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Open Programa Educação Inclusiva Direito à Disidade: estudo de caso sobre estratégia de multiplicação de políticas públicas.

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Academic year: 2018

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Universidade Federal da Paraíba

Centro de Educação

Programa de Pós-Graduação em Educação

Mestrado em Educação

Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade:

Estudo de Caso sobre Estratégia de Multiplicação de

Políticas Públicas

MARCIA TORRES NERI SOARES

(2)

MARCIA TORRES NERI SOARES

Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade:

Estudo de Caso sobre Estratégia de Multiplicação de

Políticas Públicas

Dissertação apresentada à banca examinadora no Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGE, da Universidade Federal da Paraíba, pela mestranda Marcia Torres Neri Soares, sob orientação da Profª Drª Windyz Brazão Ferreira como requisito para a obtenção do título de Mestre.

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S676p Soares, Marcia Torres Neri.

Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade: estudo de caso sobre estratégia de multiplicação de políticas públicas / Marcia Torres Neri Soares.- João Pessoa, 2010.

135p.

Orientadora: Windyz Brazão Ferreira.

Dissertação (Mestrado) – UFPB/CE.

1.Educação. 2.Política educacional inclusiva. 3.Estudos Culturais. 4.Multiplicação.

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MARCIA TORRES NERI SOARES

Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade:

Estudo de Caso sobre Estratégia de Multiplicação de

Políticas Públicas

Apresentada em 05 de outubro de 2010

COMISSÃO EXAMINADORA:

_____________________________________________

Profª Drª Windyz Brazão Ferreira – Orientadora

Universidade Federal da Paraíba

_____________________________________________

Profª Drª Ana Dorziat Barbosa de Melo

Universidade Federal da Paraíba

_____________________________________________

Profª Drª Márcia Angela Aguiar

Universidade Federal de Pernambuco

_____________________________________________

Profª Drª Maria Eulina Pessoa de Carvalho

Universidade Federal da Paraíba

_____________________________________________

Profª Drª Rosana Glat

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AGRADECIMENTOS

Ao Deus soberano, pelo provimento físico, emocional e financeiro durante o desenvolvimento de todo o Curso, marcado pela distância entre a Bahia e a Paraíba.

A minha mãe Maria Neri, grande e fiel incentivadora, por me apoiar em todos os instantes com firmeza e sabedoria imensuráveis, estando o seu amor e esforço circunscritos em cada página, título, aqui delineados.

A meu pai Nitovaldo Torres, de quem o abraço não pude receber, mas com o qual aprendi muitas coisas, dentre elas, a garra para continuar mesmo quando tudo parecia humanamente impossível.

As minhas filhas Fernanda e Raquel, pelo apoio representado, entre tantas manifestações de carinho, na descoberta dos lanches que escondiam em minha bolsa para me alimentar durante as madrugadas em saguões de aeroportos.

Aos meus irmãos Marcos, Débora e Marcelo, pelo carinho, cuidado, força e atenção dispensados.

Aos meus familiares que vibraram a cada conquista e fizeram dessas, motivo para uma grande vitória.

À professora Windyz Brazão Ferreira, minha orientadora, pelo trabalho sério e sistemático de orientação. Acreditando em mim muito mais do que eu mesma, ela me fez amadurecer academicamente e refletir sobre a vida e seus desdobramentos.

A seu Neto, por me conduzir aos destinos com muito cuidado, tornando-se um amigo a quem muitas vezes confessei o meu cansaço.

A Alê, Oli, e Adenize, pela rede de apoio construída nas dificuldades e também vitórias, sendo a nossa orientadora responsável por esse elo.

A dona Creuza, seu Agostinho e toda a sua família, pelo acolhimento ao me receber, fazendo-me sentir perto dos fazendo-meus, dado o calor, cuidado e amor recebidos.

Às amigas Conça, Reja, Paula (companheira de sonhos), Arilu, Bibi, Guenda, Déa, Janedalva e Samara, pelo apoio traduzido sob diferentes formas de ajuda antes e durante o Curso.

Aos colegas da Universidade do Estado da Bahia Campus XXI Ipiaú, pelo empenho e sensibilidade ao conceder a liberação para a realização do Curso.

Aos professores e funcionários do PPGE/UFPB, com os quais aprendi e usufrui de relevantes contribuições.

Às colegas/amigas: Jay, Gil, Rose, Paula, Marla, Dôra, Sol e Gê, que de diferentes formas colaboraram na realização desse trabalho.

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Para ser grande sê inteiro: nada seu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive.

(7)

RESUMO

A estratégia de multiplicação no âmbito de políticas públicas de inclusão do Ministério da Educação

MEC, objeto do presente estudo, vem sendo amplamente utilizada no Brasil como forma de alcançar todos os municípios de um país de dimensão continental. Em consonância com diretrizes internacionais, por meio de diferentes programas, o MEC adota essa estratégia, a partir da qual organiza a formação de multiplicadores de municípios localizados nas cinco regiões do país. O

presente estudo tem como campo de pesquisa especificamente o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade – PEI: DD, implantado no Brasil desde o ano de 2003 pela Secretaria de Educação

Especial Seesp. Muito embora tal estratégia constitua prática corrente nas ações políticas do governo federal, ainda são desconhecidos os estudos que se detenham à gênese, acompanhamento e conhecimento dos resultados do processo de multiplicação no Brasil. Esta investigação, realizada no

campo dos Estudos Culturais e Educação Inclusiva, adotou a metodologia Estudo de Caso e a Teoria Fundamentada para a construção teórica a partir dos dados colhidos no campo de pesquisa. Foram investigados cinco municípios-polo, a saber: Salvador, Feira de Santana, Juazeiro, Vitória da Conquista e Barreiras, no período de 2003-2008. O trabalho alicerçou-se na pesquisa qualitativa através da metodologia de estudo de caso. Participaram da pesquisa um total de 15 representantes da esfera municipal, um representante da esfera estadual e cinco representantes da esfera federal. Primando pela ampla variedade de evidências, como técnicas de pesquisa, além da entrevista semiestruturada, foram utilizados levantamento de documentos oficiais, a linha de tempo da mudança preenchida apenas pelos participantes que julgaram ter havido mudanças significativas em sua prática que pudessem estar associadas ao Programa, meios de comunicação e o Diário de Pesquisa – DPq, no qual foram registradas sensações e informações colhidas sob o olhar da pesquisadora em seu itinerário de pesquisa. Os dados foram analisados através de semelhanças, contrastes e barreiras entre os municípios campo da pesquisa. Dada a dimensão territorial do país, os achados indicam que há similaridades nas ações realizadas pelos municípios do PEI: DD e inúmeras barreiras, inclusive, inerentes à própria política administrativa do governo federal, que engessam os agentes de

