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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº Relator: AMADO GOMES Sessão: 09 Fevereiro 1994 Número: SJ Votação: UNANIMIDADE Meio Proc

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 045690

Relator: AMADO GOMES Sessão: 09 Fevereiro 1994 Número: SJ199402090456903 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO. PROVIDO PARCIAL.

DIREITO INTERNACIONAL DIREITOS DE DEFESA DO ARGUIDO

DIREITOS FUNDAMENTAIS DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

PROCESSO PENAL CONSTITUCIONALIDADE

RECURSO DE REVISÃO MATÉRIA DE FACTO

ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA

ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS

NULIDADE DE SENTENÇA NULIDADE RELATIVA

ARGUIÇÃO DE NULIDADES

Sumário

I - No direito internacional não é exigida a existência de um duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, no processo penal.

II - A Constituição Portuguesa não consagra directamente a existência do princípio do duplo grau de jurisdição. Só indirectamente o direito ao recurso é consagrado na medida em que fala de tribunais de recurso.

III - Na medida em que a Constituição consagra a existência de Tribunais de recurso tem entendido o Tribunal Constitucional que uma das garantias de defesa a que se refere o artigo 32, n. 2 da Constituição é o direito ao recurso.

IV - A chamada "revista alargada" ao permitir que, nos casos do n. 2 do artigo 410 do Código de Processo Penal o Supremo Tribunal de Justiça se possa

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pronunciar sobre matéria de facto é uma das garantias de defesa no recurso.

V - Não são inconstitucionais os artigos 433 e 410 do Código de Processo Penal pois não colidem com os artigos 13 e 32 da Constituição.

VI - O erro notório na apreciação da prova há-de surgir do texto da decisão recorrida.

VII - Uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, não pode ser tomada em conta pelo Tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, sendo nula a sentença que condenar nesses termos, nulidade essa sanável se arguida em tempo.

VIII - A leitura de declarações anteriormente feitas pelo arguido só é permitida na audiência nos casos do artigo 357 do Código de Processo Penal.

IX - Segundo o artigo 355 do Código de Processo Penal, não valeu em julgamento, nomeadamente para efeitos da formação da convicção do

Tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, a menos que a sua leitura possa efectuar-se na audiência.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

No terceiro Juízo Criminal de Lisboa foram julgados os seguintes arguidos:

1- A, divorciado, natural de Vila do Conde, nascido a 17 de Setemro de 1944.

2- B, natural da República Dominicana, nascido a 21 de Setembro de 1949.

3- C, solteiro, comerciante, natural da Venezuela, nascido a 25 de Maio de 1956.

Por acórdão de 13 de Maio de 1993 foi decidido:

1- Absolver todos os arguidos da prática de um crime punido e previsto pelo artigo 28 n. 1 do Decreto-Lei n. 430/83, de 13/XII.

2- Condenar cada um dos três arguidos pela prática, em co-autoria de um crime previsto e punido pelos artigos

23 n. 1 e 27 g) e c) do Decreto-Lei n. 430/83, de

13/XII, integrando-o, porém, nos artigos 21 n. 1 e 24 c) do Decreto-Lei n.

15/93, de 22/1, cuja aplicação foi determinada pelo disposto nos artigos 2 n. 4 do Código

Penal, por o seu regime ser mais favorável aos arguidos.

Foram condenados nas seguintes penas: a)- O arguido A, em nove anos de prisão. b)- O arguido C, em doze anos de prisão. c)- O arguido B, em doze anos de prisão.

3- Condenar o arguido B, por cada um dos três crimes previstos e punidos pelo artigo 228 a) e c) e n.

2, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão e trinta dias de

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multa a 500 escudos por dia ou, em alternativa desta, em 20 dias de prisão.

4- Condenar o arguido B por um crime de falsas declarações, previstas e punidas pelo artigo 22 parágrafo 1 do Decreto-Lei n. 33725, de 21 de Agosto de

1984, na pena de seis meses de prisão.

5- Condenar o arguido B, em cúmulo jurídico, na pena única de treze anos e três meses de prisão e três meses de multa a 500 escudos diários ou, em alternativa desta, em sessenta dias de prisão.

6- Decretar a expulsão do território nacional, por um período de dez anos, dos arguidos B e C, nos termos do artigo 34 n. 1 do Decreto-Lei n. 15/93.

7- Declarar perdidos para o Estado:

- O cheque de 200.000 dólares U.S.A.;

- As quantias monetárias depositadas na conta de que o arguido A é titular no Barclay`s Bank, com o n. 10701-000212029, o passaporte e as duas cartas de condução também apreendidas à ordem do processo

(artigo 107 n. 1 do Código Penal).

Esta decisão tem por base a seguinte matéria de facto decidida pelo Tribunal Colectivo:

1- No dia 22 de Setembro de 1991, o arguido B desembarcou no aeroporto da Portela, em Lisboa, de um avião proveniente de Madrid.

2- No dia 24 de Setembro de 1991, o arguido C desembarcou no mesmo aeroporto de um avião proveniente de Bruxelas.

3- Os arguidos B e A aguardavam a sua chegada no aeroporto.

4- Os arguidos tinham acordado permanecer em Lisboa durante algum tempo, necessário ao recebimento e posterior tráfico de 16 quilos de cocaína.

5- Tal quantidade de cocaína tinha sido expedida por via aérea, encontrando- se em Portugal, no aeroporto de

Lisboa, no sector de carga aérea, placa E, sob a contra-marca n. 20514, desde 25 de Setembro de 1991, dissimulado no interior de dois contentores, alojando mobílias.

