UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE ENFERMAGEM
CAMILA FLORIDO BALDINO
PREVALÊNCIA DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL NO ESTADO DE
SÃO PAULO ANTES E APÓS A FORTIFICAÇÃO DAS FARINHAS
COM ÁCIDO FÓLICO
CAMILA FLORIDO BALDINO
PREVALÊNCIA DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL NO ESTADO DE
SÃO PAULO ANTES E APÓS A FORTIFICAÇÃO DAS FARINHAS
COM ÁCIDO FÓLICO.
Dissertação apresentada à Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo para obtenção de título de Mestre em Ciências
Área de concentração: Cuidados em Saúde
Orientadora: Profª Dra. Elizabeth Fujimori
Nome: Camila Florido Baldino
Título: Prevalência de defeitos do tubo neural no Estado de São Paulo antes e após a
fortificação das farinhas com ácido fólico
Dissertação apresentada à Escola de
Enfermagem da Universidade de São
Paulo para obtenção do título de Mestre
em Ciências
Aprovado em: ____/____/_______
Banca examinadora
Profª. Drª. _____________________________ Instituição _____________________
Julgamento ____________________________ Assinatura _____________________
Profª. Drª. _____________________________ Instituição _____________________
Julgamento ____________________________ Assinatura _____________________
Profª. Drª. _____________________________ Instituição _____________________
DEDICATÓRIA
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por me proporcionar a chance de realizar um sonho e que hoje se concretiza.
À Profª. Drª. Elizabeth Fujimori pela atenção e paciência durante toda orientação e por toda confiança que depositaste em mim. Com você aprendi que embora nosso tempo seja pequeno, sempre há tempo para mais alguma coisa, obrigada por me ensinar acreditar em mim mesma, acreditar que sou capaz. Agradeço cada momento que estivemos juntas e pela amizade construída a qual pretendo levar por toda vida.
À Msª. Ana Paula Sayuri Sato por estar sempre presente e disposta a ajudar-me quando precisava.
À Profª. Drª. Ana Luiza Vilela Borges pela participação no Exame de Qualificação e suas sábias sugestões que deram direcionamento ao trabalho, também pela disposição e auxílio durante todo desenvolvimento da pesquisa.
Ao grupo de pesquisa NEPESC que desde o início pude contar com toda colaboração e sugestões.
À Fta Fernanda Furlaneto que me deu a oportunidade de exercer a profissão. Obrigada por confiar em mim e em minha capacidade, agradeço pelo apoio e compreensão durante todo esse processo.
Aos meus queridos amigos e alunos pela força, estímulo e compreensão durante todo esse período.
Ao Ricardo Campos Veríssimo por estar sempre disposto a me auxiliar, pela compreensão e o afeto. Juntos conseguiremos ir mais longe.
Aos meus irmãos André Luiz Florido Baldino e Karina Florido Baldino, meus cunhados Cristina Freguglia e Hilton Carlos da Costa Rodrigues e em especial minha sobrinha Ana Laura Freguglia Baldino, que souberam entender a dificuldade dessa trajetória e compreender a distância que por tantas vezes se fez necessária.
EPÍGRAFE
Baldino CF. Prevalência de defeitos do tubo neural no Estado de São Paulo antes e após a fortificação das farinhas com ácido fólico [dissertação]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2011.
RESUMO
Introdução: Defeitos do tubo neural (DTN) são as malformações mais freqüentes do sistema nervoso. Decorrem de falha no fechamento do tubo neural embrionário entre 21-28 dias após a concepção e representam importante causa de morbimortalidade infantil passível de prevenção. Os defeitos mais freqüentes são anencefalia e espinha bífida. Considerando que o ácido fólico reduz o risco de DTN, a fortificação compulsória das farinhas de trigo e milho com ferro e ácido fólico passou a ser obrigatória no Brasil desde junho de 2004. Assim, delineou-se este estudo com vistas a proporcionar uma base de referência sobre a evolução do problema no Estado de São Paulo e contribuir para o aperfeiçoamento das políticas públicas que visam a prevenção e a minimização desse problema de saúde em nível populacional. Objetivo: Comparar a prevalência de DTN no Estado de São Paulo, antes e após a fortificação das farinhas com ácido fólico. Método: Estudo transversal analítico que utilizou dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) nos períodos antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação obrigatória das farinhas com ácido fólico. A variável dependente foi a presença de DTN, identificado pelos códigos Q00 (anencefalia), Q01 (encefalocele) e Q05 (espinha bífida, que inclui meningocele e mielomeningocele) da 10ª Classificação Internacional de Doenças (CID-10). Avaliou-se a prevalência de DTN segundo período (antes/após-fortificação), características maternas e do recém nascido. Odds Ratio (OR) e respectivos intervalos de confiança (IC95%) foram utilizados para análise dos dados, conduzida no software R. Utilizou-se o teste de qui-quadrado com nível de confiança de 5%. Resultados: A prevalência total de DTN diminuiu significativamente no período estudado, passando de 0,57 por mil nascidos vivos antes da fortificação para 0,37 por mil nascidos vivos após a fortificação (OR:0,65; IC95%:0,59-0,72). Tanto a espinha bífida (OR:0,52; IC95%:0,45-0,59) quanto a anencefalia (OR:0,79; IC95%:0,67-0,92) foram menos prevalentes no período após a fortificação. Encefalocele foi a menos freqüente e não mostrou diferença na prevalência entre os períodos. Análise estratificada segundo características maternas e infantis mostrou associação estatisticamente significativa de DTN com idade materna no período antes da fortificação e com escolaridade materna, número de consultas de pré-natal e duração da gestação em ambos os períodos. As variáveis do recém-nascido que se associaram estatisticamente com DTN foram sexo no período antes da fortificação e peso ao nascer em ambos os períodos. A análise estratificada da prevalência de DTN mostrou redução significativa após a fortificação para mulheres de todas as faixas etárias (exceto para <15 anos), para aquelas com mais de três anos de estudo, com ou sem companheiro, com sete consultas de pré-natal ou mais e menos de 42 semanas de gestação. Em relação às características do recém-nascido, a análise apontou redução significativa para ambos os sexos, para nascidos com menos de 4000g e todas as raça/cor (exceto preta e outros). Conclusões: O estudo mostrou redução significativa na prevalência total de DTN no Estado de São Paulo após a fortificação das farinhas com ácido fólico e também nas prevalências de anencefalia e
espinha bífida. Embora tenha que se considerar que outros fatores possam ter
contribuído para esse declínio, os resultados reiteram a importância da fortificação das farinhas como medida de prevenção primária na redução da ocorrência de DTN.
Baldino CF. Prevalence of neural tube defects in the state of Sao Paulo before and after fortification of flour with folic acid [dissertation]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2011.