multiplicação. Também ilumina a urgência da implementação de estudos avaliativos e comparativos

dos resultados da aplicação da estratégia de multiplicação de políticas públicas de inclusão visando a

analisar sua efetividade no âmbito nacional e reajustá-lo à realidade local e regional, além de contribuir para assegurar a otimização do investimento na melhoria da qualidade da educação para todos, incluindo aqueles com deficiência. Com o estudo, espera-se contribuir para o avanço do debate e conhecimento na área de políticas públicas e, mais especificamente, das estratégias de disseminação de políticas educacionais de inclusão no Brasil.

Palavras-chave: Multiplicação – Política Educacional Inclusiva – Estudos Culturais.

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ABSTRACT

The multiplication strategy within the range of inclusion public policies from the Education Ministry -MEC, object of the present study, has been widely used in Brazil as a way of reaching all boroughs in this country of continental dimensions. According to the international guidelines, through different programs, the Education Ministry has adopted this strategy, in order to organize the multipliers formation, from boroughs that are situated in the five regions of the country. The research field of this study is specifically the Program Inclusive Education: the right to diversity - PEI: DD, established in Brazil by The Special Education Secretary – Seesp-since 2003. Although this strategy has been current practice in the political actions of the federal government, the studies that hold the genesis, monitoring and knowledge of the multiplication process results in Brazil are still unknown. This investigation, conducted in the field of Cultural Studies and Inclusive Education, adopted the methodology Case Study and Grounded Theory for the theoretical construction based on data collected in the research field. Five boroughs, chosen as pole, were investigated : Salvador, Feira de Santana, Juazeiro, Vitoria da Conquista and Barreiras, from 2003 to 2008. The work was grounded on the qualitative research through the case study methodology. A total of 15 municipal representatives, one representative from the state and five, from the federal level participated in the research. The focus was a wide variety of evidences, as research techniques, besides the semi-structured interview, a survey of official documents and the change timeline were used by the participants who judged that there had been significant changes in their practice that could be associated to the Program, Media and the Research Diary- PDS, in which sensations and information were recorded under the researcher view in her research itinerary. The data were analyzed through similarities, contrasts and barriers among the boroughs that are field of the research. Considering the territorial dimension of our country, the findings indicate that there are similarities in the actions realized by the PEI boroughs: DD and the innumerable barriers inherent to the own administrative policy from the federal government that ties the multiplication agents. It also illuminates the urgency of the implementation of evaluative and comparative studies from the results of the multiplication strategy application to the public policies of inclusion, aiming to analyze its effectiveness at the national level and reset it to the local and regional reality, in addition to helping ensure the optimization of investment in improving the quality of education for all, including those with disabilities. The study also is expected to contribute to the advancement of the debate and knowledge on the area of public policies and, more specifically, the strategies of dissemination of inclusion educational policies in Brazil.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURAS

FIGURA 01 – MAPA DO TERRITÓRIO DA BAHIA 70 FIGURA 02 – FLUXOGRAMA CAMINHOS OFICIAIS DA MULTIPLICAÇÃO DA

POLÍTICA DE INCLUSÃO 79 FIGURA 03 – DIAGRAMA DO FLUXO DE MULTIPLICAÇÃO 84-85 FIGURA 04 – MULTIPLICAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA DE INCLUSÃO NO PEI: DD GESTORES E EDUCADORES 110

GRÁFICOS

GRÁFICO 01 – FREQUÊNCIA DE TEMÁTICAS ABORDADAS NOS POLOS 88 GRÁFICO 02 – PRINCIPAIS DIFICULDADES NA EXECUÇÃO DO PEI: DD 106

QUADROS

QUADRO 01 – ESTABELECIMENTOS DE EDUCAÇÃO BÁSICA POR REGIÕES 35 QUADRO 02 – CAMPO DA PESQUISA 50-51 QUADRO 03 – ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO DE CASO 54 QUADRO 04 – DETALHAMENTO DO CAMPO DA PESQUISA: ENTREVISTAS 56-58

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AEE – Atendimento Educacional Especializado

Anped – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação Bird – Banco Internacional para a reconstrução e o desenvolvimento BM – Banco Mundial

BPC - Programa Benefício da Prestação Continuada

Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Cenesp – Centro Nacional de Educação Especial

CEP/HULW - Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley Conade – Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência

Corde – Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência Dese – Departamento de Educação Supletiva e Especial

DF – Distrito Federal DPq – Diário de Pesquisa EC – Estudos Culturais

FHC – Fernando Henrique Cardoso FMI – Fundo Monetário Internacional

FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

Fundeb – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

Fundef – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDA – Associação Internacional para o desenvolvimento Inep – Instituto nacional de estudos e pesquisas

MEC – Ministério da Educação

NEE – Necessidades Educacionais Especiais ONG – Organização Não Governamental ONU – Organização das Nações Unidas PAR – Plano de Ações Articuladas

PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola

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PNUD – Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas

Proinfo – Programa Nacional de Formação Continuada em Tecnologia Educacional PTA – Plano de Trabalho Anual

SEB – Secretaria de Educação Básica

Secad – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade Secrie – Secretaria de Inclusão Educacional

SEDH – Secretaria Especial dos Direitos Humanos

Seea – Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo Seesp – Secretaria de Educação Especial

Seneb – Secretaria Nacional de Educação Básica Sespe – Secretaria de Educação Especial

