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Promoção da saúde bucal: trabalho interdisciplinar na atenção primária à saúde

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ODONTOLOGIA EM SAÚDE COLETIVA

PROMOÇÃO DA SAÚDE BUCAL: TRABALHO INTERDISCIPLINAR NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

ANA CAROLINA OLIVEIRA PERES

FLORIANÓPOLIS 2019

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ANA CAROLINA OLIVEIRA PERES

PROMOÇÃO DA SAÚDE BUCAL: TRABALHO INTERDISCIPLINAR NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

Tese de doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Odontologia, para obtenção do grau de Doutor em Odontologia área de concentração: Odontologia em Saúde Coletiva

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Daniela Lemos Carcereri

Florianópolis 2019

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ANA CAROLINA OLIVEIRA PERES

PROMOÇÃO DA SAÚDE BUCAL: TRABALHO INTERDISCIPLINAR NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

O presente trabalho em nível de Doutorado foi avaliado adequado e aprovado por banca examinadora composta dos seguintes membros:

Prof.ª Ramona Fernanda Ceriotti Toassi, Dr.ª Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Prof.ª Ivonete T. S. Buss Heidmann, Drª. Universidade Federal de Santa Catarina

Prof.ª Renata Goulart Castro, Dr.ª Universidade Federal de Santa Catarina

Certificamos que esta é a versão original e final do trabalho de conclusão que foi julgado adequado para obtenção do título de doutor em Odontologia – área de concentração:

Odontologia em Saúde Coletiva.

____________________________ Prof.(a) Elena Riet Correa Rivero, Dr.(a)

Coordenador(a) do Programa

____________________________ Prof.(a) Daniela Lemos Carcereri, Dr.(a)

Orientador(a)

Florianópolis, 07 de outubro de 2019.

Daniela Lemos Carcereri:477671 20910

Assinado de forma digital por Daniela Lemos Carcereri:47767120910 Dados: 2019.10.07 21:14:22 -03'00'

Elena Riet Correa Rivero:69108390 053

Assinado de forma digital por Elena Riet Correa Rivero:69108390053 Dados: 2019.10.08 08:05:22 -03'00'

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DEDICATÓRIA

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por me abençoar tão grandemente ao longo de toda minha vida e em especial nessa jornada fantástica chamada vida acadêmica.

A minha família, meu porto seguro, meu chão, meus amigos, minha saudade constante. É muito difícil colocar em palavras toda a gratidão que tenho por ter vocês em minha vida. Mamis poderosa Telma Regina Oliveira Peres, meu pai-herói Antonio Peres Pacheco, meu maninho Victor Felipe Oliveira Peres: o que seria de mim sem vocês? Vocês são o amor da minha vida! A minha avó Agnes de Oliveira Cruz, que hoje habita em um lugar melhor que o meu, mas que permanece presente em meu coração, em meus sonhos, em nossas lembranças juntas. A saudade

permanecerá, mas tenho a certeza que nos reencontraremos. Obrigada por ser essa avó tão maravilhosa!

Ao meu namorado Eduardo Henrique Bondarczuk, por me amar e me cuidar em tantos momentos difíceis dessa caminhada, por me apoiar, por ser a calmaria nos meus momentos de

stress e por estar sempre presente, afinal fizemos esse doutorado juntos. Que alegria poder te agradecer meu parceiro. Eu AMO você!!

À minha orientadora, Daniela Lemos Carcereri, meu muito, muito, muito, muito obrigada por todos esses anos de ensinamentos, amizade, carinho, compreensão, dedicação, parceria, viagens,

estudos, muitos estudos. Obrigada por compartilhar um pouco da sua trajetória comigo e, através dela, me ensinar a crescer nessa nossa nada-mole-doce-vida! Eu te amo e te admiro

muito como mulher, mãe, professora. Continues a brilhar!

À Universidade Federal de Santa Catarina, pela oportunidade de viver e amar o mundo acadêmico nesse Programa de Pós-Graduação em Odontologia.

À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), que em diferentes momentos financiou meus estudos. À Pró-Reitoria de Pós-Graduação (PROPG) que me apoiou

financeiramente na divulgação do meu trabalho em eventos científicos.

Aos professores, dos Programas de Pós-Graduação frequentados, gratidão aos ensinamentos nessa longa caminhada. Gratidão especial aos professores da área ODOESC, por sempre me abraçarem, me entenderem, e por compartilhar comigo as possibilidades da saúde coletiva na

odontologia.

Aos funcionários da UFSC, em especial a secretária Ana Maria Frandolozzo, a mais prestativa e querida e que me acompanhou ao longo do mestrado e do doutorado, meu muito obrigada!

À REMULTSF, porque uma vez residente, sempre residente. Sempre presente na minha trajetória.

Aos meus colegas de área, hoje meus amigos, irmãos de conhecimento Igor Greik Agnoletto, Vinicius Spiger, minha peruana favorita Charo (María del Rosário), e em especial a minha best friend forever Renata Marques da Silva, parceira de casa, de artigo, de vida! Amo vocês de um

tanto! Muito grata por vocês existirem e fazerem a diferença nessa trilha cheia de boas lembranças.

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Ao grupo de pesquisa GIS-UFSC, por todas as oportunidades de aprendizado e crescimento. À minha amiga-irmã Bárbara Becker por me dar o prazer e a alegria de ser dinda da Beatriz!

Certamente ela tornou meu doutorado muito mais leve!

À minha coordenadora e hoje amiga Andrea Gallon, por acreditar em mim e me proporcionar a fantástica experiência de ter sido docente/discente.

Aos meus alunos, gratidão por me ensinarem tanto todos os dias.

Aos meus amigos, que vivem me perguntando por onde eu ando e em que parte do doutorado eu estou antes de me convidarem pra fazer alguma coisa, obrigada por não desistirem de mim! À minha equipe de trabalho da ESF Belém Novo em Porto Alegre - RS, que por quase 2 anos foi tão compreensiva com as minhas ausências. Gratidão especial à minha Auxiliar (que mão é

só de consultório) Tatiana da Rosa Silva, que me auxilia em TUDO, TUDO mesmo, um presente que Deus me deu. Te amo!

Ao IMESF, que possibilitou a liberação do meu trabalho para que eu concluísse mais essa etapa. As equipes de Saúde da Família, que me receberam, me acolheram me ensinaram muito e

permitiram que trabalhássemos juntos para que esse trabalho fosse realizado. A Secretariam Municipal de Saúde de Florianópolis, que possibilitou a realização desse

trabalho. Muito obrigada!

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RESUMO

No Brasil, desde a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), a Atenção Primária à Saúde (APS) tem na Estratégia Saúde da Família (ESF) o modelo assistencial do país, que trouxe contribuições na melhoria dos cuidados e nos resultados das condições de saúde da população. A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), ampliou o escopo da APS, expandindo a oferta de serviços, dentre os quais os odontológicos. Para atuar no cenário da ESF os profissionais necessitam desenvolver competências, que se referem a uma combinação de conhecimentos, habilidades e valores essenciais necessários para a prática efetiva de ações promotoras de saúde, que vão além do seu ‘núcleo do saber’, e assumem um novo papel no trabalho em equipe. A Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) surgiu como guia para ações superarem a ideia de cura e reabilitação, implantando objetivos, valores, temas transversais, estratégias operacionais, temas prioritários, diretrizes e ações em consonância com os princípios do SUS. Diante das transformações e desafios no processo de consolidação da APS, esta pesquisa objetivou compreender dentre as competências, quais os conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para o trabalho interdisciplinar, quais estão mais evidentes e como são aplicadas pelas equipes de saúde a fim de promover saúde bucal na APS. Tratou-se de uma pesquisa-ação de abordagem qualitativa para análise e aprofundamento sobre o objeto de estudo. Foi realizada no município de Florianópolis, considerado referência nacional em APS, e teve como referenciais a Ergologia e a Promoção da Saúde. A coleta de dados foi realizada por meio de uma revisão integrativa de literatura, metodologia da Prática Baseada em Evidências (PBE) que resultou no manuscrito 1; análise documental, observação participante, entrevistas semi-etruturadas, Grupos de Encontro sobre o Trabalho – metodologia apoiada na ergologia, uma prática coletiva que visa transformar o trabalho, que resultou no manuscrito 2. Os resultados dos manuscritos evidenciaram que a Promoção da Saúde Bucal é um tema de interesse recente na literatura nacional e internacional com destaque para a APS como coordenadora das mudanças de modelo, mas que ainda são necessários esforços continuados na gestão do trabalho, na formação e na formulação de políticas. No que se refere às competências para o trabalho interdisciplinar na APS, os profissionais relataram conhecer as normas e políticas, demonstraram habilidades para desenvolver ações de promoção da saúde e apontaram como desafio para a prática a superação das adversidades vindas com as mudanças de políticas e gestão ocorridas recentemente de forma abrupta e vertical, sem diálogo, e com a predominante reprodução de práticas do modelo tradicional, a falta de formação

