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Liberdades. revista. Publicação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais nº 18 janeiro/abril de 2015 ISSN

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| Publicação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais | nº 18 – janeiro/abril de 2015 | ISSN 2175-5280 |

Expediente | Apresentação | Entrevista | Spencer Toth Sydow entrevista Luis Ernesto Chiesa | Artigos | Globalização e o Direito Penal | Carlo Velho Masi | Voltaire de Lima Moraes | A independência judicial e o inconsciente do julgador: um diálogo (im)possível? | Bruno Seligman de Menezes | Algumas indagações sobre a desnecessidade da proibição de extraditar em casos de crimes políticos: seria o terrorismo um crime político? | Gabriela Carolina Gomes Segarra | A perspectiva psicanalítica do crime e da sociedade punitiva | Carlos Eduardo da Silva Serra | Labelling Approach: o etiquetamento social relacionado à seletividade do sistema penal e ao ciclo da criminalização | Raíssa Zago Leite da Silva | El discurso de los menores bajo medida judicial | Concepción Nieto Morales | História | O pensamento de Enrico Ferri e sua herança na aplicação do direito penal no Brasil contemporâneo | Maria Paula Meirelles Thomaz de Aquino | Resenha de Livro |“Um preço muito alto: a jornada de um neurocientista que desafia nossa visão sobre as drogas”, de Carl Hart | Roberto Luiz Corcioli Filho

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E

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xpediente

Diretoria da Gestão 2015/2016

Publicação do

Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

Diretoria Executiva

Presidente:

Andre Pires de Andrade Kehdi

1º Vice-Presidente:

Alberto Silva Franco

2º Vice-Presidente:

Cristiano Avila Maronna

1º Secretário:

Fábio Tofic Simantob

2ª Secretária:

Eleonora Rangel Nacif

1ª Tesoureira:

Fernanda Regina Vilares

2ª Tesoureira:

Cecília de Souza Santos

Diretor Nacional das

Coordenadorias Regionais e Estaduais:

Carlos Isa

Conselho Consultivo

Carlos Vico Mañas Ivan Martins Motta

Mariângela Gama de Magalhães Gomes Marta Saad

Sérgio Mazina Martins

Ouvidor

Yuri Felix

Colégio de Antigos Presidentes e Diretores

Alberto Silva Franco Alberto Zacharias Toron Carlos Vico Mañas Luiz Flávio Gomes

Mariângela Gama de Magalhães Gomes Marco Antonio R. Nahum

Marta Saad

Maurício Zanoide de Moraes Roberto Podval

Sérgio Mazina Martins Sérgio Salomão Shecaira

Coordenação da

Coordenador-Chefe:

Roberto Luiz Corcioli Filho

Coordenadores-Adjuntos:

Alexandre de Sá Domingues, Giancarlo Silkunas Vay, João Paulo Orsini Martinelli, Maíra Zapater, Maria Gorete Marques de Jesus e Thiago Pedro Pagliuca Santos.

Conselho Editorial:

Alexandre Morais da Rosa, Alexis Couto de Brito, Amélia Emy Rebouças Imasaki, Ana Carolina Carlos de Oliveira, Anderson Bezerra Lopes, André Adriano do Nascimento Silva, André Vaz Porto Silva, Antonio Baptista Gonçalves, Bruna Angotti, Bruno Salles Pereira Ribeiro, Camila Garcia, Carlos Henrique da Silva Ayres, Christiany Pegorari Conte, Cleunice Valentim Bastos Pitombo, Daniel Pacheco Pontes, Danilo Dias Ticami, Davi Rodney Silva, Décio Franco David, Eduardo Henrique Balbino Pasqua, Fábio Lobosco, Fábio Suardi D’ Elia, Francisco Pereira de Queiroz, Fernanda Carolina de Araujo Ifanger, Gabriel de Freitas Queiroz, Gabriela Prioli Della Vedova, Giancarlo Silkunas Vay, Giovani Agostini Saavedra, Humberto Barrionuevo Fabretti, Janaina Soares Gallo, João Marcos Buch, João Victor Esteves Meirelles, Jorge Luiz Souto Maior, José Danilo Tavares Lobato, Leonardo Smitt de Bem, Luciano Anderson de Souza, Luis Carlos Valois, Marcel Figueiredo Gonçalves, Marcela Venturini Diorio, Marcelo Feller, Maria Claudia Girotto do Couto, Matheus Silveira Pupo, Maurício Stegemann Dieter, Milene Maurício, Rafael Serra Oliveira, Renato Watanabe de Morais, Rodrigo Dall’Acqua, Ryanna Pala Veras e Yuri Felix.

