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I{AI,II}AI}E:
Caro
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Prof.
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Campos
Mestrado
em
Psicologia
Areade especiali zaçáo: Psicologia Clínica e da Saúde
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TRAÇOS
DISFUI§CIONAIS
DE CIÊNCIAS SOCIAISPSICOLOGIA
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DE
ÉVORA
DEPARTAMENTO
DE
PSICOLOGIA I
ESCOLA
DE CIÊNCIAS SOCIAIS
REPRESENTAçÕES PARENTAIS
E
TRAÇOS DISFUNCIONAIS
DE
PERSONALIDADE:
UM ESTUDO
COM
UMAAMOSTRA
DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOSAna Carolina Silva
FrancoOrientação: Prof.
Doutor RuiC.
CamposRS
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)+L
I4o
Mestrado
em
PsicologiaArea de Especialização:
PsicologiaClínica
eda
Sa(tdeAgradecimentos
Gostaria de começar este trabalho por agradecer a quem, não o tendo feito por
mim, teve uma parte activa na sua realização.
Em primeiro lugar,
ao
professore
orientador,o
Prof. Doutor Rui Campos. Pelapaciência, pelas orientações, pelos incentivos,
e
até pelas divergências, que são, nofundo, o combustível que nos mantêm seres pensantes e constantemente desafiantes do conhecimento do mundo, e até de nós mesmos, um grande obrigada.
Uma palavra
de
reconhecimentofica
também parua
Dr.a lsabel Leal, que tão gentilmente disponibilizou uma das provas utilizadas neste trabalho, mostrando que apartilha
de
informação
é
necessária
para
que
haja
a
construção
de
novos conhecimentos. Todos ficam a ganhar.A todos os professores que permitiram a recolha dos dados utilizados para esta
investigação fica também uma palavra de reconhecimento. A Prof.a Fátima Bernardo,
à
Prof.a Catarina Vaz Velho,ao
Prof. José Saias, ao Prof. Luís Rato, à Prof.a Teresa Gonçalvese à
Prof.a Graça Carita, por terem tão gentilmente cedido o seu tempo,já
de si
precioso, paraque
pudesse ser feitaa
recolha dos dados sem os quais nadadisto seria possível.
A todos os sujeitos que acederam a responder a tâo longo pacote de provas, por terem aberto um pouco a sua "janela da alma" e permitido que os conhecêssemos, e, de forma última, a nós próprios também.
A todos os professores que, num dado momento na minha vida, me incutiram o
gosto pelo conhecimento, pela procura de significados. Um agradecimento especial à
Prof.a Idalina,
à
Prof.a Filomena Amorime à
Prof.a lsabel Mesquita.Por
me teremtransmitido a ideia de que realmente o saber não ocupa lugar, ficar-vos=ei eternamente
grata.
Aos
meus amigos, portodos os
momentosjá
partilhadose
pelosque
aindairemos certamente partilhar. Uma tese faz-se não só de trabalho escrito, mas também de discussão construtiva, de troca de ideias, de discussões, de críticas, de conselhos,
de disparates, de riso, de telefonemas
a
qualquer hora para dúvidas ou apenas paradesabafos... Faz-se, no fundo, através de um sentimento que não pode ter outro nome
senão Amor. Um grande obrigada por tudo aquilo que são para mim,
e
pelo que me permitem ser para todos vós, em todos os momentos, bons e maus.Um agradecimento especial
à
Maria, que além dese
inserirna
secção acima,encarado esta parte da tarefa como aterrorizante. Pela eterna paciência, e pelo tempo que tirou a si mesma para mo dar a mim, deixo uma palavra de reconhecimento.
À
minha família, que compreendeuo
espaço de queeu
preciseiao
longo dealgum tempo,
e
que se
encarregoude
me
manteros pés
assentesna terra
nosmomentos
certos. Mas
tambémpelas
distracções,que me
mantiveram (mais oumenos) mentalmente
sã. Aos
meuspais,
particularmente,por terem
sempre sido "suficientemente bons". Devo-vos imenso.A quem não está "aqui", mas que transporto sempre dentro de mim.
Resumo
Represe
ntações
Parentais
e
Traços Disfuncionais
de Perso
nalidade:
llm
estudo
com
uma
amostra
de
estudanÚes
universitários
O
objectivodo
presente trabalhofoi
estudara
relaçãoentre
representaçõesparentais
e
traços disfuncionaisde
personalidadeem
sujeitos adultosda
populaçãonão-clínica. Participaram 177 estudantes universitários, dos quais 104 eram mulheres
e
73 eram homens, com idades entreos
18e
os 43 anos (M=22,66; DP=4,054). Foiaplicado
o
Mitlon Ctinicat Multiaxial lnventory-ll,o
Parental Bonding lnstrumenfe
oObject
Retations lnventory.De
acordo comos
resultados, existe uma relação entrealguns tipos
de
traços disfuncionaisda
personalidadee
experiências disruptivas narelação precoce
com
ambas
as
figuras
parentais,como
a
falta
de
autonomia psicológica e instrumental sentida, e com determinados elementos das representaçõesdas figuras
parentais,como
a
percepçãode
uma
menor benevolênciaou
maiorpunição. Encontram-se também diferenças entre sujeitos do sexo masculino e do sexo
feminino
no
que
respeita
ao
padrão
específicode
correlaçõesentre traços
de personalidade e características da relação e das representações parentais.Palavras-chave: Representações parentais; Experiências precoces; Traços de personalidade.
Abstract
Parental
Represe
ntations
and
Dysfunctional
Personality
Traib:
A
study
with
a
sample
of
university students
The
purpose
of
this
work was
to
study
the
relation between
parentalrepresentations and dysfunctional personality traits in adult subjects from a non-clinical
population. Participants were 177 university students, 104 of which were female and 73
were
men.Ages
rangedfrom
18to 43
yearsold
(M=22,66; DP=4,054).The
MillonCtinical
Muttiaxiallnventory-ll,
the
Parental Bonding lnstrument and
the
ObiectRelations lnventory
were
administered. Accordingto the
results,there
is
a
relationbetween certain types of dysfunctional personality traits and disruptive experiences in
the early
relationswith
both caregivers,like
a
perceived lackof
psychological andinstrumental autonomy, and with certain elements of parental representations, like the perception of less benevolence or
a
more punitive attitude. Differences between maleand
female subjects, concerning
the
specific pattern
of
correlations
betweenpersonality traits and parental relations' and representations' characteristics, were also
obtained.
Índice
lntrodução.
Parte I
-
Fundamentação Teôrtca..
Capítulo I
-
Experiências Relacionais na !nÍância...1.
As relações precoces2.
A teoria das relações de objecto e a teoria da vinculação....3.
Da relação objectal à representação do se/f e dos outros....4.
A avaliação das representações objectais...'.5.