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específica para a promoção da saúde, a constante falta de mais profissionais para atender à demanda sem deixarem de realizar ações de promoção da saúde. A combinação de metodologias de coleta de dados nesse estudo produziu um conjunto de informações sobre a atividade de trabalho que sugerem a necessidade de novos estudos de análise temporal relacionados ao impacto das mudanças normativas e governamentais no processo de trabalho da APS. Este estudo teve como limitação o reduzido tempo de coleta de dados devido às interferências decorrentes das transformações ocorridas no cenário do estudo. Os resultados apontaram que a abordagem das competências profissionais para a promoção da saúde é incipiente e que as políticas públicas, mesmo sendo indutoras, não garantem efetividade ou resolutividade nas ações. Fortalecer a interprofissionalidade pode ser um caminho possível no desenvolvimento de trabalho promotor de saúde.

Palavras-chave: Saúde Bucal; Promoção da Saúde; Processo de Trabalho; Interdisciplinaridade; Atenção Primária; Ergologia.

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ABSTRACT

In Brazil, since the implementation of the Unified Health System (SUS), Primary Health Care (PHC) has in the Family Health Strategy (FHS) the care model of the country, which has contributed to the improvement of care and the results of health conditions of the population. The National Policy of Primary Care (PNAB), expanded the scope of PHC, expanding the offer of services, including dental. To work in the FHS scenario, professionals need to develop competencies, which refer to a combination of knowledge, skills and core values necessary for the effective practice of health promoting actions, which go beyond their 'core of knowledge', and assume a new role in teamwork. The National Health Promotion Policy (PNPS) emerged as a guide for actions to overcome the idea of healing and rehabilitation, implementing objectives, values, cross-cutting themes, operational strategies, priority themes, guidelines and actions in line with SUS principles. Given the transformations and challenges in the PHC consolidation process, this research aimed to understand among the competencies, which knowledge, skills and attitudes needed for interdisciplinary work, which are more evident and how are applied by health teams in order to promote health. oral health in PHC. It was an action research of qualitative approach for analysis and deepening on the object of study. It was held in Florianópolis, considered a national reference in PHC, and had as reference the Ergology and Health Promotion. Data collection was performed through an integrative literature review, methodology of Evidence Based Practice (EBP) that resulted in manuscript 1; document analysis, participant observation, semi-structured interviews, Meeting Groups on Work (GRT) - methodology supported by ergology, a collective practice that aims to transform the work, which resulted in manuscript 2. The results of the manuscripts showed that the Promotion of Oral Health is a topic of recent interest in national and international literature with emphasis on PHC as coordinator of model changes, but continued efforts are still needed in labor management, training and policy making. Regarding the competencies for interdisciplinary work in PHC, the professionals reported knowing the norms and policies, demonstrated skills to develop health promotion actions and pointed out as a challenge for the practice the overcoming of the adversities coming with the changes of policies and management, occurred recently abruptly and vertically, without dialogue, and with the predominant reproduction of practices of the traditional model, the lack of specific training for health promotion, the constant lack of more professionals to answer the population demand without failing to carry out promotion

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actions of health. The combination of data collection methodologies in this study produced a set of information on work activity that suggests the need for further temporal analysis studies related to the impact of regulatory and governmental changes on the PHC work process. This study had as limitation the short time of data collection due to the interferences resulting from the transformations occurred in the study scenario. The results showed that the approach of professional competences for health promotion is incipient and that public policies, even if they are inductive, do not guarantee effectiveness or resolutivity in actions. Strengthening interprofessionalism may be a possible path in the development of health-promoting work.

Keywords: Oral Health; Health promotion; Work process; Interdisciplinarity; Primary attention; Ergology;

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Espiral de etapas da pesquisa-ação...42 Figura 2: Dispositivo dinâmico de 3 polos...45 Figura 3: Matriz de análise dos dados...47

MANUSCRITO 1

Figura 1: Etapas da revisão integrativa...51 Figura 2: Fluxograma da estratégia de busca e avaliação de resumos...54

MANUSCRITO 2

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LISTA DE QUADROS

MANUSCRITO 1

Quadro 1: Critérios de inclusão e exclusão...53 Quadro 2: Estudos incluídos na revisão agrupados por categoria, contendo título,

autoria, País, ano de publicação, tipo de estudo e principais resultados...56

MANUSCRITO 2

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABS – Atenção Básica em Saúde ACS – Agente Comunitários de Saúde APS – Atenção Primária em Saúde ASB – Auxiliar de Saúde Bucal

CASP – Critical Appraisal Skills Program CD – Cirurgião-Dentista

DSS - Determinantes Sociais de Saúde ENF - Enfermeiro

EqSF – Equipe de Saúde da Família ESB – Equipe Saúde Bucal

ESF – Estratégia Saúde da Família

GRT - Groupes de Rencontre du Travail – Grupos de Trabalho MED - Médico

PACS – Programa de Agentes Comunitários de Saúde PNAB – Política Nacional de Atenção Básica

PNPS – Política Nacional de Promoção da Saúde PNSB – Política Nacional de Saúde Bucal

PMAQ – Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade PS – Promoção da Saúde

PSB – Promoção da Saúde Bucal PSF – Programa Saúde da Família SUS – Sistema Único de Saúde TEnf – Técnico de Enfermagem TSB – Técnico em Saúde Bucal UBS – Unidade Básica de Saúde UHC – Cobertura Universal em Saúde

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 16

CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA ... 26

Atenção Primária à Saúde ... 26

A Saúde Bucal e Estratégia de Saúde da Família como inovação no trabalho da APS ... 29

O Processo Interdisciplinar de Trabalho em Saúde e a Ergologia como referenciais para compreender o trabalho ... 32 A Promoção da Saúde ... 35 OBJETIVOS ... 40 GERAL ... 40 ESPECÍFICOS ... 40 METODOLOGIA EXPANDIDA ... 41 Tipo de estudo ... 41

Cenário e participantes do estudo ... 42

Instrumentos de coleta de dados ... 43

Análise de dados ... 46

Aspectos éticos ... 47

RESULTADOS ... 49

MANUSCRITO 1 ... 49

Promoção da Saúde Bucal: Uma Revisão Integrativa da literatura ... 49

MANUSCRITO 2 ... 86

Promoção da Saúde Bucal: Competências para transformar a prática ... 86

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 106

REFERÊNCIAS ... 108

APÊNDICES ... 119

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APRESENTAÇÃO

Esta tese é fruto de uma trajetória de ensino-serviço construída com muito carinho e dedicação e com intuito de fortalecer o Sistema Único de Saúde. Venho de políticas afirmativas e sei da importância e da influência dessas políticas na melhoria de condições de vida, de ensino e trabalho. Foi a partir dessa jornada que me interessei em compreender melhor as Políticas Públicas.

Dessa forma, essa tese está constituída por uma introdução geral a qual apresenta o histórico e a contextualização da Atenção Primária em Saúde (APS) o cenário nacional, da Saúde Bucal na APS, da Promoção da Saúde da Bucal (PSB) e bem como a luz da Ergologia como referencial e metodologia para compreender o trabalho em saúde. Na sequência, encontram-se a metodologia expandida com todo detalhamento do percurso metodológico da pesquisa e os resultados serão apresentados em formato de manuscrito científico. A estrutura dos manuscritos se refere aos periódicos aos quais serão submetidos.