TGD – Transtornos Globais do Desenvolvimento UAB – Universidade Aberta do Brasil

UFPE – Universidade Federal de Pernambuco UFPB – Universidade Federal da Paraíba

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

1 A ESTRATÉGIA DE MULTIPLICAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA EDUCACIONAL EM TERRITÓRIO NACIONAL 18

1.1 Do global ao local: a utilização da estratégia de multiplicação em políticas públicas de inclusão no Brasil 20

1.2 Background para a implantação de estratégia de multiplicação de políticas públicas: o papel das agências financiadoras multilaterais 28

1.3 A política de inclusão social do governo Lula e atenção a grupos vulneráveis 33

1.3.1 A multiplicação no Brasil e os desafios: estratégia de aproximação? 36

1.3.2 A esfera federal e ações para oferta de atendimento as necessidades de alunos com deficiência no Brasil 38

1.3.3 Estudos sobre o “Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade” e implicações para a investigação da estratégia de multiplicação à luz dos Estudos Culturais 41

2. CAMINHO METODOLÓGICO 45

2.1 O “olho de dentro”: desvencilhando-me das vendas 47

2.2 Delimitação do período foco do estudo 49

2.3 Acesso 52

2.4 Procedimentos 52

2.4.1 Formas complementares de investigação: outros instrumentos 60

2.5 Projeto Piloto 67

3. “ALEGRIA, ALEGRIA É O ESTADO QUE CHAMAMOS BAHIA”: MULTIPLICANDO POLÍTICAS PÚBLICAS NA “MISTURA” DE POVOS E CULTURAS 69

3.1 Caracterização do Estado da Bahia e Polos do PEI: DD 70

3.1.2 Ao chegar a Bahia 71

3.2 Discurso oficial: documentos e declarações que revelam a concepção governamental 75 3.2.1.A esfera política federal e a estratégia de multiplicação 77

3.2.2 Caracterização para a multiplicação da política de inclusão, fluxo, similaridades, diferenças e entraves 80

CONCLUSÕES: A ESTRATÉGIA DE MULTIPLICAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA DE INCLUSÃO À LUZ DOS ESTUDOS CULTURAIS 112

REFERÊNCIAS 124

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INTRODUÇÃO

No panorama educacional caracterizado por significativos avanços, a educação inclusiva tem recebido merecido destaque no contexto acadêmico (CARVALHO, 2004; FERREIRA, 2006; MARTINS, 2006; GLAT, 2007), instituída através de mecanismos legais nacionais e internacionais1 que subsidiam, entre outras determinações, a inclusão de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades/superdotação (BRASIL, 2008) em classes comuns do ensino. Com campo de estudo próprio dentro da educação geral, dado o alijamento de que foram vítimas pessoas com deficiência no decorrer da história brasileira (FIGUEIRA, 2008; JANNUZZI, 2006; FERREIRA; GUIMARÃES, 2003; MAZZOTTA, 1995), a educação inclusiva possui também políticas públicas específicas para ações voltadas à garantia dos direitos em atendimento as suas particularidades.

A área de políticas públicas tem alcançado expressivo crescimento no âmbito acadêmico do Brasil (ARRETCHE, 2003; FARIA 2003; SOUZA, 2003; AZEVEDO, 2004). Tal crescimento atribui-se ao interesse de várias áreas do conhecimento, e não só da ciência política, na realização de pesquisas sobre propostas governamentais, e à legitimação do campo de políticas públicas em diferentes áreas como academia, órgãos governamentais e centros de pesquisa, estes últimos com tradição na área. Vários departamentos da ciência política também têm contribuído para a legitimação da área com criação de cadeiras em políticas públicas. Este é um dos indícios que sinalizam a relevância da área em diversas instituições acadêmicas (SOUZA, 2003).

A atualidade das áreas e o interesse por políticas públicas de inclusão influenciam o interesse pela presente pesquisa, que tem especificamente como objeto de estudo a estratégia de multiplicação, no território nacional, da política pública de inclusão para estudantes com deficiência.

A história ilumina que a escola brasileira foi concebida de forma elitista, iniciando-se com a escolarização de poucos privilegiados através dos colégios jesuíticos, que enquanto formavam jovens que realizariam estudos superiores na Europa (LIBÂNEO, 2002), catequizavam e instruíam o índio. Nesse sentido, a garantia de um projeto de escola para

1Destaco a Constituição Federal (BRASIL, 1988), a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), a Lei de

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todos no Brasil foi postergada para um futuro muito distante (FERRARO, 2008). Tal elitismo educacional acabou por marginalizar um significativo número de crianças em idade escolar: um Estado mantenedor da educação pública no Brasil só veio a ocorrer no final do século XIX e começo do século XX, quando do início do processo de industrialização no país (LIBÂNEO, 2002). Sendo assim, a educação para todos não encontrou espaço favorável à sua concretização.

Nesse contexto histórico-político e econômico, descaracterizado pela ausência de iniciativas estatais e consequente dificuldade na organização da oferta de escolarização básica para todos em um país de vasta extensão territorial como o Brasil (PINTO, 2000), somado à crescente influência de organismos internacionais multilaterais pós-fundação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1946, podemos extrair a complexidade inerente aos processos de expansão da educação para incluir alunos de grupos historicamente marginalizados dos sistemas educacionais. Processos esses que implicam, primeiro, políticas públicas bem definidas quanto a assegurar o direito de todos à educação, e, segundo, estratégias de disseminação eficientes, particularmente em países com grande dimensão territorial.

É nesse panorama que a estratégia de multiplicação de políticas públicas de inclusão vem sendo amplamente utilizada no Brasil como forma de alcançar todos os municípios de um país de dimensão continental. Embora sua utilização seja maciçamente adotada nas propostas governamentais brasileiras, são desconhecidos os estudos que se detenham à gênese, acompanhamento e conhecimento dos resultados da estratégia de multiplicação.

Ao realizar a presente pesquisa foi feito um levantamento bibliográfico2 de estudos realizados no campo do PEI: DD.3 Foram identificados treze estudos, os quais serão apresentados no primeiro capítulo. Desses estudos, três, especificamente, abordam o PEI: DD e indicam contribuições relevantes sobre o processo de multiplicação, seja do ponto de vista do processo de implementação da estratégia (KASSAR; GARCIA, 2009), seja através da confrontação do discurso oficial e práticas sociais (CAIADO; LAPLANE, 2009), ou ainda através da percepção dos gestores do PEI: DD (MARINS; MATSUKURA, 2009). As pesquisas identificadas foram imprescindíveis ao desenvolvimento da presente investigação porque além de indicar a relevância do estudo no heterogêneo campo político e educacional

2 O levantamento foi realizado em periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(CAPES), na biblioteca da Universidade de São Paulo (USP), em referências bibliográficas de livros sobre políticas públicas de inclusão e em anais de eventos nacionais.

