3.2.2. Geologia
Apesar de não ter sido feito um mapeamento geológico de detalhes das áreas onde se instalam os sítios e o mapas aqui utilizados terem uma escala muito ampla (1:1.000.000), foi possível percebermos algumas características recorrentes nos sítios.
Primeiramente, segundo a classificação do RADAMBRASIL (1983) os sítios Emílio Barão, Teixeira Lopes e Mata dos Bentes se assentam sobre terreno de aluvião (Qa no Mapa 9), caracterizados por formações areno- argilosas depositadas pelos rios do Peixe, para os dois primeiros sítios e rio Novo no caso o Mata dos Bentes. Estes três sítios, mais uma vez apresentam congruências entre si, pois, geologicamente se assentam próximo a planícies fluviais de formação aluvionar, que são formações raras na região, já que prevalecem os relevos mais acentuados.
Por sua vez os aluviões onde se encontram estes sítios estão circunscritos por formações geológicas mais amplas que compõem complexos geológicos. No caso dos sítios Emílio Barão e Teixeira Lopes o aluvião onde estes se encontram está inserido segundo a classificação RADAMBRASIL (1982) no Gnaisse Piedade (p,pi – Mapa 9), caracterizado por metassedimentos gnáissicos com bandamentos finos e altitudes suborizontal (RADAM, 1983: 82). Apesar de dominar uma ampla área o Gnaisse Piedade apresenta uma petrografia muito homogênea, com predominância de rochas gnáissicas com estrutura bandada regular, que se apresentam migmatizadas e granulitizadas perto do contato com o Complexo Juiz de Fora (RADAM, 1982:
84). Dando origem a bandamentos rítmicos ricos em quartzo e feldspato, além de camadas de rochas de granulometria fina.
Quanto ao aluvião onde se insere o sítio Mata dos Bentes, este se localiza exatamente no ponto de contato entre o Complexo Juiz de Fora (ver mais adiante) e o Gnaisse Piedade, portanto inserido em uma área de grande diversidade petrográfica.
Os sítios Poca e Primavera, com relação a geologia novamente apresentam características comuns, ambos estão em terrenos elevados e portanto, tendo matriz formada por rególito originado do intemperismo autóctone das rochas do Complexo Juiz de Fora (p,jf – Mapa 9). Recebe o
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nome de Complexo Juiz de Fora a seqüência de rochas da suite charnockítica, predominantemente enderbíticas, com faixas kinzigíticas intercaladas, de idade fundamentalmente arqueana (RADAMBRASIL, 1982: 56) e que foi sucessivamente trabalhada no Ciclo Transamazônico e Brasiliano.
Petrograficamente este Complexo é formado por rochas de origem magmática e metassedimentar, estruturalmente se apresentando como migmatitios, gnaisses e cataclasitos e secundariamente quartzitos encaixados em falhas, sendo abundante a ocorrência de anfibólios, quartzos e feldspato.
Com vista a geologia da microrregião podemos mencionar ser esta uma área rica em recursos líticos para as populações que nela se instalaram. As formações geológicas de ambos os Complexos permitem a disponibilidade de quartzo e algumas rochas micocristalinas aptas a serem utilizadas nas indústrias líticas lascadas. Enquanto as rochas com granulometrias mais finas foram amplamente utilizadas pelas populações na produção de artefatos polidos.
Mais especificamente podemos mencionar o fato dos sítios instalados em aluviões poderem contar tanto com os depósitos arenosos ricos em cascalho transportado de longa distância pelos rios, rochas formadas na matriz do aluvião como o arenito e o sílex, quanto com as rochas dos Complexos encaixantes que não distam mais do que 2 km dos sítios. Quanto aos sítios localizados dentro do Complexo, estes dispunham dos recursos líticos destas formações, tendo de se deslocaram a maiores distâncias para coletarem recursos mobilizados pelos rios.
Cabe ainda ressaltar que nas proximidades dos sítios Poca e Primavera (em torno de 6 km de cada um) foi localizada uma importante fonte de quartzo hialino e fume que parece ter sido aproveitada pelos grupos. Próximo aos sítios Emilio Barão e Teixeira Lopes (10 km) encontrou-se uma fonte de nódulos de sílex, que apesar de baixa qualidade para lascamento possibilita sua utilização para uma indústria informal.