6- Constava como remetente da referida encomenda, J, residente na Venezuela e como destinatário L, residente na rua ..., em Lisboa.

7- À data, o referido L encontrava-se emigrado na Suiça.

8- Logo que chegou a Portugal, o arguido B alojou-se na residência

usualmente habitada pelo arguido A, sita na Rua ..., Olivais Sul - Lisboa, sendo pertença de D.

9- A partir do dia 29 de Setembro de 1991, o arguido

C hospedou-se na "Residencial Estufa", sita na Rua ..., em Lisboa.

10- No dia 29 de Setembro de 1991, os arguidos encontravam-se na residência referida em "8", a fim de prepararem o recebimento da mercadoria do n."5".

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11- Aí, acordaram em que o A e o B procederiam às tarefas de

desalfandegamento e transporte da mercadoria contendo cocaína, para os armazéns sitos na Rua ..., em

Lisboa.

12- Entre os dias 29 de Setembro de 1991 e 2 de Outubro de 1991 os arguidos B e A contactaram um E, solicitando-lhe colaboração para a concretização das formalidades burocráticas e levantamento da encomenda proveniente da Venezuela atrás referida.

13- O E concordou com o pedido que lhe foi feito, julgando tratar-se de encomenda contendo mobiliário e, perante o argumento exposto pelos arguidos, que invocaram a circunstância de um deles (o

A) ser deficiente motor e o outro, ser cidadão estrangeiro (o B).

14- O J estabeleceu contacto pessoal com o ajudante de despachante alfandegário O e com o despachante oficial P que lhe comunicaram que a mercadoria só poderia ser levantada mediante apresentação na Alfândega do Aeroporto, de uma procuração subscrita pelo remetente a favor do terceiro interessado e um depósito de garantia a favor da Alfândega, uma vez que não havia o respectivo certificado de bagagem.

15- No dia 2 de Outuro de 1991, o E, na posse da referida procuração, obtida pelos arguidos

A, B e C, por forma não apurada, acompanhado pelo João José Sanches Galvão, dirigiu-se aos Serviços de Tesouraria da Alfândega do

Aeroporto de Lisboa, onde pagou a multa de 90000 escudos pela falta de "

certificado de bagagem ", e a quantia de 13509 escudos correspondente ao preço de armazenamento da mercadoria, no Terminal de carga Aérea do Aeroporto da Portela.

16- O E ainda subscreveu e assinou um requerimento solicitando o levantamento da mercadoria.

17- As despesas referidas atrás foram custeadas pelos três arguidos, muito embora o arguido A tenha subscrito e assinado um cheque com o n.

0407412495, titulando o montante de 13509 escudos, da conta de que é titular no Banco de Portugal, ao E.

18- Cerca das 16 horas e 30 minutos, o E transportou a mercadoria desde o Aeroporto da Portela, até aos armazéns que ficam na Rua Fernando Palha, n.

50/52,nesta cidade, utilizando para o efeito o veículo de matricula AG-....

19- Aí, após contacto com o chefe de serviço dos Armazéns de Depósito, F, assinou um

"contrato de armazenagem", tendo ficado depositado a mercadoria já referida atrás.

20- Enquanto isto, o B fazia circular, lentamente, o veículo de matricula BM-...,

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que conduzia, na Rua ..., nesta cidade, até às 16 horas e 50 minutos, acompanhando o desenrolar dos acontecimentos.

21- O arguido B estacionou a citada viatura junto aos armazéns e deslocou-se a pé até junto dos mesmos, com o intuito de se certificar da concretização do depósito da mercadoria.

22- Após ter efectuado o depósito desta, ainda em 2 de

Outubro de 1991, o E deslocou-se até à residência já referida, do A, onde se encontrou com este e com o B.

23- Aqui, o A e o B mostravam sinais de nervosismo, referindo o arguido ao primeiro que tinha visto um carro que o tinha seguido até ali, rondando depois a casa do A.

24- Foi então que o E lhes perguntou qual a razão de tal nervosismo, não tendo respondido, quer um, quer outro (A e B).

25- Começou o E a ter suspeitas sobre o que se passava, tendo decidido terminar com a colaboração que até ali tinha concretizado.

26- Abandonou a residência citada e um pouco depois estabeleceu contacto telefónico com a irmã do arguido A, dizendo-lhe que as guias do levantamento da mercadoria e o contrato de armazenagem, de onde constava a autorização de levantamento daquela pelo portador da mesma, seriam colocados no

interior da viatura que se encontrava estacionada no Campo das Cebolas, coma matrícula BM-....

27- No dia seguinte (3 de Outubro de 1991) cerca das 11 horas, os três arguidos encontravam-se no Campo das

Cebolas, nesta cidade, num café perto do parque de estacionamento, ali existente.

28- Ali acordaram que o B e o A procederiam ao levantamento da mercadoria dos armazéns da Rua Fernando Palha 50/52, enquanto o C permanecia na

"Pensão Estrela".

29- Na sequência deste acordo, cerca das 15 horas, o arguido B fez-se

transportar na carrinha de matricula PI-..., até à Rua Fernando Palha, tendo estacionado a mesma a cerca de 30 metros de distância onde se situam os armazéns.

30- Permaneceu no interior da viatura até às 15 horas e

45 minutos, hora em que apareceu o A, fazendo-se transportar na viatura de matrícula PL-11-17, acompanhado por M e N. Estacionou a viatura ao pé dos armazéns.