3 Neste estudo, adotei a sigla PEI: DD para denominar o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade

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brasileiro, permite a ampliação da análise sob a perspectiva dos Estudos Culturais (EC), como objetivo realizar.

Caracterizadamente marcado por profundas desigualdades sociais e econômicas, o Brasil, país em desenvolvimento, recebe através de diretrizes internacionais a orientação de intervenção com efeito multiplicador a fim de suprir tanto a carência de recursos humanos qualificados na área de necessidades educacionais especiais, como expandir conhecimentos e práticas específicos sobre educação inclusiva no território nacional. Tal estratégia é proposta uniformemente a despeito das características e dimensões de um país como o Brasil.

Por isso, a investigação ora apresentada se insere no campo dos EC (SILVA, 2007; ESCOSTEGUY, 2006; HALL, 2006; COSTA, 2000; WOODWARD, 2000), dentro do qual são desenvolvidos estudos e teorizações acerca do valor social de grupos em desvantagem nas relações de poder. A inserção da pesquisa justifica-se, portanto, pelo fato do campo dos EC ser imprescindível ao estudo da estratégia de multiplicação num país visivelmente marcado por diferenças políticas, econômicas, sociais e culturais. Outra justificativa reside na necessidade de incluir os estudos concernentes à inclusão do grupo constituído pelas pessoas com deficiência, historicamente à margem da ciência nos EC, pois assim como outros grupos que já recebem merecida atenção, como negros e mulheres, esse grupo também poderá se valer de seu substrato teórico na clarificação das relações de poder socialmente estabelecidas.

O referencial teórico dos EC indica a ausência do tema deficiência na literatura, muito embora apresente conceitos relevantes para o presente estudo, como cultura, identidade e diferença. Nesse sentido, essa dissertação defende que os EC constituem o lugar de direito do

debate sobre o grupo social constituído pelas pessoas com deficiência e por isso me apoio em

suas contribuições teóricas para analisar a estratégia de multiplicação na disseminação das políticas públicas destinadas especificamente a esse grupo, tendo como referência as ações do “Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade” – PEI: DD (BRASIL, 2005) da Secretaria de Educação Especial (Seesp) do Ministério da Educação (MEC).

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desde a década de 1970, década caracterizada pelos empréstimos financeiros e influência política no contexto nacional, até os seus reflexos na atualidade. Ainda nesse capítulo apresento o contexto político favorável à adoção da estratégia de multiplicação nas políticas públicas de inclusão no Brasil e as contribuições teóricas já existentes sobre o PEI: DD, bem como detalho o referencial teórico concernente à utilização da estratégia de multiplicação no Brasil.

No capítulo dois apresento o “Caminho Metodológico” deste estudo, no qual trato a metodologia de estudo de caso e os instrumentos de coleta de dados utilizados no desenvolvimento da pesquisa qualitativa. Esta investigação adotou a metodologia de estudo

de caso e a teoria fundamentada para a construção teórica a partir dos dados colhidos no

campo de pesquisa. A adoção da metodologia se justifica pela importância da utilização do

estudo de caso na investigação de fenômenos complexos (YIN, 2005). Detalho aqui os

procedimentos adotados nesta investigação, a fim de fornecer ao leitor (a) a compreensão de todo o caminho percorrido.

Tiago de Melo diz que “não tenho um caminho novo, o que tenho é um jeito novo de caminhar”.4 A afirmação do poeta define as peculiaridades próprias à forma com a qual cada

pesquisador envereda em seu próprio trabalho. Nesse “jeito novo de caminhar”, a presente pesquisa parte dos dilemas na escolha da metodologia e dos instrumentos no levantamento e elucidação de dados relevantes à investigação. O meu “jeito de caminhar” começa em 2001 com a minha função de coordenadora do setor de educação especial de um dos Polos investigados. Exercendo a citada função tive a oportunidade de, juntamente com a chefe do setor, participar do I Seminário de Formação para Gestores e Educadores para a Educação

Inclusiva do Programa Educação Inclusiva Direito à Diversidade, no ano de 2003, realizado

em Brasília – DF, como representantes do Polo.

O setor que trabalhava na identificação do número de alunos com Necessidades Educacionais Especiais (NEE)5 matriculados na rede regular de ensino, e assim criar parcerias com outras secretarias e instituições para os devidos encaminhamentos e orientações a educadores, familiares e alunos, recebeu o convite através de correspondência enviada pelo MEC, que solicitava o envio de dois gestores da Seduc, para participação no I Seminário.

Através de Carta de Acordo assinada pelo secretário da educação do município, foi concretizada a adesão ao PEI: DD, tendo a prefeitura se comprometido a cumprir as

4 Disponível em: http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=entrevistas/docs/thiagodemelo

5

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exigências da Carta e a beneficiar-se dos projetos e ações subsequentes. Desde então, o PEI: DD passa a permear as ações desenvolvidas na esfera municipal de ensino.

Da participação no PEI: DD surge o desejo de acompanhar os desdobramentos do mesmo, já que os dados disponíveis no site do MEC apenas baseiam-se na ampliação de matrículas na rede regular de ensino. O fato de ter participado da primeira edição do PEI: DD e acompanhar a realização dos seminários locais em meu município desde o ano de 2004 também me trouxe algumas inquietações tais como: “De que forma poderíamos disseminar os conteúdos da educação inclusiva nos municípios compreendidos pela nossa área de abrangência? Em quais condições os municípios da área de abrangência implementariam suas ações? Como trabalhar os conteúdos sugeridos pelo MEC junto a municípios com realidades tão díspares?” Estes questionamentos me encaminharam ao reconhecimento de que a

multiplicação de diretrizes de políticas públicas tem sido importante mecanismo utilizado no

âmbito de vários Programas implementados pelo MEC em suas propostas de formação e disseminação de políticas educacionais, porém os estudos sobre tal fenômeno são escassos.