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Eexpediente ...2

Apresentação ...5

Entrevista

Spencer Toth Sydow entrevista Luis Ernesto Chiesa ...7

Artigos

Globalização e o Direito Penal ...16

Carlo Velho Masi e Voltaire de Lima Moraes

A independência judicial e o inconsciente do julgador: um diálogo (im)possível? ...44

Bruno Seligman de Menezes

Algumas indagações sobre a desnecessidade da proibição de extraditar

em casos de crimes políticos: seria o terrorismo um crime político? ...59

Gabriela Carolina Gomes Segarra

A perspectiva psicanalítica do crime e da sociedade punitiva ...79

Carlos Eduardo da Silva Serra

Labelling Approach: o etiquetamento social relacionado à seletividade do

sistema penal e ao ciclo da criminalização ...101

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El discurso de los menores bajo medida judicial ...110

Concepción Nieto Morales

História

O pensamento de Enrico Ferri e sua herança na aplicação do direito penal

no Brasil contemporâneo ...127

Maria Paula Meirelles Thomaz de Aquino

Resenha de Livro

“Um preço muito alto: a jornada de um neurocientista que desafia nossa

visão sobre as drogas”, de Carl Hart ...152

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Apresentação

Inicia-se 2015. No ano que passou as edições da Revista Liberdades trouxeram textos que sempre nos provocaram a reflexão. A primeira edição do novo ano, creio, conseguirá manter a linha.

Iniciamos com uma entrevista repleta de pontos polêmicos. Concedida pelo professor da Universidade de Nova Iorque, Luis Ernesto Chiesa, a Spencer Toth Sydow, o entrevistado revela a importância de seus mestres George Fletcher e Francisco Muñoz Conde, em uma formação em Direito Penal que reúne as visões continental e anglo-saxã sobre a matéria. Fornece detalhes da analogia em Direito Penal possível no direito americano e expõe sua polêmica posição determinista do agir humano.

Entre os artigos, Carlo Velho Masi e Voltaire de Lima Moraes retomam a Globalização, criminalidade internacional e política criminal. Após uma abordagem histórica e teórica da globalização e duvidar de sua linearidade, preocupam-se com seus efeitos sobre a produção em matéria penal.

Nesta edição, duas expedições sobre uma ciência sempre presente e pouco penetrada pelos operadores do Direito. No primeiro artigo, Bruno Seligman de Menezes adentra no diversificado e fascinante mundo da psicologia para, à luz do pensamento Freudiano, investigar a imparcialidade judicial.

Carlos Eduardo da Silva Serra, analisando correntes psicológicas diversas, investiga suas influências nas teorias criminológicas sobre o delito e a culpa.

Gabriela Carolina Gomes Segarra discute o instituto da extradição e a diferenciação entre crimes comuns e crimes políticos. Em especial a discussão gira em torno da dificuldade de conceituação do “político” que qualifica o delito e da evidente preocupação com a classificação do terrorismo naquela categoria.

De forma direta e didática, Raíssa Zago Leite da Silva apresenta o labelling Approach, em um texto que tem como maior mérito a fluidez e brevidade das ideias em, após descrever a teoria, relacioná-la com a seletividade do sistema penal e suas consequências mais evidentes.