ABSTRACT
Introduction: Neural tube defects (NTDs) are the most frequent malformations of the
nervous system. Result of failure in the embryonic neural tube between 21-28 days after conception and are an important cause of preventable child mortality. The most frequent defects are anencephaly and spina bifida. Considering that folic acid reduces the risk of NTDs, Considering that folic acid reduces the risk of NTD, the compulsory fortification of wheat and corn flour with iron and folic acid became mandatory in Brazil since June 2004. Thus, this study was outlined in order to provide a baseline on the evolution of the problem in the State of Sao Paulo and contribute to the improvement of public policies aimed at prevention and minimization of this health problem at the population level. Objective: To compare the prevalence of NTDs in the State of Sao Paulo, before and after fortification of flour with folic acid. Methods: Analytical transversal study used data from the Information System on Live Births (Sinasc) in the periods before (2001-2003) and after (2006-2008) the mandatory fortification of flour with folic acid. The dependent variable was the presence of NTDs, identified by the codes Q00 (anencephaly), Q01 (encephalocele) and Q05 (spina bifida, meningocele and myelomeningocele including) the 10th International Classification of Diseases (ICD-10). Evaluated the prevalence of NTDs second period (before / after-fortification), and maternal characteristics of the newborn. Odds Ratio (OR) and confidence intervals (95%) were used for data analysis, conducted in the software R. Was used the chi-square test with a confidence level of 5%. Results: The total prevalence of NTDs decreased significantly during the study period, from 0,57 per thousand live births before fortification to 0,37 for a thousand live births after fortification (OR:0,65; IC95%: 0,59-0,72). Both spina bifida (OR:0,52; IC95%: 0,45-0,59) and anencephaly (OR:0,79; IC95%: 0,67-0,92) were less prevalent in the period after fortification. Encephalocele was less frequent and showed no difference in prevalence between periods. Analysis stratified by maternal characteristics and infant showed a statistically significant association of NTDs with maternal age in the period before fortification and maternal education, number of prenatal visits and duration of pregnancy in both periods. The variables of the newborn that is statistically associated with NTDs were sex in the period before fortification and birth weight in both periods. The stratified analysis of the prevalence of NTDs showed a significant decrease after fortification for women of all ages (except for <15 years) for those with more than three years of study, with or without a partner, with seven prenatal consultations or more and less than 42 weeks of gestation. In relation to the characteristics of the newborn, the analysis showed a significant reduction for both sexes, born to less than 4000g and all race/color (except black and others). Conclusions: The study showed a significant reduction in the overall prevalence of NTDs in the State of Sao Paulo after fortification of flour with folic acid and also in the prevalence of anencephaly and spina bifida. Although it is found that other factors may have contributed to this decline, the results reiterate the importance of fortification of flour as a measure of primary prevention in reducing the incidence of NTDs.
Keywords: Neural Tube Defects, Folic Acid, Food Fortified, Primary Prevention,
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Distribuição de nascidos vivos segundo características maternas, antes
(2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo ... 36
Tabela 2- Distribuição de nascidos vivos segundo características dos recém-nascidos
antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo ... 37
Tabela 3 - Prevalência de defeitos do tubo neural antes (2001-03) e após (2006-08) a
fortificação, Estado de São Paulo ... 37
Tabela 4 - Prevalência de defeitos de fechamento do tubo neural em nascidos vivos
segundo características maternas, do pré-natal e parto, antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo ... 38
Tabela 5 - Prevalência de defeitos de fechamento do tubo neural em nascidos vivos
LISTA DE SIGLAS
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CDC Center for Disease Control
DN Declaração de Nascido Vivo
DTN Defeito do Tubo Neural – DTN
ECLAMC Estudo Colaborativo Latino-Americano de Malformações Congênitas
FDA Food and Drug Administration
PNDS Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ... 12
1. INTRODUÇÃO ... 14
1.1. DEFEITOS DO TUBO NEURAL: ASPECTOS GERAIS ... 15
1.2. PREVALÊNCIA DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL ... 17
1.3. FATORES ASSOCIADOS AOS DEFEITOS DO TUBO NEURAL ... 18
1.4. ÁCIDO FÓLICO NA PREVENÇÃO DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL (DTN) ... 20
1.5. SISTEMAS DE INFORMAÇÕES SOBRE NASCIDOS VIVOS –SINASC ... 23
2. FINALIDADE E QUESTÕES DE PESQUISA ... 26
3. OBJETIVOS ... 28
4. MATERIAL E MÉTODOS ... 30
4.1. DELINEAMENTO METODOLÓGICO ... 30
4.2. LOCAL DE ESTUDO ... 30
4.3. COLETA DOS DADOS ... 31
4.4. VARIÁVEIS DO ESTUDO ... 31
4.5. PROCESSAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS ... 32
4.6. CONSIDERAÇÕES ÉTICAS ... 32
5. RESULTADOS ... 35
6. DISCUSSÃO ... 42
7. CONCLUSÕES ... 54
APRESENTAÇÃO
Meu interesse pelos aspectos neurológicos e nutricionais teve início na
graduação, ao cursar a disciplina Fisioterapia em Neonatologia e Pediatria I e
Fisioterapia Neurológica I em 2005. As disciplinas englobavam desde os aspectos do
desenvolvimento infantil até os neurofisiológicos. Essas disciplinas motivaram o
desenvolvimento do meu trabalho de conclusão de curso, que se referiu ao estudo de
quatro casos de mielomeningocele na cidade de Marília, o qual foi apresentado no IV
Congresso Brasileiro Multidisciplinar de Educação Especial em 2007. Ainda durante a
graduação, fui contemplada com Bolsa de Extensão Universitária com o projeto
“Estimulação precoce: atendimento multidisciplinar a bebês com atraso no
desenvolvimento sensório-motor”.
Interessada em dar continuidade aos estudos em nível de pós-graduação, em
2009 comecei a participar das reuniões do Grupo de Pesquisa “Aspectos nutricionais do
processo saúde doença”, do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da
Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, ora denominado “Núcleo de Estudos epidemiológicos na Perspectiva da Enfermagem em Saúde Coletiva”.
Assim, o projeto proposto para minha dissertação, que estudou a “A Prevalência
de defeitos do tubo neural no estado de São Paulo, antes e após a fortificação das
farinhas com ácido fólico” dará continuidade aos trabalhos desenvolvidos na graduação.
Espero que o desenvolvimento deste trabalho contribua para o aperfeiçoamento
de políticas públicas que visam à prevenção e a minimização de seqüelas provocadas
pelos defeitos do tubo neural, que em geral compromete a qualidade de vida dos
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo teve como objeto, a prevalência dos defeitos do tubo neural,
antes e após a fortificação das farinhas com ácido fólico.
Defeitos do tubo neural (DTN) são as malformações congênitas mais freqüentes
do sistema nervoso central. Malformação congênita é uma denominação genérica
bastante ampla que inclui toda e qualquer anomalia morfológica ou funcional presente
no nascimento, de causa genética e/ou ambiental. Em geral, as malformações congênitas
afetam entre 2 e 3% do total de nascidos vivos e pode resultar em incapacidade física
e/ou mental. As manifestações clínicas variam de quadros leves até muito graves, com
elevado risco para a vida das crianças acometidas (Cortés, 2003).
Apesar de se tratar de evento raro, os DTN aumentam o risco de
morbi-mortalidade infantil, e cerca de metade das crianças afetadas vão a óbito no primeiro
ano de vida. Muitas vezes há necessidade de intervenção cirúrgica imediata para a
sobrevivência da criança, e aquelas que sobrevivem apresentam várias incapacidades
físicas e/ou mentais, que demandam reabilitação durante toda a vida (Baird et al., 1988).
Segundo Braga et al. (2005) existem cirurgias fetais para correção de malformação que
podem ser realizadas intra-útero, essas cirurgias tem como objetivo minimizar a
progressão desse defeito congênito após o nascimento da criança. Mesmo os casos mais
leves demandam cuidados especiais que transformam a patologia em um sério problema
de saúde pública (Grillo e Silva, 2003; Costa, 2005; Gaiva et al., 2009).
Assim, o nascimento de uma criança com DTN costuma ser devastador para a
família, a sociedade e o próprio indivíduo. Diante disso, justifica-se a importância do
1.1. DEFEITOS DO TUBO NEURAL: ASPECTOS GERAIS
Os defeitos de fechamento do tubo neural são malformações congênitas da
estrutura primitiva que dá origem ao cérebro e à medula espinhal, que ocorrem muito
precocemente na vida embrionária. O canal neural e as pregas neurais já podem ser
observadas 18 dias após a concepção e o fechamento completo ocorre logo após, entre
21 e 28 dias, ou seja, antes que a mulher perceba que está grávida (Northrup e Volcik,
2000; Aguiar et al., 2003).
