A percepção da Equipe de Enfermagem quanto
ao uso de Sistemas de Informação em saúde:
uma revisão de literatura
Harriet Bárbara Maruxo1, Paulo Mazzoncini de Azevedo Marques 2
1. Enfermeira. Professora Mestre do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID). Mestre em Ciência da Saúde pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP). Especialista em Enfermagem Cardiovascular modalidade Residência pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, São Paulo (SP), Brasil.
2. Professor Associado 3. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Universidade Aberta do Brasil, São Paulo (SP), Brasil
Resumo
Objetivo: identificar a percepção da equipe de Enfermagem no uso do SIS em sua prática diária. Método: revisão integrativa de literatura norteada pela pergunta: Qual a percepção da equipe de Enfermagem quanto ao uso de Sistemas de Informação em Saúde? Foram incluídos artigos originais, publicados em português, inglês e espanhol, com resumos disponíveis nas bases de dados Medline, Lilacs, Ibecs e Bdenf sem limite de tempo. Resultados: encontrou-se um total de 70 referências, que foram analisadas integralmente resultando em 08 (100%) artigos que constituíram a amostra final e foram divididos em quatro categorias: Limitações do SIS que apresentou um total de 6 (75%) artigos, Aspectos positivos com 5 (62,5%) artigos, Gestão da Assistência em 3 (37,5%) estudos e Sugestão de Melhora em 1 (12,5%) estudo analisado. Conclusão: O SIS é visto como recurso indispensável, enfatiza-se, porém, a necessidade de capacitação da equipe de Enfermagem quanto a seu uso.
Descritores: sistemas de informação em saúde, informática em enfermagem, enfermagem;
Introdução
Os constantes avanços tecnológicos alcançaram não apenas nossa vida pessoal, mas também a profissional. Na área da saúde surgem inovações que se agregam a assistência com intuito de aprimorá-la e facilitar a atividade dos profissionais nela envolvidos. Na Enfermagem a tecnologia tem possibilitado a
ampliação das atividades desse grupo de profissionais, subsidiando uma assistência permeada pela confiabilidade de ações e qualidade (1). Por outro lado é sabido que a
quantidade de informações trabalhadas diariamente tem aumentado significativamente, o que muitas vezes pode dificultar a atuação do profissional de saúde ou, até mesmo, contribuir para a ocorrência de erros, caso estes dados não sejam sistematicamente organizados(1).
Nesse contexto a tecnologia surge como uma possível facilitadora do processo de trabalho assistencial e gerencial do enfermeiro, agregando informações multiprofissionais, evitando-se sua perda ou não compartilhamento com outras equipes de saúde. Para tanto os Sistemas de Informação em Saúde, também conhecidos como SIS, vêm com o propósito de alicerçar o cuidado em saúde, armazenando todas as informações das equipes multiprofissionais referentes a determinado paciente e possibilitando o cruzamento de tais dados. Essas funcionalidades podem subsidiar o processo de tomada de decisão pelos profissionais de saúde, com consequente contribuição para assistência e gestão nas unidades de saúde(2). Vale destacar, porém, que muitas vezes a equipe de Enfermagem, em geral o maior contingente de recursos humanos de uma instituição de saúde, apresenta resistência ao uso da tecnologia, afirmando que sua utilização os afasta da assistência direta com o paciente, enxergando seu uso como apenas mais um trabalho burocrático a ser realizado(3).
Em alguns momentos, durante o curso de Especialização em Informática em Saúde, constituído por alunos da área da saúde e tecnologia, foi oportunizado a discussão e reflexão a respeito do uso de SIS. Em diversas ocasiões surgiu a questão da falta de adesão da equipe de Enfermagem quanto a seu uso, sendo atribuído por alguns como resultado da falta de interesse e por outros como resultado da dificuldade de manipulação dos sistemas. A ausência de evidências científicas que comprovassem o motivo da resistência da equipe de Enfermagem quanto ao uso do SIS, fez surgir este trabalho que tem por objetivo ajudar a identificar, por meio de uma revisão de literatura, a percepção da equipe de Enfermagem no que tange ao uso do SIS em sua prática diária.