A perene preocupação com a formação socioeducativa dos adolescentes submetidos a medidas judiciais é explanada por Concepción Nieto Morales. Em seu texto, investiga as causas da criminalidade juvenil espanhola analisando aspectos como família, escola, amigos e drogas, e as confronta com a legislação da Espanha sobre a matéria.

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Um preço muito alto é um livro de memórias escrito por Carl Hart. Roberto Luiz Corcioli Filho nos apresenta uma resenha das memórias de um professor que ultrapassam a narrativa de fatos vividos e invadem um contexto de crítica social sobre o tratamento das drogas e sua política proibicionista.

Na seção de história, Enrico Ferri, notório pensador positivista, é retratado por Maria Paula Meirelles Thomaz de Aquino de forma cuidadosa e responsável. No texto, a autora consegue um retrato fiel e bem elaborado sobre as ideias de Ferri, os institutos que auxiliou a criar e como tais contribuições afetaram e ainda afetam sistemas penais pelo mundo, inclusive no Brasil. O Texto tem ainda outro mérito: foi produzido no seio do grupo de estudos avançados do instituto.

A primeira edição do ano marca também a passagem do cetro. Nas próximas edições, a revista contará com nova coordenação, algo sempre necessário e salutar para sua sobrevivência. Certamente, a qualidade será superada e toda a sorte é desejada ao trabalho que se inicia.

Boa leitura e um bom ano.

Alexis Couto de Brito

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Spencer Toth Sydow entrevista

Luis Ernesto Chiesa

1) Por favor, nos conte um pouco sobre sua história pessoal, relacionada com seus estudos jurídicos.

Resposta: Na realidade, eu estudei administração de empresas, com concentração em contabilidade, na

Universidade de Porto Rico em minha graduação. Nos Estados Unidos – inclusive em Porto Rico – têm-se que fazer quatro anos de graduação preliminar (denominada undergrad) após o colegial para poder ingressar na faculdade de Direito. Após isso, a faculdade de Direito leva três anos. O resultado disso é que você recebe o título de juris doctor após os sete anos de estudos que se seguem à escola. Depois de completar a faculdade de Direito, fui para a Universidade de Columbia, em Nova Iorque, para cursar meu mestrado e, eventualmente, meu doutorado em Direito (JSC ou Juris Science Doctorade, que é o grau de pesquisador em Direito). Aprendi imensamente em Columbia, levando-se em conta que meus orientadores naquela universidade foram os Professores George Fletcher e Francisco Muñoz Conde, ambos ganhadores do importante prêmio Humbold Wissenchaft em suas bolsas de estudo em direito criminal.

Em termos de minha carreira, comecei a lecionar em tempo integral na Faculdade de Direito de Pace (Pace Las School) em White Plains, Nova Iorque. Fiquei por lá por sete anos. No ano de 2013, fui aceito como professor de Direito e Diretor do Centro de Direito Criminal de Buffalo, na State University of New York. Atualmente, também sou o vice-diretor da Faculdade de Direito. Como diretor do Centro de Direito Criminal de Buffalo (CDCB), sou capaz de fornecer aos estudantes e pesquisadores uma plataforma única para imersão em estudos acerca de direito penal norte-americano, internacional e comparado. O CDCB enriquece a vida acadêmica da Faculdade de Direito de Buffalo, pois a comunidade acadêmica nacional e internacional organiza importantes eventos acadêmicos, recebendo estudiosos e promovendo a convergência entre as aproximações entre o sistema de commom law e o de continental law relacionados à justiça criminal.

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na Universidade Torcuato di Tella em Buenos Aires (Argentina), na Universidade de Ottawa (Canadá) e na Universidade de Porto Rico.

Finalmente, estou atualmente envolvido com o Poder Legislativo de Porto Rico para promover a mudança de seu Código Penal.

2) Então é possível dizer que você estudou tanto o direito continental quanto o direito anglo-saxão (common law)? Quanto importante isso foi para você e na sua vida profissional?

