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Um mergulho nas águas do Velho Chico : territorialização, desterritorialização e reterritorialização dos pescadores artesanais de Saramém, Brejo Grande-SE

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NÍVEL MESTRADO. EDILSON CARNEIRO DA SILVA. UM MERGULHO NAS ÁGUAS DO VELHO CHICO: TERRITORIALIZAÇÃO, DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO DOS PESCADORES ARTESANAIS DE SARAMÉM, BREJO GRANDE-SE. SÃO CRISTÓVÃO-SE 2014.

(2) EDILSON CARNEIRO DA SILVA. UM MERGULHO NAS ÁGUAS DO VELHO CHICO: TERRITORIALIZAÇÃO, DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO DOS PESCADORES ARTESANAIS DE SARAMÉM, BREJO GRANDE-SE. Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe.. ORIENTADOR: Prof. Dr. CRISTIANO WELLINGTON NORBERTO RAMALHO. SÃO CRISTÓVÃO-SE 2014.

(3) FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. S586m. Silva, Edilson Carneiro da Um mergulho nas águas do Velho Chico : territorialização, desterritorialização e reterritorialização dos pescadores artesanais de Saramém, Brejo Grande-SE / Edilson Carneiro da Silva ; orientador Cristiano Wellington Norberto Ramalho – São Cristóvão, 2014. 146 f. : il. Dissertação (mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Universidade Federal de Sergipe, 2014. 1. Meio ambiente. 2. Territorialidade humana. 3. Pescadores. 4. Desterritorialização. 5. Reterritorialização. 6. Etnoconhecimento. 7. Cabeço (Brejo Grande, SE). I. Ramalho, Cristiano Wellington Norberto, orient. II. Título. CDU 502/504:39.

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(6) Dedico este trabalho aos meus pais Luís Matias e Rita Belarmina e à memória de minha avó Francisca..

(7) AGRADECIMENTOS. Oito anos se passaram e muitos caminhos foram percorridos ao longo dessa trajetória acadêmica. Comemoro hoje esta vitória agradecendo a todos que contribuíram para a realização desse grande sonho. Agradeço primeiramente a Deus, o meu mestre maior, que me ensina sempre a nunca desistir dos sonhos, mesmo que encontre pedras pelo caminho. Obrigado grande Mestre! Sem Ti eu não seria nada! Agradeço em especial ao meu pai Luiz Matias e à minha mãe Rita Belarmina, que, com uma frase “O que temes? Segue teu sonho, meu filho”, me fez chegar até aqui, com a conquista de mais uma vitória em minha vida. Como também à mãe Maria de Fátima, que me deu pais maravilhosos para me educarem. Faço aqui meu agradecimento muito especial ao Programa em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe – PRODEMA e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pelo apoio financeiro e humano e também ao meu Mestre e orientador, professor e amigo, Cristiano Ramalho, por ter depositado em mim a confiança de que poderíamos juntos construir parte dessa história. Como também agradeço a todos os pescadores e pescadoras da comunidade do novo conjunto habitacional de Saramém, por terem me acolhido e contribuído significativamente para a conclusão desse estudo. Agradeço a todos os professores do PRODEMA – UFS, em especial à professora Maria José Nascimento Soares e à professora Rosemeri Melo e Souza, por depositarem em mim um voto de confiança, meu muitíssimo obrigado. Quero agradecer também à minha irmã Elizabete Regina por ter me incentivado desde sempre, à minha irmã Maria Elena, e ao meu irmão José Luís, pelo apoio nos momentos que mais precisei. E também a todos os meus familiares, em especial aos meus primos e tia: Eduardo, Gerlane, tia Regina, Paulo e Cristiano. Faço aqui também um agradecimento todo especial aos meus amigos Adriano Sotero e Rosa Saraiva, irmãos de lutas e vitórias, por acreditarem em mim, por apostarem que eu poderia chegar onde estou chegando. À minha namorada, amiga, companheira que me apoiou desde o princípio dessa luta, Luzia Gomes, e ao meu amigo Felipe e sua esposa Márcia..

(8) Agradeço ao meu amigo Heraldo Santos que dividiu comigo os momentos mais delicados desse trabalho, contribuindo assim para a qualidade e finalização do mesmo. Meu muitíssimo obrigado. Aos meus amigos Rosevaldo, Cícero e Rose Mere que sempre me incentivavam e me apoiaram nessa luta. Agradeço aos meus mestres dos saberes tradicionais, pescadores e pescadoras do Porto de Jatobá, Abreu e Lima Pernambuco, com quem aprendi tanto, Ao pescador Manuel Vicente e sua esposa Luzia e todas as pescadoras com as quais passei cinco anos trabalhando. Meu agradecimento muito especial a Conceição e seu esposo Raimundo por terem me acolhido em sua casa. A Ailton Gomes (Ronaldinho) e sua esposa, ao pescador Juarez e sua esposa Milza e ao pescador Genauro e sua esposa Nalva, por terem me acolhido em suas casas. Agradeço também aos meus educadores do período de graduação, professora Ana Emília, professora Ana Fontes, professor Luís De La Mora, professora Kátia Ramos, Vanice Selva e professora Aldemir, pessoas estas que me ajudaram a trilhar esse caminho. E, por fim, agradeço a todos os meus amigos e amigas do pré-vestibular Sandra e Neto; do Programa Conexões de Saberes, Sandro, Renato, Suse, Diana, Fabiana e Socorro. Aos amigos da graduação Evinha, Juliana e Carlos André. Aos meus amigos do Mestrado Francisco, Ricardo, Edson, Luane, Sandra, Cleidivan, Sandro e Andreia Vaz. A todos vocês o meu muito obrigado!.

(9) Deste rio, as nossas vidas sustentamos, nosso amor, Bom Jesus dos Navegantes, vinde e vamos navegar. De proa, mares e ao rio, banhado ao sol desta foz. Ordena, Senhor, a saída, na barca já nos encontramos. É a vida de nós pescadores; Senhor, vem conosco ficar. Nós descendemos do Cabeço e o Saramém, a Resina, as Capivaras e a nossa ilha criminosa. Marco histórico, nossos pais, nossas vidas, primitivos índios Tingas, destas terras e destes lagos. Bonitas praias, lindos mares, lindo rio, luminoso rio das pratas, dos piras do São Francisco.. (Hino de louvor da comunidade de Saramém José Erival Ferreira).

(10) RESUMO. Em decorrência de intensas mudanças socioambientais ocorridas nas últimas décadas, os territórios da pesca artesanal (mares, rios, estuários, lagos, lagoas, etc.) vêm sofrendo profundas transformações (poluição, diminuição dos estoques de pescados, perda da biodiversidade, turismo predatório, grandes obras públicas, erosão costeira), o que afeta diretamente o modo de vida de muitas comunidades de pescadores(as) no país. Algumas dessas transformações socioambientais têm levado diversos homens e mulheres, que vivem diretamente da pesca, a abandonar, com seus familiares, seus tradicionais lugares de trabalho e morada. O presente estudo possui como objetivo compreender os processos socioculturais e econômicos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização (TDR) vividos pelos pescadores artesanais de Saramém, Brejo Grande-Sergipe, particularmente quando estes foram obrigados, devido ao avanço do mar, a ir morar nesta localidade, advindos do Povoado do Cabeço. Saramém localiza-se na margem da foz do Rio São Francisco, assim como era o Cabeço. Em busca da compreensão desses processos, a metodologia utilizada foi a etnografia, que se construiu com base na observação direta e participante, em entrevistas semiestruturadas sobre a história de vida dos pescadores artesanais, registros fotográficos e uso de um diário de campo. Nesse sentido, o etnoconhecimento dos pescadores também foi valorizado. A pesquisa durou de setembro de 2012 a junho de 2013, foram entrevistados trinta pescadores. Como resultado, obteve-se a compreensão de que os processos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização provocaram danos materiais e imateriais, a exemplo das perdas dos lugares tradicionais de pesca, alterações nos espaços de uso comum (territórios de pesca), enquanto fruto de impactos negativos sobre os recursos naturais que se deram na foz do Rio São Francisco. Ademais, relações de vizinhança foram alteradas e elos simbólicos com o território perdidos e (re)significados. Quanto à relevância científica e social da pesquisa, entende-se que a mesma é duplamente importante, seja para as políticas públicas (compreensão dos impactos ambientais a partir do modo de vida dos pescadores), seja para os estudos acadêmicos, especialmente para as noções de espaços culturalmente definidos pelas territorialidades dos pescadores artesanais. Por isso, a importância do etnoconhecimento enquanto abordagem desta dissertação.. Palavras-Chave: Desterritorialização e reterritorialização. Território. Etnoconhecimento pesqueiro e territorialidades. Povoado do Cabeço..