Por considerar o papel central da multiplicação de políticas públicas e a ausência de detalhamento dos processos inerentes a essa estratégia governamental, acompanhamento das ações e análise dos resultados da mesma, emerge a motivação para analisar a construção do processo de multiplicação na disseminação da política pública de inclusão de crianças com necessidades diferenciadas nas escolas públicas brasileiras, tendo como referência os desdobramentos do PEI: DD nos municípios-polo do estado da Bahia.

Dessa forma, o objeto de estudo em questão neste trabalho diz respeito à aplicação, implicações e efeitos do processo de multiplicação utilizado pelo governo brasileiro através do PEI: DD, na disseminação do sistema educacional inclusivo.

E finalmente, no capítulo três, “Alegria, alegria é o estado que chamamos Bahia”:

multiplicando políticas públicas na “mistura” de povos e culturas, compartilho a riqueza

da coleta e análise dos dados realizada com base nas semelhanças, diferenças contrastantes e

barreiras identificadas nos três níveis do fluxo da multiplicação apresentados no capítulo.

(18)

a urgência da implementação de estudos avaliativos e comparativos dos resultados da aplicação da estratégia de multiplicação de políticas públicas de inclusão visando a analisar sua efetividade no âmbito nacional e reajustá-lo à realidade local e regional.

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CAPÍTULO 1

A ESTRATÉGIA DE MULTIPLICAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA EDUCACIONAL EM TERRITÓRIO NACIONAL

Este capítulo tem como foco a estratégia de multiplicação da política pública no campo da educação e como objetivo caracterizar as ações de multiplicação adotadas pelo governo federal, as articulações entre a política nacional de inclusão educacional de estudantes com deficiência e o contexto da política de educação brasileira inserida no contexto macro das diretrizes internacionais e fatores condicionantes determinados pelas agências internacionais. O sistema de multiplicação de políticas públicas de inclusão amplamente utilizado nas ações do governo federal brasileiras advém da Organização das Nações Unidas (ONU), cujos setores estabelecem diretrizes internacionais com a finalidade de orientar as políticas nacionais dos Estados-Membros.

No caso específico da política de inclusão educacional de estudantes com necessidades educacionais especiais, o documento-chave que dissemina tal orientação é a Declaração de Salamanca sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais (UNESCO, 1994) publicada em 1994 pelo setor da ONU responsável pela educação, ciência e cultura e denominado United Nations Education, Science and Culture Organization, ou simplesmente UNESCO. A Declaração de Salamanca (idem), ao versar sobre Orientações para Ações em Níveis Regionais e Internacionais, estabelece, em seu inciso III, a necessidade de cooperação internacional entre organizações governamentais e não governamentais, regionais e inter-regionais com vistas ao desenvolvimento de sistemas educacionais e escolas inclusivas. Para tanto, o documento explicita que a

assistência técnica [oferecida às secretarias de educação e às escolas das redes de ensino] deveria ser direcionada a áreas estratégicas de intervenção com um efeito multiplicador, especialmente em países em desenvolvimento (idem, p. 16. Grifos meus.).

A citação acima revela que as diretrizes internacionais para a inclusão colocam a ênfase da orientação nos „países em desenvolvimento‟ e em „áreas estratégicas de intervenção‟, as quais, no caso do Brasil, segundo Ferreira (2006), dizem respeito aos grupos sociais constituídos pelas pessoas com deficiência, aos indígenas, aos afrodescendentes, ciganos e homossexuais, entre outros.

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estratégia para suprir a carência de recursos humanos qualificados na área de necessidades educacionais especiais. Exatamente por isso a diretriz acima citada orienta para que a cooperação internacional apoie o “lançamento de projetos-piloto que objetivem testar abordagens e originar capacitação” (UNESCO, 1994, p. 16).Em outras palavras, as agências internacionais que vão cooperar com o desenvolvimento de políticas de inclusão por meio de

financiamento, recursos humanos e técnicos (consultores, especialistas) e materiais (equipamentos, materiais de formação) devem apoiar as iniciativas governamentais que lancem „projetos-piloto‟, a partir dos quais, teoricamente, podem ser desenvolvidas abordagens locais mais efetivas.

A utilização de projetos-piloto para a disseminação de política pública de inclusão, ainda que através de propostas previamente testadas, baseia-se em países com realidades bem distintas à do Brasil, constituindo-se em modelos pensados fora do contexto local e que, por isso, não correspondem às expectativas e necessidades de um país acentuadamente marcado pela diversidade regional e cultural que caracteriza disparidades e desigualdades sociais de toda sorte.

Uma vez signatário de uma declaração da ONU, em princípio, o Chefe de Estado de um país (ou seu representante oficial) assume o compromisso oficial – que não é compulsório (!) – de implementar as diretrizes estabelecidas nas políticas públicas de seu país. Dessa forma, a análise de tais processos deve considerar inúmeros fatores locais que influenciam as políticas públicas de cada nação. Portanto, a política pública de inclusão não deve ser analisada desvinculadamente da sociedade dentro da qual se insere porque “a educação, como qualquer política social, é também fruto de luta da sociedade organizada, (.) [e] não há como entender o movimento de lutas desvinculadas do movimento da sociedade” (KASSAR, 2004, p. 64).

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Dessa forma, a fim de analisar a estratégia de multiplicação da política de inclusão educacional, especificamente destinada aos estudantes com deficiência, da Seesp/MEC através do PEI: DD, é necessário abordar a relação entre a educação entendida como política pública e sua articulação com o Estado e com a sociedade (KASSAR, 2004).

