• Nenhum resultado encontrado

Em processo de inventário, é da competência do Tribunal de 1ª instância a apreciação dos recursos das decisões do Notário.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Em processo de inventário, é da competência do Tribunal de 1ª instância a apreciação dos recursos das decisões do Notário."

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 4833/17.0 T8LSB.L1-1 Relator: PEDRO BRIGHTON

Sessão: 25 Setembro 2018 Número: RL

Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: APELAÇÃO

Decisão: INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA

PROCESSO DE INVENTÁRIO NOTÁRIO RECURSO

COMPETÊNCIA

Sumário

Em processo de inventário, é da competência do Tribunal de 1ª instância a apreciação dos recursos das decisões do Notário.

Texto Integral

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA.

I–Relatório:

1)– Em 29/10/2015 deu entrada no Cartório Notarial de Pedro N. R., sito em Lisboa, um pedido de inventário por óbito de António F.,

falecido que foi em Lisboa, sendo o requerimento inicial subscrito por José F. em nome e representação de António F..

2)– Foi nomeada cabeça de casal Isabel F., cônjuge do falecido aquando da morte deste.

3)– No decurso da tramitação do processo, veio a cabeça de casal apresentar requerimento onde refere :

“Estamos, assim, face a uma nulidade insanável da Portaria (Portaria nº 278/2013, de 26 de Agosto, que regulamenta o processamento dos actos e os termos do processo de inventário no âmbito do Regime Jurídico do Processo de Inventário aprovado pela Lei nº 23/2013, de 5

(2)

de Março) que inquina todo o processo de inventário e obrigada à distribuição do mesmo segundo os critérios que decorrem dos referidos artigos 203º e segts do Código de Processo Civil.

Dispõe o Artigo 16º da Lei nº 23/2013, de 5 de Março que o notário determina a suspensão da tramitação do processo sempre que, na pendência do inventário, se suscitem questões que, atenta a sua natureza ou a complexidade da matéria de facto e de direito, não devam ser decididas no processo de inventário, remetendo as partes para os meios judiciais comuns até que ocorra decisão definitiva, para o que identifica as questões controvertidas, justificando

fundamentadamente a sua complexidade. A remessa para os meios judiciais comuns pode ter lugar a requerimento de qualquer

interessado.

É manifesto que a questão agora introduzida é de grande complexidade jurídica abarcando vários institutos, nomeadamente de natureza

Constitucional e de hierarquia de norma.

Deve ser decido pelos Tribunais Judicias, pois só estes administram a Justiça em nome do Povo (artigo 202º da Constituição) e foi o Povo através da Assembleia da Republica (artigos 108º e 147º da

Constituição), em matéria de reserva legislativa, que impõe a sua vontade na matéria que nos ocupa através da Lei nº 23/2012, de 5 de Março.

Requer-se, em consequência, a remessa para os meios comuns para decisão da questão agora levantada.

Subsidariamente e sem prejuízo do direito ao recurso, requer-se a V.Exa se digne verificar e declarar a nulidade de falta de distribuição e ordene a mesma em relação aos presentes autos”.

4)– Sobre tal questão incidiu a seguinte decisão do Sr. Notário:

“Foi requerido pelo ilustre mandatário da interessada cabeça de casal Isabel F., a remessa do processo para os meios comuns em virtude da alegada complexidade jurídica de natureza constitucional e normativa da questão suscitada.

Cumpre-me agora decidir, no âmbito das competências conferidas por Lei.

Os cartórios notariais não estão abrangidos pelo princípio da

independência consagrados nos artºs 203º e 215º da Constituição da República Portuguesa, nem estão sujeitos aos critérios e aos poderes que são atribuídos aos Tribunais. Não pressupõe uma distribuição de processos baseada na aleatoriedade e nas normas processuais sobre impedimentos e suspeições, já que escolha do cartório notarial em que

(3)

o processo de inventário irá tramitar é feita com total liberdade por aquele que der início ao processo, desde que corresponda a um cartório sito na área do Município em que se deu a abertura da sucessão, nos termos da Lei e do Estatuto do Notariado.

Do exposto, indefiro o requerimento da cabeça de casal da remessa para os meios comuns, prosseguindo os autos os seus trâmites”.

5)– Em 26/7/2016 faleceu o requerente do inventário, António F..

6)– Em 31/7/2016, a cabeça de casal deu conhecimento nos autos do óbito do requerente do inventário.

7)– No seu requerimento, a cabeça de casal requereu a suspensão da instância.

8)– O Sr. Notário proferiu despacho onde não determinou a peticionada suspensão da instância e decidiu:

“Notifique-se desde já a cabeça de casal, através do seu ilustre mandatário, para no prazo de 10 dias, juntar aos autos a relação de bens em falta”.

9)– Inconformada com as decisões referidas em 4) e 8), delas recorreu a cabeça de casal, para tanto apresentando as suas alegações, com as seguintes conclusões :

“1)- Em matéria de distribuição e de contagem de prazos o processo de inventário a correr termos em Cartório Notarial está sujeito às regras previstas no Código de Processo Civil.