Os DTN decorrem de falha no adequado fechamento músculo-esquelético
(crânio e coluna) que protege o sistema nervoso central (cérebro e medula espinhal),
que mais comumentemente resultam em anencefalia, encefalocele e espinha bífida
(Cortés, 2003). Os defeitos mais freqüentes, que respondem por cerca de 90% dos
casos, são anencefalia e espinha bífida (Santos e Pereira, 2007).
Os casos de anencefalia ocorrem quando não há fechamento da extremidade
superior do tubo neural, resultando em ausência parcial ou completa de crânio e cérebro.
Esses casos geralmente evoluem para natimortos, abortos ou nascidos vivos (NV) que
morrem logo após o parto (Aguiar et al., 2003; Mitchell et al., 2004).
A espinha bífida, por sua vez, ocorre quando a extremidade inferior do tubo
neural não se fecha. Ela representa cerca de 75% das malformações do tubo neural e
pode afetar todo o comprimento do tubo neural ou se limitar a uma pequena área.
Classifica-se em espinha bífida oculta, quando o defeito é recoberto por pele ou espinha
bífida cística, quando há protusão cística, não coberta por pele. Os casos de espinha
bífida oculta podem evoluir de forma assintomática durante a toda a vida. No caso de
protusão cística, as duas principais formas são meningocele, quando a protusão contém
meninges anormais e líquido cefalorraquidiano e mielomeningocele, a mais comumente
observada, quando a protusão cística contém elementos da medula espinhal e/ou nervos
(Northrup e Volcik, 2000; Aguiar et al., 2003; Mitchell et al., 2004).
Os DTN são severos e na maioria das vezes se associam com mortalidade
prematura, seja no período perinatal (entre 22 semanas de gestação e sete dias após o
50% dos afetados falecem no primeiro ano de vida, e os que sobrevivem apresentam
incapacidade física e/ou mental importante que requer reabilitação prolongada e de alto
custo tanto para a família quanto para a sociedade, como já referido (Cortés, 2003).
Nas crianças que nascem com DTN, as possíveis complicações presentes são
hidrocefalia; paralisia de membros inferiores; distúrbios ortopédicos como pés tortos
congênito; luxação coxofemural; escoliose; disfunção vesical, intestinal e/ou sexual;
dificuldade de aprendizagem; risco de desajuste social. Independente do grau das
complicações, as seqüelas presentes demandarão cuidados durante toda a vida (Mitchell
et al., 2004).
Assim, a criança com seqüela de DTN necessita de uma boa avaliação dos
profissionais de saúde que a acompanham. Os cuidados requerem participação de
equipe multidisciplinar, de modo a se traçar, da melhor forma, os objetivos do
tratamento que cada profissional pode oferecer às demandas da criança. Além dos
cuidados gerais da puericultura, é necessário que cada profissional olhe para a criança
de forma global, em especial o desenvolvimento cognitivo, motor e sensorial,
considerando o modo como ela enfrentará a sociedade, pois o impacto de uma
malformação congênita costuma ser devastador (Costa, 2005). Ademais, os
profissionais devem avaliar todas as fases do desenvolvimento motor normal da criança,
lembrando sempre de suas limitações, que dependerão do nível em que se encontra a
lesão (Diament e Cypel 1996, Kudo et al., 1997).
O trabalho fisioterapêutico é fundamental e tem como objetivo, promover a
independência das funções motoras da criança diante de metas especiais, visando a
prevenção e a minimização de deformidades secundárias (Shepherd, 1995). A
deambulação é considerada a principal atividade, tanto para a criança quanto para a
família, visto que na maior parte dos casos a principal seqüela é a paralisia de membros
inferiores (Kudo et al., 1997). É muito importante que a família participe do tratamento
e que os profissionais de saúde centrem o cuidado nas necessidades da família e não
apenas no processo patológico da criança (Gaíva et al., 2009). Cada a equipe sempre
faça orientações aos cuidadores para que as atividades possam ter continuidade no
ambiente domiciliar. Cada etapa do tratamento busca melhor a qualidade de vida das
1.2. PREVALÊNCIA DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL
A prevalência de DTN encontra-se entre 1 e 3 por 1000 recém-nascidos também
em nível mundial (Cortés, 2003), porém pode apresentar ampla variação em nível
mundial e nas diferentes regiões e épocas, dependendo da forma como os dados são
obtidos nos países, se a partir de dados de cobertura populacional, ou se são apenas de
base hospitalar (Cortés, 2003; Grillo e Silva, 2003; Ramos et al., 2008).
Em 2003, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou o Atlas Mundial de
Defeitos Congênitos com o intuito de apresentar as prevalências de defeitos congênitos
nos diferentes países do mundo, tendo em vista a dificuldade na obtenção de tais
informações (WHO, 2003). De acordo com os dados consolidados dos 41 países
pesquisados no período de 1993-1998, o Brasil aparece em quarto lugar entre aqueles
com maior prevalência, tanto de anencefalia, quanto de espinha bífida. A prevalência de
anencefalia por 1000 nascidos vivos atingia os índices mais elevados no Brasil (0,86),
Paraguai (0,87), Chile (0,91) e México (1,53); o mesmo sendo verificado em relação à
espinha bífida, com as maiores prevalências encontradas no Brasil (1,14), Bulgária
(1,15), Venezuela (1,20) e México (1,53). Para o Brasil os dados analisados referiram-se
àqueles obtidos nas 11 maternidades acompanhadas pelo Estudio Colaborativo
Latinoamericano de Malformaciones Congénitas (ECLANC) (Santos e Pereira, 2007).
Assim, as informações sobre DTN referem-se aos registros de dados hospitalares
monitorados pelo ECLAMC, que desde 1967 coordena pesquisas sobre anomalias
congênitas e suas causas, a partir de nascimentos que ocorrem em mais de 150 hospitais
distribuídos em nove países sul americanos entre os quais o Brasil, Chile, Uruguai,
Argentina (López-Camelo, 2010).
O programa ECLAMC cobre cerca de 200.000 nascimentos por ano, que
representa menos de 1% do total de nascimentos da região. No período de 1967 a 1995,
a partir da avaliação de mais de quatro milhões de nascimentos na América Latina, a
prevalência total de DTN encontrada pelo ECLAMC foi de aproximadamente 1,5 por
1000 nascidos vivos (Nazer-Herrera et al., 2001). Para o Brasil, os dados do ECLAMC
evidenciaram prevalência elevada de DTN, com taxa de 3,13 por 1000 nascidos vivos
Em maternidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, vinculada ao ECLAMC, o
seguimento dos nascimentos pelo período de dez anos, entre 1990 e 2000, registrou
prevalência de DTN de 4,2 por 1000 nascidos vivos (Aguiar et al., 2003).
Tais prevalências colocam o Brasil entre os países com as mais elevadas taxas de
DTN (Santos e Pereira, 2007). No entanto, há que se considerar que por representar
dados de base hospitalar, muitas vezes considerados centros de referência para risco
neonatal, os resultados obtidos em hospitais participantes do ECLAMC podem mostrar
prevalências elevadas que não refletem as reais taxas encontradas no total de
nascimentos, com uma provável superestimação dos dados (Grillo e Silva, 2003).
Estudo mais recente desenvolvido no Vale do Paraíba, que compreende 35
municípios e conta com população de 2 milhões de habitantes constatou ocorrência de
1,2 por 1000 recém-nascidos com DTN (Nascimento et al., 2008).