(11) ABSTRACT. Due to intense environmental changes in recent decades, the territories of artisanal fishing (seas, rivers, estuaries, lakes, ponds) have suffered deep changes (pollution, reduction of fish stock, loss of biodiversity, predatory tourism, large public works, coastal erosion), which directly affects the lives of many communities of fishers. Some of these environmental changes have led those who depend on fishing for susbsistence to leave, with their families, their traditional places of work and residence. The general objective of this study is to understand the socio-cultural and economic processes of territorialization, deterritorialization and reterritorialization (TDR) experienced by artisanal fishermen,particularly when they were forced to leave their hometown, Cabeço thorp , due to the coastal erosion, in order to live in Saramém, in Brejo Grande, Sergipe. Saramém is located on the shore of the mouth of São Francisco river, as so was Cabeço. In order to understand these processes, the methodology used was the ethnography, which was built based on direct and participant observation, semistructured interviews about the life history of artisanal fishermen, photographic records and the use of a diary. In this sense, the ethnoknowledge of the fishermen was taken into consideration. The survey lasted from September 2012 to June 2013, and about 30 fishermen were interviewed. As a result, we obtained an understanding that the processes of territorialization, deterritorialization and reterritorialization caused material and immaterial damage, like the loss of traditional fishing places and changes in the spaces of common use (fishing territories. Moreover, neighborhood relations were changed and symbolic links with the territory were lost and (re)signified. As for the scientific and social relevance of the research, it is doubly important, both for public policies (to the understanding of the environmental impacts from the fishermen way of living), and for academic studies, especially for the notions of culturally defined spaces by the artisanal fishermen territoriality. Therefore, the importance of the ethnoknowledge as the approach of this dissertation. Keywords: Deterritorialization and Reterritorialization. Territory. Fishing Ethnoknowledge and Territoriality. Cabeço thorp..

(12) LISTA DE FIGURAS. FIGURA 1 - Localização da Bacia do Rio São Francisco. .................................................... 19 FIGURA 2 - Localização da cidade de Brejo Grande no Estado de Sergipe, Foz do Rio São Francisco. .......................................................................................................... 20 FIGURA 3 - Localização do Povoado Saramém na cidade de Brejo Grande no Estado de Sergipe, Foz do Rio São Francisco. .................................................................. 20 FIGURA 4 - Esquema utilizado pelo pesquisador para o tratamento das entrevistas coletadas. ........................................................................................................... 31 FIGURA 5 - Imagem da ilha do Cabeço e do povoado do Cabeço. ...................................... 48 FIGURA 6 - Desenho cognitivo do antigo povoado do Cabeço. ........................................... 50 FIGURA 7 - Povoado do Cabeço em 1989, detalhe da rua principal e do Farol. .................. 51 FIGURA 8 – Barcos transportando aproximadamente 10 pessoas em direção à Ilha do Cabeço............................................................................................................... 58 FIGURA 9 - Água do poço. A) destaque da água no poço. B) Moradores instalando bomba d‟água. ............................................................................................................... 59 FIGURA 10 - O farol localizado na ilha do Cabeço. ............................................................... 60 FIGURA 11 - Plantações de coqueiros da Ilha do Cabeço. ..................................................... 62 FIGURA 12 - Pescadores em parte da orla da Ilha do Cabeço exercendo a pesca de lambuda. ........................................................................................................................... 68 FIGURA 13 - Registro do processo de erosão da ilha afetando o Povoado do Cabeço. ......... 76 FIGURA 14 - Diversas casas destruídas, outras próximas fechadas e outras mais distantes............................................................................................................. 77 FIGURA 15 - Igreja do Povoado do Cabeço. .......................................................................... 77 FIGURA 16 - Área da ilha do atual Cabeço chamada de Antigo Iraque, onde moram alguns pescadores. ........................................................................................................ 79 FIGURA 17 - O farol sobre as águas da foz do rio São Francisco e do oceano. ..................... 81 FIGURA 18 - O farol, a nova croa (seta amarela) que surgiu depois que o Cabeço foi destruído e o novo Cabeço (seta vermelha). ..................................................... 82 FIGURA 19 - Imagem de satélite da área estudada. ................................................................ 84.

(13) FIGURA 20 - Antigo Povoado do Cabeço e o novo conjunto habitacional de Saramém. ...... 87 FIGURA 21 - Saramém, os postes de iluminação e a caixa de abastecimento de água da DESO. ............................................................................................................... 88 FIGURA 22 - Bar do Coqueiro. ............................................................................................... 90 FIGURA 23 - Configuração da comunidade do NCHS, quanto aos grupos residenciais e localização de alguns prédios importantes no povoado. ................................... 92 FIGURA 24 - Estrada principal de Saramém. ......................................................................... 94 FIGURA 25 - Pescador tecendo rede na área pertencente à NORCON. ................................. 94 FIGURA 26 - Pescadores puxando a rede de marinho, sobre parte da croa que aumentou. ... 98 FIGURA 27 - O farol sobre a ilha de areia. ............................................................................. 98 FIGURA 28 - Reportagem com pescador sobre os problemas das barragens na foz do rio São Francisco. .......................................................................................................... 99 FIGURA 29 - Notícia jornalística sobre a introdução de peixes exóticos (não nativos da região) sobre os perímetros irrigados do rio São Francisco. ........................... 102 FIGURA 30 - Pescador transportando o motor rabeta para a foz do rio................................ 103 FIGURA 31 - Carro de mão utilizado para transportar o motor e os apetrechos dos pescadores. ...................................................................................................... 104 FIGURA 32 - Estaleiro de mestre Gilson no NCHS.............................................................. 104 FIGURA 33 - Casas construídas na margem do rio, lado direito. ......................................... 105 FIGURA 34 - Barco de pescador, usado para turismo........................................................... 106 FIGURA 35 - O arrais arrastando uma rede de marinho. ...................................................... 107 FIGURA 36 - O pescador tratando um tímbiro. .................................................................... 108 FIGURA 37 - Instrumento artesanal usado para segurar a rede de pesca. ............................. 109 FIGURA 38 - Pesca de xaréu, realizada pelo marinho do arrais. .......................................... 110 FIGURA 39 - Pescadores transportando os peixes de um lado da ilha para o outro. ............ 111 FIGURA 40 - Canoa carregada de peixes. ............................................................................. 111 FIGURA 41 - Local de pesca dos grupos de marinho de Saramém. ..................................... 113 FIGURA 42 - O marinho da vez, no local já escolhido pelo arrais. ...................................... 114 FIGURA 43 - O marinho do Zeca sendo puxado do mar. ..................................................... 115.