Perturbaçôes das representações objectais..."...Capítulo ll
-
A Personalidade: Funcionamento Norma! e Patológico...1.
Modelos de compreensão da personalidade e de perturbaçôes... 1.1 O modelo categorial do DSM....1.2 O modelo de traços de Theodore Millon.... 1.3 O modelo dimensional de Sidney 81att...".
Gapítulo
lll-
Estudos Empíricos Prévios1.
Experiências infantis e perturbações de personalidade.'...'...2.
Estudos sobre perturbaçôes na formação identitária..3.
Estudos sobre a depressão...4.
Estudos sobre a relação entre representações objectais e perturbaçõesde personalidade...
Parte
ll
-
Estudo Empírico..
Gapítulo lV
-
Obiectivos e Hipóteses de lnvestigação.. Capítulo V-
Metodologia...Participantes na investigação...
lnstrumentos de medida...
2.1 Object Relations lnventorY...
2.2 Parental Bonding lnstrument
2.3 Millon Clinical Multiaxial lnventory
-
11...Procedimentos e cuidados éticos...
Metodologia de análise dos dados recolhidos....
1 5 7 7 10 16 21 23 1. 2. 3. 4. 27 27 28 32 39 45 45 46 48 48 53 55 59 59 59 61 65 66 68 68
Capítulo Vl
-
Resultados... 69 69 72 72 74 76 79 79 84 85 88 94 97 1. 2. Estatística descritiva..Análise das correlações...
2.í
Análise de correlaçôes entre as escalasdo
MCM\-
tt e
as escalas do P8t...2.2
Análisede
correlaçõesentre as
escarasdo
MCM|-
tt
e
os
quatro factores e o nível conceptuaÍdo ORI para a Mãe...2.3
AnáÍisede
correlaçõesentre as
escalasdo
MCM\-
tt
e
os
quatrofactores e o nível conceptual do ORI para o pai... Capítulo
Vll-
Discussão dos Resultados...1.
Representação da relação com as figuras parentais.2.
Representação das figuras parentais...2.1 Representação da figura materna....
2.2 Representação da figura paterna...
3.
Limitações do estudo. Capítulo Vlll-
Conclusões... Referências Bibliográficas... Anexos....í03
1í3
lntrodução
A
influência que os cuidados parentais têm no desenvolvimento das crianças éinegável. Com cada
vez
mais frequência,
investigadoresde
diversas áreas
daPsicologia
têm vindo
a
estudar
a
forma como
as
relaçõesde
cuidado
precoce influenciam o desenvolvimento psicológico das crianças (Blatt & Lerner, 1983b).Partindo
da
noçãode que estas
relações precocessâo
internalizadase
setransformam em padrões a ser repetidos ao longo da vida do sujeito, sob a forma de
esquemas cognitivo-afectivos, existem diferentes teorias sobre
a
forma como estessurgem
e
influenciam o desenvolvimento das crianças, como a teoria das relações deobjecto
(Blatt,
1974, 1995, 2004;Blatt
&
Lerner, 1983a)e
a
teoria da
vinculação (Ainsworth, 1969; Ainsworth, Blehar, Waters &Wall,
1978; Bowlby, 1980). Contudo,parece
ser
comummente aceiteque será
a
partirdas
interacçõescom as
figuras significativas na infância, normalmente o pai e a mãe, que a criança se começaráaver
a si mesma e ao mundo que a rodeia, o que permitirá a emergência de representações de se/f e dos outros. Será também a partir dessas relaçôes que a criança construirá osesquemas heurísticos
que lhe
permitirâoa
regulaçãodo
seu comportamento (Blatt,Wein,
Chevron&
Quinlan,
1979; Blaü, Chevron, Quinlan, Schaffer& Wein,
1992;Ainsworth, 1969; Levy, Blatt & Shaver, 1998).
A
internalizaçáo destas relações passapor
diversas etapas.No
entanto, porvezes
ocorrem disrupções demasiado intensas
nas
relações
de
cuidado,
econsequentemente na sua internalização, para que
a
criançaas
consiga ultrapassar adequadamente,tendo esta
de
canalizaruma
energia psíquica considerável paraconseguir lidar com essas experiências perturbadoras. Como consequência origina-se
uma fixação
no
momentodo
desenvolvimentoem
que
a
criança
se
encontravaaquando
da
perturbação (Harpaz-Rotem&
Blatt, 2005;
ljzendoom,1995; Blatt
&Shichman, 1983a).
Crê-se que estas interacçôes precoces tenham um impacto significativo e que os
seus aspectos básicos tendam a perdurar ao longo da vida do sujeito, apesar de haver
alguma possibilidade de alteração destes esquemas de acordo com as experiências a
que
o
sujeitoesteja
expostoao
longo da vida
(Beebe&
Lachmann, 1988; Blatt,Auerbach
&
Levy, 1997). Neste sentido, torna-se prementeo
estudodas
possíveisrepercussões destas experiências disruptivas mais
tarde no
desenvolvimentoe
nofuncionamento mental do indivíduo (Besser & Blatt,
2007
Bornstein, 2006), de modo aque
esse
conhecimentopossa
de
certa forma
contribuirpara
a
prevenção deTeremos também
como
referencial
teórico
um
modelo dimensional
dapsicopatologia, que prevê a existência de semelhanças entre a forma como funcionam
os
indivíduos normaise
os
indivíduoscom
perturbaçõesde
personalidade (Millon,1987, 1999, 2000, 2007), assumindo uma diferença quantitativa, mas não qualitativa,
entre estilos
ou
padrões
de
personalidadee
perturbaçõesda
personalidade.Tentaremos
no
presente trabalho compreendera
forma como determinados traçosdesadaptativos
de
personalidade, associados
às
diferentes perturbações
dapersonalidade,
podem
estar
relacionados,e
ser
consequênciade
experiências disruptivas nas relações precoces e uma expressão de representações objectais maisnegativas
e
menos diferenciadase
articuladas. De certa forma, pretende-sedar
um pequeno contributo paraa
compreensão de como se estruturaa
personalidade, masnum sentido desviante,
e
de
como determinadas experiências relacionais precocespodem
ser
importantes. Pensamosque esta
investigaçãoserá útil
se
oferecercontributos
pera
a
compreensãodo
tipo
de
experiências relacionais disruptivasprecoces
que
poderão
estar
associadas
à
exibição
de
determinados
traços disfuncionais de personalidade na idade adulta.Para a avaliação de traços disfuncionais de personalidade será utilizado o Miilon Clinical Multiaxial lnventory-ll (Millon, 1987), que permite a avaliação de treze padrões
de personalidade, dez padrões básicos
e
três padrões considerados graves.para
aavaliação da representação da relação estabelecida entre o sujeito
e
as suas figuras parentais, nas dimensões de cuidado e de hiperprotecção, será utilizada a adaptaçãoportuguesa
de
Ramos, Leale
Maroco (2009) do Parental Bonding lnstrument provaoriginalmente
elaborada
por
Parker, Tupling
e
Brown (1979). Para avaliar
asdimensões estruturais
e
qualitativasdas
representações objectais dos sujeitos seráutilizado
o
Obiect Relations lnventory (Blatt et al., 1979; Blatt et al., 1g92). Trata-se de uma prova de cariz projectivo que permite avaliar o grau em que o sujeito caracterizaas figuras parentais em termos de doze características qualitativas, avaliar o grau de ambivalência com que
o
sujeito descreve as suas figuras parentais e, finalmente, o nível conceptual da representação.Apesar
de
existirem diversos estudosque
tentaram relacionar experiênciasprecoces
e
patologiana
idade adulta (Blatt, 1974, 1995, 2004; Besser & Blatt, 2OO7; Schwarz&
ZurofÍ, 1979), não existe nenhum estudo, que tenhamos conhecimento,que
tenha
procurado relacionar simultaneamentea
representaçãode
algumas dasdimensões da relação com as figuras parentais e os aspectos estruturais e qualitativos
da representação dessas mesmas figuras com traços disfuncionais de personalidade,
tal como
foi
conceptualizado e operacionalizado por Millon (1987, 2OOO). Tentaremosrelações precoces
e
das
representaçõesdas figuras
parentaispodem tornar
ossujeitos vulneráveis
ao
desenvolvimentode
traçosde
personalidade disfuncionais.Tentaremos adicionalmente verificar se existem diferenças entre homens
e
mulheresrelativamente
às
relaçõese à
representaçãode
cadaum
dos progenitoresna
suarelação com os traços disfuncionais de personalidade.