31- O M e o N tinham sido contactados pelo A às 13 horas, que lhes propôs a tarefa de descarregar as mercadorias, dizendo-lhes que se tratava de peças de mobiliário, a troco da compensação monetária no valor de 2000 escudos.

32- O arguido A, acompanhado do M e do N, saiu da viatura e dirigiu-se ao

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interior do armazém, onde contactou com o F a fim de proceder ao levantamento da mercadoria.

33- Nesse momento foi interceptado por agentes da

Polícia Judiciária que procederam à sua detenção, bem como à do B.

34- O arguido C foi detido mais tarde, nesse mesmo dia, na Pensão Estrela, onde aguardava o contacto dos outros dois arguidos.

35- Os agentes da Polícia Judiciária procederam à abertura das "caixas" que continham efectivamente mobiliário.

36- Verificaram que, dissimulados nas partes laterais e da cabeceira de uma cama, se encontrava E várias embalagens, contendo um pó esbranquiçado, com o peso de

16,300832 quilos.

37- Submetido a exame laboratorial, tal pó mostrou revelar-se como sendo cocaína.

38- Os arguidos conheciam a natureza estupefaciente do produto apreendido e destinavam-no à cedência a terceiros, por contrapartida monetária,

procurando obter avultada compensação remuneratória.

39- O arguido B identificou-se perante as autoridades alfandegárias, policiais e judiciais portuguesas, como sendo G.

40- Foi advertido pelo Excelentíssimo Juiz de Instrução

Criminal que procedeu ao interrogatório após a sua detenção, de que a falsidade quanto aos seus elementos de identificação o faria incorrer em responsabilidade criminal.

41- Apesar de ciente de tal responsabilidade, identificou-se como sendo G, filho de H e de I a 14 de Junho de 1948, natural da Venezuela e residente em San Luís, Caracas, Venezuela.

42- No decurso do inquérito afirmou ter o nome de G e os elementos de identificação constantes no passaporte que lhe foi apreendido com o n.

0299428, emitido em Caracas em 4 de Outubro de 1989.

43- O arguido sabia que era obrigado a responder com verdade quanto aos seus elementos de identificação e que a utilização de identidade "falsa"

perante autoridades judiciárias, não era permitido por lei.

44- No momento em que foi detido, o arguido B tinha em seu poder o

passaporte n. 0299428, emitido em Caracas, em 4 de Outubro de 1989, em nome de G.

45- Esse passaporte tinha a fotografia do arguido, a sua impressão digital, bem como os elementos de identificação de um indivíduo de nome G.

46- O passaporte referido foi obtido por forma não apurada, sabendo o arguido que não podia apor-lhe a sua fotografia, a sua impressão digital e inscrever o nome de G como se da assinatura do próprio se tratasse e fosse essa a sua

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verdadeira identidade.

47- O arguido sabia que o passaporte é um documento do qual apenas podem constar as verdadeiras referências de identificação do respectivo titular e que apenas nessas circunstancias é permitido pela entidade estadual.

48- Por forma que se desconhece o arguido B obteve em Caracas duas cartas de condução: uma carta de condução internacional venezuelana, emitida pelo

"Touring e Automobil Club da Venezuela" com o n. 283291 e na qual consta o nome G e datada de

3 de Agosto de 1990; uma carta de condução emitida pela mesma entidade, em Caracas, com o n. 306881, na qual consta o nome de G e datada de 1 de Agosto de 1991.

49- As referidas cartas de condução têm apostas as fotografias do arguido B, bem como a inscrição do nome G, por aquele apostas, como se da assinatura do mesmo se tratasse e fosse essa a sua verdadeira identidade.

50- O arguido B, agindo da forma descrita, sabia que causava um prejuízo ao Estado, na medida em que abalou a fé pública que o passaporte e a carta de condução merecem, eventualmente, a terceiros.

51- O arguido B usou os documentos referidos atrás, exibindo-os perante as autoridades policiais e Judiciárias, como se os mesmos se referissem aos elementos de identificação ali apostos e o respectivo titular fosse G.

52- Os arguidos agiram, consciente, livre e deliberadamente, bem sabendo que o seu comportamento era proibido por lei.

53- Os três arguidos actuaram de comum acordo, em conjugação de esforços e intentos.

54- Foi encontrado, do Banco da Consolidade da

Venezuela, um cheque emitido a favor de G, titulando o montante de 200000 dólares U.S.A.. O arguido B obteve tal quantia através da venda de produtos estupefacientes.

55- As quantias monetárias depositadas na conta de que o arguido A é titular, no Barcklay`s Bank, com o n. 10701-000212029, foram conseguidas através da venda de produtos estupefacientes, pelo mesmo.

56- O arguido A é de modesta condição social e económica. Não se mostrou arrependido (por maioria da razão). Acresce o que consta do seu certificado de registo criminal (folhas 693 a 698 - III volume).

57- O arguido B não prestou declarações.

58- O arguido C não prestou declarações.

Inconformados com o decidido interpuseram recurso os arguidos C e B.

O primeiro conclui a sua extensa motivação como também extensas conclusões que em síntese se indicam:

1- O Tribunal decidiu com base em provas desconformes

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às que estão contidas na gravação feita em julgamento, violando o principio da documentação de declarações orais e os artigos, 363, 368 n. 2 do Código do Processo

Penal e 32 da Constituição.