(14) FIGURA 44 - Pescadores segurando o copo da rede de marinho. ......................................... 116 FIGURA 45 - Pescadores colocando a rede de marinho para dentro do barco...................... 117 FIGURA 46 - Pescadores de marinho, cujas funções é de saltadores. .................................. 118 FIGURA 47 - Porto de Japonã, lado direito da foz do rio São Francisco. ............................. 120 FIGURA 48 - Chegada de pescadores de xaréu ao porto de Japonã. .................................... 121 FIGURA 49 - Pesca de marinho e captura de camurupim, xaréu, serra e tainha. .................. 127 FIGURA 50 - Pescadores fazendo a limpeza em um camurupim. ........................................ 127 FIGURA 51 - Peixes dentro de um isopor com gelo no porto Japonã. .................................. 131.

(15) LISTA DE QUADROS. QUADRO 1 - OBJETIVOS DAS VISITAS DE CAMPO (2012-2013). ................................ 28 QUADRO 2 - TIPOS DE PESCARIAS EXISTENTES NA ILHA DO CABEÇO. ............... 72 QUADRO 3 - MUNICÍPIOS ATINGIDOS PELO RESERVATÓRIO DA BARRAGEM DE XINGÓ/SE, ÁREA TOTAL POR MUNICÍPIO E ÁREA AFETADA. .......... 75 QUADRO 4 - PRINCIPAIS PEIXES CAPTURADOS, VALOR, CUIDADOS ESPECÍFICOS E ACIDENTES QUE PODEM OCASIONAR. .................... 129 QUADRO 5 - PESCA EMBARCADA NO SARAMÉM, COM OS PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE PESCA, TÉCNICAS UTILIZADAS, ESPÉCIES CAPTURADAS, PERÍODO DO ANO EM QUE SÃO UTILIZADAS, LOCAIS ONDE SÃO PESCADAS E A QUANTIDADE DE PESCADORES NECESSÁRIOS. ............................................................................................. 132.

(16) LISTA DE SIGLAS. AL. Alagoas. ANA. Agência Nacional de Água. BA. Bahia. BR-101. Rodovia Federal Brasileira nº 101. CEPED. Centro de Pesquisa e Desastre. CHESF. Companhia Hidroelétrica do São Francisco. CODEVASF. Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco e do Parnaíba. DESO. Companhia de Saneamento de Sergipe. DF. Distrito Federal. GEF. Fundo Global para o Meio Ambiente. IBAMA. Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis. NCHS. Novo Conjunto Habitacional Saramém. NORCON. Sociedade Nordestina de Construções S/A. OEA. Organização dos Estados Americanos. PE. Pernambuco. PNUMA. Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. SE. Sergipe. SE–100. Rodovia Estadual Sergipana nº 100. TDR. Territorialização, desterritorialização e reterritorialização. UFRPE. Universidade Federal Rural de Pernambuco. UFS. Universidade Federal de Sergipe. WWF-BRASIL. Fundo Mundial para a Natureza. Z-16. Colônia de Pescadores de Brejo Grande.

(17) SUMÁRIO. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 16 Questões de Pesquisa e Objeto de Estudo .............................................................. 16 Método e Metodologia .............................................................................................. 21 Caracterização do Estudo de Campo ..................................................................... 24 Tamanho da amostra ............................................................................................... 29 Análise dos resultados .............................................................................................. 30 - CAPÍTULO I – ..................................................................................................................... 33 1. O ESPAÇO TERRESTRE: PALCO DE TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES ........................................................................................ 33. 1.1. Alguns Elementos Conceituais ................................................................................ 33. 1.2. Territorialização, desterritorialização e reterritorialização ................................ 39. 1.3. Foz do rio São Francisco: o processo de territorialização e desterritorialização 42. 1.4. Territorialidade dos pescadores artesanais na foz do rio São Francisco ............ 45. - CAPÍTULO II - .................................................................................................................... 48 2. TERRITORIALIZAÇÃO DA ILHA DO CABEÇO: UM RESGATE DA MEMÓRIA ............................................................................................................... 48. 2.1. O Cabeço ................................................................................................................... 48. 2.2. “Lançando a rede na água” resgata-se o passado do Cabeço e a Territorialidade Pesqueira ................................................................................................................... 51. 2.3. As questões socioambientais e de infraestrutura da ilha ...................................... 57. 2.4. O Farol e os Coqueiros ............................................................................................. 59. 2.5. A pesca e os pescadores artesanais no Cabeço: Conhecimento consuetudinário, direitos e a pesca de lambudas ................................................................................ 64. - CAPÍTULO III – .................................................................................................................. 73 3. UM MEGULHO NAS ÁGUAS DA FOZ DO VELHO CHICO: DESTERRITORIALIZAÇÃO DO POVOADO DO CABEÇO .......................... 73. 3.1. Desterritorialização ocasionada pela Barragem de Xingó ................................... 74.

(18) 3.2. O êxodo e a diáspora após a destruição do Cabeço: os exilados da Usina Xingó e o Farol ........................................................................................................................ 78. 3.3. Desterritorialização: perdas materiais e simbólicas.............................................. 82. 3.4. Reterritorialização: o novo lugar e as novas territorialidades dos pescadores artesanais do NCHS ................................................................................................. 86. 3.5. O novo lugar: facilitador do fluxo interno e externo de pessoas .......................... 92. 3.6. Reterritorialização: como um processo positivo e negativo ................................. 95. - CAPÍTULO IV – .................................................................................................................. 97 4. A DIALÉTICA DA DESTERRITORIALIZAÇÃO E RETERRITORIALIZAÇÃO: SOCIABILIDADE DO RIO PELOS PESCADORES ......................................................................................................... 97. 4.1. Problemas socioeconômicos e ambientais no rio São Francisco .......................... 99. 4.2. O novo conjunto hhabitacional de Saramém (NCHS) e a distância para os locais de pesca .................................................................................................................... 103. 4.3. Pesca artesanal e etnoconhecimento dos pescadores........................................... 107. 4.4. O caminho trilhado pelos pescadores de marinho .............................................. 119. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................. 136 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 139.

(19) 16 INTRODUÇÃO. Questões de Pesquisa e Objeto de Estudo. O espaço geográfico do planeta Terra sempre esteve em transformação. Desde a sua própria origem ocorrem constantes mudanças climáticas e geo-físico-morfológicas, que alteram o ambiente. A espécie humana tem modificado essa dinâmica natural, a partir do emprego das tecnologias desenvolvidas e utilizadas em nome do progresso. Essas intervenções têm se intensificado no decorrer do tempo e ocasionado danos ambientais que se voltam contra a própria humanidade. Esses danos ambientais tendem a se concentrar também nos corpos hídricos, pois, em função da dependência que a vida tem da água, é no entorno destes que as civilizações costumeiramente se estabelecem e/ou exploram os seus recursos. A crescente necessidade por fontes de água para abastecimento da população, produção de energia, irrigação da agricultura, abastecimento de processos industriais, exploração imobiliária das margens, entre outras, são as principais causas que intensificam a degradação ambiental das bacias hidrográficas. Em decorrência dessas intensas mudanças socioambientais ocorridas nas últimas décadas, os territórios da pesca artesanal (mar, rios, estuários, lagos, lagoas, etc.) vêm sofrendo profundas transformações (poluição, diminuição dos estoques de pescados, perda da biodiversidade, turismo predatório, grandes obras públicas, avanço do mar), o que afeta diretamente o modo de vida de muitas comunidades de pescadores (as) no país. Algumas dessas transformações socioambientais na região do Baixo Rio São Francisco, advindas da Usina de Xingó têm levado diversos homens e mulheres, que vivem diretamente da pesca, a abandonar, com seus familiares, seus tradicionais lugares de trabalho e morada e construírem novas territorialidades. Esse rio vem sofrendo transformações no seu ambiente natural, a partir das construções de barragens para a produção energética, como a barragem de Sobradinho/BA, Paulo Afonso/BA, Xingó/SE e outras. Os resultados desses empreendimentos não só provocaram a destruição de alguns ecossistemas, mas também de diversos povoados.