Este trabalho encontra-se organizado
em
duas partes. Numa primeira parte é apresentadaa
fundamentação teórica, sendo este enquadramento teórico constituídopor três capítulos distintos.
No
primeiro capítulo abordamosa
temática
das
experiências relacionais nainfância, referindo algumas
das
teorias
existentessobre
a
influênciaque
estasmesmas relaçóes exercem
no
desenvolvimento psicológicodas
crianças.É
aindaabordada
a
evoluçãodestas
relaçõesao
longodo
desenvolvimentodo
sujeito
ediscute-se
também sobre como
acontecimentos disruptivospodem influenciar
odesenvolvimento subsequente dos indivíduos.
Num
segundo capítulo
abordamos
a
temática
das
perturbações
depersonalidade,
e
apresentaremostrês
modelosteóricos distintos.
Num
primeiromomento
faremos
referência
ao
modelo
categorial
do
DSM
(APA,
2000).Seguidamente,
é
apresentadoo
modelo de traçosde
Theodore Millon (1987, 1999,2OOO, 2OO7). Finalmente,
é
expostaa
propostade
Sidney Blatt(1974,
1991, 1995,2OO4), autor da escola psicanalítica influenciado pela teoria das relações de objecto. No terceiro
e
último capítulo faremos referências a alguns esfudosiá
realizados que tenham tentado relacionar as experiências relacionais na infância e a exibição de traços disfuncionais de personalidade na idade adulta.Numa segunda parte deste trabalho é apresentado
o
estudo empírico. Esta parte está dividida em cinco capítulos.No quarto capítulo apresentamos
os
objectivose
hipoteses de rnvestigação dopresente trabalho, à luz da literatura revista na primeira parte do trabalho.
No quinto capítulo
é
descritaa
metodologia. Apresenta-se uma caracterizaçãoda
amostrae
dos
instrumentosde
medida utilizados, sendo também descritos os procedimentos de recolha de dados e os procedimentos estatísticos efectuados.Num sexto capítulo
apresentamosos
resu/Íadose
no
sétimo capítulo
éapresentada a discussâo desses mesmos resultados
à
luz da literatura existente. Sãotambém apresentadas algumas das limitações inerentes a esta investigação.
Finalmente,
num
oitavo capítuloserão
tecidas algumas conclusões, algumasconsiderações finais globais, de forma
a
reflectir sobrea
forma como este trabalhopoderá
ter
dado
um
pequeno contributo,de
um ponto
de
vista
metodológico eParte
l:
Fundamentação Teorica
Esta parte do trabalho é composta por três capítulos.
No Capítulo
I
abordamos a temática das experiências relacionais na infância ediscutimos algumas teorias existentes sobre
a
influência destas mesmas relações nodesenvolvimento psicológico
das
crianças. Abordamosainda
a
evolução
destasrelações
ao
longodo
desenvolvimentoe
de
como alguns momentosde
disrupção podem influenciar negativamente todo o desenvolvimento subsequente das crianças.No Capítulo ll dirigimo-nos à temática das perturbações de personalidade, sendo
apresentados
diferentes modelos
de
compreensãoteórica
relativamentee
esta questão.Finalmente,
no
Capítulolll
apresentamos algumas investigaçõesjá
realizadasque tenham tentado relacionar as experiências relacionais na infância e a exibição de
Capítulo
t-
bcpertências Relacionais na
lnfância
1.
As
relações precocêsAo
longodo
século
XX
assistimosa
uma ênfase
crescenteno estudo
das estruturas psíquicas internas subjacentes aos fenómenos comportamentais para tentaralcançar
a
compreensãoda
lógica subjacenteà sua
ocorrência. Apesardisto,
umalarga fracção
da
psicologiae
psiquiatria americanas manteve um interesse exclusivona
sintomatologiaexplícita
e
no
comportamento manifesto.Contudo,
algumasexcepções
têm
oferecido grandes contributospara
a
compreensãodas
estruturasinternas principais inerentes
ao
comportamentohumano, como
é o
caso
das abordagens contemporâneas dos processos cognitivos e da teoria psicanalítica. Estastentativas
têm
enfatizado duas dimensôes primáriasque
são fundamentaispara
acompreensão da condição humana: em primeiro lugar,
a
capacidade do ser humanode ter uma actividade simbólica complexa, e em segundo lugar
o
reconhecimento da importânciada
existênciade
uma matriz interpessoal complexa dentroda qual
um indivíduo não só existe mas também se desenvolve (Blatt & Lerner, 1983b)'Desta forma, assume-se que quem soínos,
e a
formacomo
nos relacionamos com os outros significativos na nossa vida, tem em grande parte origem nas relaçôes que estabelecemos ainda enquanto crianças. Neste seguimento, houve um aumentode
interesseno papel dos pais
na
influênciado
desenvolvimento psicológico dascrianças,
pois
nenhuma
outra
relação interpessoal
tem tanta
importância
nodesenvolvimento
intelectual
e
afectivo (Blatt
et
al.,
1979).