Considerando a escassez e a heterogeneidade das informações referentes à
prevalência de DTN no Brasil, justifica-se a realização de estudos de prevalência como
este que avaliou a prevalência no Estado de São Paulo, tendo em vista que são
fundamentais para a implementação e avaliação de políticas que visam prevenir e
controlar a ocorrência desse problema em nosso meio.
1.3. FATORES ASSOCIADOS AOS DEFEITOS DO TUBO NEURAL
Há referência de que metade dos casos de defeitos congênitos podem ser
prevenidos, mesmo que a maioria das causas das malformações seja desconhecida.
Embora as causas de ocorrência de DTN não sejam bem esclarecidas considera-se a
influência de fatores genéticos e ambientais (Northrup e Volcik, 2000; Frey e Hauser,
2003).
Para Northrup e Volcik (2000), além dos fatores genéticos, as influências
ambientais são importantes para a compreensão da etiologia de DTN. O conceito de
ambiente nos estudos epidemiológicos tem sido bastante frequente para abranger
paterna, classe social, ocupação dos pais, educação, nível sócio-econômico entre outros
que têm sido explorados como potenciais fatores de risco para ocorrência de DTN.
Analisando alguns estudos que tratavam de fatores genéticos e ambientais, esses autores
constataram que a história da gravidez, história de saúde e estado nutricional materno
destacavam-se como fatores de risco potenciais. Idade materna deve ser analisada, visto
que mulheres com idade mais avançada apresentaram maior risco para ocorrência de
DTN. Em relação à associação com baixo nível socioeconômico, avaliadas pela
ocupação e educação dos pais, os dados são conflitantes, uma vez que alguns estudos
evidenciaram maior risco para ocorrência de casos de DTN. Analisandoporém outros
não. Há evidências sobre a influência da ocupação dos pais na ocorrência de DTN, com
maior risco para crianças de pais com ocupação que envolve exposição a solventes.
No que toca aos fatores ambientais associados aos DTN, Guerra et al. (2008b)
constataram que mulheres menos instruídas apresentavam prevalência notadamente
maior de defeitos congênitos. Para os autores, considerando que o grau de instrução
relaciona-se diretamente ao padrão social e econômico, é possível conjeturar que tais
problemas são mais comuns entre as mulheres com menos recursos financeiros,
exatamente o grupo em que se verificou elevada prevalência de malformações do
sistema nervoso.
Costa (2005), por sua vez, comprovou associação entre anomalia congênita e
assistência pré-natal inadequada (até três consultas) e entre mulheres com parto em
maternidade pública ou conveniada ao Sistema Único de Saúde.
Maior ocorrência de DTN tem sido observado no sexo feminino, em recém
nascidos com baixo peso e prematuros (Stevenson et al., 2000; Cortés et al 2001;
Nazer-Herrera et al., 2001; Aguiar et al., 2003; Pacheco et al 2006; Nascimento 2008).
Também têm risco aumentado de recorrência, crianças de pais que já tenham tido um
filho com DTN, quando um dos progenitores tem DTN e quando há dois filhos afetados
com o problema (Cortés, 2003).
Embora a etiologia de DTN não seja completamente conhecida, existem
evidências consistentes que associam a nutrição materna deficiente com a ocorrência de
risco mais importante identificado até hoje (Thame et al., 1998; Northrup e Volcik
2000; Frey e Hauser, 2003).
1.4. ÁCIDO FÓLICO NA PREVENÇÃO DE DEFEITOS DO TUBO NEURAL (DTN)
Resultados de ensaios clínicos randomizados evidenciaram que o uso de
suplemento de ácido fólico no período pré-concepção diminui significativamente a
incidência de DTN (Czeizel e Dudás, 1992). Revisão sistemática de três ensaios clínicos
randomizados indicaram que a suplementação medicamentosa com ácido fólico no
período periconcepcional reduz em 70% a recorrência de DTN (Blencowe et al., 2010).
O ácido fólico é uma vitamina hidrossolúvel do complexo B, conhecida por
participar das reações metabólicas indispensáveis para a síntese normal dos ácidos
nucléicos DNA e RNA, sendo vital para a divisão celular e síntese protéica.
Conseqüentemente, a deficiência de ácido fólico pode ocasionar alterações na síntese de
DNA e alterações cromossômicas dificultando o fechamento do tubo neural. Assim, o
ácido fólico é imprescindível para o crescimento normal na fase reprodutiva, ou seja,
durante o processo gravídico (Thame et al., 1998; Cortés et al., 2000).
As melhores fontes alimentares de ácido fólico são vísceras; leguminosas como
feijão, lentilha, grão de bico; frutas e hortaliças de folha verde como espinafre, brócolis,
couve (Vítolo, 2009).
A deficiência de ácido fólico pode ocorrer por diferentes causas como ingestão
inadequada de alimentos ricos nessa vitamina, absorção deficiente, alterações na sua
utilização, além de uma dieta pobre. Algumas outras situações podem levar à
deficiência de ácido fólico, tais como alcoolismo, doenças intestinais, uso de algumas
medicações como drogas antiepilépticas, diureéticos, antiglicemiantes (González
González e Garcia Carballo, 2003; Nasser et al., 2005; Eichholzer e Zimmermann,
2006).
Recente revisão sistemática da Cochrane que analisou quatro estudos de
6.425 mulheres, constatou que a suplementação com ácido fólico nesse período foi
eficaz em reduzir a incidência dos casos de DTN. Assim, os autores recomendam que
sejam feitas orientações em saúde e educação, com informações referentes ao efetivo
efeito do ácido fólico no período peri-concepcional de modo a contribuir para a
prevenção dos casos de DTN (Lumley et al., 2007).
Considerando o ácido fólico como principal fator de risco para a ocorrência de
DTN, em 1992, o Centers for Diseases Control and Prevention (CDC) recomendou que
todas as mulheres em idade fértil fizessem uso de 400µg/dia de suplemento de ácido
fólico obtido via suplementação medicamentosa ou alimentos fortificados (CDC, 1992).
O CDC recomenda ainda que a partir da confirmação da gravidez, a mulher continue a
ingerir 400µg/dia de ácido fólico. Mulheres com histórico familiar de DTN devem
receber prescrição de 4000µg/dia, dois meses antes da concepção até o 3º ou 4º mês de
gestação (CDC, 1992; Vítolo, 2009).
Embora existam campanhas de saúde pública que recomendam suplementação
periconcepcional diária com suplemento medicamentoso de ácido fólico para prevenção
primária de DTN, muitas mulheres não seguem tal recomendação, especialmente os
grupos mais vulneráveis como aquelas de baixo nível educacional, jovens e mulheres
com gravidez não planejada (Eichholzer e Zimmermann, 2006).
No Brasil, Fonseca et al. (2003) avaliaram o consumo de ácido fólico em 285
parturientes de uma maternidade pública do Rio de Janeiro e constataram deficiência de
folato em 51%, porém apenas 22,4% haviam feito uso de suplemento medicamentoso
de ácido fólico durante a gestação. Esses resultados indicam a necessidade e a
importância do aconselhamento sobre ingestão de suplemento de ácido fólico para
mulheres que planejam engravidar e também durante as consultas de pré-natal.
Para Scholl e Johnson (2000), devido à falta de informação sobre o efeito do
ácido fólico antes e durante a gravidez, casos de DTN são freqüentemente encontrados,
principalmente em filhos de mulheres de populações com dietas que contêm baixa
densidade de vitaminas e minerais, incluindo o ácido fólico.
Três estratégias podem aumentar a ingestão de ácido fólico: aumento do
consumo de alimentos fonte, suplementação e fortificação de alimentos. Esforços para
requer mudança nos hábitos alimentares. A suplementação periconcepcional também
tem tido pouco efeito porque cerca de 50% das gestações não são planejadas. Assim, a
fortificação de alimentos é uma estratégia considerada altamente efetiva por não
demandar mudança comportamental (CDC, 2010).