Método
Trata-se de um estudo de revisão integrativa de literatura, que contou com a utilização da estratégia PICO para elaboração da pergunta de pesquisa. O uso da
estratégia PICO possibilita a criação de uma pergunta sólida, auxiliando na recuperação de artigos com consideráveis níveis de evidência. O acrônimo PICO tem em sua definição a letra P como população do estudo, letra I intervenção ou indicador, letra C comparação ou controle e letra O indicando os resultados esperados. A pergunta de pesquisa estabelecida foi: Qual a percepção da equipe de Enfermagem quanto ao uso de Sistemas de Informação em Saúde? Sendo o P equipe de Enfermagem, I a percepção da equipe de Enfermagem, C os Sistemas de Informação em Saúde e O a percepção da equipe de Enfermagem em relação aos Sistemas de Informação.
Os artigos foram selecionados a partir de resultados de buscas nas bases de dados Medline, Lilacs, Ibecs e Bdenf, sem estabelecer período específico ou limite de tempo. Os critérios de inclusão consistiram em estudos publicados na íntegra nos idiomas português, inglês e espanhol, cujos resumos estivessem disponíveis nas bases de dados selecionadas e que se relacionassem ao tema proposto. Os critérios de exclusão consistiram em estudos repetidos e artigos sem acesso ao texto completo.
Os descritores foram selecionados por meio da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), através dos Descritores em Ciências da Saúde da Bireme (Decs), contemplando os seguintes termos: sistemas de informação em saúde, informática em Enfermagem, Enfermagem, health information systems, nursing informatics, nursing, sistemas de información em salud, informática aplicada a la enfermeira, enfermeira. Os estudos selecionados foram analisados de acordo com o idioma, base de dados, ano, tema central do estudo, objetivos e resultados alcançados. Resultados
Foram encontrados inicialmente 521 artigos nas bases de dados, cujos títulos e resumos foram analisados, resultando em um total de 70 artigos completos selecionados, que foram lidos integralmente. Considerando a temática proposta e os critérios de inclusão e exclusão, oito artigos foram escolhidos para compor esse artigo de revisão, que estão apresentados no Quadro 1.
Quadro 1. Lista de artigos selecionados. São Paulo, 2016
Título do
Artigo/Referência Objetivo Resultados
Experiência computacional de enfermeiros brasileiros de um Hospital Universitário (1) Identificar a experiência computacional dos enfermeiros de um hospital universitário do Sul do Brasil
Maior utilização do SIS para questões administrativas e menos para questões clínicas e registros de cuidados de Enfermagem. O SIS nem sempre oferece funcionalidades das quais o enfermeiro precisa, como a possibilidade da realização do levantamento de
diagnósticos de Enfermagem e o
planejamento de cuidados. Os
participantes referem que o SIS é indispensável. Participatory Design of an Integrated Information System Design To Support Public Health Nurses and Nurse Managers (4) Caracterizar as necessidades de informação no trabalho da equipe de Enfermagem atuante na saúde pública. E validar a versão preliminar do SIS apontando informações adicionais a serem acrescentadas
Necessidades apontadas: integração de dados, visualização de informações do paciente, como exames laboratoriais e de imagem no momento da visita domiciliar; alimentação do SIS no momento da visita domiciliar, realização de visitas domiciliares com o uso de
tecnologia móvel ao invés do
deslocamento a casa do paciente. Necessidade de incluir equipe de Enfermagem na produção e adaptação de SIS A quantitative analysis of the impact of a computerised Information system on nurses’ clinical practice using a Realistic evaluation framework (5) Avaliar, do ponto de vista do Enfermeiro, o
uso do SIS em sua prática clínica
A maior parte dos participantes afirmou sentir-se confiante com o emprego do SIS, avaliando-o positivamente. Em relação do suporte do TI, os valores de
satisfação são percebidos mais
negativamente na UTI do que em
unidades de internação gerais
(enfermarias) A produção de dados para o Sistema de Informação do Pré-Natal em unidades Básicas de saúde (6) Analisar o processo De produção de dados para o SISPRENATAL Em Unidades Básicas de Saúde
Foram verificadas falhas no sistema
informatizado. Medidas como a
capacitação dos profissionais, a revisão do sistema e de suas fichas são indispensáveis para a produção de
informações fidedignas sobre a
assistência pré-natal no município Electronic
error-reporting systems: A case study into the
Impact on nurse reporting of medical erros(7) Verificar se o uso de um sistema de relatório de erros, Riskman, cria barreiras adicionais para impedir o erro.
