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Toto, acho que já não estamos no Kansas! Dorothy em O Feiticeiro de Oz

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Academic year: 2021

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Índice

1. Uma mente stressada num mundo stressado ... 11

2. O plano geral ... 51

3. A nossa aparência não é quem somos ... 73

4. Algumas notas sobre o tempo ... 91

5. Sobrecarga de vida ... 103 6. Ansiedades da Internet ... 115 7. O choque das notícias ... 151 8. Um pequeno capítulo sobre o sono ... 167 9. Prioridades... 177 10. Medos telefónicos ... 187 11. O detetive do desespero ... 207 12. O corpo pensante ... 237 13. O fim da realidade ... 253 14. Desejos ... 269

15. Duas listas sobre trabalho ... 295

16. Moldar o futuro ... 307

17. A canção de si mesmo ... 323

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Toto, acho que já não estamos no Kansas!

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1.

Uma mente stressada

num mundo stressado

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Uma conversa, há cerca de um ano

estava tenso.

Caminhava de um lado para o outro, enquanto me esfor-çava por ganhar uma discussão nas redes sociais. Enquanto isso, a Andrea observava-me. Ou, pelo menos, acho que ela me estava a observar. Era difícil ter a certeza, pois não tirava os olhos do meu telemóvel.

– Matt? Matt? – Hum? O que é?

– O que se passa? – perguntou-me ela, com aquela voz desesperada que se vai desenvolvendo ao longo de um casa-mento. Ou melhor, ao longo de um casamento comigo.

– Nada.

– Andas para aí às voltas, a dar encontrões aos móveis. Há mais de uma hora que não tiras os olhos do telemóvel.

O meu coração batia muito depressa. Sentia uma rigidez no peito. Devia continuar a lutar ou fugir? Sentia-me encur-ralado e ameaçado por um desconhecido, alguém que vivia a mais de 10 mil quilómetros de distância, alguém que eu

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jamais conheceria pessoalmente e que, ainda assim, estava a conseguir estragar o meu fim de semana.

– Estou só a tentar responder a uma coisa. – Matt, larga isso.

– Estou só…

Quando entramos num estado de agitação mental, muitas das coisas que nos dão alguma satisfação a curto prazo aca-bam, a longo prazo, por nos deixar a sentir mal. Distraímo--nos de nós próprios, quando o que realmente precisamos é de nos conhecermos.

– Matt!

Uma hora depois, já no carro, a Andrea olhou para o lugar do pendura. Eu já não estava ao telemóvel, mas continuava agarrado ao aparelho com todas as minhas forças, tal como uma freira se agarra ao rosário.

– Estás bem, Matt?

– Estou. Porque perguntas?

– Pareces meio perdido. Parece que estás igual àquela altura…

Ela conseguiu interromper a frase a tempo. Mas eu sabia o que ela ia dizer: “… em que estavas com uma depressão”. Na verdade, conseguia sentir a ansiedade e a depressão a ron-darem-me. Ainda não estava propriamente nesse estado, mas perto. Lembrava-me de como era. Quase podia vê-las, na-quela subitamente abafada atmosfera do carro.

– Estou bem – menti. – Estou bem, estou bem…

Na semana seguinte, estava deitado no meu sofá, mergu-lhado na minha décima primeira crise de ansiedade.

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Editar uma vida

estava cheio de medo. Tinha mesmo de estar. A ansie-dade está diretamente relacionada com um sentimento de medo.

Os surtos de ansiedade começaram a  surgir cada vez menos espaçados. Fiquei preocupado com o curso que esta-vam a tomar. Parecia-me que o desespero era algo que podia crescer infinitamente.

Procurei distrair-me do que se estava a passar. Contudo, devido a experiências anteriores sabia que não podia tocar em bebidas alcoólicas. Por isso, voltei a fazer coisas que, no passado, me ajudaram a sair do buraco e das quais me esque-cera de integrar no meu quotidiano. Passei a ter cuidado com a alimentação. Fiz ioga. Tentei meditar. Deitei-me no chão, pousei a mão sobre a barriga, inspirei e expirei profunda-mente – para dentro, para fora, para dentro, para fora – e dei--me conta do ritmo descompassado da minha respiração.

Mas tudo isso me era custoso. Podia desatar a chorar com algo tão simples como acordar e  ter de decidir que roupa vestir nesse dia. Pouco importava que já me tivesse sentido

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assim. Uma garganta inflamada não se desinflama apenas por já sabermos o que é ter este problema.

Tentei ler, mas senti dificuldade em concentrar-me. Ouvi podcasts.

Vi novas séries no Netflix. Naveguei nas redes sociais.

Respondi a todos os e-mails atrasados, para tentar recu-perar o controlo sobre o meu trabalho.

Acordava e agarrava-me ao telemóvel, na expectativa de encontrar algo que me fizesse esquecer de mim.

Pois bem, ficam já a saber: não resultou.

Comecei a sentir-me cada vez pior. Muitas dessas “dis-trações” não me distraíam nada; serviam apenas para piorar o que sentia. “Distraídos da distração pela distração”, como diz T. S. Eliot no poema Quatro Quartetos.

Ficava a olhar apavorado para um e-mail por responder, sem conseguir dar-lhe seguimento. No Twitter – a minha distração preferida no mundo digital –, percebi que a minha ansiedade parecia intensificar-se. O simples ato de percor-rer as minhas publicações ao longo do tempo era como ras-par a crosta de uma ferida.

Outra das distrações era ler notícias. Mas era demasiado para a minha cabeça. Saber da existência de tanto sofrimento no mundo não ajudava a relativizar a minha própria dor; ape-nas provocava uma sensação de impotência. E pensava que era profundamente patético eu ficar paralisado por proble-mas invisíveis quando havia tantas desgraças reais no mundo. Fiquei cada vez mais desesperado. Por isso, decidi agir. Desliguei-me.

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Decidi não ir às redes sociais durante alguns dias. Es-crevi uma resposta automática para os e-mails que recebia. Deixei de ler notícias e de ver televisão. Não vi videoclipes. Até passei a  evitar revistas. (Anos antes, durante o  meu primeiro colapso, o imaginário lustroso das revistas costu-mava deixar a minha mente repleta de imagens frenéticas e febris que, à noite, dificultavam-me o adormecer).

Passei a deixar o telemóvel no piso de baixo, quando subia para me ir deitar. Tentei sair de casa mais vezes. A minha mesa de cabeceira era um caos de livros que não lia e de uma série de fios e aparelhos tecnológicos, por isso tratei de arru-mar aquela confusão e levar tudo dali para fora.

Sempre que estava em casa, tentava passar o máximo de tempo deitado, às escuras, como habitualmente se faz quando se tem uma enxaqueca. Eu já percebera, desde o primeiro epi-sódio suicida dos meus 20 e tal anos, que a recuperação pas-sava sempre por uma espécie de edição da vida.

Uma limpeza.

“Há felicidade em ter-se menos”, advoga Fumio Sasaki, defensor do minimalismo. No início da minha primeira ex-periência com os ataques de pânico, limitei-me a fazer uma limpeza às bebidas alcoólicas, aos cigarros e aos cafés fortes. Naquele momento, muitos anos depois, o problema parecia estar numa sobrecarga mais generalizada.

Uma sobrecarga de vida.

E,  seguramente, uma sobrecarga tecnológica. Durante o meu plano de recuperação, a única tecnologia com a qual interagi, se excluir o carro e o fogão, foi assistir a vídeos

Referências

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