O
desenvolvimentopsicológico
é
visto como
a
consequênciados
padrõesde
cuidadode
pessoas significativasno
ambiente precoceda
criança. Desta forma,a
ênfase crescente nainvestigação
das
relações parentais precoces,nas
relaçõesde
cuidado,surgiu
noseguimento
da
assumpção
de
que
a
internalizaçãodessas mesmas
relaçôes desenvolver-se-áem
representaçõessobre
os
outros
e
sobre nós mesmos
quedeterminarão a organização das nossas experiências interpessoais futuras
e
a formacomo vemos
o
mundo.As
interacções interpessoais comas
figuras significativas, consistentes e cuidadoras, são então vistas como factores relevantes na formação de esquemas cognitivo-afectivos, definidos primariamente como conceitos desenvolvidos do se/f e dos outros no mundo objectal. Estes esquemas são vistos comoo
resultado da interacção complexa entre as bases biológicas da criança e as suas predisposiçõese a
matriz interpessoal da famíliae
da cultura (Blatt&
Lerner, 1983b)' Assim, estassujeito, auxiliando na maturação pulsional e na estruturação do Eu (Coimbra de Matos,
2OO2).
De
acordo coma
psicanátisee a
psicologia cognitivado
desenvolvimento, as crianças transformam as interacções com os seus cuidadores iniciais em esquemas cognitivo-afectivosde
elas mesmas
e
dos
outros,e
estes
esquemas regulam edireccionam um largo número de comportamentos subsequentes, especialmente nas
relações interpessoais (Blatt et at., 1997; Blatt & Lerner, 1983b; Levy et al.,
í9gg;
Btatt & Auerbach,200í;
Besser&
Blatt, 2OO7). Estes esquemas derivam das experiênciasprecoces interpessoais significativas,
e
são constituídos por componentes cognitivas,afectivas e experienciais, de carácter tanto consciente como inconsciente, e reflectem
o nível desenvolvimental do sujeito e aspectos importantes da vida psíquica, como os
impulsos, os afectos, as pulsões e as fantasias. Podem ainda envolver representações
verídicas
da
realidade consensual, construções
idiossincráticas,ou
distorçõesprimitivas e patológicas que sugerem psicopatologia (Blatt, 1g74,1995;
Besser & Blatt,
2007; Blatt & Blass, 1990, 1996). Estes esquemas tornam-se então nos protótipos que
estruturam a forma como as pessoas pensam e se sentem em relação a elas mesmas
e
às
outras pessoas. Assim, estes esquemas são simultaneamenteo
resuttado daexperiência
do
sujeito numa matriz
interpessoatcomo
estão
na
origem
dessa experiência (Blatt&
Auerbach, 2OO1).O
desenvolvimentodos
esquemas cognitivo--afectivos, ou representações mentaís do próprio e dos outros, dá-se ao longo do ciclovital. No
entanto, apesardo seu
carácter desenvolvimentista, estas representações são fundamentadas no início de vida relacional (Beebe & Lachmann, 19gg; Blatt, 20O4;Diamond, Blatt, stayner & Kaslow, 19g1; campos, 2ooo, 2006; Blatt et al., 1997; Levy et al., 1998; Blatt & Auerbach, 2OO1; Besser & Blatt, 2OO7).
As
criançasfazem
uso
destas
interacçõescom
os
seus
cuidadores paraconstruir esquemas heurísticos,
o
que
permitea
regulaçãodo seu
comportamento (Blatt et al., 1997; Aínsworth, 1969; Diamond etal.,
1991; Fritsch&
Holmstrom, í9g0;Blatt, 1991,
1995). Assume-se portantoque
a
estruturadas
interacções precocesoferece
uma
base importantepara
a
organizaçãoda
experiência infantile
para a emergência de representações de se/fe
dos outros que perdurarão ao longo da suavida, apesar
de
havera
possibilidade de alteração dos esquemas de acordo comas
várias experiências de vida do sujeito (Beebe & Lachmann, 19gg).
As
estruturasde
interacçãosão
padrões característicosde
regulações mútuasnos quais tanto
a
criançacomo
o
cuidadorse
influenciam mutuamente.Com
afrequência das interacções, a criança passa depois a reconhecer, memorizar eesperar
um estilo
de
interacção recorrente com os cuidadores privilegiados. Assim,a
criança poderá esperar alguma regularidadee
previsibilidade,o
que lhe dá
um sentido derealidade consistente
e
coerente (Beebe&
Lachmann, 1988; Blatt&
Lerner, 1983b).De
acordo com alguns autores
(Schwartz,1993; Beebe
&
Lachmann,1988)'
ainternalização
destas
experiênciasprecoces dá-se
de
uma forma
relativamenteestável, com
a
passagempor
momentos específicos. Desta forma, assume-se que num momento inicial existe a vivência do momenfo com o objecto, seguindo-se depoisa
memória
do
momento,sendo estes
momentos organizados mentalmente em categorias funcionais ao nível das representações, em representações dos momentos. Contudo, apesar desta conceptualização, existem divergências de opinião sobre comose
definemquais
os
momentoscom
o
objectoque
são
memorizadose
depois representados mentalmente,e
quais os momentos em que se dão as distorções quepoderão levar a um processo psicopatológico (Schwartz, 1993).
Uma outra perspectiva próxima ao que
já
referimos sobre o desenvolvimento dosesquemas cognitivo-afectivos é a de Sidney Blatt (1991, 1995; Blatt et al., 1997), autor
para
o qual os
esquemas cognitivo-afectivostêm
uma sequência desenvolvimental relativamente estável, com oito níveis que representam avanços relativamente ao nívelimediatamente
anterior. Desta forma,
Blatt
identificouvários pontos nodais
no desenvolvimento das representações mentais.Num primeiro momento (nível
1), entre os
2 e
os
3
meses, encontramos aconstância
de
limites, momento
no
qual
a
criança pela
primeira
vez
tomaconhecimento
do facto
de
que
existe alguém separado dela, começandoassim
acontactar
com esse outro.
O
sorrisoé
um
indicativo comportamentaldessa
suacapacidade
de
reconhecimentode
alguém separado, conseguindo entãoa
criançaSeparar-se dos outros, ao perceber a diferença do se/f para o não-se/f.