(20) 17 ribeirinhos que viviam (e vivem) historicamente próximos aos locais de implantação desses projetos, provocando a relocação de diversas comunidades, povos ou grupos de pessoas. Uma das comunidades diretamente afetadas por barragens foi o Povoado do Cabeço. Constituído basicamente por pescadores artesanais, esse povoado estava localizado em uma parte da Ilha do Cabeço e teve sua continuidade sociocultural negada neste lugar, ao mesmo tempo em que parte da ilha foi destruída pelo mar, gerando o deslocamento dos pescadores para outros locais e em definitivo para o novo conjunto habitacional de Saramém, em Brejo Grande-SE. De fato, esta comunidade, que já havia consolidado seus territórios (identitário) naquela localidade, foi forçada a se desterritorializar e se reterritorializar, enquanto resistências de territorialização de fazer-se e refazer-se constantemente para continuar a existir, a reproduzir-se socialmente, pois a territorialização é a construção de práticas socioespaciais, por determinados grupos ou pessoas, a construção de um território identitário, de um lugar de vida entre outros. A desterritorialização pode significar saída ou perdas de identidades, de pertencimento que se tem a algum lugar ou perdas de territorialidades. A reterritorialização pode ser compreendida como a relocação, entrada em um novo lugar, aceitação ou negação de novas territorialidades. Tal acontecimento foi o ponto de partida que motivou as seguintes questões: Quais os motivos que levaram a territorialização e as desterritorialização da Ilha do Cabeço? Os processos de desterritorialização e reterritorialização causam danos positivos e/ou negativos na vida dos pescadores ativos e aposentados que estão atuando na pesca? Quais as territorialidades desenvolvidas em terra e na pesca artesanal na nova comunidade de Saramém pelos pescadores artesanais? Os processos de desterritorialização e reterritorialização alteram as territorialidades e o etnoconhecimento dos pescadores artesanais? 1 A busca pela resposta a essas questões foi relevante ao propiciar o resgate e o registro memorável de histórias de vidas de atores de uma comunidade hoje extinta em determinado lugar (no Cabeço) e que vivia em um espaço de uso comunal, o que nos permitiu compreender este passado cultural, social, econômico e religioso e descrever as consequentes modificações ocorridas no modo de vida e em sua reprodução social, com destaque ao etnoconhecimento da pesca artesanal da região. Os conhecimentos socioambientais são úteis como vetores para a 1. Foi feita uma opção teórico-metodológica nesta pesquisa, ou seja, não utilizaremos hipóteses e sim perguntas, pois esta é uma pesquisa de cunho qualitativo, guiada pelo trabalho de campo num fazer-se constante. Ademais, a hipótese é um instrumento de análise de forte matriz positivista, que soa como uma lei, algo que não compartilhamos..

(21) 18 elaboração de políticas públicas voltadas para comunidades ribeirinhas que correm riscos de serem afetadas por situações da mesma ordem. Assim, a relevância científica e social da pesquisa é duplamente importante, seja para as políticas públicas (a compreensão das mudanças socioculturais a partir do modo de vida dos pescadores), seja para os estudos acadêmicos, especialmente para as noções de espaços culturalmente definidos pelas territorialidades dos pescadores artesanais. Dessa forma, esta pesquisa teve como objetivo geral: compreender os processos socioculturais e econômicos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização (TDR) vividos pelos pescadores artesanais de Saramém, Brejo Grande-Sergipe, particularmente quando estes foram obrigados, devido ao avanço do mar, a ir morar nesta localidade, advindos do Povoado do Cabeço; e como objetivos específicos: I – Analisar, a partir das histórias orais de vida, o processo de territorialização dos pescadores do Cabeço II – Identificar as causas da desterritorialização e as possíveis mudanças socioespaciais na vida dos pescadores. III – Discutir a reterritorialização do etnoconhecimento e as novas territorialidades dos pescadores residentes no novo conjunto habitacional de Saramém. A área delimitada para esse estudo é o novo conjunto habitacional de Saramém (NCHS), situado no município de Brejo Grande-Sergipe e que faz divisa com o estado de Alagoas. Vale destacar que a Bacia do Rio São Francisco (Figura 1) é subdividida politicamente em quatro áreas: o Alto, que abrange o trecho que vai da nascente até a cidade de Pirapora, no estado de Minas Gerais; o Médio, que vai de Pirapora até a cidade de Remanso, no estado da Bahia; o Sub-Médio que se estende de Remanso até Paulo Afonso/BA, e o Baixo São Francisco que vai de Paulo Afonso até sua foz no Oceano Atlântico, que ocorre entre os estados de Sergipe e Alagoas (CODEVASF, 2002). Entre os diversos municípios que estão politicamente situados na Região do Baixo São Francisco, tomou-se como recorte espacial o município de Brejo Grande-SE (Figura 2), em especial o povoado de Saramém (Figura 3), situado na margem direita do rio, cuja localização é fronteiriça com o município de Piaçabuçu, localizado na margem esquerda do rio no estado de Alagoas. O município, com relação à capital Aracaju, situa-se a uma distância de 137 km, com uma área aproximada de 149 km². O município de Brejo Grande, no passado, também foi uma ilha, mas diferentemente da ilha do Cabeço, ele está localizado na ponta extrema norte e direita do estado de Sergipe, povoado pelos Índios Tupinambás, que viviam na Ilha de Paraúna, doada a Antônio Cristóvão.

(22) 19 de Barros em 1570. Depois de algum tempo, fizeram ligação dessa ilha com o continente, onde se passou à monocultura da cana-de-açúcar. Logo depois a principal atividade econômica tornou-se o arroz, pois a região é bastante rica em terras inundáveis, propícias a esse tipo de cultivo. Após alguns anos, o coco, a pesca e o petróleo tornaram-se fontes econômicas para o município (CHESF, 2011).. FIGURA 1 - Localização da Bacia do Rio São Francisco. Fonte: Projeto ANA/GEF/PNUMA/OEA, p. 2, 2003..

(23) 20. FIGURA 2 - Localização da cidade de Brejo Grande no Estado de Sergipe, Foz do Rio São Francisco. Fonte: Adaptado de Atlas de Recursos Hídricos da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado de Sergipe (SEMARH/2012).. FIGURA 3 - Localização do Povoado Saramém na cidade de Brejo Grande no Estado de Sergipe, Foz do Rio São Francisco. Fonte: Adaptado de Atlas de Recursos Hídricos da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado de Sergipe (SEMARH/2012)..

(24) 21 Atualmente grande parte dos seus povoados desenvolve, como uma das atividades econômicas, a pesca artesanal. O município se destaca no estado de Sergipe, junto com outros municípios, na produção de pescados, peixes e crustáceos, de acordo com a Estatística Pesqueira da Costa do Estado de Sergipe e Extremo Norte da Bahia, 2010 (SOUZA et al., 2012). O NCHS é uma comunidade que se formou com a junção de comunidades pesqueiras e não pesqueiras, como as comunidades de pescadores do antigo Saramém, de Resina e do Povoado do antigo Cabeço, além de uma pequena parcela de moradores não pescadores que vieram de outras regiões como Piaçabuçu, no estado de Alagoas e de Brejão e Brejo GrandeSergipe, entre outros (ALBUQUERQUE, 2013). Método e Metodologia. Para dar conta do objeto de estudo e das questões formuladas, a pesquisa qualitativa mostrou ser o caminho mais indicado, especialmente por ter nos pescadores, em suas representações e práticas diárias o foco central de informações deste estudo. Por isso, esse estudo teve como base a etnografia, pois um dos seus principais pressupostos é o reconhecimento do outro, através da valorização de suas práticas cotidianas (objetivas e subjetivas), sua vivência de trabalho e lazer, suas práticas sociais (individuais, familiares e coletivas), seus costumes. Neste sentido, torna-se necessária a vivência com o grupo para uma apreensão mais adequada dos processos sociais por parte do pesquisador (OLIVEIRA, 2006). No caso, a “pesquisa etnográfica permite uma guinada de pontos de vistas que conseguem fazer com que o pesquisador veja de outra forma coisas nas quais nos esbarramos todos os dias sem as „ver‟ de verdade” (STÉPHANE; WEBER, 2007, p. 11). Dessa forma, entende-se que não se pode „ver‟ no sentido mais amplo do que só olhar, como sentir, perceber, ouvir e conviver com outras pessoas se o pesquisador não estiver no campo com as pessoas e juntos a elas, observando e sendo observado, conhecendo e deixando-se conhecer, aceitando ou negando o outro. Nesse caso, compreende-se que um curso, uma disciplina específica ou um guia não pode substituir a prática em campo (OLIVEIRA; Idem; STÉPHANE; WEBER, Idem). Assim, considera-se que o pesquisador etnógrafo, embora desenvolva uma ação de aproximação com o sujeito/objeto da pesquisa, precisa ter atenção a isso, visto que é necessário tomar distanciamento, afastar-se para melhor observar e perceber os fatos que o.