Nas proximidades de todos os sítios temos sempre áreas com depósitos argilosos, seja nos terrenos alagadiços ou margens dos cursos de água. Estas poderiam ter sido utilizadas como fontes de matéria-prima para a confecção de cerâmica, cabendo futuramente efetuar exames físico-químicos para se estabelecer correlações mais seguras (MUNITA, et alii, 2003).
95
MAPA 9
MICRORREGIÃO DE JUIZ DE FORA: GEOLOGIA
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e Projeto RADAMBRASIL Organização: Museu de Arqueologia e Etnologia - Universidade de São Paulo
Autores e Desenho: Ângelo Alves Corrêa e Danielle Gomes Samia
11 0 11 22 33 Km
-44° -45°
-22°
2 1
5
4 3
Legenda:
Divisão Administrativa:
1S ítioTeixeiraLopes
ZM-JF-01 2S ítioEmílioB arão
ZM-JF-02 3S ítioPrimavera
ZM-JN-01 4S ítioPoca
ZM-JN -02 5S ítioMatadosB entes
Mesorregião da Zona da Mata Microrregião de Juiz de Fora Sítios Arqueológicos:
Xisto Santana do Deserto- p€sd Grupo Italva- p€tv/mm
Complexo Paraíba do Sul - p€ps/m
d
Complexo Juiz de Fora - p€jf/kz Gnaisse Piedade - p€piGrupo São João Del Rei Formação Prados Grupo Andrelândia -
- p€jp Geologia:
Aluviões - Qa
Gnaisse Piedade - p€pim
d
Gnaisse Piedade - p€pimg P€as/qz 44
-52° -50° -48° -46° -44° -42° -40°
-16°
-18°
-20°
-22°
-24°
ZONA DA MATA MG
SP
ES
RJ
3.2.3. Hidrografia
Como fica claro na descrição das características de implantação dos sítios associados aos produtores de cerâmica policroma, há uma forte associação com os recursos hídricos. De modo geral, na bibliografia esta população teria ligação principalmente com cursos de águas navegáveis considerados como as principais vias de expansão (BROCHADO 1984, PROUS 1992, NOELLI 1993, ASSIS 1996 entre outros). Ao refletirmos sobre a relação da Microrregião de Juiz de Fora com a hidrografia percebemos (Mapa 10) que as nascentes de importantes bacias hidrográficas estão bem próximas, tais como as do rio São Francisco, Grande, Doce e os principais contribuintes do Paraíba da Sul. Ressaltamos ainda que o rio Grande por desaguar no rio Paraná já foi considerado uma importante via de ligação entre o interior e o litoral. Contudo, nos últimos anos vem tomando força modelos de expansão Tupi não tão ligados a vias fluviais (NOELLI 1993, SILVA et alii, 2004).
Devido à importância do fator hídrico, procuramos perceber as características de implantação dos sítios em relação a este, para isto foram elaborados mapas hidrográficos segundo a base do IBGE (1:50.000) com os sítios plotados (Mapas 11 a 15)
A primeira relação que buscamos remete a distância dos sítios em relação ao curso de água mais próximo, ficando esta distância entre 50 e 250 m. Estes cursos mais próximos aos sítios são sempre representados pela cabeceira de pequenos córregos, possuindo pequena quantidade de água, mas são perenes. Uma característica importante destes córregos menores é que mesmo logo após chuvas torrenciais suas águas ficam limpas rapidamente, enquanto os cursos maiores ficam com águas barrentas por muitos dias.
Destarte, seriam excelentes fornecedores de água potável o ano todo, e como são os mais próximos dos sítios permitem fácil acesso.
Como a bibliografia ressalta, pareceu-nos importante verificar a relação dos sítios com os cursos de água com possível navegabilidade. Verificamos empiricamente que mesmo não existindo grandes rios próximos aos sítios estes sempre estão próximos a cursos de água maiores, regionalmente
97
conhecidos como ribeirões, que poderiam ter servido de via a embarcações menores até os rios maiores, já que apresentam mais de 3 m de largura e profundidade variando de 0,5 a 1,5 m. Assim tanto os rios quantos os ribeirões foram entendidos como cursos de água principais, potencialmente navegáveis com tecnologias específicas, e apresentando distâncias entre 500 e 1500 m dos sítios.