Entre os
6 e
osI
meses (nível 2),a
criançajá
consegue distinguir as pessoasnas quais investe
das outras,
havendo portantoum
reconhecimentoou
constância tibidinat.A
angústia despertada na presença de estranhos, típicado
80 mês, mostraque
estaé
responsivaao
que lhe
é
familiare
seguro, mantendo uma vinculação emocionalconsistente a uma pessoa em particular.A
constância evocativa do objecto (nível 3) diz respeito à capacidade de manter mentalmentea
existênciade
um
objectoque não está
presenteno
seu
campo perceptivo. lsto ocorre por volta dos 16ou
18 meses, pela capacidade da criança de manter um sentido da sua mãe mesmo quando esta está ausente. A criança começa aconseguir deixar
a
sua mãe, em movimentos de afastamento como os que ocorrem quando as crianças começam a andar. Assim, a criançaé
capaz de alcançar e manteruma relação emocional positiva com um outro significativo mesmo quando o outro está
Entre
os 30
e
os36
mesesa
criança adquire um sentido consolidado de se/f como separadoe
independente dos outros (nível 4).A
emergênciadesta
constânciade
self e de obiecto é indicada pela crescente capacidade de se identifícar a si mesma,ou de identificar algo como dela, com grande especificidade e precisão. Aqui a criança
já
tem uma representação de si própria coesa, estável e consolidada, vendo-se comodiferente
e
distinta
dos
outros,
de
forma
duradourano
espaço
e
no
tempo, índependentemente do seu estado emocional.Por volta dos 5 anos surge
o
pensamento operatóio concreto (nível 5), com umacapacidade para
a
coordenaçãode
várias dimensões simultaneamente.A
criança écapaz agora
de
lidar com
conceitos como
a
antecipação,a
transformação, aconservação e a reversibilidade de características manifestas externas. Há a noção de um "nós", com o início da resolução da crise edípica.
O
pensamentooperatóio
formalé
característicoda
entradana
adolescência,entre
os
11e os
12 anos (nível6).
Ocorre aqui o desenvotvimento dos conceitos dese/f
e
dos outros num
conceitode
"nós"
de
maneiramais formal
e
em
termosabstractos, com os quais a criança
já
começa a conseguir lidar. Surge assim um novonível
de
coordenaçãoe
integraçãodos
conceitosde se/f
e
dos outros de
formaintegrada, com
a
simultaneidadeda
lógicada
individualidadee
do
relacionamento.Aqui
há
uma
mudança fundamentalda
internalizaçáodos
conceitospara
a
suaintegração, passando estes agora
a
estar mais próximos dos processos conscientes de pensamento.Finalmente,
nos
últimosdois
momentos, entreo
inícioda
adulteze
na
meia--idade
(respectivamentenível
7 e
nível8), surge a
identidadee
integridade, comsíntese
e a
integração
das
expressões maduras
de
individualidade
e
derelacionamento na capacidade de se ser íntimo com outra pessoa e de contribuir para
um
colectivo
sem
perder
a
sua
individualidade.Há
um
sentido
de
"nós"
maisaprofundado, numa lógica de se/f em relação, pois o sujeito
é
capazde se considerarna
configuração triádica interpessoalda
sua famíliae,
porfim,
num contexto socialalargado (Blatt, 1 995).
2.
A teoria das relações de obiecto e a teoria da vincutaçãoDa
mesma maneiraque
existem diferentes olharessobre
a
forma
como seprocessa a formação dos esquemas cognitivo-afectivos das crianças, existem também
diferentes perspectivas
sobre
a
forma como
as
relações precoces influenciam odesenvolvimento das crianças. Se por um lado encontramos os teóricos das relações
de
objecto, como por exemplo Blatt (1974, 1991, 1ggs, 2oo4; Blatt& shahar,
Zoo/;;Blatt
&
Auerbach, 2OO1; Levyet al.,
1998; Blatt&
Lerner, 1983a, 1983b), por outroencontramos
os
teóricosda
vinculação,como
Bowlby (1980)e
Ainsworth (1969;Ainsworth et al., 1978). Apesar das inúmeras críticas feitas por ambas as perspectivas
teóricas entre
si,
existemtambém
autoresque
defendema
similitudeentre
elas,tentando promover a integração
e
a ampliação destas teorias, que teriam a beneficiar de um entendimento mútuo (Goodman,2004).O
conceitode
relaçâode
objecto derivada
teoria psicanalíticado
instinto. Oobjecto de um instinto é o agente através do qual o objectivo instintivo é alcançado, e
o agente
é
normalmente concebido como outra pessoa. Este objecto é definido como um outro significativo, uma pessoa que é alvo de investimento emocional significativo ou alguém com o qual uma pessoa tenha uma relação emocional significativa (Blatt etal.,
19g7). Geralmenteé
assumido que o primeiro objecto da criançaé
a sua mãe, eque
a
relação inicial entre elasé
vista como sendo de natureza essencialmente oral(Ainsworth, 1969; Blatt, 1974, 1995).
As relações objectais dão lugar, quando internalizadas, às representações. Estas
representações
do
objecto, às vezes chamadasde
introjecções, desenvolvem-se ao longo do tempo, mas têm qualidades duradouras que são relativamente resistentes à mudança. Comparando a teoria das relações de objecto com a teoria da vinculação,pode afirmar-se
que
a
primeira apresentaum
conceitode
representação com umaqualidade mais epigenética ou desenvolvimental. Blatt
e
outros (1974; Blatt & Lerner,1g63b),
ao
integrarema teoria
psicanalítica coma
perspectiva desenvolvimental depiaget
e
Wemer, sugeriram
que
as
componentescognitivas
e
afectivas
dasrepresentações
do
se/fe
dos outros se desenvolvem epigeneticamentee
se tornamcada vez mais exactas, articuladas
e
conceptualmente mais complexasao
longo do tempo. Níveis mais elevados de representação desenvolvem-se a partir de níveis maisprimários. Assim, novos modos de representação são mais compreensivos e eficazes
do que modos anteriores de representação. Desta forma, estas representaçôes do se/f
e
dos outros vão desde mais primárias, globais, difusas, fragmentadase
inflexíveis anÍveis
cada vez
mais
sofisticados,
diferenciados,flexíveis
e
hierarquicamenteorganizados,
com
o
enfoquea
mudar desdea
satisfaçãode
prazerque
o
objectooferece
ao
se/f para uma diferenciaçãoe
aceitaçãodas
diferenças entreo
se/fe
oobjecto (Levy
et
al., 1998). Estudos de alguns autores, como Blatt (1991), confirmamque
a
pessoa
com
introjecções
que
sejam
conceptualmentesofisticadas
eafectivamente positivas estão,
à
partida, menos vulneráveisao
desenvolvimento de psicopatologia severae
crónica, enquanto que pessoas com introjecções que sejam conceptualmente mais primárias e associadas a afectos negativos sofrem de um maior risco de patologia (Bornstein, 2006).As três estruturas mentais
-
ld,
Egoe
Superego-
têm um papel de relevo nodesenvolvimento
da
personalidadenormal
e
patológica. Enquantoque
o
ld
é concebido comoa fonte de
impulsos,o
Superego representao
se/f idealizadoe
aconsciência, ou código moral. Já
o
Egoé
considerado responsávet pelo pensamento racional, orientado paraa
realidade. As experiências precoces ajudam a determinar aforça
do
Ego da
criança,que se
define comoo
grau com que
o
Ego
respondeadequadamente aos testes
da
realidadee
lida efectivamente com os impulsos. Umaparentalidade adequada
e
um
mínimode
experiências traumáticasou
disrupções permitemà
criançaa
atribuição de energia psíquica considerável para um bom teste da realidadee
a aquisição de estratégias de auto-controlo eficazes.euando
isto nãoocorre,
parte da energia
psíquicada
criançatem de ser
reencaminhadapara
asfunções
de
lidar
com
experiências stressantese
dolorosas,
pois
em
caso
deperturbação demasiado forte na relação com os cuidadores, a representação ocorrerá com uma flxação num dado momento do desenvolvimento.