Sim, eu estudei ambas as aproximações no que se refere ao direito criminal durante meus estudos de graduação e, mais tarde, em meu doutorado na Faculdade de Direito de Columbia, Nova Iorque. Estudar direito criminal em Porto Rico necessariamente implica estudar direito criminal comparado, uma vez que o estado mistura jurisdições civis e anglo-saxãs à luz de seus laços históricos com a Espanha e seus laços atuais com os Estados Unidos da América do Norte. Eu aprofundei tais estudos comparados em meu doutorado, uma vez que o Professor George Fletcher é um dos principais estudiosos do mundo nessa área. Além disso, aprendi muito sobre direito criminal continental com Francisco Muñoz Conde, que considero ser meu mestre espanhol. Considero ter sido essencial tal perspectiva comparativa para minha formação como pesquisador e como professor. Isso contaminou todos os aspectos da minha vida pessoal e é o fator definidor da minha carreira de estudos. Creio que se pode aprender muito olhando para outros sistemas legais e observando como tais sistemas lidam com problemas comuns. Direito comparado nos dá uma ferramenta importante nesse sentido.

3) Em sua opinião, quais as principais diferenças entre os dois sistemas (common law e continental law)?

Embora existam muitas maneiras em que sistemas de common law e civil law possam variar, uma diferença particularmente importante é a maneira pela qual os advogados em cada jurisdição raciocinam a partir de um problema jurídico.

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Em geral, os advogados de direito anglo-saxão raciocinam o direito penal (e outras áreas do Direito) indutivamente. Ou seja, eles começam com um caso (ou grupo de casos) no qual eles têm interesse em resolver de modo realista, razoável. Então o caso é decidido de uma forma que parece adequada. Subsequentemente, casos semelhantes são decididos de forma semelhante. Eventualmente, um princípio que explica por que esses casos foram decididos de forma semelhante surge como resultado do raciocínio indutivo.

Advogados de direito anglo-saxão, portanto, progridem de casos específicos para princípios gerais. Mas os princípios apenas passam a existir porque eles representam adequadamente a resolução correta dos casos individuais. Se surgirem casos no futuro que não podem ser resolvidos de forma justa pela aplicação do princípio, advogados de direito anglo-saxão são bastante tendentes a fazer revisão ou abandonar o princípio se essa for a única maneira de resolver um caso concreto (ou um grupo de casos) de forma adequada.

Em contraste, os advogados de direito continental tipicamente raciocinam seu caminho através de um problema jurídico de modo dedutivo. Ou seja, eles começam a sua análise de um caso com um princípio aparentemente aplicável, que é geralmente aceito como prevalente e vinculativo. Eles, então, aplicam o princípio para o caso em questão para se chegar a uma solução. Advogados de direito continental, portanto, tipicamente vão dos amplos princípios geralmente aceitos para a resolução específica de casos concretos. Como resultado, ao contrário de jurisdições de direito comum, os princípios não se justificam, porque eles fornecem resultados intuitivos em casos particulares. Em vez disso, os princípios são justificados, porque eles são vistos como prevalentes de forma independente ou obrigatórios, independentemente de produzirem soluções intuitivas ou contraintuitivas para casos particulares. O princípio é visto como autoritário ou o prevalente se ele deriva de compromissos jurídicos, políticos ou morais ainda mais amplos.

4) Por que você diz que o direito anglo-saxão não possui uma aproximação dogmática em seu modo de ser?

Alguns estudiosos de direito anglo-saxão realmente constroem o direito penal de uma forma que provavelmente seria descrita como “dogmática”. O exemplo mais óbvio é o do Professor Paul Robinson. Se um estudioso de

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direito continental lesse o livro de Paul Robinson intitulado Estrutura e Funcionamento em Direito Penal (1997), ele ficaria chocado com a semelhança da abordagem de direito penal feita por ele frente às modernas teorias funcionalistas do tipo, populares em jurisdições atuais.

