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GESTÃO FRAUDULENTA, CONFIANÇA NOS INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS E CRISES SISTÊMICAS: Dignidade penal e método de tutela

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Academic year: 2021

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III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação

PUCRS

GESTÃO FRAUDULENTA, CONFIANÇA NOS

INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS E CRISES SISTÊMICAS:

Dignidade penal e método de tutela

Thiago Zucchetti Carrion, Luciano Feldens (orientador)

Programa de Mestrado em Ciências Criminais, Faculdade de Direito, PUCRS,

Resumo

1 CONFIANÇA E INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA

Nos termos do ministrado por LOPES e ROSSETTI, as economias desenvolveram mecanismos para fazer com que o capital dos agentes superavitários migrasse aos que necessitam de tais valores, de maneira indireta, esses mecanismos que se alocam entre os agentes possuidores de poupança e os que dela necessitam são chamados de intermediadores financeiros (LOPES e ROSSETTI, 1988: p. 291-292).

Essas entidades desempenham, em síntese, duas funções distintas, podendo realizá-las isoladamente ou cumulativamente (SAUNDERS, 2000: p. 81.). A primeira consiste na corretagem, na qual o intermediário financeiro supre o agente poupador da informação necessária e reduz o custo das transações (CARVALHO, Fernando J. Cardim de et al., 2000: p. 243). A segunda forma de intermediação seria a desempenhada, por exemplo, pelos bancos, que captam capital dos depositantes, assegurando liquidez para estes, ao passo que possibilita ao intermediador financeiro efetuar empréstimos com esses valores, inexistindo relação direta entre o depositante e o destinatário final daqueles recursos (CARVALHO, Fernando J. Cardim de et al., 2000: p. 242-243). Tais atividades, contudo, não apresentam vantagens, tão

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somente, quando consideradas sobre o plano individual. Segundo LOPES e ROSSETTI, a intermediação financeira tem a capacidade de aumentar a quantidade de formação de capital, por meio do incentivo à poupança, possibilitando com que grandes somas excedentes sejam redistribuídas e que pequenos poupadores possam ter relevância pela sua consideração conjunta. Isso torna possíveis maiores investimentos, ante a elevação dos níveis de capital disponíveis, bem como é capaz de propiciar um alargamento no consumo (LOPES e ROSSETTI, 198: p. 294).1

O que possibilita aos bancos e demais intermediários financeiros promover essas atividades é o fato que, em situações normais, a quantidade de saques e depósitos tende a ser equivalentes, mantendo-se o saldo estável (SINGER, 2003: p. 52). Assim, toda essa estrutura depende, em síntese, que os depositantes, em número excessivamente elevado, não desejem reaver os valores confiados a determinado intermediário financeiro de maneira simultânea. Um dos fatores que propicia, de maneira mais destrutiva, esse cenário, é a perda da confiança do público nos intermediários financeiros, a qual, segundo CARVALHO, SOUZA, SICSÚ, PAULA e STUDART, proporciona um contágio de choque que se alastra de instituição em instituição, ocasionando o que se chamou, no início do século passado, de “corridas bancárias” (CARVALHO, Fernando J. Cardim de et al., 2000: p. 321)2. Esse “efeito dominó”, assim denominado por SINGER, desemboca, caso não exista uma intervenção salvadora da autoridade monetária, no ponto crítico da crise financeira, quando se instaura o pânico e o sistema financeiro encaminha-se ao colapso (SINGER, 2003: p. 129)3.

2 DA DIGNIDADE PENAL À TÉCNICA DE TUTELA

Diferentemente do que defendia KELSEN, FELDENS afirma que na vigência do Estado constitucional de Direito, a Carta Magna deve ser protegida dos ataques advindos da legislação infra-constitucional mediante um duplo filtro, consistente tanto na observância do rito previsto para a concepção do diploma legislativo (vigência) quanto na sua adequação ao conteúdo prescrito no estatuto político (validade) (FELDENS, 2005: p. 33). Nesse tom, é

1 No mesmo sentido: SAUNDERS, 2000: p. 81. 2

Nos mesmos termos: SINGER, Paul. op. cit., p. 58; SAUNDERS, Antony. op. cit., p. 87 e TOBIN, James. Financial intermediaries. In: EATWELL (Ed.), MILGATE (Ed,) e NEWMAN , c1998., v. 2: p. 345.