(25) 22 cercam. Busca-se evitar o mero empirismo, como se os dados, o campo falassem por si só. Esse afastamento não é do pesquisador para com a comunidade, mas para com ele mesmo e por meio de uma leitura crítica sobre seu saber-fazer científico e a realidade encontrada. Dessa forma, a posse de uma bagagem teórica não é suficiente para conduzir uma pesquisa etnográfica, embora ela seja imprescindível, pois os obstáculos presentes no campo que são sociais e mentais (psicológicos), além da própria dinâmica do real, colocam questionamentos constantes aos conceitos e teorias. Por isso, o campo informa e refaz aspectos teóricos e conceituais, assim como é tecido por eles; (STÉPHANE; WEBER, 2007). Ainda, segundo os autores: O etnógrafo reserva-se ao direito de duvidar a priori das explicações já prontas da ordem social. Preocupa-se sempre com ir ver mais de perto a realidade social, livre para ir de encontro às visões oficiais, a opor-se às forças que impõem o respeito e o silêncio, àquelas que monopolizam o olhar sobre o mundo (STÉPHANE; WEBER, 2007, p. 11).. Somando-se à etnografia, foram utilizadas como procedimentos a história oral, a observação direta e a pesquisa participante. Os entrevistados foram classificados em duas categorias: os informantes, cuja participação foram ativas, e os participantes, cuja participação foi passivas, ou seja, no primeiro caso (os entrevistados informantes) realizou-se entrevistas e criou-se laços de confiança, que proporcionou ao pesquisador participação em momentos de pescarias vivência no cotidiano e aproximação com outros parentes dos pescadores, já com os participantes, só. contribuíram para as. entrevistas. (MEIHY; HOLANDA, 2007;. ALBUQUERQUE; LUCENA; CUNHA, 2010). Vale considerar que a relação do pesquisador com os informantes e participantes extrapolou o interesse de extrair informações para a construção de uma dissertação, pois se construíram relações de sentimentos vividos e percebidos entre o pesquisador com os moradores do NCHS e com o próprio lugar em si, fatores esses que fazem parte da pesquisa qualitativa. Nesse aspecto, cabe lembrar as considerações de Angrosino (2009, p. 46) ao dizer que a observação participante requer que o pesquisador esteja interagindo diariamente com as pessoas em estudo. Nesta pesquisa acompanhei pescarias, vivi sentimentos, como alegrias e lágrimas em algumas histórias. Às vezes, senti algum desconforto como também angústia e dificuldade de aproximação. Destaco também o acolhimento por parte dos pescadores e suas respectivas esposas como Juarez (Lêla) e Milza, José Ailton (Ronaldinho) e sua esposa Maura dos Santos,.

(26) 23 o que me remeteu a uma definição sintética feita pelo meu orientador (Cristiano Ramalho) sobre isso: “você não escolheu a comunidade, você foi escolhido por ela”. Foi essa a sensação que senti durante a vivência em campo. A vivência em campo, anunciada também pelas histórias de vida dos pescadores, nos possibilitou compreender que: “As narrativas sobre o passado via rememoração não implica apenas na tentativa de restauração do passado, mas alavanca também uma transformação do presente de tal forma que, se o passado aí for reencontrado, ele não fique o mesmo, mas seja também ele retomado e transformado” (DIEHL, 2002, p. 101). Assim, entendeu-se que, no estudo etnográfico, „sua cientificidade‟ não é nem mais nem menos fundamentada do que em outros modos de pesquisas de cunho quantitativo, pois seus dados permitem reflexões e críticas. Dessa forma, para a elaboração desse estudo, fortaleceu-se o princípio de que a pesquisa etnográfica e a história oral não se opõem, mas se complementam ricamente, dialogando para o desvendamento de fatos passados e na compreensão e transformação de um presente vivido (MEIHY; HOLANDA, 2007; STÉPHANE; WEBER, 2007; BOSI, 2003). Sendo assim, pode-se dizer que a tradição oral, assim como o estudo etnográfico, foi um precioso instrumento na construção de micro-histórias do cotidiano da comunidade de pescadores do novo conjunto habitacional de Saramém. Foi possível compreender um passado inconcluso para os pescadores e um presente visível ligado a esse passado. Cabe, nesse caso, salientar que “parenta da etnografia a boa resolução da pesquisa em tradição oral implica minuciosa descrição do cotidiano e de suas inversões” (MEIHY; HOLANDA, 2007, p. 40). Assim, a observação constante e os registros do cotidiano em um diário de campo foram instrumentos indispensáveis também para esse estudo. Dessa forma, compreende-se que a história que se apoia unicamente em documentos oficiais, não pode dar conta das paixões individuais e coletivas que se escondem atrás de episódios vividos e retratados na memória dos pescadores que pertenciam ao povoado do Cabeço e foram relocados para o novo Saramém. Sendo assim, as histórias dessas pessoas podem ser trabalhadas como um mediador entre a geração atual e as testemunhas do passado. “Ela é o intermediário informal da cultura” (BOSI, 2003, p. 15). Foi a partir dessa compreensão que esse estudo se propôs a viajar – também - na máquina do tempo do passado dos pescadores, em busca de compreender os acontecimentos, alegrias, tristezas, perdas, saudades, entre outros, existentes na vida de pescadores artesanais.

(27) 24 do NCHS. Como também se procurou compreender quais os fatores históricos que levaram a esses acontecimentos e o que isso provocou na vida, nas práticas e costumes desses pescadores.. Caracterização do Estudo de Campo. A pesquisa no povoado de Saramém caracteriza-se como qualitativa, por conta das questões frisadas acima. Considerou-se também que a abordagem qualitativa permite grande diversidade nas análises dos dados (FLICK, 2009). Ela não prioriza contagem e medidas, mas incluiu em seu fazer qualquer forma de comunicação humana - escrita, auditiva ou audiovisual, comportamentos, simbolismos ou artefatos culturais. Assim, “o tipo mais comum de dado qualitativo usado em análise é o texto, que pode ser uma transcrição de entrevistas ou notas de campo de trabalho etnógrafo ou outros tipos de documentos” (GIBBS, 2009, p. 17). Algumas atividades desenvolvidas no passado pelo pesquisador foram fundamentais para que esta pesquisa fosse possível2. Antes de submeter o pré-projeto de pesquisa à banca examinadora de qualificação, tinha-se a proposta de estudar cinco comunidades com a seguinte temática: “Territorialidades de mar de dento e mar de fora nas comunidades de Brejo Grande, Brejão, Saramém, Carapitanga e Resina, no município de Brejo Grande-SE”. Mas com as primeiras visitas ao campo proposto para pesquisa, algumas dificuldades foram percebidas, como a distância entre os povoados variando entre 6 km a 7 km. Sendo assim, o pesquisador não teria tempo hábil para estudar todas essas comunidades. Além disso, a pretensão era fazer um estudo etnográfico com pescadores artesanais, algo inviável de ser vivenciado no período de um ano em todas essas comunidades. Assim, escolheu-se uma comunidade que atendesse ao seguinte critério: a maioria dos pescadores deveria exercer sua atividade embarcada na foz do rio São Francisco. Após a maturação do pré-projeto, trilhou-se o seguinte caminho:. 2. Educador Social do Programa Conexões de Saberes, trabalhando em comunidade pesqueira, como facilitador de incursão em comunidades pesqueiras, pelo Instituto Oceanário da Universidade Federal de Pernambuco; membro da equipe de coordenação do Projeto em Desenvolvimento Local e Sustentável na Comunidade de Pescadores de Jaguaribe – Jatobá – PE, pelo Centro de Pesquisa e Desastre – CEPED – UFRPE. Por fim, membro temporário da equipe de comunicação da Petrobrás– SE, que me proporcionou conhecer diversas comunidades pesqueiras do Estado, em especial as do município de Brejo Grande, onde se localiza a comunidade de Saramém..