1.1 Do global ao local: a utilização da estratégia de multiplicação em políticas públicas de inclusão no Brasil

No estudo sobre os fatores relacionados à política pública, Höfling (2001) afirma que as mesmas devem sempre estar circunscritas no interior do Estado, dentro do qual são nacionalmente implementadas e se desenvolvem. Então, as políticas públicas não podem ser reduzidas a políticas estatais porque é do Estado a responsabilidade “quanto à implementação e manutenção [das políticas públicas] a partir de um processo de tomada de decisões que envolve órgãos públicos, diferentes organismos e agentes da sociedade relacionados à política implementada” (HÖFLING, 2001, p. 31). Com este argumento, a autora clarifica a organização e a função distinta entre o Estado, o Governo e a Política Pública:

 o Estado deve ser considerado como o conjunto de instituições permanentes que possibilitam a ação do governo.

 o Governo deve ser entendido como o conjunto de programas e projetos que configuram a orientação política de um determinado governo assumindo e desempenhando as funções de Estado num dado período.

 a Política Pública deve ser entendida como um projeto de governo que se configura por meio de ações voltadas para setores específicos da sociedade.

Assim, Höfling (2001) esclarece que a educação entendida como uma política social deve considerar o importante papel do Estado na formulação e implementação de suas propostas. Se aplicadas tais definições ao objeto de estudo da presente dissertação, a proposição de analisar a estratégia de multiplicação no interior de uma política pública implica compreender a complexidade dos fatores macro (internacionais e nacionais – estado) que incidiram sobre sua formulação (projeto de governo) e os caminhos percorridos para a sua implementação (políticas públicas e estratégias).

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considera as complexas e múltiplas relações que dizem respeito à sua estrutura e influência que incidem sobre a (não) neutralidade da política pública, uma vez que tais políticas são “mediatizadas pelas lutas, pressões e conflitos entre elas [...] estrategicamente empregadas no decurso dos conflitos sociais expressando, em grande medida, a capacidade administrativa e gerencial para implementar decisões de governo” (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007, p. 8-9)

Se considerado o papel do Estado no decurso da política educacional brasileira (PERONI, 2003; SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007; ARELARO, 2003), observa-se uma forte influência do capitalismo tardio com características coloniais e escravistas. Uma análise sucinta do panorama brasileiro permite identificar que até os anos 1970, as políticas públicas para a educação estavam associadas aos discursos da construção nacional e propostas de fortalecimento do Estado, revestindo-se, portanto, de forte motivação centralizadora (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007). Para as autoras, nesse contexto, as reformas de ensino foram importante instrumento de persuasão frente aos diferentes interesses sociais e, como consequência, tardou a existir no Brasil uma política de educação que estabelecesse diretrizes nacionais. Até 1930, ainda não havia sido organizado um sistema nacional integrado. Foram as reformas empreendidas pelo Governo Provisório que, pela primeira vez, forneceram uma estrutura orgânica ao ensino brasileiro.

O período subsequente, caracterizado como ditadura militar, apesar de permeado pelo discurso do Presidente Vargas em 1936 sobre a importância da educação na formação política do povo, na verdade materializava-se em um Estado repressor das tentativas de mobilização e organização dos setores mais politizados da sociedade. Por esse motivo, nos anos iniciais do Estado Novo, em 1940, o debate educacional foi caracterizado pela reduzida circulação de ideias. Apenas em 1945, com o fim dos anos ditatoriais do Estado Novo, começou-se a pensar sobre a educação dos brasileiros, tendo o ministro da Educação, Clemente Mariano, nomeado comissão com o objetivo de estudar e propor uma reforma geral da educação nacional. A proposta se arrastaria até 1961 quando foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, gestada através de fortes pressões privatistas e conservadoras (idem, idem).

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da educação pública, abriu brecha para que a escolarização fosse um negócio altamente rentável. Pode-se afirmar que o regime militar terminou oficialmente em 1985, com a substituição do general Figueiredo, seu último presidente, pelo presidente José Sarney,6 dando início à “Nova República”, ou mais uma face do mesmo poder autocrático das classes dominantes brasileiras (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2007).

Em 1987, começavam-se as discussões em torno do projeto para a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Contudo, o projeto aprovado em 1996 não correspondia às aspirações de quase duas décadas. Na esteira da lei governamental e da forma como foi aprovada, o Estado não é impedido nem obrigado a realizar alterações substantivas na educação.

Nesse conturbado processo, no qual diferentes posições políticas, ideológicas, econômicas, culturais e sociais se sobrepuseram, a década de 1990 foi caracterizadamente marcada pela busca de direitos sociais e pela eleição do presidente Fernando Collor de Mello, que, por sua vez, não traduzia propostas condizentes com a mobilização social ou ações educacionais efetivas, o que, aliado a outros fatores, ocasionou o seu impeachment7 (ARELARO, 2003). Em lugar do presidente Collor, assume o vice-presidente Itamar Franco, que, apesar de apresentar outras prioridades na forma de conduzir a proposta governamental, contribuiu para a consolidação do projeto neoliberal na conjuntura brasileira (idem, idem).

A breve revisão sobre o papel do Estado brasileiro, na correlação de forças instituídas em diferentes momentos políticos, ajuda-nos no entendimento de que políticas públicas não são pensadas em um vácuo histórico-espacial e temporal; ao contrário, são elaboradas dentro de um contexto específico, ou seja, no atual momento histórico da corrente investigação, o

contexto da globalização do final do século XX em transição para o século XXI, que constitui

um fenômeno multifacetado com dimensões econômicas, sociais, políticas, culturais, religiosas e jurídicas interligadas e inseridas em um vasto e intenso campo de conflitos entre grupos sociais: estados e interesses hegemônicos, por um lado, e grupos sociais, estados e interesses subalternos, por outro, porque “mesmo no interior do campo hegemônico há divisões mais ou menos significativas” (SANTOS, 2005, p. 27). Tais conflitos e divisões são reflexos de

6 O presidente eleito pelo Colégio Eleitoral, Tancredo Neves, havia morrido antes da posse e seu vice, José

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outras transformações no sistema mundial que lhe são concomitantes, tais como o aumento dramático das desigualdades entre países ricos e países pobres e, no interior de cada país, entre ricos e pobres, a sobrepopulação, a catástrofe ambiental, os conflitos técnicos, a migração internacional massiva, a emergência de novos Estados e a falência ou implosão de outros, a proliferação de guerras civis, o crime globalmente organizado, a democracia formal como uma condição política para a assistência internacional, etc. (SANTOS, 2005, p. 26).