Os sítios maiores (Emilio Barão, Teixeira Lopes e Mata dos Bentes) se apresentaram com melhor acessibilidade aos recursos hídricos, como já salientado, por ficarem em cotas mais baixas estão mais próximos tanto dos cursos de água menores quantos dos navegáveis. Ocorrendo exatamente o contrário com os sítios menores (Poca e Primavera), pois as cotas mais elevadas destes ocasionam um maior distanciamento dos recursos hídricos.
Ressaltamos ainda o fato de que estes sítios menores não ficam próximos a rios e sim a ribeirões, pelo menos no que concerne a rede hidrográfica estariam em uma posição secundária.
A relação com a hidrografia poder-se-ia apontar para a importância deste recurso na seleção de áreas escolhidas para instalar os assentamentos, aparentemente temos uma primeira relação com o fornecimento de água potável e em segundo lugar com cursos de água que permitam navegação.
Não apenas de grandes cursos, mas de todo aquele que permitisse navegabilidade mínima, com embarcações de pequeno porte, como as referidas jangadas dos Tupinambá. Tais jangadas são mencionadas por diversos cronistas, mas Gandavo nos dá uma boa descrição:
(...) jangadas, que sam huns três ou quatro páos pegados nos outros e juntos de modo que ficam á maneira dos dedos da mão estendida, sobre os quaes podem ir duas ou três pessoas ou mais se mais fore os páos(...). Tem quatorze ou quinze palmos de comprimento, e de grossura orredor, occuparam dous pouco mais ou menos” (GANDAVO, 1980: cap. X)
Assim consideramos viável que ribeirões, como os próximos aos sítios Poca e Primavera, pudessem ser utilizados como vias de acesso a outros assentamentos próximos pertencentes ao mesmo tecoaba e ao curso do Rio Novo que dista em média 2,5 km do primeiro e 4 km do segundo. Os ribeirões
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e rios próximos aos sítios seriam aonde os indivíduos iriam para os banhos e atividades de pesca, caça e coleta.
Ao cruzarmos fatores hidrográficos e topográficos, percebemos que todos os sítios estão implantados em elevações que apresentam pelo menos uma vertente com declividade mais suave voltada para os cursos de água (Mapas 4 a 8). Isto parece importante se pensarmos que diariamente teria de ser transportada água para os assentamentos, seja para consumo, preparação de alimentos e bebidas ou fabricação de cerâmica.
Além das considerações já postas sobre a importância dos recursos hídricos ainda podemos mencionar o seu uso para a obtenção de recursos alimentares, já que a pesca e coleta de molusco é sempre apresentada como importante fonte alimentar (NOELLI, 1993; PROUS, 1992; ASSIS, 1996). Deste modo os ribeirões e rios próximos aos sítios permitem a pesca com anzol, arco e flecha, tridente, lança, peneiras, puçás, vários tipos de redes, pari, nassa, ictiotóxicos, currais, etc. (NOELLI et alii, 1995/96: 435-436). Ainda atualmente a população pesca nos ribeirões da região utilizando, anzol, redes, peneiras e puçás pegando peixes e camarões de água doce (pitú), a construção de estruturas como pari não fica descartada, já que existem locais com corredeiras que permitem sua instalação. Além da pesca e coleta, a proximidade com cursos de água e áreas alagadas permitiriam a caça de animais associados a estes ambientes como os anfíbios (rãs), répteis (jacarés, tartarugas e jabutis e grandes cobras), mamíferos (ratos do banhado, preás, capivaras) e aves (NOELLI, 1993). Havendo também muitos recursos vegetais associados a estes ambientes hídricos (ver mais adiante).