No entanto, não há nenhuma dogmática no direito anglo-saxão em um sentido mais amplo, porque teóricos anglo-americanos passam pouco tempo tentando racionalizar normas legais existentes. Em vez de se engajar em tais esforços descritivos, os teóricos anglo-americanos se envolvem mais no que você poderia chamar de “filosofia do direito penal”. Portanto, eles veem seu trabalho como um conceito normativo que não pergunta “como é que podemos racionalizar a lei existente” (a questão dogmática), mas sim “como deveria ser a lei ideal” (a questão filosófica). É por isso que os principais professores anglo-americanos de direito penal são realmente mais filósofos do que advogados (por exemplo, Michael Moore, Antony Duff, Doug Husak, Heidi Hurd, Larry Alexander etc).

5) Quais os trabalhos e/ou autores que mais o influenciaram em sua carreira?

O trabalho de direito penal que mais me influenciou foi – de longe – Repensando direito penal (Rethinking Criminal Law), de George Fletcher. Eu acho que é o mais importante livro de Direito Penal escrito em qualquer língua no século XX. É incrível como Fletcher foi capaz de expressar – em inglês – ideias, como a teoria finalista da ação de Welzel, de um modo a fazê-la relevante para os advogados de direito anglo-saxão (common law). Um trabalho realmente impressionante. É uma verdadeira pena que ele não tenha sido traduzido para o espanhol, alemão ou português. Espero que alguém traduza isso em breve. Outra obra que influenciou meu pensamento foi Estrutura e Funcionamento em Direito Penal (Structure and Function in Criminal Law), de Paul Robinson. Lê-se como um texto em alemão, mas escrito em inglês. Fiquei impressionado com a forma como o pensamento de Robinson é semelhante com a teoria básica do direito penal alemão.

No que se refere a autores europeus, fui bastante influenciado pela teoria da ação elaborada em Fundamentos del Sistema Penal, de Tomas Vives Antón. As obras de Silva Sanchez sobre omissão também moldaram a

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forma como eu encaro o injusto passivo. Eu também acho muito importantes as obras de Manuel Cancio Meliá sobre causalidade, “imputação objetiva” e conduta da vítima. Finalmente, admiro a obra de Jakobs, embora eu costume discordar dele. No entanto, é difícil negar que Jakobs seja o teórico de direito criminal alemão mais filosoficamente sofisticado das últimas décadas.

6) Você acredita que estamos diante de uma espécie de fusão entre direito anglo-saxão e direito continental, especialmente considerando crimes que possuem consequências internacionais como lavagem de dinheiro, corrupção e crimes informáticos?

Na verdade, eu não acredito que o que está acontecendo pode ser chamado de “fusão” ou uma “convergência” dos sistemas de common law e continental law de direito penal. Infelizmente, acho que o direito penal ainda é considerado uma disciplina paroquial. No entanto, o Estatuto de Roma é definitivamente um exemplo que tenta mesclar os dois sistemas. Creio que a afirmativa é verdadeira para Direito Penal Internacional em geral, embora eu ache que ainda exista muito trabalho a ser feito; também acredito que os estudiosos do direito penal internacional em geral – com exceção de Kai Ambos – comumente não são muito sofisticados em sua compreensão da teoria do direito penal. Também é verdade que os crimes com consequências internacionais, tais como lavagem de dinheiro, corrupção e crimes de internet, provavelmente vão forçar uma aproximação dos sistemas para se conseguir lutar contra esses males. No entanto, eu não acredito que estamos lá ainda.

7) Você acredita que os Estados Unidos da América do Norte possuem uma forma mais ampliada de interpretar o direito criminal?

Uma coisa que deve ser esclarecida é que nos EUA – como em jurisdições continentais europeias – o principal órgão encarregado de criar o direito penal é o legislador. No entanto, é verdade que os tribunais norte-americanos se sentem mais confortáveis para interpretar as leis penais de forma mais ampla do que seria, provavelmente, considerada censurável na Europa ou na América Latina. Assim, por exemplo, a principal preocupação do princípio da legalidade nos EUA parece ser a de garantir ao cidadãos um aviso prévio e justo do que seria uma

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conduta proibida, em vez de garantir uma apropriada separação de poderes entre o Legislativo e o Judiciário. Como resultado, a chamada “proibição de analogia” (in bonan ou in malan partem) não existe nos EUA, uma vez que os tribunais podem interpretar as legislações criminais analogicamente desde que a interpretação seja razoavelmente previsível e, portanto, não prive cidadãos de aviso prévio e justo da existência da proibição da conduta.