(28) 25 Escolha do campo; seleção bibliografia; investimento pessoal, dedicação ao campo de pesquisa; chegada ao campo; construção de um diário de campo; vivência com a comunidade: passaram-se semanas; registros das ocorrências no campo: filmagem, fotografias e gravações de vozes, descrições das observações durante a vivência em campo; escolha de instrumentos: máquinas fotográficas, gravador de voz digital e diário de campo; organização dos dados coletados; e, para análise dos resultados, considerou-se o diário de campo, registros audiovisuais, entrevistas e observações durante o período de tempo vivenciado pelo pesquisador em campo.. É importante frisar que, nas primeiras visitas, não foram utilizados câmara fotográfica nem o gravador digital de voz. As pessoas e suas escolhas de como e quando queriam dar seus depoimentos foram respeitadas. Primeiro, criou-se uma aproximação em que o pesquisador e participantes pudessem se conhecer e se aproximar. Só após a vivência de 10 dias consecutivos e outras visitas feitas anteriormente, com a permanência de uma semana na comunidade, iniciaram-se as entrevistas. Foram solicitadas as permissões para fazer gravações e explicitados os motivos das entrevistas, assim como as intenções do trabalho. Os registros fotográficos e filmagem com as pessoas só foram possíveis após algumas aproximações entre o pesquisador e os informantes e participantes, quando já havia quatro meses de campo e diálogo com as pessoas3. Diante desse esboço: A pesquisa de campo supõe o emprego de um certo número de „qualidades pessoais‟ aquelas de que se precisa em qualquer relação social um pouco imprevista como por exemplo, a capacidade de entrar em relação com pessoas desconhecidas pertencentes a outros meios sociais que não o seu e de ganhar a confiança do pesquisador, de negociar um lugar no campo, de ficar lá, capaz, às vezes de „incomodar as pessoas‟ (STÉPHANE; WEBER, 2007, p. 22).. Primeiro realizou-se um trabalho de campo indireto, nas buscas e leituras bibliográficas voltadas ao tema de pesquisa e sobre o lugar pretendido por esse estudo, na qual foram consultados livros, publicações em artigos científicos, periódicos, documentos oficiais, meio eletrônicos e um registro audiovisual do Cabeço, realizado no ano de 1989. No primeiro momento, pensava-se que o vídeo sobre o antigo Cabeço fosse um produto de pesquisa de dois estudantes que estiveram na comunidade, mas depois ficou claro que foi produzido por Raimundo Vídeo Mania. Posteriormente, buscou-se fazer um trabalho de campo minucioso com observações diretas, que durou entre setembro de 2012 a junho de 2013, em Saramém, ocorrendo uma vez por mês, onde o pesquisador ficava dias ou semanas ininterruptamente, depois retornava para Aracaju, para dar continuidade ao trabalho escrito. Durante essas visitas, o pesquisador, por quatro vezes, acompanhou as pescarias de marinho (pescarias de arrasto em praia) e 3. Por questões éticas algumas entrevistas e anotações não forma feitas nem gravadas..

(29) 26 acompanhou uma vez a pescaria de cacear (pescaria onde o pescador deixa a rede num dia e vai buscar no outro). Três vezes foi pescar, com outro pescador com rede de taineira. Os peixes capturados eram para o próprio consumo. Porém, nos primeiros contatos realizados em 2012, não foi dada a preferência a quem deveria se conhecer, vivenciou-se o lugar e os moradores dos lugares. Isso proporcionou conhecer a dinâmica de cada comunidade: Brejo Grande, Brejão e Saramém, bem no início quando a pretensão era trabalhar com cinco comunidades. Para a escolha da comunidade, criou-se um critério que era ser uma comunidade de pescadores artesanais que trabalhassem embarcados. Sendo assim, Brejão estaria fora, porque grande parte dos pescadores trabalha com catação de caranguejo e criação de ostras. Quanto a Brejo Grande, mesmo tendo pescadores embarcados, uma parte considerável da população vive do terceiro setor (comércio, posto de saúde, barco, entre outros). No caso de Saramém, a grande maioria é pescador e vive da pesca (ALBUQUERQUE, 2013). Após a mudança do projeto e da comunidade, resolveu-se adotar como estratégia conhecer melhor a comunidade escolhida. Durante algumas entrevistas informais e sem gravações descobriu-se, a partir da vivência no campo, que a maioria dos moradores de Saramém tinha vindo de outro lugar, chamado Ilha do Cabeço, e que devido à destruição do povoado tiveram que migrar para esse novo local. Isso despertou um interesse de compreender o(s) motivo(s) da saída e o que isso ocasionou para as suas práticas e costumes. O mais importante é que essa descoberta não se deu por leituras de documentos, livros ou artigos, mas pela vivência empírica do pesquisador em campo. Foram dedicados os meses de dezembro de 2012, janeiro, fevereiro e março de 2013 para conhecer e me deixar ser conhecido pela comunidade. Criou-se a estratégia de morar na comunidade, conversar com pessoas na praça, no bar, na margem direita do rio, na ida e saída à missa da igreja católica, e a conversa com frequentadores da Assembleia de Deus. Sempre que amanhecia, procurava falar com as pessoas, também no horário da tarde e da noite. Nas quintas-feiras, nos sábados e domingos das semanas em que estive em campo, pela manhã, ia assistir ao futebol. Jogava bola com os moradores; frequentava o circo, ia sempre à área da NORCON4, local que alguns pescadores utilizam para tecer redes ou. 4. NORCON - Sociedade Nordestina de Construções S/A, é uma grande empreendedora da construção civil do estado de Sergipe. Diversas áreas de terras próximas à comunidade de Saramém pertencem a essa construtora, Visto que as áreas são cobertas por árvores, os pescadores da região utilizam-na para tecer redes ou para conversar..