3.Ainda, conforme CARVALHO, SOUZA, SICSÚ, PAULA e STUDART, não é necessária uma verdadeira corrida bancária para abalar a liquidez da instituição financeira, porque mesmo a coincidência de saques de menor vulto tem o condão de desempenhar tal papel (CARVALHO et al., 2000: p. 269).

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manifesto o papel desempenhado pela teoria do bem jurídico, a qual, conforme alerta FELDENS, mesmo após dois séculos de problematização, continua a desempenhar um papel necessário no direito penal do Estado constitucional de Direito. Contudo, a categoria do bem jurídico, anteriormente um elemento estruturado pela dogmática, atualmente, deve ser vista como um “elemento estruturante e informador da política criminal do estado, cuja legitimidade passa a estar condicionada a um modelo de crime como ofensa a bens jurídicos” (FELDENS, 2005: p. 44).

Nesse tom, pensamos que a confiança nos intermediários financeiros atende satisfatoriamente aos pressupostos elencados à necessidade de sua tutela penal. Em primeiro lugar, a sua violação, conforme se buscou demonstrar acima, tem o condão de ocasionar crises sistêmicas, que, na pior das hipóteses, podem levar ao colapso todo o sistema financeiro. Além disso, nos termos do que ministram SCHMIDT e FELDENS, os fundamentos constitucionais e as finalidades sobre os quais a Ordem Econômica e Financeira se alicerça criam um núcleo valorativo digno de tutela, de forma que a necessidade de tutela penal, além de faticamente considerada, encontra respaldo na Carta Magna (SCHMIDT e FELDENS, 2006: p. 7.).

Quanto à técnica de tutela, pelo menos em princípio, parece certo que o delito previsto no art. 4º, caput, da Lei n. 7.492/86 trata-se de um crime tutelado sobre a forma de perigo abstrato, o que, além de ser corriqueiro nas legislações do direito penal secundário4, desperta uma série de críticas, colocando em xeque a própria categoria jurídica dos crimes de perigo abstrato. Primeiramente, cabe afastar qualquer afirmação que busque negar a constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, uma vez que, conforme D’AVILA, as tradicionais concepções dos crimes de perigo abstrato como mera violação de dever ou presunção absoluta de perigo.5

No que tange à necessidade do emprego da técnica de tutela de perigo abstrato, importantíssima a contribuição de D’AVILA, o qual, baseando-se nas lições de FARIA

4 Nesse sentido: DIAS, Jorge de Figueiredo. Para uma dogmática do direito penal secundário. Um contributo para a reforma do direito penal econômico e social português. In: D’AVILA (Coord.) e SOUZA (Coord.), 2006: p. 56; D’AVILA, Fabio Roberto. O modelo de crime como ofensa ao bem jurídico. Elementos para a legitimação do direito penal secundário. In: D’AVILA (Coord.) e SOUZA (Coord.), 2006: p. 91.

5 D’AVILA, Fabio Roberto. O modelo de crime como ofensa ao bem jurídico. Elementos para a legitimação do direito penal secundário. D’AVILA (Coord.) e SOUZA (Coord.), 2006: p. 94-95.

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COSTA referentes à matriz onto-antropológica da noção de cuidado-de-perigo, desenvolve uma dogmática segundo a qual a ofensividade nos crimes de perigo abstrato está ligada à possibilidade de interferência na esfera de manifestação do bem jurídico, bem como à necessidade dessa possibilidade não ser insignificante (D’AVILA, 2005: p. 166-174, especialmente, p. 168)

Introdução

O tratamento jurídico-penal de âmbitos historicamente confiados à investigação de outras ciências, muitas vezes, condiciona descompassos e incompreensões que podem gerar efeitos significativos na instrumentalização daquele saber. Ademais, a redação da Lei n. 7.492/86, devido à utilização exagerada de conceitos econômicos e a problemas de técnica jurídica, vem a agravar esse problema, sendo objeto de duras críticas pela dogmática penal nacional, muitas das quais merecidas.