2- A não audição no Supremo Tribunal de Justiça dessa gravação e a imposição legal de decisão do recurso com base apenas no texto da decisão recorrida, constitui violação do direito de recurso e traduz a inexistência do recurso da matéria de facto.

3- A tramitação do recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça é contrário à do recurso perante as Relações o que constitui desigualdade perante a Constituição - artigo 13.

4- Os artigos 363 e 410 do Código de Processo Penal violam o artigo 32 da Constituição da República

Portuguesa.

5- Houve erro notório na apreciação da prova pois os factos ns. 15, 17 e seguintes da decisão são contrários ao ocorrido em julgamento.

6- Os artigos 410 n. 2 e 433 do Código do Processo

Penal violam: a) O artigo 14 n. 5 do Pacto Internacional sobre direitos civis e políticos. b) O protocolo n. 7 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

c) O artigo 32 da Constituição.

Tais artigos são inconstitucionais.

7- Não existe recurso da matéria de facto.

8- O Tribunal Colectivo alterou substancialmente os factos dos artigos 22 e 24 da acusação, nos pontos 15 e

38 da decisão recorrida o que constitui nulidade prevista no artigo 379 b) do Código de Processo Penal e determina o reenvio do processo.

9- O Tribunal Colectivo ao fundamentar a sua convicção nas declarações do arguido perante o Juiz de instrução sem que o arguido tivesse prestado declarações no julgamento, violou os artigos 343 n. 1, 357 e 374 n. 2 do Código de Processo Penal e o artigo 32 da Constituição.

Termina pedindo a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 363, 410 e 433 do Código de Processo Penal ou declaração da nulidade da decisão e reenvio do processo.

O arguido B fundamentou o seu recurso com a motivação de folhas 1023 a 1048 na qual formulou, em síntese, as seguintes conclusões:

1- A simples fundamentação da decisão é insuficiente para a observância do princípio do duplo grau da jurisdição - princípio constitucional derivado do artigo 32 n. 1 da Constituição.

2- O artigo 433 do Código de Processo Penal é inconstitucional porque não permite o reexame pelo

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Supremo Tribunal de Justiça da matéria de facto conforme prova gravada em audiência.

3- Não devem valer para a formação da convicção do

Tribunal, documentos que não foram produzidos ou analisados em julgamento - artigo 355 n. 1 do Código de

Processo Penal.

4- Tal convicção deve assentar em critérios objectivos e deve ser motivada, sendo certo que do acórdão não resultam elementos demonstradores de que a quantia do cheque encontrado ao arguido B provenha da venda de

estupefacientes.

5- A seguir o recorrente faz várias considerações sobre a punição do crime previsto e punido pelos artigos 23 n. 1 do Decreto-Lei 430/83, de 13/XII, valoração da conduta dos arguidos, determinação da medida concreta da pena, - artigo 72 do Código Penal - salientando o principio da necessidade da pena contida no artigo 18 n. 2 da Constituição, mas não formula qualquer pedido relativamente à medida da pena que lhes foi aplicada.

Concluiu a motivação dizendo apenas que foram violadas as normas constantes dos artigos 433, 410 n. 1 e 2, 355 n. 1 do Código de Processo Penal, artigos 32 n. 1 e 18 n. 2 da Constituição, artigo 23 do Decreto-Lei 430/83 e artigo 72 do Código Penal e pedindo a revogação do acórdão.

O Ministério Público respondeu aos dois recursos contrariando detalhada e fundamentadamente os argumentos e concluindo que os recursos não merecem provimento.

Neste Supremo Tribunal o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto teve vista do processo, não suscitando quaisquer questões que obstassem ao

prosseguimento dos recursos para a audiência.Foram colhidos os vistos legais.

Teve lugar a audiência.

Passa-se a decidir.

I- Recurso do arguido C.

1- Alegou a inconstitucionalidade dos artigos 410 n. 2 e 433 do Código de Processo Penal relativamente aos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, na parte em que a norma dos artigos 410 n. 2 restringe a invocação dos vícios ali apontados, com os condicionantes "desde que o vicio resulte da decisão recorrida" e que seja "notório", porque violam o

"principio constitucional do duplo grau da jurisdição" em matéria de facto e artigo 14 n. 5 do

Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e

Políticos, o Protocolo n. 7 da Declaração Europeia dos Direitos do Homem e artigo 32 da Constituição.

Por esta questão se começa, como é lógico.

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Tem ela sido apreciada pelo Tribunal Constitucional em vários acórdãos decidindo por maioria que tais preceitos legais não violam a constituição.

A mesma orientação tem sido seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça mas, aqui, por unanimidade.

Apesar desta orientação ditada, principalmente, pelo

Tribunal que mais autoridade tem nesta matéria, continua a assistir-se à invocação desta inconstitucionalidade invocado-se, além do mais, argumentos chave como "ofensa ao Estado de Direito" e

"Regime Democrático".

O invocado princípio do duplo grau de jurisdição não tem sido considerado como indiscutível garantia dos cidadãos, e ainda hoje o não é, como disso nos dá noticia Armindo Ribeiro Mendes, em Recursos, folha 118 e seguintes, salientando até que no direito soviético, em certa fase, a possibilidade de um tribunal superior apreciar de novo a matéria de facto, foi considerada anti- democrática.

Vejamos, em primeiro lugar, esta questão à luz dos tratados internacionais:

1- A Declaração Universal dos Direitos do Homem não consagra tal principio, designadamente no seu artigo 11 n. 1 que preceitua: "Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se publico em que todas as garantias de defesa lhe sejam asseguradas".