No Brasil, com objetivo de prevenir a ocorrência de defeitos congênitos do tubo
neural, especialmente em mulheres com antecedentes desse tipo de malformação, o
Ministério da Saúde recomenda a administração preventiva de 5mg/dia de ácido fólico
via oral no período pré-gestacional, durante 60 a 90 dias antes da concepção (Brasil,
2005). Apesar dessa recomendação desde 2005, estudo que avaliou a prevalência do uso
de ácido fólico e fatores associados na gestação e no período peri-concepcional,
realizado em cinco maternidades da cidade de Pelotas, RS, com 1.450 mulheres,
constatou uso de ácido fólico no período peri-concepcional, em apenas 4,3% das
mulheres, enquanto o uso de ácido fólico em algum momento da gestação foi de 31,8%
(Mezzomo et al., 2007).
A fortificação de alimentos é uma estratégia desde dezembro de 2002, data em
que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) tornou obrigatória a
fortificação das farinhas de trigo e milho com ferro e ácido fólico no País por meio da
Resolução n° 344, de 13 de dezembro de 2002, efetivamente implementada a partir de
junho de 2004 (Brasil, 2002). A ANVISA determina que cada 100g de farinha de trigo e
de milho seja fortificada com 150mcg de ácido fólico, pouco mais do que a
recomendação feita pela Food and Drug Administration (FDA), de 140mcg para cada
100g destas farinhas nos Estados Unidos (Crider et al., 2011).
Muitos estudos têm sido desenvolvidos para avaliar o impacto da fortificação de
alimentos com ácido fólico. Nos Estados Unidos, avaliação em 45 municípios de
Washington no período de 1990 a 1999 constatou que a prevalência de nascimento com
DTN informado nas certidões de nascimento diminuiu de 0,37 por 1000 nascidos vivos
antes da fortificação para 0,30 por 1000 nascidos vivos após fortificação obrigatória,
que representou declínio de 19% (Honein et al., 2001). De acordo com revisão de Crider
et al. (2011), estudos realizados nos Estados Unidos mostram redução de 19% a 32% na
prevalência de DTN desde que a fortificação tornou-se obrigatória em 1998. Na
América do Sul, constatou-se redução geral de 47% na freqüência de DTN após a
No Brasil, Pacheco et al. (2009) analisaram o efeito da fortificação das farinhas
na prevalência de DTN entre nascidos vivos no município de Recife, PE, a partir de
dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc). Apesar da tendência
de diminuição, não se identificou redução significativa na prevalência de DTN nos
períodos anterior (2000-2004) e posterior (2005-2006) à obrigatoriedade da fortificação
das farinhas de trigo e milho. Os autores, contudo, não descartam o benefício do ácido
fólico na prevenção de DTN e reforçam a necessidade da realização de outros estudos
que avaliem o efeito da fortificação alimentar com ácido fólico após período maior de
fortificação.
Apesar dos efeitos benéficos, alguns autores alertam para o risco de potenciais
efeitos adversos da fortificação de alimentos com ácido fólico tais como deficiência de
vitamina B12, câncer coloretal, abortamentos (Chanarin, 1987; Thame et al., 1998,
Calvo e Biglieri, 2008; Almeida e Cardoso, 2010).
1.5. SISTEMAS DE INFORMAÇÕES SOBRE NASCIDOS VIVOS –SINASC
O Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc) foi criado no Brasil em
1990, como medida para a coleta de dados sobre nascimentos. Sob a responsabilidade
das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, esse sistema baseia-se na Declaração
de Nascido Vivo (DN), documento obrigatoriamente emitido pela unidade de saúde
onde ocorreu o nascimento, ele inclui informações sobre a saúde materna, gestação e
características do recém-nascido (Almeida et al., 2006). Além de permitir análises
descritivas a partir de suas variáveis, o Sinasc possibilita também calcular indicadores
de saúde como mortalidade infantil e materna, mortalidade perinatal, níveis de
fecundidade e estimativas populacionais (Mello-Jorge et al., 1993). Assim, muitos
estudos na área da saúde materno-infantil têm utilizado esse sistema de informações
como meio para sua coleta de dados.
Em 1999 foi criado um novo campo na DN, conhecido por campo 34, para
auxiliar na captação de informações referentes à presença ou não de malformação
fornecer dados que possibilitam obter informações sobre incidência e/ou prevalência de
malformações congênitas, desde que as pessoas encarregadas por esse serviço sejam
devidamente capacitadas para o seu correto preenchimento (Luqueti e Koifman, 2009).
Luquetti e Koifman (2009) avaliaram a cobertura, validade e confiabilidade do
Sinasc para anomalias congênitas em hospital de Campinas, SP. Os resultados
indicaram que esse sistema ainda apresenta limitações como fonte para determinar a
prevalência de anomalias congênitas e indicam que esse sistema demanda
aprimoramento para retratar a situação desses casos no município de Campinas.
No município do Rio de Janeiro, estudo de confiabilidade das informações
presentes no Sinasc, verificou que as variáveis que apresentaram maior concordância
foram sexo do recém-nascido, peso ao nascer, idade da mãe, tipo de parto e gestação e
as variáveis com baixo índice de confiabilidade foram situação conjugal, instrução da
mãe e número de consultas pré-natal. Discute-se a importância da qualidade dessas
informações e o seu uso na área da saúde materno-infantil (Theme Filha et al., 2004).
Outro estudo feito para avaliar a confiabilidade das informações sobre defeitos
congênitos no município do Rio de Janeiro evidenciou resultados não muito
satisfatórios e apontaram para a necessidade de qualificação do pessoal que está
envolvido no preenchimento das DN, assim como a padronização da codificação dos
defeitos congênitos (Guerra et al., 2008a).
Apesar de tais limitações e falhas no preenchimento atribuída à alta rotatividade
dos trabalhadores, análise recente avalia o preenchimento do Sinasc como muito bom
2. FINALIDADE E QUESTÕES DE PESQUISA
Tendo em vista as repercussões e o impacto que os DTN geram para a família,
sociedade e também ao próprio indivíduo, delineou-se este estudo com a finalidade de
proporcionar uma ampla base de referência sobre a evolução desse problema no estado
de São Paulo e contribuir para o aperfeiçoamento das políticas públicas que visam a
prevenção e a minimização desse problema de saúde em nível populacional.
A questão de pesquisa que norteia este estudo é:
a) Será que a prevalência de DTN no Estado de São Paulo diminuiu após a
3. OBJETIVOS
Comparar a prevalência de defeitos do tubo neural no Estado de São Paulo, antes e após a fortificação das farinhas com ácido fólico
Estimar a prevalência de defeitos do tubo neural segundo características maternas e do recém-nascido antes e após a fortificação das farinhas com
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1. DELINEAMENTO METODOLÓGICO
Estudo transversal analítico, que utilizou dados secundários, do Sistema de
informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), disponibilizado pela Secretaria de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. Delineado para comparar a prevalência dos defeitos do tubo neural no estado de São Paulo em dois momentos, antes (1º de
janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2003) e após (1°de janeiro de 2006 a 31 de
dezembro de 2008) a efetiva implementação da estratégia de fortificação das farinhas
com ácido fólico.
4.2. LOCAL DE ESTUDO
O estudo foi desenvolvido no Estado de São Paulo, composto por 645
municípios distribuídos em um território de 248.196.960 (km2). Em 2010, a população
residente era de 41.262.199 habitantes, sendo 21.184.326 mulheres e 20.077.873
homens com densidade demográfica de 166.25 habitantes/km2. (http://www.ibge.gov.br
– acessado em 04/06/2011/Fundação IBGE, 2010).