Uma compreensão adequada dessa racionalidade econômica permitiria travar-se uma discussão de maior qualidade no que diz respeito ao atendimento dos pressupostos constitucionais de necessidade penal e ofensividade, bem como influiria diretamente na análise da técnica de tutela empregada na redação do referido tipo penal, o crime de perigo abstrato.

O presente trabalho busca por meio de um diálogo com ciências como a economia, analisar a efetiva legitimidade e proporcionalidade do delito mais grave e, possivelmente, um dos mais controversos da “Lei do Colarinho Branco”, compreendo a maneira como se dá a afetação da confiança dos intermediadores financeiros de maneira real, analisando historicamente períodos e episódios nos quais tal questão surtiu os efeitos cogitados como possíveis. Ainda, estudar as categorias dogmáticas que se encontram ligadas ao crime de gestão fraudulenta.

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O trabalho se encontra em estado preliminar, tendo sido efetuada um levantamento bibliográfico nos periódicos internacionais sobre economia, publicidade bancária e direito penal econômico, bem como em obras completas sobre risco sistêmico e regulamentação financeira.

Resultados Parciais

Até o momento, as pesquisas demonstram que as premissas assumidas são cientificamente defensáveis, em que pese não se encontrem muitos trabalhos específicos acerca do tema, a aproximação entre economia e direito, constitucional e penal, que se busca efetuar por meio deste projeto, tem a consistência necessária para lançar luz sobre a problemática que circunda o delito de gestão fraudulenta.

Referências

BODIE, Zvi. Fundamentos de investimentos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2000.

CARVALHO, Fernando J. Cardim de et al. Economia monetária e financeira: teoria e política. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito Penal: parte geral. Tomo I: questões fundamentais; a doutrina geral do crime. Coimbra: Coimbra Ed., 2004.

_______________________. Para uma dogmática do direito penal secundário. Um contributo para a reforma do direito penal econômico e social português. In: D’AVILA, Fabio Roberto (Coord.); SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de (Coord.). Direito penal secundário: Estudos sobre crimes econômicos, ambientais, informáticos e outras questões. São Paulo: Revista dos Tribunais; Coimbra: Coimbra Ed., 2006, p. 13-69.

D’AVILA, Fabio Roberto. Ofensividade e crimes omissivos próprios: (Contributo à compreensão do crime como ofensa ao bem jurídico). Coimbra: Coimbra Ed. 2005.

______________________. O modelo de crime como ofensa ao bem jurídico. Elementos para a legitimação do direito penal secundário. In: D’AVILA, Fabio Roberto (Coord.); SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de (Coord.).

Direito penal secundário: Estudos sobre crimes econômicos, ambientais, informáticos e outras questões. São

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FELDENS, Luciano. A Constituição penal: A dupla face da proporcionalidade no controle de normas penais. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005

FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón: Teoria del garantismo penal. Trad. Perfecto Andrés Ibáñez et al. 5ª ed. Madrid: Trotta, 2001.

HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal (Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940), vol. VII: Arts. 155 a 196. 3ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1967.

LOPES, João do Carmo; ROSSETTI, José Paschoal. Economia monetária. 5ª et. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 1988.

MAIA, Rodolfo Tigre. Dos crimes contra o sistema financeiro nacional: Anotações à lei federal n. 7.492/86. São Paulo: Malheiros, 1996.

SAUNDERS, Antony. Administração de instituições financeiras. 2ª ed. Trad. Antonio Zoratto Sanvicente. São Paulo: Atlas, 2000.

SCHMIDT, Andrei Zenkner; FELDENS, Luciano. O crime de evasão de divisas: A tutela penal do sistema financeiro nacional na perspectiva da política cambial brasileira. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

SINGER, Paul. Para entender o mundo financeiro. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2003.

SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de. Bem jurídico-penal e engenharia genética humana: Contributo para a compreensão dos bens jurídicos supra-individuais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

TOBIN, James. Financial intermediaries. In: EATWELL, John (Ed.); MILGATE, Murray (Ed,); NEWMAN, Peter. The New Palgrave: a dictionary of economics. London: Macmillan, c1998., v. 2, p. 340-348.

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