2- A convenção Europeia dos Direitos do Homem preceitua no seu artigo 6 n.

1:

"Qualquer pessoa tem o direito a que a sua conduta seja examinada equitativa e publicamente, num prazo razoável, por um Tribunal independente e

imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá ... sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela".

Não consagra o direito a dois ou mais graus de jurisdição, como tem decidido pacificamente o Tribunal

Europeu dos Direitos do Homem.

3- O Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos, aprovado para ratificação pela lei n.

29/78, de 12/6, é que estabelece a garantia do duplo grau de jurisdição em matéria penal, nos seguintes termos:

Artigo 14 n. 5: "Qualquer pessoa declarada culpada de um crime terá o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade, e a sentença, em conformidade com a lei".

Porém, a expressão "em conformidade com a lei", significa que os Estados Membros gozam de liberdade para determinar as modalidades que o reexame da causa, por um Tribunal Superior, há-de revestir.

4- Norma semelhante à do artigo 14 n. 5, acabado de referir,é o artigo 2 do

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Protocolo n. 7 à convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, elaborado no âmbito do Conselho da

Europa, devido à apontada lacuna da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Preceitua aquele artigo 2:

"n. 1- Qualquer pessoa declarada culpada de uma infracção penal por um tribunal tem o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a condenação. O exercício desse direito, bem como os fundamentos pelo qual ele pode ser exercido, são regulados pela lei".

"n. 2- Este direito pode ser objecto de excepções em relação a infracções menores, definidas nos termos da lei, ou quando o interessado tenha sido julgado em primeira instância pela mais alta jurisdição ou declarado culpado e condenado no seguimento do recurso contra sua absolvição".

Sucede, porém, que este protocolo não vigora ainda em

Portugal porque ainda não se procedeu ao depósito dos instrumentos de Ractificação.

E, quando entrar em vigor, não implicará a existência do duplo grau de jurisdição tanto em matéria de direito como em matéria de facto porque, segundo o relatório explicativo desse Protocolo, o referido artigo 2 "deixa à legislação interna o cuidado de determinar as modalidades do exercício desse direito, incluindo os motivos pelos quais pode ser exercido".

A conclusão que se tira destas normas é que no direito internacional não é exigida a existência de um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, no processo penal.

O mesmo sucede no direito interno de Espanha, França, Itália e Alemanha.

A Constituição da República Portuguesa não consagra, expressamente, o princípio do duplo grau de jurisdição.

Só indirectamente o direito de recurso resulta daquele diploma fundamental, na medida em que prevê a existência de tribunais de recurso.

Assim, face à ausência de uma imposição constitucional do duplo grau de jurisdição, o legislador ordinário pode livremente estabelecer as regras sobre os recursos desde que delas não resulte, na prática, a sua ineficácia.

Ao consagrar-se na Constituição o direito de acesso aos tribunais, apenas se garante isso mesmo: - todo, cidadão tem assegurado o acesso aos tribunais.

Mas isto não significa que tal direito de acesso tenha de garantir a existência de vários graus de jurisdição, apenas garantindo o acesso aos graus de

jurisdição que o legislador ordinário tenha estabelecido.

Mas, na medida em que a Constituição consagra a existência de Tribunais de recurso, tem entendido o

Tribunal Constitucional que uma das garantias de defesa a que o artigo 32 n. 1

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se refere é o direito de recurso, o que equivale a reconhecer a consagração do duplo grau da jurisdição.

Este princípio, levado às últimas consequências significaria, como pretende o recorrente, a possibilidade de ser repetida a prova perante o Supremo

Tribunal de Justiça.

Isso é o que não resulta da constituição.

Na verdade, não havendo naquele diploma uma disposição expressa do duplo grau de jurisdição penal relativamente aos crimes mais graves e entendendo- se que só indirectamente ali está consagrado, a questão que se pode por é apenas a de saber com que extensão, em matéria de facto, está reconhecido entre nós, conhecido como é o que se passa a nível internacional.

Nunca o Tribunal Constitucional entendeu, mesmo quando declarou inconstitucional o artigo 665 do Código de

Processo Penal/29 com a interpretação dada pelo Assento de 29 de Junho de 1934, que a adopção de uma outra solução que não seja a da repetição da prova perante o tribunal de recurso contrário à Constituição pois, entre o sistema do assento e o da repetição da prova, outros há que não põem em causa as garantias de defesa.

Uma dessas soluções é a adoptada pelo Código do

Processo Penal de 1987, criando a chamada "revista alargada" que protege o arguido contra erros grosseiros de facto que podem conduzir a uma sentença injusta, como sucede nos casos contemplados no artigo 410 n. 2 e suas

alíneas.

O Tribunal Constitucional tem salientado (acórdãos ns.

61/88 e 124/90) que, relativamente à matéria de facto, há razões de

praticabilidade que justificam não poder o recurso ter o mesmo âmbito que em matéria de direito.

Na verdade, uma repetição da prova perante o tribunal de recurso, que tenderia a ser praticado por sistema, seria impraticável e inconveniente.

A apreciação da prova não teria as mesmas possibilidades de descoberta da verdade material que tem a produzida perante o Juiz da primeira instância, porque lhe falta a imediação, porque está mais distanciada dos factos, porque um segundo julgamento tem o inconveniente de decorrer num cenário já montado.

Por outro lado, o Código do Processo Penal atribui um elevado grau de confiança na prova apreciada pelo

Tribunal Colectivo porque resulta do debate dos pontos de vista de cada juiz e não de uma opinião isolada,além de que a sentença tem de conter a

fundamentação imposta pelo artigo 372.