(30) 27 conversar. Dialogava com os jovens, professores, entre outros. Todos esses vínculos de aproximação levaram o pesquisador a ser visto como se fosse alguém da comunidade, assim como possibilitou o desenvolvimento deste estudo. Para detalhamento foi construído o quadro 1, com as datas que foram realizadas as visitas de campo, apresentando os objetivos que se pretendia alcançar e os resultados alcançados (é claro que tudo isso foi sofrendo mudanças conforme os resultados que os trabalhos de campo informavam). Cabe destacar que as datas que estão na mesma célula significam que foram dias seguidos de permanência na comunidade de Saramém, já as datas que estão isoladas indicam que o pesquisador foi ao campo e retornou no mesmo dia. Faz-se necessária uma observação quanto às dificuldades de ir e voltar no mesmo dia para a comunidade, já que a mesma é distante 137 km da capital, Aracaju. A saída da UFS ocorria pela manhã, entre 8 e 8h30min, e chegava-se à comunidade entre 11 e 11h30min, pois havia bloqueios na rodovia BR-101, devido aos trechos em obras. Justamente no horário em que os pescadores estavam no mar ou no rio, ou estavam retornando das pescarias, geralmente cansados. Nesse caso, as visitas ficavam para o horário da tarde. Para não viajar no horário da noite, retornávamos entre 16h30min e 17 horas. Nesse caso, como estratégia da construção de um interconhecimento, optou-se em passar dias na comunidade, e isso exigiu custos com alimentação, gás, transporte, serviços domésticos e mudanças nos horários de dormir, devido à rotina da pesca. Tudo isso mostra que: Sem interconhecimento não há campo, não há pesquisa etnográfica. Está aí uma regra de ouro que não aceita nenhuma exceção. É a condição, do lado do meio pesquisado, para fazer funcionar a „dinâmica‟ da pesquisa, a transformação do pesquisador em aliado ou em inimigo potencial, a possibilidade de encadear as entrevistas e de observar as interações pessoais. (STÉPHANE; WEBER, 2007, p. 192-193)..

(31) 28 QUADRO 1 - OBJETIVOS DAS VISITAS DE CAMPO (2012-2013). Data. 19/10/12 23/10/12 26/11/12. 09/11/12. 19 e 20/12. 26/11/12. 06/07/12 17/12/12 21/01/13. Objetivos. Resultados Alcançados. Conhecer as lideranças das comunidades de Brejão, Saramém e Brejo Grande, iniciar contatos e diálogos informais com alguns pescadores. Observar a geografia local. Continuar do mês de outubro. Dar continuidade aos diálogos informais.. Conhecimento de lideranças de Brejão e de Saramém, conversas com pescadores na margem direita do rio São Francisco, no município de Brejo Grande e no povoado de Saramém. Feitas algumas observações sobre a geográfica dos lugares.. Apresentar a proposta para a representante da Colônia Z-16 e para os moradores de Saramém. Contatar moradores. Devido às obras na BR-101, houve atraso na viagem e dificuldade de contato com os moradores de Saramém. Deixar ser observado pelos moradores das comunidades de Saramém. Fazer observações e marcar algumas entrevistas. 25/01/13. Organizar a casa cedida, até a conclusão da pesquisa, pela presidente da Colônia Z-16.. 26/01/13. Entrevistar pescadores para conhecer melhor as histórias do povoado.. 27/01/13 Pretensões de retorno a Aracaju. 30/01/13 21/02/13. Continuar entrevistas. Continuar diálogos com os pescadores.. 07/03/13 19/03/13. Continuar entrevistas. Fazer entrevistas com os pescadores.. 30/04/2013. Ir ao Porto Japonã (na foz do rio), diálogo com os pescadores e com o atravessador. Continuar entrevistas.. Conhecimento da liderança da colônia Z-16, Conceição, também conhecida por Ceça. Passei o dia conversando com ela e alguns pescadores de Brejo Grande. Pela manhã, apresentou-se a proposta a Conceição, da Colônia Z – 16. No horário da tarde para os moradores de Saramém. Manteve-se diálogo com um morador de Saramém chamado Gomes. Realizou-se uma visita à prefeitura do município, onde se buscou informações sobre Saramém. Frequentou-se alguns locais como o circo, a igreja católica, o porto de Japonã e de Saramém. Realizaram-se diálogos com alguns pescadores mais jovens, adultos e idosos Realizaram-se algumas entrevistas e marcaram-se outras. Acompanhamento de pescaria com o pescador Justino e seu filho. Levou-se um dia para organizar a casa, porque estava abandonada há mais de 6 meses. Foram feitas as primeiras entrevistas com o senhor Santos, pescador de 60 anos. Conversou-se com Justino, pescador, e sua esposa, e também com seu Ramires e sua esposa, a parteira. Com seu Paulo, aposentado pela pesca. Conversou-se com um padre austríaco que celebrava missas na igreja que havia no Cabeço, e com um músico e historiador que fez um hino para o Povoado do Cabeço. Conversou-se com algumas mulheres esposas de pescadores. Diálogos com Sr. Ramires (aposentado de 78 anos), com o pescador Geraldo (pescador de 50 anos). Pescou-se com o pescador Gomes (39 anos), com rede de taineira. Saída 21 horas, retorno às 2 horas da madrugada. Realizaram-se três entrevistas. Entrevistou-se Zezo (aposentado, 72 anos), Simão (aposentado, 72 anos), Péricles (aposentado, 77 anos). No período entre abril e maio, nenhum pescador vai para o mar, pois ele fica muito agitado, segundo o pescador Justino.. Chovia bastante, choveu pela manhã e muitos pescadores assistiam ao jogo do Barcelona, da Espanha, contra o time dos Ir conhecer o que restou da ilha do Santos, do Brasil. 02/05/13 Cabeço. Diálogos com moradores do novo Cabeço, no que restou da Ilha do Cabeço. Passou-se um dia na ilha, da tarde de uma quinta para a sexta-feira pela manhã. Acompanhou-se a pescaria do arrai Geraldo, pescador, 50 anos. 03/05/13 Continuação das entrevistas. Realizou-se entrevistas com Justino e sua esposa. Conversou-se com ex-morador do Cabeço Sebastião (aposentado, 72 anos). 04/05/13 Acompanhar a pesca de marinho com Ida para a nova croa5, acompanhou-se a pescaria com o o arrai Zeca. pescador Zeca e mais cinco pescadores, jovens e adultos. Concluir as entrevistas e comunicar à Deu-se o encerramento às entrevistas e foi comunicado à 06/06/13 comunidade do afastamento para a comunidade que o pesquisador iria se afastar, mas que 09/06/13 realização do trabalho escrito retornaria. Fonte: SILVA, E. C. Elaborado a partir de dados desta pesquisa, 2014. 01/05/2013. 5. A nova croa surgiu no lugar onde ficava localizado o povoado do Cabeço. o termo Croa é uma denominação local que os pescadores atribuem a ilhas de areias que surgem na foz do rio São Francisco, ou em outros locais do rio..

(32) 29 Tamanho da amostra. Considerando a complexidade tanto de análise como de caracterização da amostragem para uma pesquisa com esse viés etnográfico e de história oral de vida (individual ou coletiva), o mais importante, além da pesquisa participante e da observação direta, são os relatos autobiográficos que afloram nas lembranças e imagens, um passado que parece está morto, mas se faz vivo na revelação (BOSI, 2003; FREITAS, 2006). Dessa forma, segundo Bosi (2003, p. 49) “a narrativa e oralidade, ambas se desenvolveram no tempo, falam no tempo, recuperando na própria voz o fluxo circular que a memória abre do presente para o passado e deste para o presente”. A pesquisa construiu alguns critérios para ajudar na escolha amostral dos informantes e participantes dessa pesquisa: I). II) III). Pescadores que tinham morado no antigo povoado do Cabeço e que foram transferidos para Saramém, com 30 anos ou mais. Isto é, pessoas que viveram todo o processo de territorialização, desterritorialização e reterritorialização; Apenas pescadores artesanais que trabalham embarcados no rio ou no mar, com idade igual ou superior a 39 anos e atendam o critério I; Pescadores que atuem na atividade da pesca artesanal na região da foz do rio São Francisco. As escolhas - por esses dois critérios - originaram-se pelos seguintes motivos: (a) levou-se em consideração que no novo conjunto habitacional de Saramém há pescadores do antigo povoado de Saramém, de Resina e de outros lugares; (b) a pesca artesanal ou pesca simples, pois de acordo com a literatura, quando embarcada, é uma atividade essencialmente desenvolvida por homens (MALDONADO, 1994), uma vez que comunidades de pescadores artesanais apresentam uma divisão de trabalho: os homens pescam e as mulheres muitas vezes são responsáveis pela limpeza, preparo do pescado, catação de marisco ou mesmo a comercialização do pescado (BEGOSSI, 2004)6. As entrevistas contemplaram trintas pessoas (entre informantes e participantes) de diversas faixas etárias, sendo que 12 dessas entrevistas foram realizadas com idosos e 18 com pescadores adultos. Essa escolha deu-se devido que os idosos não participavam da atividade da pesca, porque estavam aposentados e os adultos atuavam na atividade, no caso dos idosos 6. Na vivência em campo, algo, chamou a atenção que, na foz do rio São Francisco, existem casais que vão pescar juntos, muitas vezes levam os filhos. Segundo alguns pescadores no passado no Povoado do Cabeço levavam suas esposas para elas não ficarem sós. Não é algo tão comum dentro da comunidade de Saramém, mas há entre 4 a 5 casais que vão pescar juntos..