Apenas metade dos funcionários da amostra recebeu treinamento quanto ao uso do SIS, houve relatados de dificuldade de acesso a computadores e por isso a resistência quanto ao uso do SIS e sua aceitação, além disso a falta de feedback por parte dos gestores
Perceptions of the Effect of Information and Communication Identificar as percepções de médicos e enfermeiros que trabalham em emergência sobre o
O SIS foi percebido como positivo sobre a tomada de decisão clínica e acesso as informações do paciente
Enfermeiros satisfeitos por serem
Technology on the Quality of Care Delivered in Emergency Departments: A Cross-Site Qualitative Study(8)
uso de um SIS voltado para emergência
mesmas informações que os médicos. Conhecimento rápido de todo o histórico de saúde do paciente. Dificuldades em relação as limitações individuais no que concerne ao uso de computadores, bem como problemas com o equipamento
The Importance of Medical And Nursing
Sub-cultures in The Implementation of Clinical Information Systems(9) Mensurar a percepção de médicos e enfermeiros quanto a satisfação com um sistema informatizado em todo o hospital
Tanto Enfermeiros como Médicos
concordaram que o SIS reduz erros de atendimento ao paciente, além de consumir menos tempo do que sistemas manuais e facilitar a comunicação entre
os profissionais. Enfermeiros
concordaram que o SIS auxiliou a decidir
quais exames seriam os mais
apropriados e a ordem em que estes deveriam ser realizados.
O uso do sistema de informação na estratégia saúde da família: Percepções dos enfermeiros(10) Analisar a percepção dos enfermeiros sobre
o uso do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB), na Estratégia Saúde da Família (ESF),
SIS facilita a coleta de dados da população pelos profissionais da ESF. É necessário que, além de realizarem a
digitação dos dados, os próprios
profissionais usufruam desses dados. Falta de capacitação para trabalhar com o SIS; falta de apoio/assessoria para sanar dúvidas em relação ao SIAB. Falhas encontradas no software como um pequeno número de doenças codificáveis, que podem não colaborar para o real panorama da população.
No que concerne a indexação dos artigos, verificou-se que 06 (75%) encontravam-se indexados na Medline, 1 (12,5%) no Lilacs e 1 (12,5%) na Bdenf. Em relação ao idioma, 5 (62,5%) apresentaram-se em inglês, 3 (37,5%) em português e nenhum em espanhol, o ano variou de 2009 a 2015.
Entre os estudos selecionados 4 (50%) referiam-se a SIS na área hospitalar, enquanto 3 (37,5%) tratavam de SIS na atenção primária e 1 (12,5%) dos artigos não apresentou o local em que o SIS foi avaliado.
Após leitura e análise dos artigos 4 categorias emergiram a partir dos apontamentos e percepções presentes nos estudos em questão, sendo estas: Limitações do SIS, Aspectos positivos, Gestão da Assistência e Sugestão de Melhora.
Na categoria Limitações do SIS incluíram-se 6 (75%) artigos que apresentaram como percepções: diminutas possibilidades de Diagnósticos e Prescrições de Enfermagem, ausência de treinamento para manipulação do SIS prejudicando sua alimentação, correlação e análise de dados, suporte insuficiente da
Tecnologia e Informação (TI), defeitos técnicos e de programação que permitem inserir dados retrospectivos, falta de infraestrutura adequada, pequeno número de doenças codificáveis.