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MAPA 10
BRASIL E MICRORREGIÃO DE JUIZ DE FORA : HIDROGRAFIA
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Organização: Museu de Arqueologia e Etnologia - Universidade de São Paulo Autores e Desenho: Ângelo Alves Corrêa e Danielle Gomes Samia
Legenda:
Estados
Microrregião de Juiz de Fora
30 0 30 60 90 120 Km
RioXingu RioJuru
RioN egro
Rio Madeira
Rio Jari
RioParaguai RioGuaporé
RioGrande RioAmazonas
RioTapajós RioSolim
ões
Rio Uruguai Rio Iguaçu
Rio Parnaíba Rio Doce
Rio Pia uí
RioJequitinhonha
Rio Parapanema
RioPelotas
RioParaíba
Rio Ibicuí
RioTo cantins
RioSãoFrancisco RioAraguaia
RioParnaíba
RioParaná
Sítios Arqueológicos Hidrografia
NN
N N N
Rio ParaíbadoSul
RioPomba RioPiranga
Rio das Mortes
RioMogi-Guaçu
RioParaibuna RioG
rande
RioDoce
RioParaopeba
Rio São Francisco aselhVsadioR
RioPreto
RioPiabanha
MG
SP
ES
RJ
RioMuriaé
RioPeixe
RioNovo
7620
7618
7616
7614
702 704 706
700
NQ
Sítio Primavera/ZM-JN-01
MAPA 11 HIDROGRAFIA
SÍTIO ARQUEOLÓGICO PRIMAVERA SÃO JOÃO NEPOMUCENO/MG
R oi
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Ribei rão
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Hildebrando r Futado e
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H rique en
0 0,5 1,0
0,5
Km 1:50.000 Fonte: IBGE, 1976/Escala:1:50.000
Org: Museu de Arqueologia Etnologia - USP Autor: Ângelo Alves Corrêa Des: Danielle Gomes Sam ia
Data: Fevereiro/2007
Hidrografia Legenda:
NQ
MAPA 12 HIDROGRAFIA
SÍTIO ARQUEOLÓGICO POCA SÃO JOÃO NEPOMUCENO/MG
7618
7616
7614
7612
710 712 714 716
Rio Novo Cachoeira
a d Fumaça
ber Ri
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Roça
Ribeirão do
Tambor
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Taru
Fonte: IBGE, 1976/Escala:1:50.000 Org: Museu de Arqueologia Etnologia - USP
Autor: Ângelo Alves Corrêa Des: Danielle Gomes Sam ia
Data: Fevereiro/2007
SítioPoca ZM-JN-02 Hidrografia
Legenda:
0 0,5 1,0
0,5
Km 1:50.000
642 644 646
7592
7590 640
7594
7588
NQ
Sítio Teixeira Lopes/ZM-JF-01
MAPA 13 HIDROGRAFIA
SÍTIO ARQUEOLÓGICO TEIXEIRA LOPES JUIZ DE FORA/MG
Rio
do
eix
P e
Cóerrgo da Sud
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0 0,5 1,0
0,5
Km 1:50.000 Fonte: IBGE, 1976/Escala:1:50.000
Org: Museu de Arqueologia Etnologia - USP Autor: Ângelo Alves Corrêa Des: Danielle Gomes Sam ia
Data: Fevereiro/2007
Hidrografia Legenda:
642 644 646
7592
7590 640
7594
7588
NQ
Fonte: IBGE, 1976/Escala:1:50.000 Org: Museu de Arqueologia Etnologia - USP
Autor: Ângelo Alves Corrêa Des: Danielle Gomes Sam ia
Data: Fevereiro/2007
Legenda:
Sítio Emílio Barão/ZM-JF-02
MAPA 14 HIDROGRAFIA
SÍTIO ARQUEOLÓGICO EMÍLIO BARÃO JUIZ DE FORA/MG
0 0,5 1,0
0,5
Km 1:50.000
Rio
do
Peixe
óreo C
rg ra Ser
da Saudade
Rio
do
P ixee
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Córrego da Se arr Córrego
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Ribeirão
São
Mateus
R eã ib ir o
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Arrependido
C armo
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Hidrografia
688 690 692 694
7624
7622
7620
7618
NQ
Sítio Mata dos Bentes
MAPA 15 HIDROGRAFIA
SÍTIO ARQUEOLÓGICO MATA DOS BENTES RIO NOVO/MG
Rio
Novo
Ribei orã
Ponte
Rio
Novo
óre o Cr
g
ar l C ongo a
o Córreg
Santa
Fonte: IBGE, 1976/Escala:1:50.000 Org: Museu de Arqueologia Etnologia - USP
Autor: Ângelo Alves Corrêa Des: Danielle Gomes Sam ia
Data: Fevereiro/2007
Legenda:
Hidrografia
0 0,5 1,0
0,5
Km 1:50.000