t3a. Em ambos os casos, temos Gdecompon´ıvel, absurdo.
No caso (2.3), se m3 ≥m1, podemos trocar t3 por t3′ =t1t3a e obtemos G∈ G7. Se m3 < m1 ent˜ao fazemos t′
1 = t1t3a. Observe que essa troca ´e poss´ıvel j´a que s=t1pm1−1
= (t1t3a)pm1−1
. Assim,G=hx, y, t′
1, t2i × ht3i, uma contradi¸c˜ao.
No ´ultimo caso, podemos suporp6= 2, pois no caso p= 2 j´a foi demonstrado em [[9], Proposi¸c˜ao 3.3] queG∈ G7.
Se m1 ≥ m2 ≥ m3 ent˜ao trocamos x por x′ = xyn, onde n ´e tal que
a+nb≡0 (mod p). Assim,x′p =t1t2n. Se n≡0 (mod p) ent˜ao podemos supor que
x′p = t1. Nesse caso, G ´e decompon´ıvel, pois podemos trocar t2 por t′
2 = t2t3b obtendo G = hx, y, t1, t′2i × ht3i. Suponhamos ent˜ao x′p = t1t2a, yp = t2t3b onde a, b ∈ {1,2, . . . , p −1}. Podemos escrever Z(G) = ht1t2ai × ht2t3bi × ht3i o que
implica que G´e decompon´ıvel se trocarmos t1 por t′