MANUSCRITO 1: Promoção da Saúde Bucal: Uma Revisão Integrativa

MANUSCRITO 2: Promoção da Saúde Bucal: Competências para transformar a

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INTRODUÇÃO

O Brasil ao promulgar sua Constituição Federal, em 1988, tornou a saúde um direito de cidadania que originou o processo de criação de um sistema de saúde público, universal e descentralizado, o Sistema Único de Saúde (SUS), com princípios e diretrizes pautados pelo movimento da Reforma Sanitária Brasileira (PAIVA; TEIXEIRA, 2014).

No entanto, seria necessário definir um modelo de atenção para esse novo sistema. Inicia-se então o debate sobre a organização das práticas de saúde, tendo de um lado, o designado “modelo biomédico”, reconhecido e incorporado pelos serviços de saúde, pelos seus benefícios em promover o alívio da dor e o tratamento de diversas doenças, mas também, com reconhecidas limitações como: o foco no indivíduo indiferenciado e intervenções no seu corpo e na parte afetada ou “não funcionante do corpo-máquina”; a ênfase nas ações curativas e no tratamento das doenças, lesões e danos; a medicalização; a ênfase na atenção hospitalar com uso intensivo do aparato tecnológico do tipo material (FERTONANI, et al., 2015).

Do outro lado, tem-se o que poderia ser um novo modelo de atenção orientado pelos princípios e diretrizes do SUS, com acesso universal e igualitário, regionalizado, hierarquizado, com a descentralização dos serviços de saúde, atendimento integral e participação popular (FERTONANI, et al., 2015).Nessa perspectiva de reestruturação dos serviços de saúde a partir do SUS, foi criado em 1991, em caráter de política focalizada, nas regiões Norte e Nordeste do país o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), responsável por cadastrar e acompanhar as famílias com intuito de reduzir a mortalidade materna-infantil. O PACS foi essencial para a definição e implantação do Programa Saúde da Família (PSF) em 1994 (BRASIL, 2010).

Em 1996, com a Norma Operacional Básica de Saúde (NOB), o PSF passa a ser considerado a estratégia nacional de substituição ao modelo de atenção vigente de saúde – fragmentado, hospitalocêntrico, individualista, de alto custo tecnológico - sendo renomeado para Estratégia Saúde da Família (ESF) (MORAES et al., 2015; FREITAS; MANDÚ, 2015).

A ESF incorporou os princípios do SUS (universalidade, integralidade, equidade) e se aproximou dos pressupostos da Atenção Primária à Saúde (APS), que internacionalmente se apresenta como uma estratégia de organização da atenção à saúde

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voltada para responder de forma regionalizada, contínua e sistematizada à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando ações preventivas e curativas, individuais e coletivas, sendo o primeiro nível de um sistema de saúde com oferta de serviços clínicos de qualidade, responsável pela coordenação do cuidado (LAVRAS, 2011; FAUSTO et al., 2018).

De acordo com Mendes (2012), há três interpretações principais da APS: 1º- a “APS seletiva” que atua como um programa focalizado e seletivo, destinado a populações e regiões pobres com oferta, exclusivamente, de um conjunto de tecnologias simples e de baixo custo, provido por pessoal de baixa qualificação profissional e sem a possibilidade de referência para níveis mais complexos; 2º - a APS como o nível primário do sistema de atenção à saúde, caracterizada por organizar e fazer funcionar a porta de entrada do sistema, enfatizando a resolutividade desses serviços sobre os problemas mais comuns de saúde, com baixo custo, porém, restritas às ações de atenção de primeiro nível; e 3º- a APS como estratégia de organização do sistema de atenção à saúde, compreendida como forma singular de apropriar, recombinar e reordenar todos os recursos do sistema para satisfazer às necessidades, demandas e representações da população, o que implica a articulação da APS como parte e como coordenadora de uma Rede de Atenção à Saúde (RAS).

No caso brasileiro, em busca de uma identidade, o Ministério da Saúde assumiu que a APS seria chamada de Atenção Básica em Saúde (ABS), a forma estruturante de organização do modelo, assumindo esse posicionamento claro na publicação da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) em 2006, a qual se caracteriza por ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais uma equipe assume a responsabilidade sanitária. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, sendo o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde e orientada pelos princípios e diretrizes do SUS (BRASIL, 2006).

Assim, no Brasil, a ABS torna-se sinônimo de APS, que tem na ESF a estratégia de operacionalização dos atributos da APS dimensionados por Starfield (2004) como: primeiro contato, longitudinalidade, abrangência do cuidado, coordenação e orientação à família e às comunidades, sendo coerente com o conceito ampliado de saúde presente no texto constitucional de 1988 (FAUSTO et al., 2018).

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A PNAB trouxe uma redefinição dos princípios gerais, das responsabilidades de cada esfera de governo, da infraestrutura e recursos necessários, das características do processo de trabalho, das atribuições dos profissionais, e as regras de financiamento, incluindo as especificidades da ESF (BRASIL, 2006).

Com a necessidade de rever e atualizar as normas da ABS, a PNAB foi atualizada primeiramente em 2012,buscando preservar a centralidade da ESF e consolidar uma APS forte, introduziu inovações voltadas à ampliação do acesso, cobertura e resolubilidade da atenção básica, com destaque para a flexibilidade da carga horária médica e o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQ-AB). Também trouxe elementos ligados ao papel da ABS na ordenação das RAS como o acolhimento, os avanços na gestão e coordenação do cuidado do usuário nas demais RAS, maior tipologia de equipes para as diferentes realidades do Brasil, inclusão dos Consultórios na Rua, ampliação do número de municípios que podem ter os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), facilitação na criação de unidades fluviais e ESF para as populações ribeirinhas (BRASIL, 2012).

A Política de 2012 também articulou a AB com importantes iniciativas do SUS, como a ampliação das ações intersetoriais e de promoção da saúde, universalização do Programa Saúde na Escola, acordo com as indústrias e escolas para uma alimentação mais saudável, implantação das Academia da Saúde, atuação junto as equipes do Melhor em Casa para ampliar a resolubilidade da atenção domiciliar, a integração dos sistemas de informação e a política de regulação, visando ampliar a resolubilidade da AB (BRASIL, 2012).

Mesmo com todos os avanços trazidos pela PNAB 2012, o desafio da resolutividade dos serviços permaneceu e fez com que gestores municipais e estaduais de saúde, por intermédio do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) e do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), mostrassem interesse em debater a PNAB vigente, principalmente com relação ao financiamento federal para outras modalidades da AB e novos arranjos na composição da ESF. Paralelamente, o relatório da 15ª Conferência Nacional de Saúde de 2015, propôs garantir o processo de revisão da PNAB, de modo a discutir a composição e a carga horária de profissionais da ESF e os critérios de distribuição de habitantes por equipe (ALMEIDA et al.,2018).

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Porém, importantes acontecimentos políticos ocorridos no cenário nacional em 2015, que culminaram no impeachment da Presidente Dilma Roussef, produziram um período de instabilidade político-institucional, refletidas em publicações como as portarias ministeriais 958 e 959, de 10 de maio de 2016, que permitiam a composição de ESF sem Agentes Comunitários de Saúde (ACS), podendo estes serem substituídos por técnicos de enfermagem, que resultaram em insatisfação e movimentação da categoria para revogar tais portarias, interrompendo assim o processo de revisão e debate da PNAB (ALMEIDA et al., 2018; MOROSINI; FONSECA; LIMA, 2018).

Com a transição governamental, novos atores políticos ingressaram no Ministérios da Saúde e colocaram em pauta de forma prioritária a finalização da revisão da PNAB, mesmo diante da Emenda Constitucional nº 95/2016, conhecida como a emenda do 'Teto dos Gastos', que congela por 20 anos a destinação de recursos públicos para saúde. Com o realinhamento político entre os membros das instâncias componentes da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), a PNAB foi foi aprovada em 30 de agosto de 2017, pouco mais de um mês após tornar-se oficialmente pública (ALMEIDA et al., 2018; MOROSINI; FONSECA; LIMA, 2018) e trouxe modificações nas diretrizes fundamentais que podem ameaçar a organização de uma APS, universal, abrangente, integral, inclusiva e equânime, destacando-se a autonomia concedida ao gestor municipal para definir o escopo de serviços (essencial ou ampliado) que serão ofertados, a delimitação do espaço territorial de vinculação da população às Equipes de Saúde da Família (EqSF) e principalmente a explicitação de alternativas para a configuração e implementação da AB, traduzindo-se em uma pretensa flexibilidade, sustentada pelo argumento da necessidade de atender especificidades locorregionais, caracterizando retrocessos em relação à construção de uma APS integral, que vinha direcionando o modelo de AB baseado na ESF. (BRASIL, 2017; FAUSTO, et al., 2018).