A solução legal adoptada pelos artigos 410 n. 2 e 433 garante o núcleo

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essencial no recurso em matéria de facto, e não viola o principio do duplo grau de jurisdição.

Improcede, pois a inconstitucionalidade invocada.

2- Inconstitucionalidade do artigo 363 do Código de

Processo Penal, conjugado com o artigo 110 do mesmo código, por violação do artigo 32 da constituição.

Depois do que atrás foi dito a respeito dos artigos 410 n. 2 e 433, temos de concluir que o registo da prova produzida perante o tribunal Colectivo, nada tem a ver com a possibilidade de o Supremo Tribunal de justiça reexaminar a prova produzida em julgamento.

Para decidir sobre os vícios que são apontados à decisão de facto não pode o Supremo Tribunal servir-se da gravação feita na audiência.

Assim, quer o tribunal de primeira instância tenha, quer não tenha meios técnicos para gravar a prova; quer tenha ou não feito a gravação, é totalmente irrelevante para a decisão de um recurso que tenha por fundamento os vicios do número 2 do artigo 410.

O registo da prova destinava-se a garantir maior segurança na decisão de facto, sendo até obrigatória quando a audiência decorrer perante o Tribunal singular, no caso previsto no artigo 364 n. 1. Perante o Tribunal Colectivo nunca o registo é obrigatório.

A circunstância de o Supremo Tribunal não poder servir-se da gravação feita da prova produzida perante o Tribunal Colectivo não viola o artigo 32 n. 1 da Constituição pois, como já se disse, o princípio do duplo grau de jurisdição está suficientemente garantido com o sistema adoptado pelo Código de Processo Penal.

Não há inconstitucionalidade.

3- Violação do artigo 13 da Constituição por desigualdade de tramitação do recurso perante as

Relações e perante o Supremo Tribunal de Justiça.

Preceitua o artigo 13:

"n. 1- Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei".

"n. 2- Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão da circunstância, sexo, raça,língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social".

Este preceito constitucional nada tem a ver com a tramitação dos recursos penais, mas apenas com a igualdade dos cidadãos perante a lei.

O arguido C, ao interpor este recurso para o Supremo

Tribunal de Justiça é tratado da mesma forma que qualquer outro cidadão que

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para o mesmo tribunal recorra.

O facto de os recursos perante as Relações admitirem reexame da matéria de facto nos casos previstos no código e o mesmo não suceder perante o

Supremo Tribunal de Justiça não significa desigualdade de tratamentos.

Os pressupostos de tais recursos são diferentes: o recurso para a Relação da matéria de facto só pode ser interposto da decisão proferida pelo juiz singular, na hipótese prevista no artigo 364 n. 1, dada a maior falibilidade da

apreciação da prova feita por um só juiz; a decisão de facto proferida pelo Tribunal

Colectivo oferece maiores garantias, como já se salientou.

Improcede esta questão.

4- Erro notório na apreciação da prova.

O fundamento deste erro, alegado pelo recorrente, consiste em os factos números 15,17 e seguintes da decisão, serem contrários ao ocorrido em julgamento.

Depois do que já foi decidido atrás, designadamente que o artigo 410 n. 2 do Código do Processo Penal não é inconstitucional, a improcedência desta questão é manifesta.

O erro notório há-de resultar do texto da decisão recorrida.

O erro que o recorrente invoca resulta da apreciação da prova produzida em julgamento.

O Supremo Tribunal de Justiça,não reexamina essa prova.

Do texto da decisão não resulta qualquer dos vícios apontados nas alíneas a), b), c) daquele n. 2 do artigo

410, ainda que nos socorramos da experiência comum.

Este Tribunal não sente quaisquer dúvidas quanto à matéria de facto capazes de determinar o reenvio do processo.

Sem outras considerações, por inúteis, e manifesta a improcedência desta questão.

5- Alteração substancial dos factos dos arts. 22 e 24 da acusação, nos pontos 15 e 38 da decisão recorrida.

Artigo 22 da acusação - "No dia 2 de Outubro de 1991, o

E, na posse da referida procuração obtida por forma não apurada..."

Ponto 15 da decisão - "No dia 2 de Outubro de 1991 o

E, na posse da referida procuração, obtida pelos arguidos A, B e C, por forma não apurada..."

Artigo 24 da acusação: "As despesas referidas no artigo 22 foram suportadas pelo arguido A"

Esta matéria da acusação foi decidida no ponto 17 da decisão e não no 38, da seguinte forma: "As despesas referidas atrás foram custeadas por três

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arguidos, muito embora o arguido A tenha subscrito e assinado um cheque..."

O vicio que vem arguido, alteração substancial dos factos, para os efeitos previstos no Código de Processo

Penal é o que está definido no seu artigo primeiro alínea f) nos seguintes termos:

"b) Alteração substancial dos factos: aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicadas".

Tal alteração, segundo o artigo 359 do Código de Processo Penal, não pode ser levado em conta pelo

Tribunal para o efeito de condenação no processo, excepto se houver acordo do E.P., arguido, e assistente na continuação do julgamento, se essa alteração não determinar a incompetência do tribunal.

E, a condenação por factos diversos dos descritos na acusação fora do caso previsto no artigo 359, constitui nulidade (sanável) da sentença, conforme dispõe o artigo 379 b). Tratando-se de nulidade sanável e tendo sido arguido em tempo, pode ser decidido.

