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Educação continuada e a formação do profissional reflexivo

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Academic year: 2021

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Apresentação

Educação continuada e a formação do profissional reflexivo

Beltrina Côrte Vera Brandão

bordar a educação continuada, na perspectiva da formação do profissional reflexivo (Schonn, 2007), é desafio que se impõe aos professores e aos que buscam conhecimentos na sociedade atual. A educação adquiriu na nossa sociedade um caráter instrumental e, desde a infância, somos treinados para resultados.

Formados, já no mercado de trabalho, as exigências resultantes da acelerada transformação social e tecnológica leva a maior parte dos profissionais a constantes cursos de reciclagem, aperfeiçoamento, especialização, mestrado, doutorado, MBA, entre outros. A comunicação em tempo real – aqui/agora - impele ao consumo constante, e absurdo, de informações que não temos tempo de apreender e, consequentemente, de elaborar e transformar em um saber consistente.

Como realizar o imprescindível processo de educação continuada baseada na reflexão crítica? A permanente busca de novos instrumentos e técnicas de trabalho? Os cursos de atualização, também para quem já se aposentou, mas quer continuar ativo intelectualmente? O conhecimento de outro idioma – mas não a cultura que o contextualiza? O curso que nos propõe a chave para o

sucesso, como uma receita? Mas qual o sentido que damos a essas escolhas,

ao longo da trajetória de vida?

Trajetória de vida, ou trajetória identitária, entendida aqui como o processo de apreensão da realidade da qual cada indivíduo - a partir de sua percepção única e mergulhado numa cultura social ampla e familiar - abstrai, reordena e transforma em projeto, profissão, modo e estilo de vida. O indivíduo é influenciado e influencia, formando um elo, em uma corrente sem fim, do que chamamos saber, que constrói e dá sentido à trajetória humana.

Muitas são as questões na área da formação, e temos observado crescente imposição da profissionalização para o mercado. Japiassu, em sua crítica ao modelo vigente, afirma que “a lógica do conhecimento submete-se à lógica da encomenda, consequentemente, à lógica do mercado” (1995, p.79).

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Como refletir sobre o tema do ensino-aprendizagem – a construção do saber - em um tempo de movimento e incerteza, que caracteriza a sobremodernidade

e a lógica do mercado? (Balandier, 1997).

Segundo Schonn (2007), o ensino prático reflexivo é elemento-chave na educação profissional atual, ponte entre o mundo acadêmico e a prática profissional. Muitas de nossas escolas e universidades estão orientadas apenas pela disciplina e a lógica do mercado, desarticuladas de contextos essencialmente complementares e dos desafios reais do cotidiano no mundo do trabalho.

Formação restrita, instrumentalizada, mecânica, que remete à célebre cena do filme de Charles Chaplin – Tempos Modernos (1936) -, na qual o operário só aperta parafusos... Hoje aperta botões.1

Importante ressaltar que a tecnologia é o maravilhoso resultado do avanço humano nas ciências, buscando o progresso por “um mundo melhor”. No processo de instrumentalizar conhecimentos e práticas perde-se o fator surpresa - visto como “falha” ou falta de competência -, que pode nos encaminhar para a atitude de reflexão na ação.

No processo de educação continuada reflexiva nos deparamos com o denominado conhecimento emancipatório, como proposto por Santos (2000), no contexto de uma teoria crítica que se imponha ao consenso de resignação e

razão indolente – perspectiva de aceitação ante a homogeneização decorrente

das globalizações, que afeta toda a formação.

O autor propõe como alternativa (des)pensar para (re)pensar – novas formas de aprendizagem e ações sociais, valorizando os sujeitos e suas singularidades sócio históricas e individuais.

A surpresa ante o novo decorrente de situações inesperadas, de falhas e hesitações não é parte do cotidiano de todos os profissionais? Na hesitação podemos, se preparados, exercitar a prática reflexiva: o que fazer? Essas questões indicam a educação continuada, na perspectiva crítica e interdisciplinar - aliando teoria e prática dos diferentes profissionais –, como caminho para a compreensão ampliada que facilite a ação em processo.

A educação continuada crítica e interdisciplinar instiga o profissional a revisitar as escolhas feitas e a praxis. Devemos perguntar: por que escolhemos nosso tema de estudo? Qual o sentido do projeto de vida-trabalho que guiou a escolha inicial? No que mudamos, nós e nossos projetos? O que conservamos do sentido-paixão que nos fez trilhar esse caminho? Quais os desvios feitos? O que fizemos dos nossos projetos?

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Estes são pontos que nortearam a organização do curso lato sensu - Especialização em Gerontologia.

O curso, com carga horária de 360 horas, dividida em módulos, é promovido pelo Programa de Estudos Pós-graduados em Gerontologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e se justifica pelo crescimento da população idosa, dado significativo a ser avaliado não somente pelo Estado, a partir de políticas específicas para os que envelhecem, mas por toda a sociedade.

A Gerontologia é área do saber que fornece instrumentos e referenciais analíticos para os profissionais e acumula vasta produção científica.