Relações e interferências como as descritas acima contribuem ao entendimento de que, embora a concepção corrente sobre a globalização seja de um processo linear e consensual, esta só pode ser entendida a partir de diferentes conjuntos de relações sociais, e o seu conceito deve ser processual e não substantivo, já que devemos falar de globalizações, em vez de

„globalização‟ (idem, idem). O neoliberalismo tem forte influência sobre os efeitos da globalização econômica, particularmente nos países mais sujeitos às imposições dos seus preceitos porque ficam vulneráveis às condições para a renegociação de dívida externa através de programas de ajustamento estrutural, fortemente direcionados pelas agências credoras, como, por exemplo, no caso do Brasil. Dessa forma,

dada a natureza hierárquica do sistema mundial, torna-se crucial identificar os grupos, as classes, os interesses e os Estados que definem as culturas parciais enquanto culturas globais, e que, por essa via, controlam a agenda da dominação política sob o disfarce da globalização cultural. Se é verdade que a intensificação dos contatos e da interdependência transfronteiriços abriu novas oportunidades para o exercício da tolerância, do ecumenismo, da solidariedade e do cosmopolitismo, não é menos verdade que, simultaneamente, têm surgido novas formas e manifestações de intolerância, chauvinismo, de racismo, de xenofobia e, em última instância, de imperialismo. As culturas globais parciais podem, desta forma, ter naturezas, alcances e perfis políticos muito diferentes (idem, 2005, p. 48).

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as tensões existentes entre a prática pedagógica e as determinações legais que consubstanciam a política de inclusão têm precarizado as práticas inclusivas, limitando em muito o desenvolvimento escolar das pessoas ditas com deficiência e gerando resistências no interior da escola, mascarada pela criação de uma cultura de tolerância às diferenças (DORZIAT, 2009, p. 7).

Nesse sentido, se aplicada a compreensão sobre os discursos hegemônicos ao contexto das políticas públicas de inclusão do Brasil, a adoção da estratégia de multiplicação como suficiente para alcançar municípios de realidades tão distintas favorece a disseminação da cultura como uma cultura global, única, desconsiderando as condições desiguais em que

multiplicadores atuam. A globalização, como processo transparente e sem complexidade,

“mascara” e elege um suposto consenso no qual convivem diferentes povos e culturas. Aplicando mais uma vez a afirmação ao objeto de estudo, tal consenso, além de responsabilizar multiplicadores pelo sucesso ou fracasso de suas ações, já que a todos foi oferecida a mesma formação, confunde e obscurece as intencionalidades dos dispositivos ideológicos e políticos sobrepostos.

Segundo Oliveira (2007), há uma estreita relação entre os planos de desenvolvimento brasileiros e a ênfase dos aspectos sociais como coadjuvantes no processo econômico, ou seja, “a educação e outros setores sociais não são pensados em função dos benefícios ou do b em-estar da população, mas o que se percebe é o predomínio do econômico nas „razões‟ do Estado” (OLIVEIRA, 2007, p. 65). Esse é fator importante ao se analisar a estratégia de

multiplicação diante das intencionalidades do Estado no contexto macro da efetivação de

políticas públicas de inclusão no Brasil.

O aprofundamento e a intensidade das interações interestatais, globais e transnacionais faz com que as formas de poder se exerçam como trocas desiguais, e, nesse sentido,

no domínio das práticas sociais e culturais transnacionais, as trocas dizem respeito a recursos não mercantis cuja transnacionalidade assenta na diferença local, tais como etnias, identidades, culturas, tradições, sentimentos de pertença, imaginários, rituais, literatura escrita ou oral. São incontáveis os grupos sociais envolvidos nestas trocas desiguais e as suas lutas travam-se em torno do reconhecimento da apropriação ou da valorização não mercantil desses recursos, ou seja, em torno da igualdade na diferença e da diferença na igualdade (SANTOS, 2005, p. 60).

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na perpetuação de estigmas, preconceitos e discriminações (CROCHIK, 1997; AMARAL, 1995; VELHO, 2003; SILVA, 2006; FERREIRA, 2009).

Numa perspectiva mais ampla, as ações governamentais de países são instituídas e legitimadas junto a diferentes populações e interesses de grupos sociais, e em consequência são materializadas formas de disseminação das políticas governamentais que, por sua vez, só podem ser entendidas no âmbito de conjuntura que a fundamenta.

Muito embora a multiplicação e a propagação das políticas públicas sejam distribuídas em todo o país, cada município implementa as diretrizes de forma singular. No caso do PEI: DD, espera-se que os multiplicadores repassem e (multipliquem) os conteúdos trabalhados. Multiplicadores são pessoas que devem repassar o conteúdo apresentado pelo Programa, mas que o faz de acordo com sua formação e entendimento, as diferenças de suas regiões, acesso aos municípios da área de abrangência, condições de funcionamento das secretarias em que trabalham, os cargos que ocupam, condições socioeconômicas e partidos políticos do município, e todas essas variáveis caracterizam a complexidade inerente ao processo de

multiplicação:

o que equivale a dizer que, na prática, cada executor vai interpretar a norma a partir de seus valores: sempre vai existir uma multiplicidade de interpretações de uma mesma norma e, esta condição, também implicará na existência de uma multiplicidade de implementações relacionadas com as distintas interpretações feitas (BRIZOLLA, 2007, p. 53).

Este fenômeno gera a necessidade de acompanhar os seus desdobramentos tendo em vista a consideração da formulação do PEI: DD até sua concretização junto aos municípios-polo nos vários estados brasileiros.

Ao realizar o levantamento bibliográfico para a construção desta pesquisa, considerando-se a escassa literatura sobre estratégias de multiplicação, foi possível entrar em

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é necessário que sejamos capazes de resolver equações relacionadas aos recursos financeiros e ao tempo que nos afastam da possibilidade de assimilar e acessar tudo o que consideramos essencial ao desenvolvimento de um determinado projeto, programa ou causa. O segredo da multiplicação está guardado na capacidade de um representar vários, na essência de um grupo ser reeducado por um semelhante (DANTAS, 2008, p. 43).