A
criança terá dificuldadeem
evoluirpara além desse
pontose
nãofor
expostaa
experiênciasde
relaçãopositivas
que
abramcaminho
paraa
reconstruçãoda
representação anteriormente afectada (ljzendoorn, 1995; Blatt, 1974, 19g5; Blatt et al., 19g7; Harpaz-Rotem & Blatt,2005; Blatt & Shichman, 1983a).
Por seu lado,
a
teoriada
vinculação refere-se ao estabelecimentode
um laçoafectivo que leva uma pessoa
a
ligar-se individuatmentea
outra pessoa específica e descriminada. Como as relações de objecto, a vinculação ocorre em todas as idades enão
implica
necessariamente imaturidadeou
desamparo.
O
primeiro
laço
é estabelecido na maioria das vezes com a mãe, mas isto é rapidamente suplantado porvinculações a outros sujeitos específicos (Ainsworth, 1969). De acordo com a teoria da
vinculação, os modelos internos dinâmicos são uma noção importante (Soares & Dias,
2007). Durante
os
primeiros anos de vida,ao
longo das várias interacções com asfiguras prestadoras de cuidados, a criança vai constituindo graduatmente um conjunto
de
conhecimentose
expectativassobre
a
forma como essas figuras actuam
erespondem
aos
seus pedidos
de
ajuda
e
protecção-
no
fundo, sobre
a
suaacessibilidade
e
responsividade-
e
sobre o se/f, em relação ao seu valor próprio e àsua
capacidade
para
influenciar
os
outros.
Bowlby
(1980)
denomina
estes conhecimentos e expectativas, construídosa
partir das interacções repetidas com asfiguras
de
vinculaçãoe
internamente organizadassob
a
formade
representações generalizadas sobre o se/f, sobre as figuras de vinculação e sobre os modelos, como modelos internos dinâmicos de vinculação, ou internal working models. Estes modelospara com uma figura em particular, antecipar o futuro
e
iazer planos, para conseguiroperar de forma mais eficiente (Soares & Dias, 2007).
Estes
modelos tornam-se progressivamente resistentesà
mudança (Bowlby,1g8O) e tornam-se estáveis tão cedo quanto os 12 meses da criança (Ainsworth, 1969;
Ainsworth
et al.,
1978; Levyet al.,
1998), pois nesta alturajá
o
Ego será capaz dedistinguir
entre se/f
e
não-se/f.A
criança deixará
de ser
passiva
e
passaráprogressivamênte a ser mais activa,
e
adquiriráa
crescente capacidade de distinguiras pessoas, existindo condições para a formação
de
um vínculo estávelà
sua mãe.Assim,
de
um período indiferenciadoe
sem objecto,a
criança passará por uma fasetransitiva onde começará a estabelecer relações com o objecto, e finalmente chegará
a
um
ponto
em
que haverá
a
constânciado
objecto, com uma
capacidade dediscriminar
o
objecto
dos
outros
todos,
o
que
vai ao
encontro
do
que
foiconceptualizado por Blaü (1995).
Associada
a
este conceitode
modelo interno surgea
propostade
três estilosbásicos
de
vinculação,com
basena
conhecida experiênciada
"situação estranha" (Ainsworth et al., 1978), em que uma criança é sujeita a uma sequência predefinida depresença
e
afastamento da sua mãe,ao
mesmo tempo que um terceiro elemento, o"estranho",
é
introduzido
e
também
ele
retirado
do
ambiente
em
momentosespecíficos. Estes estilos básicos de vinculação, concebidos a partir das observações
de crianças, são: a) estilo seguro, em que
a
criança usao
cuidador como uma basesegura a partir da qual explora o mundo e à qual regressa em momentos de ansiedade
ou stress; b) estilo inseguro-evitante, em que a criança explora
o
ambiente de formaaparentemente
confiante
mas
ignora
o
cuidador quando
este
regressade
ummomento
de
separação;e
c)
estilo inseguro-ansioso-ambivalente, em quea
criançafoca a sua atenção no cuidador e fica relutante em se separar e explorar o ambiente,
ficando
à
sua
espera,
dependentede
uma
reaproximação(Blatt
et
al.,
1997).Recentemente, emergiu uma hipótese central na teoria da vinculação que sugere que
as representaçôes mentais dos pais das suas experiências de vinculação na infância
influenciam fortemente a qualidade da vinculaçâo estabelecida com as suas crianças.
É hipotetizado que a avaliação que um adulto faz das suas experiências de vinculação
e a
influência destas no seu comportamento actual se organiza numa concepção ourepresentação relativamente
estável
em
relaçãoà
vinculação. Pensa-seque
asdiferenças individuais nas representações mentais de vinculação dos pais determinam
a
sua
responsividadeaos
sinaisde
vinculaçãoda
criançae,
assim, direccionam odesenvolvimento sócio-emocional da criança (ljzendoorn, 1995)'
Uma
vez
estabelecida,quer seja
à
mãeou
a
outra pessoa, uma vinculaçãointeracção situacional puramente
de
dependência (Ainsworth,1969).