8) Os Estados Unidos da América do Norte têm a maior população carcerária do mundo. Quais as causas que justificam isso em sua opinião? O sistema é muito eficiente, muito radical ou a sociedade é muito criminalizada?

Há um consenso entre os estudiosos do direito penal nos EUA de que nosso direito penal é demasiado punitivo e que temos tanto um problema de supercriminalização quanto de superpopulação carcerária. As causas para o encarceramento em massa são de natureza política. Políticos americanos frequentemente fazem campanhas baseadas em uma mentalidade de serem “duros com o crime” que, inevitavelmente, se traduz em mais punição. Estudiosos de ciências criminais sabem que isso não funciona, mas os políticos não se importam. Dito isso, acredito que estamos começando a enxergar uma inversão da tendência de encarceramento em massa. As prisões estão atualmente muito lotadas, e manter tantos detentos está começando a se tornar um grave fardo financeiro. Isso está levando à liberação de muitos prisioneiros. Além disso, vários estados já descriminalizaram o uso da maconha. Se essa tendência continuar, veremos consideravelmente menos prisões e, portanto, menos pessoas presas ao menos por posse de drogas.

9) O que você acha do Patriot Act (“Lei Patriota” promulgada após o episódio das Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001)? Acredita que diminui direitos constitucionais e processuais?

A “Lei Patriota” claramente restringiu os direitos substantivos e processuais dos suspeitos. No entanto, se a restrição de direitos equivale a uma violação da constituição, já é uma questão diferente. É óbvio que a tortura que aconteceu em Guantánamo e em prisões secretas eram inconstitucionais. É também óbvio que a detenção prolongada de suspeitos sem eles terem a oportunidade de contestar a legalidade da sua detenção em um

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tribunal é inconstitucional. Mas nenhuma dessas situações foi autorizada pelo Patriot Act. Eram coisas que o ex-presidente George W. Bush fez sem expressa autorização legislativa ou judicial. Um problema mais difícil é a existência atual dos Tribunais FISA (Tribunais criados pelo Foreign Intelligence Surveillance Act ou Lei de Vigilância da Inteligência Estrangeira), que autorizam a pesquisa de registros de internet e telefone celular sem obtenção de um mandado tradicional de um tribunal norte-americano. Não estou convencido de que esse procedimento é constitucional.

10) É verdade que você não acredita em livre-arbítrio? Poderia nos explicar um pouco sobre isso?

É verdade. Antes de explicar meu ponto de vista, deixe-me primeiro esclarecer o que quero dizer com “livre-arbítrio”. Eu defino o livre-arbítrio como “o grau de liberdade que faz juízos de culpa e atribuições de responsabilidade moral possíveis”. Uma vez definido o livre-arbítrio dessa maneira, é fácil ver por que ele é ameaçado pela tese do determinismo causal. Determinismo causal é a crença de que tudo o que acontece no universo, incluindo a conduta humana, é o produto de tudo o que aconteceu no passado, em combinação com o funcionamento de leis naturais.

Há pelo menos quatro razões que sugerem que a tese do determinismo causal deve ser levada a sério. Primeiro, não há respaldo científico para a visão de que o comportamento de objetos macroscópicos é determinado causalisticamente pela confluência do passado e as leis naturais. Em segundo lugar, estudos neurocientíficos famosos, como os realizados por Benjamin Libet, sugerem que a conduta humana é determinada por processos inconscientes que não estão sob o controle do ator.