Os resultados da APS vinham sendo apresentados na forma de contribuições na melhoria dos cuidados e nos resultados das condições de saúde, principalmente das doenças crônicas (STARFIELD et al., 2004; OPAS/OMS, 2005; OMS, 2008; GIOVANELLA; PINTO, 2018). No caso brasileiro a ESF cresceu significativamente desde sua implantação, sendo que, em maio de 2019, o país contava com um total de 42.719 equipes implantadas, com cobertura de 63,45% da população, o que corresponde a cerca de 132 milhões de pessoas (BRASIL, 2019).

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A indução de mudanças vindas com a ESF fundamentadas na incorporação de novos atores e ações de saúde promoveu a expansão da oferta de serviços, dentre os quais os odontológicos (MARIN; et al., 2014). A Saúde Bucal (SB) passou a integrar a ESF nos anos 2000, com a Portaria GM/MS 1444 que estabelecia incentivo financeiro aos municípios para reorganizarem a atenção, ampliar o acesso da população e melhorar os índices epidemiológicos de saúde bucal (BRASIL, 2000). Essa inserção visou a substituição do modelo de prestação de serviços públicos odontológicos, baseados no curativismo, tecnicismo e biologicismo, estendendo as possibilidades de acesso à população por meio de ações de promoção da saúde, prevenção de agravos e recuperação da saúde bucal (BALDANI et al., 2018).

A ampliação da SB se deu através da incorporação de cirurgiões-dentistas (CD) e auxiliares de saúde bucal (ASB) às equipes da ESF e criou um espaço de práticas e relações para a reorientação do processo de trabalho e para a própria atuação da SB no âmbito dos serviços públicos de saúde, até então voltados para o alívio da dor, ou focalizados em grupos específicos como gestantes e escolares. O sistema de atendimento utilizado na ESF pelas equipes de saúde bucal (ESB) deve ser voltado à promoção de saúde, controle e tratamento das doenças bucais em âmbito individual e coletivo (LUCENA; PUCCA JUNIOR; SOUSA, 2011; MATTOS et al., 2014).

Visando expandir a inserção das ESB no SUS, foi formulada na agenda política brasileira, durante o governo Lula, através da ação estratégica de um grupo de atores envolvidos com o movimento da reforma sanitária brasileira, a Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB) – “Brasil Sorridente”, que tem como pressupostos a qualificação da APS, garantia de integralidade das ações, atuação com base na vigilância em saúde, planejamento das ações de acordo com a epidemiologia e informações do território (SOUZA; CHAVES, 2010).

Através da PNSB inicia-se a implantação de uma rede de referência e contrarreferência, através dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO), agrega a reabilitação protética, via Laboratórios Regionais de Próteses Dentárias (LRPD) e expande a cobertura da fluoretação da água de abastecimento público no Brasil (LUCENA; PUCCA JUNIOR; SOUSA, 2011), e torna-se um marco histórico e legal para as políticas públicas de SB.

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Desde o seu lançamento em 2004, estudos são realizados e indicam que o impacto da PNSB já pode ser visto na ampliação do acesso aos serviços de saúde bucal, principalmente na APS (PEREIRA et al., 2012; CASOTTI et al., 2014), e na atenção secundária, concretizada pela abertura dos CEOs (AQUILANTE; ACIOLE, 2015; LUVISON et al., 2016).

Com a inserção da SB na ESF, a odontologia se viu imersa num contexto de mudança de paradigma, numa ótica diferente de atenção em saúde, que busca olhar o paciente como um todo e não somente os seus problemas bucais (MATTOS et al., 2014). Os profissionais da saúde inseridos nesse contexto precisam desenvolver competências, que se referem a uma combinação de conhecimentos, habilidades e valores essenciais necessários para a prática efetiva de ações promotoras de saúde individuais ou coletivas e que vão para além do seu ‘núcleo do saber’, (REIS; SCHERER; CARCERERI, 2015; NETTO; SILVA; RUA, 2016). Isto se constitui em um desafio, na medida em que se faz necessário integrar a prática dos profissionais diante de um cenário marcado pela fragmentação com que cada especialidade ou subespecialidade cuida de apenas uma parte do cuidado (SCHERER; PIRES; SCHWARTZ, 2009).

No que se refere ao processo de trabalho do CD no âmbito da ESF, este agregou novas atribuições, dentre elas: conhecer a realidade da comunidade, ser responsável pela população da área adscrita, identificar os determinantes de saúde da população, organizar as atividades segundo os riscos e vulnerabilidades individuais e coletivos. Ou seja, é necessário um trabalho em equipe cujo objetivo é ampliar os conhecimentos, permitindo uma abordagem integral ao indivíduo (BRASIL, 2004).

O SUS e a Promoção da Saúde (PS), ao incorporar o conceito ampliado de saúde, que é resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde, definido pelas formas de organização social em um contexto histórico e num dado momento de seu desenvolvimento, buscando superar a concepção da saúde como ausência de doença e devendo ser conquistada pela população em suas lutas cotidianas (BRASIL, 1986; BRASIL, 2015), faz uma passagem de um modelo de atenção à saúde centrado na doença para um modelo que foca na análise dos efeitos dos condicionantes sociais, culturais, econômicos e bioecológicos, na articulação intersetorial

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e na participação da sociedade para a redução de vulnerabilidades e riscos, se comprometendo assim com a PS (MORAES et al., 2014).

A PS vincula-se à concepção expressa na Carta de Ottawa, sendo definida como o processo de capacitação de indivíduos, famílias e comunidades para aumentar o controle sobre os Determinantes Sociais de Saúde (DSS) e atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde indo para além de um estilo de vida saudável (HEIDEMANN et al., 2014).

Os DSS "são os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e fatores de risco na população" (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007, p. 78). Ou seja, as diferenças de saúde entre grupos humanos não podem ser justificadas apenas por fatores biológicos; pelo contrário, as diferenças de saúde parecem resultar de hábitos e comportamentos construídos socialmente e, principalmente, de fatores que estão fora do controle direto do indivíduo ou do grupo (SOUZA; SILVA; SILVA; 2013).

Os DSS enfatizavam que, para entender a saúde, incluindo a saúde bucal, é imprescindível analisar as populações no contexto das políticas públicas e ações de saúde dirigidas à sociedade (BUENO et al., 2014). Considerando os DSS e os conhecimentos atuais sobre o processo saúde-doença, promover saúde e, portanto, saúde bucal, é tão necessário quanto desafiador num país com grandes diferenças sanitárias, epidemiológicas, sociais e culturais (DOMINGUES; CARVALHO; NARVAI, 2008; KUSMA; MOYSÉS; MOYSÉS, 2012).

Dessa forma, a promoção da saúde torna-se estratégica para o processo de reformulação de práticas sanitárias, principalmente por ser um dos eixos centrais do SUS na construção de uma abordagem integral do processo saúde-doença (KUSMA; MOYSÉS; MOYSÉS, 2012). É diante dessas transformações que a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), publicada em 2006 (BRASIL, 2006) foi revista e atualizada em 2014, adotou ações públicas que superam a ideia de cura e reabilitação, implantando objetivos, princípios, valores, temas transversais, estratégias operacionais, responsabilidades, temas prioritários, diretrizes e ações em consonância com os princípios do SUS, reforçando o conceito de determinação social da saúde de modo a impactar favoravelmente a qualidade de vida (BRASIL, 2015; HEIDEMANN, 2014).