2)- No presente processo ocorreu a escolha livre do Senhor Notário Julgador por uma das partes e esse mesmo Senhor Notário Julgador afirmou formalmente nos autos que “Os cartórios notariais não estão abrangidos pelo princípio da independência”.

3)- Alheio ao falecimento de uma das partes e à sua não habilitação, i.e. à suspensão da instância, o Senhor Notário em crise ordenou a junção aos autos pela cabeça de casal, ora recorrente, da relação de bens.

Todavia,

4)- O presente processo de inventário, a correr termos em Cartório Notarial, tem os prazos para a prática de quaisquer actos suspensos desde o dia 15 de Julho de 2016, por forças das férias judiciais, ...

5)- ...estando a instância suspensa desde dia 26 de Julho de 2016, dia do óbito do requerente António F., óbito devidamente comunicado em 31 de Julho de 2016 e comprovado por certidão do assento de óbito junto a 10 de Agosto de 2016.

6)- Pelo que, e enquanto não tiverem sido declarados habilitados os eventuais sucessores do falecido interessado António F. não se mostra

(4)

possível a prática de actos, salvos os urgentes, o que não é o caso da apresentação pelo cabeça de casal da relação de bens, conforme foi ordenado no segundo despacho em crise.

7)- Os processos de inventário a correr termos em Cartório Notarial em municípios com dois ou mais Notários (como é o caso dos autos) devem ser previamente distribuídos segundo as regras dos artigos 203º e

segts do Código de Processo Civil, nomeadamente a regra da divisão do trabalho segundo critérios aleatórios e a regra da aleatoriedade da escolha da pessoa do julgador.

8)- Sendo certo que o Código de Processo Civil, e consequentemente a Lei do Processo de Inventário que para ele remete, não autoriza a escolha discricionária do julgador que há-de intervir no processo por uma das partes interessadas.

9)- A portaria nº 278/2013, de 26 de Agosto e o sistema informativo implementado (www.inventarios.pt) ao permitir a escolha do Notário pelo interessado que dá o impulso ao processo são consequentemente ilegais, pois violam norma da Assembleia da República e de natureza hierárquica superior (violação do critério da superioridade: Lex

superior derogat legi inferiori).

10)- O Notário em crise deveria face ao requerido pela cabeça de casal, ora recorrente, ter remetido as partes para os meios judiciais comuns de modo a que fossem os Tribunais a decidir esta questão,

especialmente complexa e fora do âmbito de atribuições e competências dos Senhores Notários.

11)- Consequentemente, os dois despachos em crise devem ser revogados e substituídos por douta sentença que:

Declare a suspensão da instância desde a data do falecimento de António F. e até que seja julgada e transitada a sua habilitação de herdeiros;

e ordene, uma vez terminada a suspensão da instância e se tal ocorrer, a distribuição do processo segundo meios aleatórios.

Assim se fazendo Justiça, como se espera do Digníssimo Tribunal da Instância Local da Comarca de Lisboa, ou aquele que se houver por competente para apreciar o presente recurso”.

10)- Não foram apresentadas contra-alegações.

11)- Foram os autos remetidos ao Juízo Local Cível de Lisboa, Juiz 11, onde foi proferido o seguinte despacho:

“Subam os autos uma vez que a questão do recurso tem que ver com a

(5)

suspensão dos autos devido ao falecimento de uma das partes.

Not”.

12)- De imediato, e após notificado tal despacho, foi o processo remetido ao Tribunal da Relação de Lisboa.

* * *

II–Fundamentação.

a)– A matéria de facto a considerar é a que consta do relatório supra e para o qual se remete.

b)– Como resulta do disposto nos artºs. 635º nº 4 e 639º nº 1 do

Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.

Perante as conclusões da alegação da recorrente, as questões em recurso são as seguintes:

- Determinar se há motivos para determinar a suspensão da instância.

- Determinar se a Portaria nº 278/2013, de 26/8, ao permitir a escolha do Notário pelo interessado que dá o impulso ao processo é ilegal (ou inconstitucional).

c)– No entanto, previamente, haverá que apurar a competência em razão da hierarquia para conhecimento do presente recurso, o que se fará ao abrigo do disposto nos artºs. 96º e 97º do Código de Processo Civil.

Ora, a apelante dirigiu o recurso para “o Digníssimo Tribunal da Comarca de Lisboa, Instância Local Civil de Lisboa (…) ou para o Tribunal que se tiver por competente”.

Aquele Tribunal determinou a subida dos autos (para o Tribunal da Relação), “uma vez que a questão do recurso tem que ver com a suspensão dos autos devido ao falecimento de uma das partes”.

Aceitamos que a questão não se apresente de resposta fácil, pela simples razão de a lei não a ter resolvido expressamente.

No entanto, a Lei nº 23/2013, de 5/3, que aprova o Regime Jurídico do Processo de Inventário, nas suas diferentes normas que tratam do tema dos recursos e da articulação dos Srs. Notários com os Tribunais em geral (vide artºs. 3º nº 7, 13º nº 2, 16º nºs. 4 e 5, 57º nº 4, 66º nºs.