Em terceiro lugar, estudos biológicos demonstram que aspectos do comportamento humano são, em grande parte, determinados por nossa composição genética. Por fim, vários estudos psicológicos sugerem a possibilidade de que aspectos do comportamento humano são determinados, em grande medida, por fatores ambientais.

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Nenhum desses motivos sozinho é suficiente para estabelecer a verdade do determinismo causal.

No entanto, a combinação de todos esses fatores faz pelo menos com que uma dúvida séria seja lançada sobre se o comportamento humano pode ser rastreado até processos indeterministas. Esse é especialmente o caso quando a evidência mais forte até agora em favor da conclusão de que o comportamento humano não é causalisticamente determinado é a intuição de que nós controlamos nossos destinos de uma forma que desmente a tese do determinismo.

A maioria das pessoas acredita que seres humanos podem ser culpados ou elogiados por aquilo que fazem apenas se tiverem a capacidade de escolher agir de forma diferente (os filósofos chamam este o princípio de possibilidades alternativas). O determinismo causal ameaça o princípio de possibilidades alternativas, porque sugere que, dada a fixidade do passado e da imutabilidade das leis naturais, os seres humanos não têm controle sobre os fatores que moldam a sua conduta.

Curiosamente, a maioria dos filósofos e cientistas concorda que o determinismo causal é verdadeiro. No entanto, muitos filósofos (os chamados “compatibilistas”) também acreditam que o livre-arbítrio é compatível com a verdade do determinismo causal. Eu sou cético de que o livre-arbítrio e o determinismo causal são compatíveis. À luz desse ceticismo, prefiro acreditar que o determinismo causal é verdadeiro e, assim, incompatível com o livre-arbítrio (sou o que os filósofos chamam de “incompatibilista rígido”). Além disso – e mais importante –, acredito que nós não perdemos muito se rejeitarmos o livre-arbítrio. Na verdade, penso que o direito penal é melhor sem livre-arbítrio.

Se partirmos do princípio de que os seres humanos não têm livre-arbítrio, isso nos levaria a livrar-nos da finalidade retributiva como uma justificativa para a imposição da pena.

Ao contrário do que os retributivistas nos querem fazer crer, acabar com a retribuição não faria o nosso sistema de justiça criminal menos atraente.

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Uma legislação penal que não depende da retribuição como justificativa para a punição deverá conceber punição como forma de neutralizar os infratores perigosos. Conceituar o direito penal como instrumento que pode ser usado para neutralizar os infratores perigosos é suscetível de conduzir a um sistema economicamente mais eficiente e humano de justiça criminal que se baseia menos em encarceramento e muito mais no tratamento e reabilitação.

Como resultado, há boas razões para acreditar que a assunção de que os seres humanos não têm livre-arbítrio geraria uma lei penal mais normativamente atraente do que a que temos hoje e isso, por sua vez, fornece-nos boas razões para abraçar uma solução incompatibilista ao problema do livre-arbítrio.

11) É importante que estudantes de um país que adota a sistemática continental como o Brasil estudem a forma de pensar do direito anglo-saxão? Como e por quê?

Certamente é importante. Creio que aprender como o direito anglo-saxão se aproxima do direito continental dá ao estudante uma ferramenta por meio da qual ele pode avaliar a legislação de seu próprio país. Mais especificamente, o estudante poderá verificar quais legislações necessitam de mudanças.

Embora esse uso crítico do direito criminal comparado seja obviamente relevante para a reforma legislativa, também pode informar como o sistema judicial responde a questões complexas e importantes do direito penal doméstico. Se ambos os sistemas abordarem um problema da mesma forma, então pode-se ter certeza de que a solução é a correta. No entanto, se a solução do direito anglo-saxão para um determinado problema é diferente da solução do direito continental europeu, então há razão para pensar sobre o assunto mais profundamente. Por que as soluções são diferentes? Posso aprender alguma coisa com essa outra abordagem? É possível que o outro sistema legal esteja realmente certo e o meu, errado? Essas são questões importantes e você pode aprender muito sobre o seu próprio sistema de direito penal comparando-o com um sistema diferente.

Referências

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