Um
estudo longitudinal que procurou verificar a estabilidade dos estilos de vinculação na infância,seguro
e
inseguro na "situação estranha", entrea
infânciae
a adolescência, mostrouuma
correspondênciade
cerca
de
75o/o, confirmandoo
carácterestável
destas representações (Blatt et al., 1997).De
acordocom
Goodman (2004), alguns teóricosda
vinculação criticam asteorias das relações de objecto ao afirmarem que estas são baseadas num modelo de fixação-regressão que se foca na inibição de mais desenvolvimento além do ponto de
perturbação na relação. Assim, um modelo de construção contínuo, como o modelo de
vinculação, supostamente corrigiria
os
erros
de
um
modelode
fixação-regressãoporque não especificaria
o
ponto de origem de várias formas de psicopatologiae
nãoos
ligaria a fases particulares do desenvolvimento. Pelo contrário,a
questão da sua suposta origem seria deixada em aberto. Coincidente com esta ideia,a
intervençãoclínica foca-se não tanto no significado
ou
interpretação de eventos específicos queocorrem em etapas específicas
do
desenvolvimento psicossexualda
criança ou emfases de separação-individuação, mas sim no significado
e
interpretaçãode
padrõesde
interacção,
desde
a
infância
até
ao
presente, expressos
na
relação
de transferência. Assim, os modelos ínternos dinâmicos não representam as experiênciasinterpessoais
com
um
cuidador numa
época
desenvolvimentalparticular;
pelocontrário, representam
uma
acumulaçãodestas
experiênciasao
longode
toda
a história interpessoal da pessoa (Goodman, 2004).Por outro lado,
teóricosdas
relaçõesde
objectocomo
Blatte
Levy
(19g9)acusam a teoria da vinculação de reduzir a imensa variação da psicopatologia a dois ou três padrões de segurança
e
insegurança que não permitem fazer discriminaçõessubtis entre
níveisde
funcionamento adaptativoe
perturbado.Por
exemplo, umapessoa
com um modelo interno
dinâmicoseguro
podeapesar
de
isso
ter
umarepresentação objectal desintegrada ou indiferenciada, dependendo da gravidade da
patologia.
O
abandono
por
parte dos
teóricos
da
vinculaçãodas
teorias
dodesenvolvimento por estádios é então equacionado por estes autores das relações de
objecto como uma
desvalorizaçãodas
influênciasdo
desenvolvimento,tanto
daacumulação de experiências interpessoaís como das mudanças maturacionais,
já
queassumem que aos 12 meses os estilos de vinculação estão praticamente definidos, na
forma
e
na
gravidade
da
psicopatologia:«Se uma pessoa
com
represenÍaçÕespsicóticas
pode ser
inserida numa categorianão
autónoma-
comoa
insegura-
damesma
fonna como
o
pode
ser uma pessoa com
uma
adaptação geralmente adequada, entãoo
srbÍemade
classificação de vinculação necessifa de refinamento»t (Goodman ,2004, pp. 600, trad. livre).Diamond
e
Blatt (1994) afirmam que os modelos dinâmicos de vinculaçãoe
asrepresentações
de
objecto
são
formas
semelhantes,
se
não
idênticas,
deconceptualizar
os
esquemas
cognitivo-afectivos
internalizados
que
dãosimultaneamente forma
e
se originam das relaçôes interpessoais.A
ideia de que asrepresentações de objecto dão organizaçáo e direcção ao comportamento manifesto,
incluindo relações interpessoais, funções perceptuais
e
cognitivas,e
concepções dese/f e dos outros, corresponde em muito à ideia de que os modelos intemos dinâmicos
são
representações mentaisde
aspectosdo
mundo,dos outros,
do
se/f,
ou
de relaçôes com outros de especial relevância parao
indivíduo. Estas representaçõesmentais
guiam
a
organizaçãoda
informação
em
relação
às
experiências de vinculação, sentimentos e ideias, assim como recordaçóes de experiências, e pode-seesperar que afectem a linguagem e o pensamento assim como o comportamento não
verbal. Ambas as teorias conceptualizam as representações mentais como esquemas cognitivo-afectivos que dão informação emocional sobre
o
objecto, ose/í
e o se/f emrelação
com
o
objecto, atravésda
internalizaçãode
memórias episódicas. Assim,parece
que as
definições conceptuaisda
representaçãode
obiectoe
dos
modelos internos dinâmicos estão de facto relacionadas.Estes
modelos internos dinâmicos,como são
identiÍicadospelas
teorias devinculação,
são
consistentescom
as
investigaçõese
formulaçõesteóricas
dasrelações
de
objecto,que
consideramas
representaçôes mentaiscomo
estruturaspsicológicas relevantes no desenvolvimento da personalidade. As comparações entre estas duas perspectivas têm sido predominantemente teóricas (Blatt & Blass, 1990). A diferenciação
das
representaçõesdo se/f
e
de
outros descritapelos
teóricos dasrelações de objecto pode elucidar a forma pela qual os processos de vinculação levam
à
formaçãode
esquemas cognitivo-afectivosdo
se/fe
de
outros (Diamond &.Blatt,1994).
Como
importante diferença
pode
apontar-se
o
facto
de
o
estudo
dasrepresentações mentais segundo
a
teoria
das
relaçõesde
objecto
ser
baseadoprimariamente no estudo da psicopatologia, especialmente nos adultos, ao passo que
a
investigaçãodos
modelos internos
dinâmicosna
teoria
da
vinculação
derivapredominantemente do estudo do comportamento de crianças normais na interacção
com
as
suas mães (Ainsworthet. al,
1978; Blatt, 1995; Blattet al.,
1997; Soares &3.
Da relaçãoobjectalà
representação do seíf e dosoutros
De acordo com alguns autores como Hartmann, Spitz e Anna Freud (Sherwood,
1989),
o
desenvolvimentodas
relaçõesde
objecto na criança passa por duas fases distintas. A primeira fase, a das relações de objecto para satisfação das necessrdades,é
característica dos primeiros meses de vidado
bebé, quando o valor que os outrossignificativos
têm
paraa
criança se prende como
seu papel na satisfação dos seus desejos e necessidades e, assim, na redução das tensões. Por a criança percepcionara
funçãodos
outrosna
reduçãoda
tensãomas
nãoa
pessoaem si, os
objectos podem mudar: qualquer pessoa queseja
capaz de desempenharo
papel de objecto que satisfaz as necessidades pode satisfazer a criança. Assim, o objectoé
percebido inteiramente dentro de um contexto de necessidades e desejos da criança (Sherwood, 198e).Hartmann atribui
o temo
constância de objecto para descrevere
segunda fasedas relações de objecto, durante a qual
a
mãe existe continuamente para a criança enão
apenas durante
as
funções
de
satisfaçãodas
necessidade:a
criança ficavinculada
à
mãee
nãoàs
suas funçõesde
satisfaçãode
necessidades.euando
anoção
de
constânciade
objectoé
utilizada, refere-seà
capacidadede
manter umavinculação
que
é
relativamente independenteda
gratificaçãoou
frustração. Algunsautores que observaram
a
ansiedade das crianças ao 80 mês na "situação estranha', (Ainsworth et al., 1978) consideram-na como uma prova de que a criança escolheu umobjecto libidinal específico
-
as
pessoasjá
não são
indiferenciadas-
e
de que
a vinculação podeser
mantida na ausênciade
necessidades instintivas por satisfazer(Sherwood, 1989).
Neste seguimento,
Anna
Freud propôsque a
permanênciado
objectoé
um processo diferente da constância de objecto,e
que a permanência deve preceder aconstâncía. Se uma criança mantém uma vinculação com
a
mãe mesmo quando eta está ausenteou
nãoé
satisfatória, entãoé
necessário que haja alguma capacidadecognitiva de conceber a mãe como alguém que existe mesmo quando não está à vista,
e
como alguém
que
tem
atributos positivos mesmo quando
não
é
satisfatória(Shenrood, 1989).