É significativo o número de pesquisas que tem, na velhice e no processo de envelhecimento, o objeto central de suas investigações. Diretamente vinculadas à vida cotidiana dos milhões de brasileiros idosos, questões relacionadas à identidade e subjetividade, às trocas sociais e afetivas, à saúde, à previdência social, ao trabalho, à família e às políticas públicas, dentre outras, encontram-se, na atualidade, especialmente contempladas.

Ousamos construir um conhecimento que teça a linha - ordem, método, razão - para a formação da rede - intuição, imaginação, criatividade, relação - como forças complementares que mesclam estilos, procedimentos, aberturas para espaços do fazer que, em última instância, organizará os conceitos aprendidos e as experiências vividas.

Acreditamos que o exercício de reaprender e refazer é individual e coletivo, no movimento da escuta sensível de nós mesmos e dos outros. Descobrir, construir, aprender e ensinar com e a partir da intersubjetividade, “pois o segredo está na intenção da troca” (Fazenda, 2001, p. 22).

O projeto de Educação Continuada deve ter sentido para que o professor possa “encantar” o aluno-profissional, que busca renovação ou inicia um caminho - e despertar nele o desejo de conhecer – uma viagem de aventura – a aventura da descoberta. Esse caminho deve ser percorrido em conjunto – alunos e professores - e as perguntas geradoras de reflexões devem ser lançadas a todos.

Essa perspectiva implica o diálogo, a parceria e a interação de inter-subjetividades, um desafio que exige clareza dos objetivos a serem atingidos pelo grupo, um tempo de reflexão e de espera, no qual seja praticada a difícil arte da humildade ante o saber-fazer dos demais e diante das limitações recíprocas (Fazenda, 2001).

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A inclusão de todos, na perspectiva de educação continuada em Gerontologia, é tarefa exigente. As questões teóricas e filosóficas indicam a imperiosidade da apreensão da velhice como questão complexa; isso significa que ela abriga um conjunto de saberes e de áreas de conhecimento - sociologia, psicologia, antropologia, serviço social, economia, política, direito, biologia, filosofia, entre outras - para uma compreensão abrangente e ao mesmo tempo substantiva. Esse conjunto de saberes deve ser pensado como relações e interfaces, características da interdisciplinaridade. Refletir sobre a velhice, nessa perspectiva, sugere o desenvolvimento de novo olhar, novo pensar a respeito dos vários significados e dimensões do envelhecer.

O nº 37 da Revista Portal de Divulgação, do mês de outubro, exemplifica esse processo por meio das reflexões interdisciplinares desenvolvidas na disciplina Envelhecimento com dependência: os cuidadores, ministrada por Bernadete de Oliveira e Isabella Bastos de Quadros, que são as editoras convidadas deste número, e assim a definem:

A disciplina aborda o processo de envelhecimento e a longevidade humana, reconhece a dependência e a fragilidade como condições humanas e evidencia o cuidado e a qualidade de vida como diretrizes básicas de atuação profissional para ter e manter uma boa saúde. Estimula o profissional a trabalhar em equipe, fortalecer a sua rede e identificar as necessidades ditas e não ditas pelo idoso, por meio de avaliação utilizando instrumentos validados e mecanismos de ação que envolvam a compreensão interdisciplinar dos cuidados singulares e coletivos que a velhice requer.

Referências

BALANDIER, George. (1997). A Desordem – Elogio do Movimento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

BRANDÃO, Vera Maria A. T. (2006). “Aprendizagem ao longo da vida na perspectiva interdisciplinar”. In: Fazenda, I. (org.). Interdisciplinaridade na

formação de professores: da teoria à prática. Canoas RS, Ed.Ulbra.

pp.163-172.

FAZENDA, Ivani. (org.) (2001). Dicionário em Construção: Interdisciplinaridade. São Paulo: Cortez.

JAPIASSU, Hilton. (1995). “A Crise das Ciências Humanas”. In: Fazenda, I. (org). A Pesquisa em Educação e as Transformações do Conhecimento. São Paulo: Papirus.

SANTOS, Boaventura S. (2000). A Crítica da Razão Indolente. Contra o

desperdício da experiência. São Paulo: Cortez.

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Data de recebimento: 22/09/2013; Data de aceite: 22/09/2013.

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Beltrina Côrte - Jornalista, com doutorado e pós.doc em Ciências da

Comunicação/USP. Professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia e coordenadora do curso de Especialização em Gerontologia, campus Ipiranga, ambos da PUC-SP. Membro do Observatório da Longevidade Humana e Envelhecimento (OLHE) e coordenadora de conteúdos do Portal do Envelhecimento. E-mails: beltrina@pucsp.br ou beltriolhe@gmail.com.

Vera Brandão - Pedagoga (USP). Mestre e doutora em Ciências Sociais-

Antropologia (PUC-SP). Pesquisadora (CNPq PUC-SP). Docente do COGEAE (PUC-SP). Membro fundador do OLHE. Coeditora do Portal do Envelhecimento e da Revista Portal de Divulgação. E-mail: veratordinobrandao@hotmail.com

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