Em 2008, o Estado de São Paulo conseguiu atingir o menor índice de
mortalidade infantil da história com taxas de 12,5 óbitos por 1000 nascidos vivos em
crianças menores de um ano. No país de forma geral, a mortalidade neonatal (que
ocorre de 0 a 27 dias) representa aproximadamente dois terços da mortalidade infantil, e
essa alta taxa se deve à ocorrência de mortes consideradas de difícil prevenção e
tratamento, como aquelas que se originam no período perinatal (de 22 semanas de
gestação a sete dias após o nascimento), como as malformações congênitas e/ou
4.3. COLETA DOS DADOS
Os dados foram coletados do Sistema de Informações Sobre Nascidos Vivos, do
Ministério da Saúde. No estado de São Paulo o órgão responsável por alimentar o
Sinasc é a Secretaria de Estado da Saúde, através do Centro de Informações Estratégicas
em Vigilância à Saúde e Coordenadoria de Controle de Doenças. As informações de
interesse foram captadas através do programa tabwin32.
4.4. VARIÁVEIS DO ESTUDO
No presente estudo, a variável dependente foi a presença de defeito de tubo
neural (DTN). Utilizou-se o capítulo X da 10ª Classificação Internacional de Doenças
(CID-10), considerando as seguintes anomalias e respectivos códigos, Anencefalia
(Q00.0), Encefalocele (Q01.0, Q01.8, Q01.9) e Espinha bífida (Q05.0, Q05.1, Q05.2,
Q05.3, Q05.4, Q05.7, Q05.9).
As variáveis independentes foram: período antes (de 1º de janeiro de 2001 a 31
de dezembro de 2003) e após a fortificação das farinhas com ácido fólico (de 1° de
janeiro de 2006 a 31 de dezembro de 2008); e também aquelas contidas no Sinasc,
denominadas como variáveis maternas e variáveis do recém-nascido.
As variáveis independentes foram divididas em maternas e do recém-nascido e
categorizadas da seguinte maneira:
a) Variáveis maternas:
Idade (em anos): < 14, 15-19, 20-34, 35 e +;
Escolaridade (em anos de estudo): nenhuma, 1-3, 3-7, 8-11, 12 e + anos;
Estado civil: com companheiro (casada e união consensual) e sem companheiro (solteira, separada e viúva);
Número de consultas pré-natal: < 4 vezes, 4-6, 7 e + vezes;
b) Variáveis do recém-nascido
Sexo: feminino, masculino;
Raça/cor: branca, preta, parda;
Peso ao nascer (Kg): < 1000, 1000-1499, 1500-2499, 2500-2999, 3000-3999, 4000 e +.
4.5. PROCESSAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS
Os bancos do Sinasc encontravam-se no software Tabwin32. As prevalências de
DTN antes e após a fortificação das farinhas foram calculadas por 1000 nascidos vivos.
Para tanto, dividiu-se o número de casos registrados de DTN pelo total de crianças
nascidas vivas no Estado de São Paulo em cada período e, posteriormente, a proporção
obtida foi multiplicada por 1000.
Utilizou-se teste de qui-quadrado com nível de significância de 5% para analisar
associação entre prevalência de DTN e características maternas e infantis. As
prevalências de DTN nos períodos antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação
das farinhas com ácido fólico foram comparadas por meio dos valores da razão de
chance - Odds Ratio (OR) - e respectivos intervalos de confiança (IC95%),
considerando que o OR é uma boa estimativa do risco relativo em doenças raras, como
é o caso de DTN. Todas as análises foram conduzidas no R.
4.6. CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
É importante ressaltar que o estudo utilizou dados secundários do Sinasc, sem
acesso aos dados de identificação dos sujeitos da pesquisa e por esse motivo não foi
necessário submeter o projeto à apreciação e aprovação de um Comitê de Ética em
Vigilância à Saúde e Coordenadoria de Controle de Doenças, bastando apenas
5. RESULTADOS
A Tabela 1 mostra as características maternas e da gestação no período antes
(2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação das farinhas com ácido fólico. Nos
períodos estudados, verificou-se diminuição de nascidos vivos de mães com menos de
20 anos de idade (mães adolescentes) e aumento de nascidos vivos de mães com 35
anos de idade ou mais. A escolaridade materna melhorou, com aumento do número de
nascidos vivos de mães com 8 anos ou mais de estudo e diminuiu o número de nascidos
vivos de mulheres com companheiro. Constatou-se maior número de nascidos vivos de
mães com 7 consultas ou mais de pré-natal, ademais, também verificou-se aumento de
nascidos vivos pré-termo (Tabela 1).
Constata-se pela Tabela 2, que mostra as características dos nascidos vivos,
maior proporção de nascimentos do sexo masculino, tanto antes quanto após a
fortificação. Com relação ao peso ao nascer, houve discreto aumento de nascimentos de
crianças com peso inferior a 1500g e superior a 3000g após a fortificação. Também
constata-se discreto aumento de nascimentos de crianças de cor parda e diminuição de
nascimentos de crianças brancas após a fortificação (Tabela 2).
A prevalência dos três tipos mais comuns de DTN (anencefalia, encefalocele e
espinha bífida) por 1000 nascidos vivos (NV) é apresentada na Tabela 3. Constatou-se
que a prevalência total de DTN reduziu-se significativamente no período estudado,
passando de 0,57 por 1000 nascidos vivos antes da fortificação para 0,37 por 1000
nascidos vivos após a fortificação. No período após a fortificação das farinhas com ácido fólico, os nascidos vivos tiveram menos chance de ter DTN em relação ao período
antes fortificação (OR:0,65; IC95%:0,59-0,72). Tanto a espinha bífida quanto a
anencefalia foram menos prevalentes no período após a fortificação. A espinha bífida
foi a anomalia mais freqüente, seguida pela anencefalia. A prevalência de espinha bífida
que era de 1,03 por 1000 nascidos vivos antes da fortificação caiu para 0,54 por 1000
nascidos vivos após a fortificação, redução estatisticamente significativa com menor
chance de ocorrência no período após a fortificação (OR:0,52; IC95%:0,45-0,59). A
chance de ocorrência (OR:0,79, IC95%:0,67-0,92). Encefalocele foi a menos freqüente
e não mostrou diferença significativa entre os períodos (Tabela 3).
Tabela 1- Características maternas e da gestação antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo.
Nascidos vivos Antes da fortificação
Nascidos vivos Após a fortificação
Variável* N** % N %
N = 3.666.911
Idade (anos)
<14 10547 0,57 10646 0,59
15-19 330619 17,73 282593 15,70
20-34 1330866 71,37 1291212 71,72
35 e + 192631 10,33 215801 11,99
Escolaridade (anos)
Nenhuma 19241 1,08 8881 0,51
1 a 3 155884 8,77 64628 3,71
3 a 7 570573 32,10 395057 22,70
8 a 11 748381 42,10 964950 55,44
12 e + 283574 15,95 306956 17,64
Estado civil
com companheiro 1218067 66,95 749389 43,51 sem companheiro 601262 33,05 972965 56,49
Número de consultas de pré-natal
< 4 vezes 123017 6,95 85381 4,80
4-6 vezes 471189 26,60 341013 19,19
7 e + 1176920 66,45 1351014 76,01
Duração da gestação
< 27 7613 0,42 8614 0,49
28 a 31 15072 0,82 14398 0,82
32 a 36 111091 6,07 120938 6,90
37 a 41 1684402 91,97 1600862 91,32
42 e + 13377 0,73 8286 0,47
*Nem todas as informações foram obtidas para todas as variáveis. **N=número total de nascidos vivos.