Na APS, a ESF busca (res)situar o usuário, a família e a comunidade no centro do cuidado, o que exige uma intrínseca interação entre as categorias profissionais que

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compõem as equipes de saúde (BARROS; SPADACIO; COSTA, 2018). Para que o trabalho de saúde bucal na ESF integre toda a equipe de profissionais, e se desenvolva pautado nas políticas que regem o trabalho na APS, buscando o conhecimento integral e a construção coletiva das intervenções, e não apenas articulações pontuais e encaminhamentos internos, é essencial a compreensão da sua complexidade, do processo saúde-doença, a fim de ampliarem as intervenções sobre determinados problemas, e assim promover saúde (FACCIN; SEBOLD; CARCERERI, 2010).

Para cumprir com proposto, o trabalho interdisciplinar, no qual o trabalho deve ser realizado a partir da articulação de saberes, e interprofissional, que é o trabalho com e entre muitos, portanto um ação em equipe para o enfrentamento dos problemas a partir de um constante processo de comunicação e de tomada de decisões (MATUDA et al.,2015), torna-se estratégia central pois pressupõe novas formas de relacionamento institucionais e interpessoais, trabalho mais integrador e articulado, valorização dos domínios de conhecimentos específicos de cada saber/fazer envolvido no cuidado em saúde, tendo como objetivo a produção da saúde (MATOS, PIRES, CAMPOS, 2009). Na perspectiva interprofissional a equipe desenvolve uma identidade, compartilha objetivos, busca o cuidado integral, considerando o caráter complexo e dinâmico das necessidades de saúde de indivíduos e coletivos (BARROS; SPADACIO; COSTA, 2018).

Nesse contexto de interdisciplinaridade e interprofissionalidade, tem-se no cenário nacional o município de Florianópolis que veio se destacando no processo de implantação da ESF, e que em 2015 chegou a atingir 100% de cobertura de ESF. Atualmente, com as mudanças advindas com as reformas nas políticas públicas de saúde do município, a cobertura de ESF encontra-se em 64,38% e em relação à ESF com ESB em apenas 14%. Hoje o município conta também com as novas conformações de equipes atuando na APS e por isso tem-se uma cobertura populacional na ABS de 92,54% e 49,51% para a Saúde Bucal (SB) (BRASIL, 2019). Mesmo em um cenário de transformações, nos últimos 7 anos o município garantiu por três vezes o 2º lugar no Prêmio Brasil Sorridente e ainda possui o menor índice de cárie aos 12 anos (0,68). A capital também recebeu outros prêmios na área da educação, turismo, gastronomia e desenvolvimento econômico, se mantendo como um município de destaque no país (CHAVES, et al., 2016).

Para seguir Neste contexto de APS, o processo de trabalho das equipe foi o objeto deste estudo que objetivou responder a seguinte questão norteadora: “De que forma, as

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competências para o trabalho interdisciplinar das equipes de saúde da família e saúde bucal se configuram e como são aplicadas pelas equipes a fim de promover saúde bucal na APS?”

O objetivo foi de compreender a partir do referencial da ergologia, definida como “[...] um projeto de melhor conhecer e, sobretudo, de melhor intervir sobre as situações de trabalho para transformá-las” (SCHWARTZ, 2010, p. 37) originada de estudos pluridisciplinares a respeito de situações de trabalho nos anos 1970 e início de 1980 na França, sendo fruto de experimentações e debates entre profissionais do conceito e protagonistas da atividade de trabalho (ATHAYDE; BRITO, 2011; HENNINGTON; CUNHA; FISCHER, 2011) e da promoção da saúde em seu conceito ampliado, por meio do Groupes de Rencontre du Travail (GRT – metodologia de trabalho apoiada na ergologia, dentre as competências, quais os conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para o trabalho interdisciplinar, quais estão mais evidentes e como são aplicadas pelas equipes de saúde a fim de promover saúde bucal na APS.

Trata-se de um tema de pesquisa relevante, pois a PNPS veio para provocar mudanças nos modos de organizar, planejar, realizar, analisar e avaliar o trabalho em saúde e trouxe, em sua essência, a necessidade de estabelecer relação com as demais políticas públicas conquistadas pela população, que mesmo imersa em tantas transformações na APS brasileira continua vigente e apontando para estratégias integradas que procuram articular pesquisa, publicidade e a comunicação social com o intuito de divulgar iniciativas efetivas para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando metodologias participativas e o saber popular (KUSMA; MOYSÉS; MOYSÉS, 2012; MALTA et al., 2016).

Considerando as metodologias participativas, a originalidade se destaca em termos metodológicos com a pesquisa-ação, por requerer a construção de estratégias e caminhos para a superação dos desafios, construídas pelos atores em consonância com seus cenários de prática (GONÇALVES; et al, 2015). Essa construção foi realizada durante os GRT, utilizado por outras áreas profissionais, mas sem referências para a área da odontologia sendo um estudo não trivial com potencial de produzir conhecimento científico e, também de gerar transformações no cotidiano das equipes.

Dessa forma os resultados desse estudo poderão contribuir no processo de trabalho das equipes de saúde diante dos enfrentamentos e desafios complexos inerentes ao ato de

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cuidar, no empoderamento dos profissionais para tomada de decisão tanto para as realizações de práticas interdisciplinares pautadas no real conceito de promoção da saúde (geral e bucal) quanto às reorientações de políticas e normas que gerem o trabalho em saúde no contexto da atenção primária.

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CONTEXTUALIZAÇÃO TEÓRICA

Neste capítulo será apresentada um breve histórico, definições e principais conceitos sobre a APS, a saúde bucal na ESF e seu modelo inovador de processo de trabalho para a APS, o processo de trabalho interdisciplinar de trabalho em saúde e a ergologia como referencial para analisar e compreender esse trabalho. Atenção Primária à Saúde.

Atenção Primária à Saúde

A APS como ideia de organização dos sistemas de saúde apareceu pela primeira vez no Relatório Dawnson, em 1920, no qual o governo inglês procurou constituir-se numa referência para a organização do modelo de atenção inglês, que começava a preocupar as autoridades daquele país, devido ao elevado custo, à crescente complexidade da atenção médica e à baixa resolutividade (KUSCHNIR; CHORNY, 2010).

A conferência de Alma Ata, em 1978, estabeleceu o consenso de que a APS seria a estratégia fundamental e a porta de entrada do sistema de saúde enfatizando a promoção da saúde e com capacidade para resolver 80% dos problemas de saúde da população, melhorar o status de saúde e reduzir custos (ONOCKO-CAMPOS et al., 2011).

Internacionalmente tem-se apresentado ‘Atenção Primária à Saúde’ (APS) como uma estratégia de organização da atenção à saúde voltada para responder de forma regionalizada, contínua e sistematizada à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando ações preventivas e curativas, bem como a atenção a indivíduos e comunidades (DE-CARLI et al., 2015).

Para Starfield (2004), a APS corresponde ao primeiro nível de atenção do sistema de saúde, articulando-se ao trabalho de todos os outros níveis e organizando o uso dos recursos, direcionados à promoção, manutenção e melhoria da saúde.

No Brasil, a ABS é sinônimo de APS que através do SUS enfatiza a reorientação do modelo assistencial, a partir de um sistema universal e integrado de atenção à saúde (LOCH-NECKEL et al., 2009). Essa adoção possibilitou a construção da PNAB, lançada em 2006, que incorporou os atributos propostos por Starfield (2004) e tornou a ABS o contato prioritário da população com o sistema de saúde, sendo definida como: um conjunto de ações de saúde no âmbito individual e coletivo que abrangem a promoção e

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proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde. Desenvolvida através de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade. Orienta-se pelos princípios da universalidade, acessibilidade e coordenação do cuidado, vínculo e continuidade, integralidade, responsabilização, humanização, equidade, e participação social (BRASIL, 2006).

A reorientação do modelo iniciou-se com o PACS em 1991 e com o PSF em 1994, com foco em áreas de maior risco social. No período de 1998 – 2002, adquiriu centralidade na agenda do governo, convertendo-se em Estratégia Saúde da Família (ESF), estratégia estruturante dos sistemas municipais de saúde e modelo de APS (MELO et al., 2018).

Implementar uma APS abrangente ou integral implica a construção de sistemas de saúde articulados em rede, centrados no usuário e que respondam a todas as necessidades de saúde da população. A atuação intersetorial é condição para que a APS seja base a toda a atenção, contemplando aspectos biológicos, psicológicos e sociais, incidindo sobre problemas coletivos nos diversos níveis de determinação dos processos saúde-enfermidade, promovendo a saúde (GIOVANELLA et al., 2009).