1 e 3, 69º, 70º e 76º) não nos permite concluir que se tenha instituído um regime legal de recursos directos das decisões do Notário para o Tribunal da Relação e não, primeiro, para o Tribunal da 1ª instância e,

(6)

daí, depois, para a Relação, dentro das regras normais do Código de Processo Civil.

É claro que o legislador poderia ter introduzido esse sistema do recurso “per saltum”, optando por libertar, quase por completo, os Tribunais de comarca dos processos de inventário (passando o encargo para os tribunais da Relação). Mas, se fosse essa a sua intenção,

deveria tê-lo formulado expressamente.

Ao invés, nem de forma implícita (e, muito menos, de maneira expressa) se extrai daquele regime legal qualquer “revolução” nos recursos dos senhores Conservadores e Notários, que são interpostos, como é sabido, usualmente, em primeira linha, para os Tribunais de comarca, conforme aos respectivos Códigos de Registo.

Consequentemente, teremos que concluir que os recursos, neste tipo de processo especial (o inventário), continuam a ser interpostos para o Tribunal de comarca e não para o Tribunal da Relação.

Nem se poderá concluir, do teor do artº 76º do Regime Jurídico do Processo de Inventário, pela competência “ab initio” do Tribunal da Relação.

Com efeito, tal normativo reporta-se, de forma expressa, a recursos para a Relação, mas das decisões proferidas pelo Juiz da comarca, quer a que homologa a partilha, quer outras, subindo com aquele os

recursos das decisões interlocutórias proferidas ao longo do processo (no limite, mesmo que se admitisse que as decisões interlocutórias seriam recorríveis logo para a Relação, sem passar primeiro pelo Juiz da 1ª instância – o que não defendemos – então só poderiam subir à Relação com o recurso que se interpusesse da decisão homologatória da partilha e não imediatamente, como ocorreu).

Já assim era, de resto, no âmbito do anterior Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei nº 29/2009, de 29/6 (vide artºs 4º, 8º nº 2, 60º nº 3, 64º nº 1, 72º e 73º).

É de salientar, em abono da posição que aqui defendemos, que, noutros casos em que a lei passou competências dos Tribunais para o

Ministério Público e para os Notários e Conservadores, manteve sempre a possibilidade de reapreciação pelos Juízes dos Tribunais judiciais da 1ª instância e, daí, para a Relação, nos termos gerais.

Tal ocorreu, por exemplo, com a Lei nº 82/2001 de 3/8, que “autoriza o Governo a atribuir e transferir competências relativamente a um

conjunto de processos especiais dos tribunais judiciais para o Ministério Público, as conservatórias de registo civil, predial,

comercial e automóvel e os cartórios notariais” : “sem prejuízo de

(7)

reapreciação pelo tribunal” (artigo 3º, 1)) ; “remessa do processo ao tribunal judicial competente” (artigo 3º, 3), v), 6), iv)) ; “recurso da decisão do conservador para o tribunal” (artigo 3º, 3), vii), 8), 9), 10), e 11)).

Ou com o Decreto-Lei nº 272/2001, de 13/10, que operacionaliza a autorização da Lei anterior : seus artºs. 3º nº 6, 4º nº 6, 8º e 10º nº 1 (“das decisões do conservador cabe recurso para o tribunal judicial da 1ª instância competente em razão da matéria no âmbito da

circunscrição a que pertence a conservatória”).

Deste modo, entendemos que haverá que declarar o Tribunal da

Relação incompetente para apreciar o presente recurso (neste sentido, cf. Decisão Singular do Tribunal da Relação de Évora, de 5/4/2016, consultada na “internet” em www.dgsi.pt).

* * *

III–Decisão.

Pelo exposto acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em declarar este Tribunal da Relação incompetente para apreciar o recurso e ordena-se a remessa do Processo ao Juízo Local Cível de Lisboa, Juiz 11.

Sem custas

Lisboa, 25 de Setembro de 2018

(Pedro Brighton) – (Processado em computador e revisto pelo relator.)

(Teresa Sousa Henriques)

(Isabel Fonseca)

Referências

Documentos relacionados

A descrição das atividades que podem vir a ser desempenhadas pelo AVISA, além de se fundamentar na perspectiva da integralidade da atenção à saúde, envolvendo desde as ações

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo realizar testes de tração mecânica e de trilhamento elétrico nos dois polímeros mais utilizados na impressão

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

psicológicos, sociais e ambientais. Assim podemos observar que é de extrema importância a QV e a PS andarem juntas, pois não adianta ter uma meta de promoção de saúde se

Ninguém quer essa vida assim não Zambi.. Eu não quero as crianças

Este estudo, assim, aproveitou uma estrutura útil (categorização) para organizar dados o que facilitou a sistematização das conclusões. Em se tratando do alinhamento dos

Ocorre o fenômeno da crase diante dos pronomes relativos “a qual” e “as quais”, quando o verbo da oração introduzida por esses pronomes exigir a