Tabela 2- Distribuição de NV segundo características dos recém-nascidos antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo.
Nascidos vivos Nascidos vivos
Antes da fortificação Antes da fortificação
Variável* N** % N %
Sexo
Masculino 955740 51,21 922707 51,25
Feminino 910514 48,79 877587 48,75
Peso ao nascer
< 1000 9322 0,50 10326 0,58
1000 – 1499 14407 0,78 14365 0,81
1500 – 2499 145033 7,83 137115 7,69 2500 – 2999 474601 25,63 449458 25,22 3000 – 3999 1136228 61,37 1100380 61,74
4000 e + 71821 3,88 70645 3,96
Raça/cor
Branca 1134538 79,82 1264124 77,35
Preta 21637 1,52 23748 1,45
Parda 259589 18,26 341461 20,89
Outras 5554 0,39 4988 0,31
*Nem todas as informações foram obtidas para todas as variáveis. **N=número total de nascidos vivos.
Tabela 3- Prevalência de defeitos do tubo neural (DTN) antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo.
Tipo Antes da fortificação Após a fortificação OR(IC95%) NV DTN n/1000 NV DTN n/1000
Espinha bífida 610555 629 1,03 601795 322 0,54 0,52 (0,45-0,59) Anencefalia 632483 348 0,55 603368 261 0,43 0,79 (0,67-0,92) Encefalocele 623302 92 0,15 595408 89 0,15 1,01 (0,76-1,36) TOTAL 1866340 1069 0,57 1800571 672 0,37 0,65 (0,59-0,72)
Durante o período analisado, o Sinasc registrou 1741 casos de DTN, 1069 antes
(2001-2003), a média anual de casos de DTN era de 356, enquanto após a fortificação das
farinhas, a média caiu para 224 casos por ano.
A Tabela 4 apresenta a análise estratificada da prevalência de DTN segundo
características maternas e do pré-natal e período antes e após a fortificação das farinhas.
Tabela 4- Prevalência de defeitos de fechamento do tubo neural (DTN) em nascidos vivos segundo características maternas e do pré-natal, antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo.
Antes da Fortificação Após a Fortificação
Variável DTN DTN OR(IC95%)
DTN n/1000 DTN n/1000
Idade (anos)
<14 7 0,66 3 0,28 0,42 (0,11-1,64)
15-19 242 0,73 100 0,35 0,48 (0,38-0,61)
20-34 711 0,53 481 0,37 0,70 (0,62-0,78)
35 e + 109 0,57 88 0,41 0,72 (0,54-0,95)
p-valor* <0,001 0,749
Escolaridade (anos)
Nenhuma 13 0,68 4 0,45 0,67 (0,22-2,04)
1 a 3 94 0,60 26 0,40 0,67 (0,43-1,03)
3 a 7 358 0,63 151 0,38 0,61 (0,50-0,74)
8 a 11 421 0,56 392 0,41 0,72 (0,63-0,83)
12 e + 122 0,43 83 0,27 0,63 (0,48-0,83)
p-valor 0,008 0,020
Estado civil
com companheiro 672 0,55 288 0,38 0,70 (0,61-0,80) sem companheiro 370 0,62 363 0,37 0,61 (0,52-0,70)
p-valor 0,098 0,734
Número de consultas de pré-natal
< 4 vezes 115 0,93 58 0,68 0,73 (0,53-1,00)
4-6 vezes 300 0,64 183 0,54 0,84 (0,70-1,01)
7 e + 588 0,50 414 0,31 0,61 (0,54-0,70)
p-valor <0,001 <0,001
Duração da gestação
< 27 21 2,76 4 0,46 0,17 (0,06-0,49)
28 a 31 64 4,25 40 2,78 0,65 (0,44-0,97)
32 a 36 222 2,00 153 1,27 0,63 (0,52-0,78)
37 a 41 723 0,43 435 0,27 0,63 (0,56-0,71)
42 e + 10 0,75 4 0,48 0,65 (0,20-2,06)
p-valor <0,001 <0,001
No geral, análise por período mostrou associação estatisticamente significativa
de DTN com idade e escolaridade materna antes da fortificação e com número de
consultas de pré-natal e duração da gestação em ambos os períodos.
Verificou-se redução significativa da prevalência total de DTN no período após
a fortificação para mulheres em todas as faixas etárias, exceto para adolescentes
menores de 15 anos de idade. Antes da fortificação, a prevalência de DTN era mais
elevada entre mães adolescentes (< 20 anos), seguida por mães com idade igual ou
superior a 35 anos, faixa etária que após a fortificação concentrou a maior prevalência,
porém sem diferença estatística significativa.
Com relação à escolaridade, houve redução significativa de DTN após a
fortificação em todos os níveis de escolaridade, exceto para aquelas com três anos ou
menos de estudo. Antes da fortificação a prevalência associou-se estatisticamente com a
escolaridade, sendo maior para mães com menos de oito anos de estudo, porém após a
fortificação não se constatou mais essa associação.
A redução na prevalência de DTN foi significativa para mulheres com e sem
companheiro e em ambos os períodos, a prevalência de DTN não se associou com essa
variável.
A prevalência de DTN foi significativamente maior entre mães com menor
número de consultas de pré-natal em ambos os períodos. Entretanto, a redução na
prevalência de DTN foi estatisticamente significativa somente para aquelas que
realizaram sete consultas pré-natais ou mais.
Os DTN associaram-se significativamente com duração da gestação em ambos
os períodos, e após a fortificação, constatou-se redução significativa de DTN em todas
as categorias de duração da gestação, exceto para nascidos vivos com 42 semanas ou
mais de gestação.
Análise da prevalência de DTN segundo características do recém-nascido
(Tabela 5) apontou redução significativa para ambos os sexos e mostrou que no período
antes da fortificação, a prevalência era estatisticamente maior no sexo feminino, porém
Observou-se maior prevalência de DTN em crianças com baixo peso ao nascer
(< 2500g) em ambos os períodos (p<0,05), com redução estatisticamente significativa
de DTN para todas as faixas de peso ao nascer, exceto para nascidos com 4000g ou
mais. Não se observou associação de DTN com raça/cor, porém após a fortificação a
redução foi significativa para brancos e pardos.
Tabela 5- Prevalência de defeitos de fechamento do tubo neural (DTN) em nascidos vivos segundo características infantis, antes (2001-2003) e após (2006-2008) a fortificação, Estado de São Paulo.
Antes da Fortificação Após a Fortificação
Variável do RN DTN DTN OR(IC95%)
DTN n/1000 DTN n/1000
Sexo
Masculino 450 0,47 336 0,36 0,77 (0,67-0,89)
Feminino 614 0,67 327 0,37 0,55 (0,48-0,63)
p-valor* <0,001 0,070
Peso ao nascer
< 1000 60 6,44 43 4,16 0,65 (0,44-0,96)
1000 – 1499 107 7,43 78 5,43 0,73 (0,55-0,98)
1500 – 2499 275 1,90 185 1,35 0,71 (0,59-0,86) 2500 – 2999 254 0,54 164 0,36 0,68 (0,56-0,83) 3000 – 3999 346 0,30 185 0,17 0,55 (0,46-0,66)
4000 e + 20 0,28 12 0,17 0,61 (0,30-1,25)
p-valor <0,001 <0,001
Raça/cor
Branca 706 0,62 514 0,41 0,65 (0,58-0,73)
Preta 17 0,79 10 0,42 0,54 (0,25-1,17)
Parda 153 0,59 105 0,31 0,52 (0,41-0,67)
Outras 3 0,54 2 0,40 0,74 (0,12-4,44)
p-valor 0,702 0,075
6. DISCUSSÃO
À semelhança do que se tem constatado internacionalmente, os resultados
indicaram redução estatisticamente significativa de 35% na prevalência de DTN no
Estado de São Paulo, com uma diminuição de 0,57 para 0,37 por 1000 nascidos vivos
após a fortificação obrigatória das farinhas com ácido fólico. As reduções nas
prevalências de espinha bífida e anencefalia foram de 48% e 22%, respectivamente,
evidenciando que a chance de uma criança nascer com esses defeitos congênitos foi
estatisticamente menor no período após a fortificação. Tais reduções importantes na
prevalência dos DTN, associadas com a fortificação de alimentos com ácido fólico têm
sido relatadas em diversos países, com reduções que variam de 10 a 78% (Santos e
Pereira 2007; Flour Fortification Initiative, 2009; Crider et al., 2011).