Estudos indicam que medidas visando o aumento do protagonismo da APS em promover a coordenação dos cuidados são temas recorrentes e prioritários na agenda do setor saúde (KRIGOS et al., 2010; GOMES et al., 2011; ALMEIDA et al., 2011; RODRIGUES et al., 2014). Dentre as medidas em prol da coordenação do sistema pela APS encontra-se a expansão dos serviços nesse nível de atenção para incluir atividades de prevenção e promoção, cuidados comunitários e execução de procedimentos antes realizados na atenção hospitalar (pequenas cirurgias, diagnóstico, atendimentos de urgência, cuidados paliativos e acompanhamento pós-alta hospitalar), serviços odontológicos, aumento do acesso a meios diagnósticos e terapêuticos, educação continuada; e o maior prestígio e reconhecimento profissional (ALMEIDA et al., 2011; MARIN et al., 2014).

Outra medida que apresentou avanços importantes na prestação de serviços capaz de qualificar e consolidar a APS foi o desenvolvimento do trabalho de forma

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interdisciplinar pelas equipes da ESF. As equipes multiprofissionais de saúde da família (EqSF) são compostas por profissionais médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, agentes comunitários de saúde e odontólogos, com o objetivo de estreitar laços entre profissionais da saúde, educação, gestores e população usuária dos serviços de saúde. Essa iniciativa, quando estabelecida, vem contribuindo significativamente para a efetivação de mudança no modelo assistencial, com ênfase na promoção de saúde da família (LOCH-NECKEL et al., 2009).

Porém, mudanças na PNAB em 2017, ocorridas em meio à grave crise política, econômica e institucional que abateu o país, desenha um cenário futuro de muitas incertezas, marcado por cortes orçamentários, austeridade econômica, desregulamentação do estado, descontinuidade dos projetos que promoviam a inclusão social, entre outros (MALTA et al., 2018).

A Emenda Constitucional nº 95 e do Novo Regime Fiscal impõe o congelamento dos gastos públicos por 20 anos, afetará municípios e estados e resultará em retração da oferta de ações e serviços do SUS, principalmente as de promoção da saúde que dependem da intersetorialidade (MALTA, et al, 2018; MOROSONI, et al, 2018).

Internacionalmente, em comemoração aos 40 anos da Declaração de Alma-Ata, por iniciativa da OMS, do UNICEF e do Governo do Cazaquistão, realizou-se, em Astana, em outubro de 2018, a Conferência Global sobre Atenção Primária à Saúde, com o propósito de renovar o compromisso da APS. A Conferência de Astana ocorre em um contexto internacional distinto daquele de Alma-Ata, com políticas de austeridade, crise migratória e ameaças à democracia. Restringe o sentido da APS integral de Alma-Ata e o alcance do direito à saúde ao subsumi-la à Cobertura Universal de Saúde (UHC - em inglês) (GIOVANELLA et al., 2019).

A UHC, moldada na última década congrega diretrizes das reformas pró-mercado como a redução da intervenção estatal, subsídios à demanda, seletividade e focalização nas políticas de saúde. Na proposta de UHC o direito à saúde se restringe ao asseguramento de uma cesta de serviços restrita a ser contratada, reeditando a APS seletiva. Resulta, portanto, em cobertura segmentada por seguros diferenciados por grupos sociais conforme sua renda e respectivos pacotes de serviços que cristalizam desigualdades, se contrapondo ao espírito de Alma-Ata e aos Objetivos de

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Desenvolvimento Sustentável: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades (ALAMES, 2018; CNS, 2018; GIOVANELLA, et al., 2019).

A Declaração de Astana é um referente internacional, mas não supera a de Alma-Ata, em seus princípios de justiça social e de concepção de APS integral, inseparável do desenvolvimento econômico e social. Apresenta ambiguidades e lacunas.A ênfase na cobertura da UHC pode debilitar a abordagem integral de APS e limitar o acesso da população (GIOVANELLA, et al, 2019). Aintegralidade pode ficar comprometida tanto em seus componentes de promoção e prevenção como nos de garantia de acesso à atenção especializada e hospitalar conforme necessidades (VANCE, 2018).

A Declaração, porém, afirma o compromisso com o direito fundamental de todo ser humano à saúde, reconhecendo como inaceitável a persistência de iniquidades em saúde. Indica a APS como fundamento de sistemas de saúde sustentáveis, aspira aos governos e sociedades que priorizem a saúde e o bem-estar e promovam e protejam a saúde mediante sistemas de saúde sólidos (GIOVANELLA et al., 2019).

A Saúde Bucal e Estratégia de Saúde da Família como inovação no trabalho da APS

O inicial PSF transformou-se em ESF caracterizando-se como estratégico e inovador pela sua capacidade em orientar a organização do sistema de saúde, buscar respostas para as necessidades de saúde da população e contribuir na mudança do modelo assistencial médico-centrado focado na doença, para um modelo usuário-centrado. Foi desenvolvida com o objetivo de estreitar laços de compromisso entre profissionais da saúde, educação, gestores e população usuária dos serviços de saúde (ARANTES; SHIMIZU; MERCHÁN-HAMANN, 2016).

Essa iniciativa apresentou avanços importantes para a APS. Em uma dimensão político-institucional a ESF favoreceu a expansão dos cuidados primários no país e instituiu o processo de avaliação (PMAQ) e quanto à promoção da equidade, a ESF também foi melhor quando comparado com o modelo tradicional de APS (modelo queixa-conduta); na dimensão organizativa, a implantação da ESF ampliou a oferta de serviços nas áreas periféricas e rurais, inclusive para a saúde bucal; em uma dimensão técnico-assistencial, a ESF foi melhor do que o modelo de APS tradicional quanto ao desempenho, ao trabalho multiprofissional, ao enfoque familiar, ao acolhimento, ao vínculo, à humanização e à orientação comunitária, enfatizando a promoção da saúde da

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família, a prevenção de doenças, a busca ativa de casos, a educação em saúde, a assistência domiciliar, o aumento do número de consultas pré-natais, puericultura, de orientações sobre o aleitamento materno exclusivo, da coleta de colpocitologia oncótica; a redução de nascidos com baixo peso, da mortalidade infantil e das internações hospitalares (LOCH-NECKEL et al., 2009; SANTOS; OLIVEIRA, 2013; RASELLA et al., 2014; ARANTES; SHIMIZU; MERCHÁN-HAMANN, 2016; MULLACHERY; SILVER; MACINKO, 2016).

As equipes de saúde da família (EqSF) são responsáveis pelo acompanhamento de um número definido de famílias, localizadas em uma área geográfica delimitada e atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais frequentes, e na manutenção da saúde desta comunidade, bem como ações que priorizem os grupos e fatores de risco; acolhimento com escuta qualificada; atenção integral, contínua e organizada; atenção domiciliar; ações educativas e intersetoriais, que possam interferir no processo saúde-doença da população de forma individual e coletiva, na busca da qualidade de vida (BRASIL, 2006).

A incorporação das Equipes de Saúde Bucal (ESB) na ESF veio com a Portaria nº 1444 (2000), que definiu o incentivo financeiro para a implantação dessas equipes, gerando um aumento significativo do número de ESB, porém sem garantir, necessariamente, a mudança no modelo assistencial em saúde bucal (SOARES et al., 2011).

Visando ampliar a inserção das ESB, foi lançada, em 2004, a Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB) – “Brasil Sorridente”, cujos pressupostos são: qualificar APS, assegurar a integralidade das ações, atuar com base na vigilância em saúde, planejar as ações de acordo com a epidemiologia e as informações do território, e financiar e definir agenda de pesquisa para que se trabalhe com base em evidências científicas (BRASIL, 2004).

Para a PNSB foram elaboradas diretrizes gerais para atuação de cada membro da ESB, o cirurgião-dentista (CD), o técnico em saúde bucal (TSB) e o auxiliar de saúde bucal (ASB). Essas equipes possuem duas modalidades: ESB modalidade I composta por um CD e um ASB e a ESB modalidade II formada por um CD, um ASB e um TSB. Do

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ponto de vista do processo de trabalho inicialmente foi incorporada uma ESB para cada duas ESF (BRASIL, 2004).