Os factos substancialmente essenciais à integração do tipo legal de crime previsto e punido pelos artigos 23 n. 1 e 27 g) e c) do Decreto-Lei

430/83 do qual os três arguidos vinham acusados em co-autoria e do tipo legal previsto e punido pelos artigos 21 n. 1 e 24 c) do Decreto-Lei n. 15/93 pelo qual vieram a ser condenados, pelas razões sabidas, resultaram provados quanto a todos os arguidos - cfr, designadamente,os factos números 1, 2, 3, 4, 5, 38, e

53 da decisão e ainda quanto ao arguido C, os números 27 e 28.

Ao decidir sobre a matéria dos factos números 22 e 24 da acusação, estava já formada a actuação conjunta dos três arguidos para levantamento na

Alfândega de 16 quilos de cocaína para posterior tráfico, que eles sabiam já ali se encontrar para ser por eles levantada.

Nas diligências que fizeram para levantamento do produto e armazenamento do mesmo noutro local, não é o facto de a procuração ter sido obtida só por um ou pelos três ou o facto das despesas terem sido custeadas só por um ou,também pelos três, que altera o tipo legal de crime ou a nulidade das penas. São factos sem relevo para a decisão tanto assim é que na

fundamentação do enquadramento jurídico-penal, a decisão nem a eles se refere.

Sendo assim, não se verificam os pressupostos no artigo

359 do Código do Processo Penal e, consequentemente, não se verifica a nulidade, prevista no artigo 379 b) do mesmo código.

6- Leitura das declarações do arguido perante o Juiz de

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Instrução.

O recorrente declarou em audiência que não desejara prestar declarações e não consta da acta que alguma declaração tenha sido por ele produzida sobre a matéria da acusação ou da defesa.

Nestas circunstâncias tais declarações só podiam ter sido lidas a requerimento do arguido - artigo 357 n. 1 a) - mas isso não foi por ele requerido. Nem a

leitura podia fundamentar-se nas contradições referidas na alínea b) daquele n. 1 porque, não tendo sido prestadas declarações em audiência, não podia haver contradições.

É portanto uma prova proibida por lei, pelo que não é admissível - artigo 125.

A nulidade daí resultante não tem a natureza de insanável - artigo 119.

Tratando-se da nulidade de um acto a que o arguido assistiu devia ter sido arguida antes que esse acto terminasse - artigo 120 n. 1 a) - o que não sucedeu.

E o despacho que ordenou a leitura, transitou em julgado porque dele não foi interposto recurso.

Improcede totalmente o recurso do arguido C.

II- Recurso do arguido B.

1- A primeira questão posta é a da inconstitucionalidade do artigo 433 do Código de

Processo Penal.

Esta matéria foi já decidida no recurso do arguido C em termos que aqui se dão como reproduzidos, no sentido de que tal artigo não é inconstitucional.

2- A segunda questão consiste na existência do erro notório na apreciação da prova porque: a) O Tribunal considerou, para formar a sua convicção, o

diagrama de conexões de folhas 345 e 349, do II volume, o cheque da folha 58 do I volume, a factura de folhas 234 do II volume, o contrato de armazém de folhas 235 e 236 do II volume, os documentos das folhas

423 e 424 do III volume, o exame de folhas 250 e 251 do II volume, o

documento de folhas 397 e 398 os exames de folhas 634, 635, 637, 638, e os documentos das folhas 654, 655 e 656, do III volume.

Destes documentos só o primeiro foi objecto do contraditório; nenhum dos outros foi produzido ou analisado em audiência, motivo porque não devem valer para a formação da convicção do Tribunal , do acordo com o previsto o artigo 355 n. 1 do Código de Processo

Penal.

E do referido diagrama não resulta qualquer ligação entre o C e o A. b)

Nenhum dos depoimentos prestados foi decisivo para a formação da convicção do Tribunal. c) Quanto ao cheque da folha 58, encontrado na posse do arguido B, não resulta da prova produzida em julgamento que a quantia nele expressa

(17)

tivesse sido obtido através da venda de estupefacientes.

Toda esta argumentação não integra o vicio do erro notório na apreciação da prova a que se refere o artigo

410 n. 2 c) do Código de Processo Penal porque não resulta do texto do acórdão recorrido, como impõe tal artigo, mas sim da apreciação feita pelo Tribunal

Colectivo da prova produzida em julgamento, como vem alegado.

A matéria de facto decidida pelo Tribunal Colectivo está definitivamente fixada, não tendo o Supremo

Tribunal de justiça poderes para a alterar, como resulta do artigo 433 citado.

Este Tribunal pode, unicamente, detectar, na matéria de facto decidida, os vícios a que alude o citado artigo 410 n. 2 face aos quais apenas pode decretar o reenvio do processo para que, em novo julgamento, sejam sanados tais

vícios. No caso em apreço não se verifica o vicio que vem alegado nem qualquer outro.

Relativamente ao cheque de 200.000 dólares U.S.A., o

Tribunal Colectivo deu como provado, no ponto 54 da matéria de facto, que o arguido B obteve aquela quantia através da venda de estupefacientes. Este facto não pode mais ser discutido porque a matéria de facto não suscita quaisquer dúvidas capazes de determinar o reenvio do processo.

A argumentação do recorrente que atrás se expôs na alínea a) nada tem a ver com o erro notório na apreciação da prova.