Já a categoria Aspectos Positivos englobou em sua constituição 5 (62,5%) artigos enfatizando a importância do SIS como recurso indispensável para a assistência, além do auxílio para tomada de decisão clínica, compartilhamento de informações do paciente com equipe multiprofissional, acesso rápido ao histórico de saúde do paciente, solicitação e verificação de exames, agrupamento e análise de dados de uma região favorecendo o direcionamento da assistência, redução do tempo em relação a sistemas manuais.
A categoria Gestão da Assistência foi encontrada em 3 (37,5%) artigos analisados, contemplando relatos em que o SIS é usado basicamente para resolução de questões administrativas como transferências de unidades, solicitação de materiais entre outros. Nessa categoria cita-se ainda dificuldade na determinação do membro da equipe de saúde responsável pelo preenchimento do SIS, além do fornecimento de dados incompletos que podem comprometer a assistência.
A última categoria Sugestão de Melhora, presente em 1 (12,5%) artigo equivale a pontos que necessitam de aprimoramento segundo a visão da equipe de Enfermagem, sendo estes: necessidade de maior integração de dados e possibilidade de utilizá-lo em tempo real no caso de visitas domiciliares.
Discussão
O SIS traz como uma de suas propostas a integração de informações a respeito do paciente. Nos dias de hoje a informação torna-se essencial para o desenvolvimento de um cuidado pautado em qualidade. Dessa forma a literatura nos indica que quanto mais o SIS consiga armazenar informações e integrá-las, maiores as chances do profissional de saúde utilizá-lo na tomada de decisão clínica, norteando a assistência a ser desenvolvida(11).
Neste estudo, evidenciou-se na percepção da equipe de Enfermagem as limitações do SIS no que concerne a inserção de informações, gerando poucos resultados para o direcionamento da assistência. Os achados na literatura tratam a informação como essencial para o cuidado em Enfermagem sendo o SIS um auxiliar do Enfermeiro na interpretação de informações, subsidiando suas condutas(11,12).
Segundo a literatura, o SIS deveria possibilitar a inserção de uma quantidade de dados suficiente para apoiar a prática de Enfermagem, bem como agregá-los em um resultado possível de aplicação. É preciso que equipes de Enfermagem e profissionais da área de TI trabalhem em conjunto na construção ou customização de SIS, facilitando a dinâmica assistencial e o direcionamento do cuidado. Watson e Oroviogoicoechea(5), afirmam que um dos principais problemas dos SIS consiste em sua falta de adaptação para o público-alvo, devendo equipe de saúde e TI trabalharem em conjunto em sua construção e superação de limitações. Além disso faz-se necessário promover a capacitação da equipe de Enfermagem quanto ao uso do SIS, fazendo-a enxerga-lo como algo que vai além de um repositório de dados e que apresenta inúmeros recursos que poderiam ser acrescentados a assistência, complementando-a. O ideal seria não apenas afirmar o quão bem um SIS funciona, mas, efetivamente, mostrar como ele funciona, sendo este considerado um ponto crucial para o sucesso da implantação de um SIS.
A introdução da tecnologia no cotidiano de trabalho traz a necessidade do aprimoramento da equipe de saúde para seu manuseio. Em estudo realizado no ano de 2007, os enfermeiros relataram que a informatização dos sistemas consistia em algo complicado, faltando habilidade, estrutura e treinamento para seu uso, corroborando com alguns dos achados desta revisão(3). Diante de tais evidências torna-se imprescindível que as organizações de saúde montem programas de atualização em informática para seus profissionais, bem como estruturem treinamentos para a equipe de Enfermagem antes da concreta instalação do SIS, buscando assim garantir que este seja utilizado em todo seu potencial.
Conclusões
Esta revisão bibliográfica teve por objetivo verificar a percepção da equipe de Enfermagem quanto o uso do SIS na assistência em saúde. Com base nos artigos estudados conclui-se que o SIS é nos dias de hoje visto como recurso indispensável para apoiar a assistência e auxiliar na tomada de decisão clínica, com base no compartilhamento de informações. Enfatiza-se, porém, a necessidade de capacitação da equipe de Enfermagem quanto a seu uso, bem como a participação conjunta da equipe de Enfermagem e TI em seu desenvolvimento ou customização.
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