Segundo as Diretrizes Nacionais de Saúde Bucal:

“Ao colocar para a saúde bucal a proposta de sua inserção em uma equipe multiprofissional, além de introduzir o ‘novo’, afronta valores, lugares e poderes consolidados pelas práticas dos modelos que o antecederam” (BRASIL, 2004, p. 8).

A ampliação do acesso aos serviços odontológicos passa pela qualificação do processo de trabalho à luz da ESF, e implica avançar nas concepções e práticas que possibilitem romper a hegemonia da odontologia de mercado, transformar o modelo de atenção e, com isso, avançar na desodontologização da saúde bucal e na universalização dos cuidados odontológicos, preconizados pela Saúde Coletiva, tornando concreto para todos, também em seu componente bucal, o direito humano à saúde (NARVAI; CARCERERI, 2012).

Toda essa ampliação caracteriza a renovação da APS, a qual inclui inovações tecnológicas materiais, como a informática, e inovações tecnológicas não materiais, destacando-se as de reorganização do trabalho (LORENZETI et al., 2012).

Nesse sentido a ESF pode ser considerada uma inovação tecnológica de organização do trabalho que incorpora os princípios da universalidade, equidade, integralidade da atenção, trabalho em equipe e interdisciplinar, foco de atuação centrado no território-família-comunidade, humanização da atenção, responsabilização e vínculo, que regem o SUS, valorizando os aspectos culturais e acolhendo as demandas de indivíduos e grupos numa perspectiva interdisciplinar (SORATTO et al., 2015).

Estudos registram importantes distinções deste modelo assistencial com o modelo biomédico tradicional. O modelo da ESF enfatiza a perspectiva interdisciplinar em contraposição à ênfase nas especialidades médicas e na doença; outras distinções são a delimitação da área de atuação das equipes, a valorização da atenção integral, o enfoque familiar e o estabelecimento de vínculos de co-responsabilidade com a população (BRASIL, 2009; FERTONANI, 2015).

Porém, a literatura mostra que, após uma década de implantação da PNSB, os principais problemas e dificuldades no trabalho das ESB não são exclusivos da

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odontologia. A rigor, acompanham a realidade do trabalho das equipes da ESF, em consonância com o indicado por estudos recentes sobre o trabalho das equipes de saúde da família (SCHERER; SCHERER, 2015).

As mudanças ocorridas na PNAB 2017 podem implicar maiores dificuldades para a integração entre as ESF e a SB e na mudança do modelo de atenção à saúde bucal já que as ESB tornaram-se optativas ao gestor local e quando presentes, podem ser vinculadas às equipes de atenção básica tradicionais e sem reajuste do financiamento dos diferentes componentes do PAB Variável mais relacionado com a ESF , o qual a saúde bucal está vinculada (MELO et al., 2018).

A relevância da interdisciplinaridade e da complementaridade entre todas as profissões de saúde na ESF reforça o papel da ESB na saúde integral e ajuda a compreender o processo de trabalho neste novo contexto, na tentativa de romper com os paradigmas tradicionais da odontologia que, apesar de ter um novo cenário normativo, as mudanças são incipientes no trabalho em saúde bucal (NASCIMENTO et al., 2013; SCHERER; SCHERER, 2015).

O Processo Interdisciplinar de Trabalho em Saúde e a Ergologia como referenciais para compreender o trabalho

A finalidade de qualquer ação em saúde, é o ato de cuidar, o que requer tecnologias de trabalho – um “conjunto de conhecimentos e agires” – que estão materializados em máquinas e instrumentos ou em recursos teóricos ou técnicos (“tecnologias duras ou leve-duras”), mas também estão dispersos “nas experiências e modos singulares de cada profissional de saúde operar seu trabalho vivo em ato” (p. 116). Sendo o trabalho em saúde essencialmente “intercessor”, relacional, as “tecnologias leves” operam a função criativa dos serviços de saúde para produzir o cuidado (MEHRY et al., 2004).

O processo de trabalho em saúde faz parte do setor de serviços obedecendo, historicamente, à lógica taylorista de organização e gestão (RIBEIRO; PIRES; BLANK, 2004). O modelo da Administração Científica foi desenvolvido pelo engenheiro norte-americano Frederick Taylor (1856-1915), sendo um dos pioneiros na estruturação da disciplina científica da administração de empresas. Tem como referencial a ênfase nas tarefas, com foco no aumento da eficiência operacional do trabalho com a máxima economia de esforço (TAYLOR, 1995).

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O “trabalho em saúde é um trabalho essencial para a vida humana e é parte do setor de serviços. É um trabalho da esfera da produção não material, que se completa no ato de sua realização. Não tem como resultado um produto material, independente do processo de produção e comercializável no mercado. O produto é indissociável do processo que o produz; é a própria realização da atividade” (PIRES, 2000, p.85).

Para compreender melhor essa indissociação entre produtor/processo/produto que nasce a Ergologia, uma abordagem pluridisciplinar, que reconhece a atividade de trabalho como um debate de normas, desenvolvendo na prática a reflexão/confrontação dos saberes entre si; dos saberes com as experiências, da atividade de trabalho enquanto matriz de saberes, significa o estudo da atividade humana (SCHWARTZ; DURRIVE, 2008). Essa perspectiva mostra que o trabalho efetuado jamais corresponde ao trabalho esperado, determinado pelas regras e pelos objetivos pré-determinados (SCHERER; PIRES; SCHWARTZ, 2009). Portanto, a análise do trabalho é feita tanto quanto possível “do ponto de vista daquele que trabalha” e se constitui no intuito de investigar o permanente debate de normas e de valores que renovam indefinidamente a atividade humana (SCHWARTZ; DUC; DURRIVE, 2010).

De acordo Schwartz e Durrive (2008) as normas exprimem uma regra, um objetivo, um modelo, definidas por uma autoridade que pode ser exterior ao indivíduo [normas impostas e mais ou menos assumidas], como pode ser do próprio indivíduo [normas instauradas na atividade], porque cada um procura ser produtor das suas próprias normas, na origem das exigências que o governam. Para trabalhar, o ser humano tem necessidade de normas antecedentes (manuais e notas técnicas, regras de gestão, organizacionais, prescrições e instruções, procedimentos, etc.) que, ao mesmo tempo, o constrangem e lhe permitem desenvolver uma atividade singular por renormalizações sucessivas.

Na atividade de trabalho, uma vez que os trabalhadores fazem escolhas – conscientes ou inconscientes, em razão de critérios e, portanto, em razão de valores, e são os valores que levam à reconfiguração das normas, ou seja, às “renormalizações”. Renormalizações são as múltiplas gestões de variabilidades, de furos das normas, de tessitura de redes humanas, de canais de transmissão que toda situação de trabalho requeira, sem, no entanto, jamais antecipar o que elas serão, na medida em que essas renormalizações são portadas por seres e grupos humanos sempre singulares, em

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situações de trabalho, elas mesmas também sempre singulares” (SCHWARTZ, 2011, p. 34).

Esse debate de normas se constitui na essência do trabalho vivo em ato, que possui duas dimensões: uma, a da atividade como construtora de produtos; a outra se vincula ao produtor do ato, o trabalhador, e à sua relação com seu ato produtivo e seus produtos, bem como com suas relações com os outros trabalhadores e com os possíveis usuários de seus produtos. Na saúde o ‘trabalho vivo em ato’ é o trabalho humano no exato momento em que é executado e que determina a produção do cuidado num processo de produção de relações intercessoras (SANT’ANNA; HENNINGTON, 2011).

As ações coletivas multiprofissionais são características do trabalho em saúde, entretanto ocorrem muitas vezes de maneira fragmentada onde cada especialidade ou subespecialidade cuida de uma parte da atividade. O fato de seu campo de ação envolver a vida e a morte gera no trabalho em saúde a necessidade de domínio de vários conhecimentos para ser posto em prática em cada ser humano que possui uma história de vida singular (SCHERER; PIRES; SCHWARTZ, 2009).