O que o recorrente quis alegar foi que o Tribunal

Colectivo, na formação da sua convicção, se servir de meios de prova de que não podia servi-se porque os documentos referidos não foram produzidos nem examinadas na audiência.

Também aqui não tem razão porque não foi violado o disposto no artigo 355 do Código de Processo Penal.

Este artigo refere-se à prova oral que não sendo produzida em julgamento não pode ser considerada ou a outros meios de prova que não constam do

processo.

Os documentos em questão já estavam juntos aos autos quando teve lugar a audiência, portanto, submetidos ao contraditório. Qualquer das partes podia impugná-los; quanto à prova oral, só as testemunhas que compareceram à audiência podiam ser submetidas ao contraditório.

Tais documentos, à disposição do Tribunal e das partes em julgamento, terão o valor probatório que resultar da discussão da causa: nenhum valor se as

partes conseguirem destruir o seu valor probatório ou se isso não acontecer, terão o valor que o Tribunal deles extrair.

3- As restantes questões suscitadas dizem respeito à punição do crime

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previsto e punido pelos arts. 23 n. 1 e 27 g) e c) do Decreto-Lei n. 430/83, de 13/XII.

Embora não formule qualquer pedido concreto, resulta da alegação que o Tribunal não decidiu correctamente ao fixar-lhe, por tal crime, uma pena em medida superior à do arguido A.

Entende-se que, neste ponto, o recorrente tem razão.

Vejamos.

Os três arguidos são co-autores de um crime de tráfico de estupefacientes agravado previsto e punido pelos artigos 23 n. 1 e 27 g) e c) já citados.

Da matéria de facto provada não pode concluir-se que o grau de culpa do arguido A seja inferior à dos outros dois. Embora isso possa ter resultado da prova produzida em julgamento, o certo é que a decisão de facto não deixa transparecer tal diferença, sendo certo até que o acórdão recorrido concluiu que a participação do A foi "de primacial importância para a organização do processo" nacional "de trafico de cocaína", sem esclarecer qual foi a

participação dos outros na actuação extranacional.

Não tem razão o Ministério Público, na resposta à motivação, na folha 1061, ao dizer que " os arguidos desempenharam papéis diferentes e aí sobressai uma maior responsabilidade dos arguidos C e B que, como " donos do negócio

", solicitaram e obtiveram o consenso do arguido A ". Isto não resulta da matéria de facto por mais leituras que dela se façam.

E, com suposições, não podemos definir o grau de culpa dos arguidos.

É inquestionável que o grau de culpa dos três arguidos

é muito elevado atendendo ao elevado grau de ilicítude e à intensidade do dolo directo.

Não há bases de facto para graduar em níveis diferentes a culpa de cada um.

A matéria de facto provada relata a actuação dos arguidos a partir do

momento em que os 16 quilos de cocaína chegaram a Portugal. Desconhece-se se o A interveio no " processo extranacional " de conseguir o estupefaciente e enviá-lo para Portugal e qual a participação de cada arguido nesse processo.

Entende-se, portanto, que a culpa de cada um se situa no mesmo nível de gravidade.

Segundo o art. 72 do Código Penal a culpa é fundamento e limite da pena.

Assim, a medida da pena a aplicar a cada arguido só poderia variar se as necessidades de prevenção fossem diferentes e diferentes fossem também as circunstâncias agravantes e atenuantes.

Já resulta do exposto que a agravação é igual porque idênticos são os graus de ilicítude e de dolo.

As necessidades da prevenção são igualmente acentuadas.

O circunstancionalismo atenuativo não é mais acentuado quanto ao A que

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quanto aos outros dois.

Mas há uma circunstância que tem de ser levada em conta no doseamento das penas, apesar da gravidade do crime: o estupefaciente não chegou a entrar no circuito do consumo; não produziu efeitos nocivos.

Assim, numa moldura penal de 5 a 15 anos de prisão, com referência ao Decreto-Lei n. 15/93, de 22/1 (artigo 21 n. 1 e 24 c)) a agravação do mínimo legal em 4 anos seria a justa medida da pena para todos os arguidos, já que o arguido C beneficia do recurso nesta parte por força do disposto no artigo 402 n. 2 a) do Código de

Processo Penal, fixando-se em nove anos de prisão a medida da pena para todos.

III- Decisão.

Em face do exposto, acorda-se:

1- Em negar provimento ao recurso do arguido C.

2- Em dar provimento parcial ao recurso do arguido

B revogando-se o acórdão recorrido quanto à medida da pena que lhe foi aplicada pelo crime previsto e punido pelos artigos 21 n. 1 e 24 c) do Decreto- Lei

15/93, de 22/1 e condenando-se o arguido, por tal crime na pena de 9 ( nove ) anos de prisão e, em cúmulo jurídico com as restantes penas, na pena única de 11

(onze ) anos de prisão.

3- Em alterar o acórdão recorrido quanto à pena imposta ao arguido C pelo crime previsto e punido pelos artigos 21 n. 1 e 24 c) do Decreto-Lei 15/93, condenando-o em 9 ( nove ) anos de prisão.

4- Em confirmar, quanto ao mais, o acórdão recorrido.

5- Em condenar o arguido C, pelo decaimento total, em 7 u.c.s., e o arguido B em 5 u.c.s., de taxa de justiça, e nas custas, na proporção de dois terços para o primeiro e um terço para o segundo, com 20000 escudos de procuradoria.

Lisboa, 9 de Fevereiro de 1994.

Amado Gomes.

José Sarmento da Silva Reis.

Ferreira Dias.

Ferreira Vidigal.

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