Numa
outra
perspectiva
sobre
a
constância objectal, encontramos
asformulações
de
Sherwood (1989), para quemé
inadequado considerara
constânciade objecto como a internalização de uma imagem matemal realista e disponível. para
este autor, a constância de objecto é a ilusão da constante disponibilidade da mãe na
sua função
de
espelho, sendo queo
queestá na
ilusãoda
constânciade
se/fé
oocasionais
da
mãe
e
a
sua
capacidadede
deixar
a
criança,esta
experimentamovimentos
de
autonomiae a
sua
capacidadede
criar
distânciada
mãe.
Nestesentido,
a
ilusão
da
constânciade
objecto
permiteJhevalidar
experiências deindependência. Caso a criança não sinta uma congruência entre os seus sentimentos
e
desejose as
respostas empáticasda
mãe, correráo
risco de ficar dependente esubmissa do seu objecto materno, por sentir como inaceitável a sua independência e autonomia, uma
vez que
a
sua
mãenão lhe
transmitirá perante isso segurança eaceitação. Assim, Sherwood afirma
que o
que está de factoem
riscono
atingir da constância de objecto é o se/f da criança e não o da mãe, pois sem este a criança nãoconseguirá desenvolver uma identidade separada daquela que
é a
da sua mãe, por falta de empatia e corespondência. A relação disfuncional da criança com a mãe teráas suas repercussões negativas ao nível da representação que será intemalizada pela
criança (Sherwood, 1 989).
De
acordocom os
teóricosdas
relaçõesde
objecto, assume-se então quê arelação
objectal
se
torna
internalizadaatravés
de
uma série
de
processos quepermitem
à
criançaa
criaçãode
uma base primária
parao
desenvolvimento deestruturas intrapsíquicas (funções
do
ego
e
estruturas cognitivas
como
asrepresentações
do
se/f
e
do
objecto)
que vão
regular
e
direccionar
o
seucomportamento
(Blatt
&
Lemer, 1983b). Este objecto precoce relacional, enquantointernalizado, pretende-se
que
se vá
tornando
total,
ou
seja, que
vão
sendoreconhecidas
ao
mesmo
tempo
aS
SuaS qualidades
mas
também
aS
SuaS características negativas, havendo uma articulação dentro do mesmo de todas as suasfacetas, mesmo
que
sentidas enquanto contraditóriasou
indesejáveis (Coimbra deMatos,
2OO2).De
acordo com Melanie Klein (Marcelli, 2005; Zimmerman, 1999), éentre os
6
mesesde
idade e os dois anos que as crianças passam a percepcionar oobjecto como sendo total.
Até
esta altura,a
criança clivaos
objectos, conseguindo então separaro
lado
"bom"do
objectodo seu
lado'mau',
projectandono
exterior aquilo que lhe fossep§udicial,
interiorizando dessa forma no seu Eu apenas aquilo que lhe fosse benéfico (Schwartz, 1993; Sherwood, 1989). Esta posição, apelidada de esquizo-paranóide,é
então caracterizada por esta clivagem, tendo como mecanismosde defesa adicionais
a
negação,a
idealizaçãoe
a
desvalorizaçâodo
objecto, entreoutros. contudo,
com
a
maturação progressiva,a
criança passa
a
integrar
ascaracterísticas boas e más de um objecto num todo com sentido.
O
objecto totalé
tipicamente definido como uma imagem integradado
objectoconstruída no mundo interno, representacional. Assim, a criança descobre que a mãe vive no mundo externo, isto é, que vive num domínio muito mais amplo do que aquele
da mãe [pela criançal como
uma
pessoa totat abre um novo mundode
experiências. Reconhecer a mãe comouma
pessoa totat significa reconhecê-la comouma
pessoa individual que tem uma vida própriae
relações com outraspessoas» (Sherwood, 1ggg,pp.
20, trad.
livre). Relaçõesde
objecto totais, então, significam uma mudança noexperienciar a mãe num enquadramento puramente egocêntrico para um mais amplo,
num contexto mais objectivo. Com
a
excepçãode
situações mais patológicas, esta permanência é realista.A
mãe tem de facto uma vida própria,e a sua identidade não
se
extingue nos sentimentos momentâneosda
criança sobreela
(Shennrood, 19g9).Consequentemente, ao aceitar que
a
mãe se torna num objecto inteiro, também o Euda
criança
se
tornará
num
objecto
total,
bifurcando-secada
vez
menos
emcomponentes boas e más (Dias & Vicente, 1gg4).
Desta forma, espera-se
que
haja
uma
evolução
da
relação objectal,
econsequentemente da sua representação, pois
o
objecto que inicialmenteé
descrito com base nas suas funções respeitantes unicamente ao indivíduo, no sentido em quelhe proporciona prazer ou dor, passará
a
ser alvo de uma representação articulada, integrada, complexa, simbólicae
diferenciada em relação ao seu se/íl De amorfas e globais,estas
representações passam como
desenvolvimentoa
ser
diferenciadas,integradas e articuladas, permitindo ao sujeito funcionar de forma reflexiva, empática e
simbólica.
As
representaçõesdo se/f
e
de
outrossão
então inicialmentevagas
evariáveis,
e
desenvolvem-segradualmente
para
serelativamente
realísticas.
De
apenas baseadas
nastornarem consistentes
eexperiências
de
ptazer
edesprazer, ou frustração e gratificação, passam depois a permitir à criança começar a orientar o seu olhar sobre o mundo que a rodeia e as pessoas com as quais interage,
e
ainda construir representações estáveis sobresi
mesmae os
outros, assim como estabelecer investimentos duradourose
compromissosafectivos.
Lentamente, acriança começa a deixar de reconhecer o objecto apenas em termos das suas funções
e
acçõesde
gratificaçãoe
começaa
ser
capazde
diferenciar representaçõesdos
outros e de eÍe mesmo (Sherwood, 1989; Marziali & Oleniuk, 1gg0; Blatt et at., 1992;
Levy et al., 1998; Goodman, 2004; Blatt, 1974,2004; Blatt & Lerner, 19g3a, 1gg3b).
A
internalizaçâoda
organizaçãoe
previsibilidade das relações coma
mãee
opai dão
à
criançaa
capacidadede
tolerara
espera,as
imposições externas. lstoeventualmente desenvolve-se
na
capacidadede
tolerara
esperade
necessidadessentidas internamente,
e
de
estabelecer estruturas psicológicasque
permitem oadiamento
da
descarga,
e
o
desenvolvimentoda
capacidadede
antecipação,planeamento e transformação, que são tarefas desenvolvimentais avançadas (Blatt
&
Lerner, 1983b).