O trabalho envolve sempre a necessidade do “uso de si”. Pode ser o “uso de si” pelos outros, uma vez que sua atividade sempre é constituída por uma diversidade de normas, prescrições e valores construídos no contexto histórico da humanidade. Entretanto, pode ser também o “uso de si” pelo próprio trabalhador, uma vez que constantemente ele renormaliza as prescrições e cria alternativas personalizadas para enfrentar os desafios do cotidiano profissional (SCHWARTZ, 2000).

Toda atividade profissional apresenta um aspecto que envolve sua prescrição, ou seja, um conjunto de antecipações e outro que se vincula à realização da atividade concreta de trabalho. São três as dimensões, chamadas por Schwartz (1998a) de ingredientes da competência, que buscam predefinir a atividade de trabalho: a heterodeterminação, com as prescrições e os recursos tecnológicos disponíveis para a atividade; as experiências apreendidas no trabalho, que, formando um conjunto de valores científicos e culturais do coletivo, guiam e influenciam na atividade; e a dimensão dos valores (REIS; SCHERER; CARCERERI, 2015).

O trabalho prescrito refere-se ao que é esperado no âmbito de um processo de trabalho específico, com suas singularidades locais (BRITO, 2008), relaciona-se às regras

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e objetivos fixados pela gestão – “o que se deve fazer”. Sua prescrição pode ser verbal ou escrita, ou pode, ainda, ser apenas implícita (OLIVEIRA, 2011). É caracterizado pelos objetivos a serem atingidos, pelos métodos e procedimentos previstos, instruções a serem seguidas, protocolos e normas técnicas, condições temporais e socioeconômicas (BRITO, 2008). O trabalho real pode-se dizer que é aquilo que é posto pelos trabalhadores para realizarem o trabalho prescrito, é um processo de regulação e gestão das variabilidades e do acaso inerentes à realização da atividade de trabalho (BRITO, 2008; OLIVEIRA, 2011). O fato de o trabalho real diferir do prescrito constitui um dos elementos essenciais para a compreensão de como o trabalho se desenvolve na realidade (OLIVEIRA, 2011).

O trabalho em saúde é permeado todo o tempo por práticas multi, pluri e interdisciplinares, conforme os problemas que se colocam, as demandas surgidas e a necessidade de resolução (SCHERER; PIRES; SCHWARTZ, 2009).

As mudanças que vinham ocorrendo na APS brasileira, como o aumento do vínculo entre profissionais-comunidade, o trabalho territorializado dos ACS, diminuição das internações hospitalares sensíveis à APS, presença de espaços instituídos como as reuniões de equipe, sinalizavam para a possibilidade de práticas mais colaborativas e com impacto positivo no resultado assistencial, mostrando que as EqSF e ESB são exemplos de equipes prescritas importantes, mas sua definição é insuficiente para compreender as trocas/relações entre as pessoas para a realização da atividade e para torná-la mais eficaz. A atividade de trabalho de uma equipe se integra permanentemente com outros serviços e outras equipes (SCHERER; PIRES; SCHWARTZ, 2009).

Nesse sentido, compreender como os profissionais da ESF, diante das transformações no cenário nacional da APS, continuam a desenvolver seus processos de trabalho e quais competências eles utilizam para efetivá-las pode contribuir para reorientar prescrições e a própria gestão do trabalho e assim manter o foco da APS na Promoção da Saúde.

A Promoção da Saúde

O conceito de promoção à saúde tradicional iniciou-se com o modelo de Leavell & Clark, na década de 40, no esquema da História Natural da doença, como um dos elementos do nível primário de atenção em medicina preventiva. Este enfoque foi se modificando e em meados dos anos 70, resultado do debate sobre a determinação social

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e econômica da saúde e a construção de uma concepção não centrada na doença, surgiu no Canadá o "Informe Lalonde", focado nas mudanças dos estilos de vida, com ênfase na ação individual, comportamental, preventivista. Ele recebeu críticas, por negligenciar o contexto político, econômico e social, responsabilizando determinados grupos sociais por seus problemas de saúde. Assim, em meados dos anos 80, começa a surgir um discurso alternativo e, em 1984, a OMS/Europa produziu um documento preliminar contendo os elementos-chave da “nova promoção à saúde”, reforçando a noção da determinação social da saúde ao empregar os conceitos de desenvolvimento comunitário e empowerment como elementos-chave para alcançar saúde (HEIDMANN, 2006).

A Promoção da Saúde (PS) pressupõe uma concepção de saúde não restrita à ausência de doença, mas sim, a uma saúde que seja capaz de atuar sobre seus determinantes (TAVERES et al., 2016). Sua dimensão política na saúde ganhou forma e expressão em 1986 na I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada no Canadá. Esta conferência resultou no documento denominado “Carta de Ottawa” que definiu a promoção da saúde como “o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo” (WHO, 1986).

Ao adotar a Carta de Ottawa como referência para a PS, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu os programas, as políticas e as atividades a serem executadas baseando-se nos princípios de concepção holística, intersetorialidade, empoderamento, participação social, equidade, ações multiestratégicas e sustentabilidade como características da promoção de saúde em 1998 (SILVA et al., 2014).

As Declarações das Conferências Internacionais seguintes mantiveram a perspectiva da Carta de Ottawa (BRASIL, 2002), com alguns aspectos a serem destacadas. A Declaração de Adelaide (BRASIL, 2002) - centraliza nas políticas públicas saudáveis, sendo a intersetorialidade a estratégia fundamental para sua construção. Declara que o acesso a produtos e serviços de saúde, à educação em saúde e a criação de ambientes favoráveis poderiam fechar a lacuna de tais desigualdades sociais. A Declaração de Sundsvall (BRASIL, 2002) enfatiza a necessidade de ações urgentes para se atingir maior “justiça social em saúde” e a criação de ambientes favoráveis (aspectos físicos e sociais do nosso entorno); destaca a situação de extrema pobreza; reforço à ação comunitária, de educação e capacitação dos indivíduos e comunidades para o controle

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sobre a saúde e de “empoderamento” das pessoas. A Declaração de Jacarta em 1997 foi a primeira a tratar dos DSS em um item específico. Enfatiza a necessidade de novas respostas no âmbito da PS. (BRASIL 2002)

A Declaração do México nos anos 2000, analisou o impacto das estratégias de PS para melhorar a saúde e a qualidade de vida das pessoas mais pobres. Seu tema central foi a equidade. A Carta de Bangcok em 2005 afirma que as políticas e alianças destinadas a empoderar as comunidades e melhorar a saúde e a equidade em saúde devem ter lugar central na agenda do desenvolvimento mundial. Os DSS são apontados como “fatores de risco” sobre o controle dos indivíduos (BRASIL, 2002).

A 7ª Conferência resultou no documento “Nairóbi chamada à ação” (WHO, 2009) que reforça como responsabilidades prioritárias daqueles comprometidos com a PS: fortalecer a liderança em PS e os sistemas de saúde; empoderar as comunidades e indivíduos; colocar a PS como estratégia central na agenda do desenvolvimento; fortalecer processos participativos e; construir e aplicar conhecimentos acerca da PS e elege algumas estratégias de ação.

A 8ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde foi realizada em Helsinque, na Finlândia em e a Declaração de Helsinki sobre Saúde em Todas as Políticas (WHO, 2013) firmou um compromisso entre os governos, entidades e membros participantes para com a equidade em saúde e a saúde em todas as políticas. Afirma que políticas equitativas ampliam níveis de saúde, reduzem a pobreza e promovem inclusão social e segurança.

A última Conferência, realizada em Xangai (WHO, 2015) para comemorar os 30 anos da Carta de Ottawa, se comprometeu a fazer escolhas políticas audaciosas para a saúde, enfatizando as ligações entre saúde, bem-estar e a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e seus Objetivos do Desenvolvimento Sustentável; ressalta o papel da boa governança e da alfabetização em saúde na melhoria da saúde, bem como o importante papel desempenhado pelas autoridades municipais e pelas comunidades.

Em 2016, a cidade de Curitiba, capital do Paraná, no Brasil, sediou a 22ª Conferência Mundial de Promoção da Saúde da União Internacional para a Promoção da Saúde e Educação (UIPES), onde cerca de 2,5 mil profissionais – entre pesquisadores,

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