Nos Estados Unidos, a fortificação de cereais tornou-se obrigatória a partir de
janeiro de 1998. Avaliação do impacto dessa medida sobre a ocorrência de DTN em
nível nacional foi realizada a partir da análise de certidões de nascimentos em 45
estados norte-americanos, comparando-se registros de espinha bífida e anencefalia nos
períodos antes da fortificação (outubro de 1995 a dezembro de 1996) e após a
fortificação (outubro de 1998 a dezembro de 1999). Os resultados mostraram que a
prevalência diminuiu de 0,37 para 0,30 por 1000 nascidos vivos, representando uma
redução de 19% (Honein et al., 2001). Outra análise de dados nacionais, realizada no
período de 1996 a 2001, constatou um declínio de 23% após a fortificação (CDC, 2002).
Dados de um sistema de vigilância que cobre cerca de metade dos nascimentos no país
evidenciam que a prevalência de DTN diminuiu cerca de 36% de 1996 a 2006 (CDC,
2010). Entretanto, em 2004, destacava-se a necessidade de esforço adicional para se
alcançar a meta nacional de redução de 50% na ocorrência de espinha bífida e outros
DTN (Mills e Signore, 2004; CDC, 2002).
Vários estudos conduzidos no „ também constataram diminuição na prevalência
de DTN após a fortificação das farinhas com ácido fólico, que se tornou obrigatória em
novembro de 1998 (Persad et al., 2002; Liu et al., 2004; De Walls et al., 2008). Em
Ontário, a partir do rastreamento de quase 350 mil mulheres, verificou-se redução de
48% na prevalência de DTN aberto, que caiu de 1,13 por 1000 gestações antes da
Quebec, a prevalência caiu 32%, de 1,89 por 1000 nascimentos no período de
1992-1997 para 1,28 por 1000 nascimentos entre 1998-2000 (De Wals et al., 2003). Estudo
realizado no período de 1993 a 2002 em sete províncias canadenses encontrou redução
de 46% na prevalência de DTN, que passou de 1,58 por 1000 nascimentos no período
anterior à fortificação para 0,86 por 1000 nascimentos após março de 2000, período
considerado com total fortificação (De Wals et al., 2007).
Baboza e Umaña (2011) avaliaram o impacto da fortificação de alimentos com
ácido fólico sobre a prevalência de DTN na Costa Rica, que desde 1997 fortifica a
farinha de trigo, em 1999 passou a fortificar a farinha de milho, em 2001 o leite de vaca
e em 2002 o arroz. Análise de todos os nascimentos ocorridos de 1987 a 2009 revelou
que antes da fortificação, a prevalência de DTN oscilava de 1,0 a 1,8 por 1000
nascimentos, com taxa de 1,19 por 1000 nascimentos no período de 1987-1997. A partir
de 1998 apresentou diminuição significativa até atingir redução de 58% no triênio de
2007-2009.
Resultados similares têm sido constatados também na América do Sul, onde se
estima uma redução global de cerca de 47% (López-Camelo, 2010). Dados preliminares
do Chile, que iniciou a fortificação de alimentos com ácido fólico no ano 2000,
mostraram redução de 31% na prevalência de DTN em apenas 20 meses de fortificação
(Castilla et al., 2003). Dados mais definitivos evidenciaram diminuição de 51% para
espinha bífida (0,93 antes da fortificação para 0,48 por 1000 nascimentos após a
fortificação) e de 43% para anencefalia (de 0,82 para 0,32 por 1000 nascimentos)
(López-Camelo et al., 2005). Na Argentina, a fortificação foi efetivamente
implementada em abril de 2004 e análise de dados de 2000 e 2005 mostraram
diminuição percentual de 53,8%, 45,4% e 33,4% na ocorrência de anencefalia, espinha
bífida e encefalocele, respectivamente (Calvo e Biglieri, 2008).
No Brasil, como referido, há poucos estudos que avaliaram o efeito da
fortificação das farinhas com ácido fólico na prevalência de DTN. Tratam-se dos
estudos de Pereira (2007) e Pacheco et al. (2009). O primeiro, realizado no Distrito
Federal, analisou dados de um hospital de referência e observou queda de 43,7% na
prevalência de DTN entre os anos de 2003 a 2006, com diferença estatisticamente
significativa entre esses dois anos. O outro, realizado no município de Recife, PE, a
prevalência de DTN nos períodos anterior (2000-2004) e posterior à fortificação
(2005-2006), que passou de 0,72 para 0,51 por 1000 nascidos vivos. Assim, a importância
deste estudo está no fato de praticamente não existirem estudos dessa natureza em nosso
país e porque se avaliou o efeito da fortificação na prevalência de DTN no Estado
brasileiro que concentra o maior contingente populacional, fornecendo uma ampla base
de referência que certamente servirá de apoio para outros estudos que tenham como
objetivo avaliar a efetividade da política de fortificação de alimentos.
No presente estudo, da análise de um total de 3.666.911 nascidos vivos,
constatou-se a ocorrência 1741 casos de DTN registrados no Sinasc do Estado de São
Paulo nos seis anos analisados, sendo 1069 no período antes da fortificação (2001-2003)
e 672 após a fortificação (2006-2008). A média anual de 356 casos de DTN antes da
fortificação caiu para 224 casos por ano. Apesar dessa queda, o número de casos é
muito elevado, considerando tratar-se de uma malformação congênita evitável, pois
tanto estudos observacionais, quanto de intervenção, incluindo estudos de caso-controle
e estudos clínicos randomizados têm demonstrado que um consumo adequado de ácido
fólico no período peri-concepcional pode prevenir de 50 a 70% dos casos de DTN
(Lumley et al., 2007; CDC, 2010).
De fato, experiências de 15 anos de fortificação com ácido fólico evidenciam
que os percentuais de redução na prevalência de DTN são consideráveis, porém essa
análise indica uma redução de apenas 2% na prevalência de espinha bífida no Brasil,
justificado pelo uso de estudo que analisou dados três meses após a fortificação (Flour
Fortification Initiative, 2009). Revisão sistemática realizada por Blencowe et al. (2010)
encontrou dez estudos populacionais do tipo antes e depois que avaliaram o efeito da
fortificação de alimentos com ácido fólico e a meta-análise de oito desses estudos
constatou que a fortificação pode reduzir em cerca de 46% a incidência de DTN.
O padrão de freqüência dos DTN analisados no presente estudo, espinha bífida,
anencefalia e encefalocele, seguiu o descrito na literatura, sendo o mais prevalente a
espinha bífida e a anencefalia (Castilla et al., 2003; De Wals et al., 2007; Calvo e
Biglieli 2008; Pacheco et al., 2009; López-Camelo, 2010; Barboza e Umaña, 2011). No
caso da encefalocele, segundo Barboza e Umaña (2011), embora seja classificada como