(33) 30 ajudou-nos a compreender o passado da pesca na Ilha do Cabeço e no caso dos pescadores adultos contribuíram à compreensão do presente na atividade da pesca na foz do rio São Francisco.. Análise dos resultados. Para análise dos resultados, foram utilizados o diário de campo, as anotações e as transcrições das entrevistas. Buscou-se assim descrever as entrevistas fazendo-as interagir com as anotações feitas no diário de campo e com documentos impressos. Sempre após algumas entrevistas o diário era relido e colocado pontos de vistas vivenciados no campo. Usou-se como pressuposto o discurso do sujeito coletivo, no qual se fez uso das narrativas de histórias de vidas dos participantes e informantes, buscando-se familiaridades das respostas. Posteriormente foi associada a temas específicos a compreensão de cada tópico, pois, geralmente, as histórias de vida têm temas e estes podem ser codificados de forma comum (ANGROSINO, 2009). Para tratamento das entrevistas, foi trilhado - conforme o caminho esquematizado na figura 4 e descrito a seguir – os seguintes passos: no processo das descrições, as falas foram separadas por temas, dos quais se considerou o roteiro das entrevistas como temas principais que foram: (a) Dados pessoais e históricos dos pescadores de Saramém – as perguntas utilizadas nesse tema proporcionaram conhecer um pouco do pescador, e de sua história no passado do Cabeço, ou seja, o processo de territorialização da ilha; (b) trabalho desenvolvido pelos pescadores no passado (povoado do Cabeço) e no presente (novo conjunto habitacional Saramém) – as perguntas nesse tema proporcionaram compreender a pesca no passado, as relações sociais, os tipos de trabalho e as mudanças com relação à atividade da pesca; (c) infraestrutura da ilha no passado e de Saramém no presente – as perguntas utilizadas nesse tema levaram-nos a um vídeo do passado e a compreensão material da ilha. As observações no campo proporcionaram compreender as infraestruturas presentes e quais as mudanças socioespaciais que ocorreram ou as territorialidades desenvolvidas em terra; e (d) cultura, comemorações festivas do passado e no presente – as perguntas aqui nos levaram a compreender as festas que eram comemoradas no Cabeço, como também como acontecia a principal atividade pesqueira, qual a participação da mulher naquela época. O presente vivenciado pelo pesquisador proporcionou-lhe compreender como isso está ocorrendo..

(34) 31. FIGURA 4 - Esquema utilizado pelo pesquisador para o tratamento das entrevistas coletadas. Tratamento das entrevistas coletadas. Roteiro das entrevistas. Diário de campo Filmagens e fotografias. Técnicas utilizadas. Separação das palavraschave.. Seleção de fotografias.. Dados pessoais contexto histórico.. e. Trabalho: a pesca, rizicultura e o coco.. a. Uso e posse do território do Cabeço.. vídeos. Leituras e observações durante a vivência em campo.. e. Passado e presente: (o antes no Cabeço e o agora em Saramém). Observações do entrevistador sobre os entrevistados. Observações pessoais do entrevistador. Vivências pessoais em campo.. Infraestrutura.. Observações das entrevistas.. Cultura.. Resultados: compreensão. Territorialização Desterritorialização. Reterritorialização. Fonte: SILVA, E. C. Elaborado a partir de dados desta pesquisa, 2014.. Assim, foi elaborado o diário de campo para cada descrição que era observada, levando em conta a data, a fala, dos participantes ou informantes entrevistados. Foram feitas leituras panorâmicas do diário de campo, assim como se assistiu a alguns vídeos, no propósito.

(35) 32 de resgatar detalhes das entrevistas. Dessa forma, obtiveram-se como dados as falas dos participantes, suas opiniões, visões de mundo, sentimentos, angústias, desejos e satisfação com o novo lugar, pois foi importante também compreender esses processos. Para atender o proposto na pesquisa, esta dissertação se desdobra em quatro capítulos, como segue: Capítulo 1 – São discutidos os conceitos relativos a território, identidade, pertencimento, à territorialização, desterritorialização e reterritorialização, focalizando inclusive as questões vinculadas à foz do rio São Francisco, que fica entre os estados de Alagoas e Sergipe. Capítulo 2 – Debate-se a territorialização da Ilha do Cabeço a partir das memórias dos pescadores locais, que viviam no povoado do Cabeço e atualmente vivem no novo conjunto habitacional de Saramém. Capítulo 3 – Apresenta-se o fenômeno da desterritorialização, que ocorreu no povoado do Cabeço destruído pelo avanço do mar e a erosão de parte da ilha, e o de reterritorialização dessa população no novo conjunto habitacional de Saramém, Brejo Grande-SE. Capítulo 4 – Descreve-se a dialética da desterritorialização e reterritorialização, tendo como referencial as resiliências naturais do rio e as sociais dos pescadores, além do etnoconhecimento pesqueiro local, adaptado a esse novo contexto..

(36) 33 - CAPÍTULO I –. 1. O ESPAÇO TERRESTRE: PALCO DE TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES. 1.1 Alguns Elementos Conceituais. Após o surgimento dos seres humanos no planeta Terra, a partir de um salto ontológico da vida inorgânica à orgânica e desta para a condição de ser social, que o levou a fazer e refazer sociocultural e ambientalmente o próprio mundo, com base em suas técnicas e tecnologias de trabalho, sem nunca abolir as barreiras naturais, inclusive orgânicas (LUKÁCS, 1978; FOLADORI, 2001), o ser humano tornou o nosso planeta num espaço geográfico habitável, territórios materiais e imateriais das sociedades, palco de diversas relações socioespaciais ou territorialidades, espaço vivido entre outros significados. Sendo assim, não dá para compreender o espaço terrestre e aquático sem levar em conta essa relação homem/ natureza, pois sem o homem não há espaço social. É quem atribuiu significados e valores para cada parte do espaço. Assim, o espaço compreendido como espaço social, vívido, não deve ser visto como espaço absoluto, „vazio‟ e puro, lugar dos números e das proporções. Para Corrêa (2005, p. 25), “o espaço não é nem o ponto de partida (espaço absoluto), nem o ponto de chegada (espaço como produto social)”, ele é o lócus da reprodução das relações sociais de produção, ou seja, palco de reprodução social. O espaço é, ademais, expressão de uma dialética ininterrupta que tem na ação humana sobre o ambiente algo importante e que, no mesmo instante, reflete processos humanos distintos e diferenciados entre si e para com o espaço. Nessa compreensão: Há na atualidade dois aspectos dialeticamente articulados que produzem notável ressignificação ao espaço terrestre, a primeira seria a integração da humanidade com o mundo e a segunda em direção oposta, são as mais diversas e desiguais maneiras e níveis de participação e de identidade (HEIDRICH, 2010, p. 29).. As maneiras desiguais de ver, perceber e viver o espaço terrestre se dão porque cada grupo e/ou sociedade atribui um valor ou significado diferente, inclusive para os que vivem e dependem diretamente dos espaços de uso comunais (comunitários) e dos recursos naturais,.

Referências

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