Posteriormente, ao analisar os dados veremos que a utilização da estratégia de

multiplicação é justificada por seus implementadores (gestores federais) como a forma

econômica encontrada para alcançar a totalidade de municípios do Brasil. Contudo, é o próprio documento em apreço que põe em dúvida a efetividade da estratégia ao questionar:

mas, nesse caso, mais uma vez, estamos diante de desafio dos mais representativos: somos capazes de receber o conteúdo e partilhar? Temos habilidade e cultura suficientes para essa divisão? Enxergamos em nossos pares agentes capazes de nos transmitir conhecimento? (DANTAS, 2008, p. 43).

Apesar de não aprofundar os questionamentos e de concluir sobre a eficácia da estratégia como indicativo de sucesso, já que há “exemplos de organizações não governamentais e projetos sociais que formam multiplicadores” (idem, idem), o documento indica uma discussão importante que será resgatada mais adiante ao considerar os achados desta pesquisa. A ênfase na eficácia da estratégia de multiplicação é valorizada pela possibilidade em formar um para alcançar muitos:

O trabalho com pessoas com deficiência é um eterno jogo de multiplicar [...]

Multiplicadores são formados com esse intuito. A formação de um pode representar a informação de muitos e o bem-estar de milhares – que dependem da disseminação de uma cultura plural para o sucesso de um programa de formação de agentes multiplicadores dos direitos das pessoas com deficiência. Acreditar nesse princípio é mergulhar no mundo da diversidade e do compartilhamento, a mais democrática das realidades (DANTAS, 2008, p. 43. Grifos meus.).

O autor prossegue citando um exemplo de um município brasileiro com a finalidade de ilustrar os benefícios advindos da utilização da estratégia de multiplicação, afirmando que

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A estratégia é utilizada pelo MEC em vários Programas e Projetos de suas Secretarias não é exclusividade da Seesp no PEI: DD, conforme exemplos retirados de notícias publicadas em sites8:

Duzentos e vinte coordenadores e tutores participaram do curso regional de

formadores e multiplicadores do programa nacional de formação continuada em tecnologia educacional (PROINFO INTEGRADO) sudoeste, realizado esta semana em Belo Horizonte. Agora, eles vão multiplicar o conhecimento nos estados de origem. A intenção é capacitar cerca de 800 professores para trabalhar com as tecnologias educacionais na região sudeste (PORTAL MEC/PROINFO, 2010. Grifos meus.).

Outro exemplo é o Pró-letramento:

Uma segunda etapa [do Pró-letramento] é o plano de formação continuada. O MEC já oferece formação em matemática e língua portuguesa dos anos iniciais do ensino fundamental pelo programa Pró-letramento, que é um

sistema de formação de multiplicadores. Em torno de 300 mil docentes já estão concluindo a formação (PORTAL MEC/PROLETRAMENTO, 2010. Grifos meus.).

Pela sua forte incidência, a multiplicação é um fenômeno complexo que precisa ser bem compreendido no âmbito das políticas públicas porque constitui uma estratégia política, social e pedagógica na disseminação das orientações, recursos e publicações de um determinado programa através de representantes de órgãos gestores de secretarias da educação. Eles são preparados mediante cursos de formação para o repasse dos seus conteúdos a um número específico de coordenadores, professores ou municípios compreendidos em sua circunvizinhança, que, como num eterno “jogo de multiplicar” (DANTAS, 2008, p. 43),deverão disseminá-los para outras pessoas.

Apesar das importantes contribuições teóricas à forma adotada para disseminação do PEI: DD e do referencial que está sendo construído em políticas públicas de inclusão (MAZZOTTA, 1995; CURY, 2002; ARELARO, 2003; SILVA e VIZIM, 2003; GARCIA, 2006; LAPLANE, 2006; PRIETO, 2006), o presente estudo ilumina a escassez de fontes sobre o processo de multiplicação. Dessa forma, ressalto a importância do estudo, ao mesmo tempo que objetivo detalhar esse processo, descrever as etapas e analisar o papel da

multiplicação na disseminação de uma política pública, tal como farei na seção que tratará da

8 Os sites são, respectivamente:

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análise dos dados. No que se refere à utilização da estratégia em políticas públicas de inclusão, essa precisa ser compreendida sob a influência dos organismos multinacionais na disseminação de políticas públicas no Brasil, como veremos a seguir.

1.2 Background9 para a implantação de estratégia de multiplicação de políticas públicas:

o papel das agências financiadoras multilaterais

Na seção anterior, vimos que a estratégia de multiplicação, amplamente utilizada pelo governo federal na disseminação de políticas públicas educacionais no país, constitui um fenômeno que deve ser entendido na trama das relações globais na qual está imersa. Segundo HADDAD (2008), o Brasil é um dos maiores clientes do Banco Mundial (BM) e, consequentemente, devem ser reconhecidos os efeitos de sua forte influência nas políticas públicas da educação no país, uma vez que este banco, desde a década de 1990,

vem adquirindo expressiva importância no âmbito das políticas públicas brasileiras. Esta evolução pode ser explicada pelo papel que o Banco desempenha junto aos países mais pobres como estrategista do modelo neoliberal de desenvolvimento e também como articulador da interação econômica entre as nações, inclusive, para a negociação de sua dívida externa (FONSECA, 2007, p. 46).

O BM é uma organização criada após a Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos, juntamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI), numa ação conjunta entre as principais nações do mundo, a fim de dirigir a atuação dos países deles dependentes (HADDAD, 2008). Essas instituições financeiras denominadas agências multilaterais passaram a articular seus objetivos, os quais, no caso do BM, diziam respeito a auxiliar na reconstrução do desenvolvimento dos países-membros no período pós-guerra e, no caso do FMI, supervisionar o sistema monetário internacional e garantir uma estabilidade do sistema cambial (HADDAD, 2008; ROSAR, 2007) para a implementação de políticas que favorecessem a reprodução do capital global. Há, portanto, uma forte influência dessas agências financiadoras na organização dos sistemas educacionais dos países devedores, uma vez que tais agências concebem a educação como forma de superação da pobreza típica de países subdesenvolvidos e como uma estratégia de política social (HADDAD, 2008).

Alinhado a esta concepção, o site10 do BM define esta organização como uma „fonte vital de assistência técnica e financeira para países em desenvolvimento no mundo todo‟ e que

9 Expressão inglesa cujo significado é pano de fundo. 10

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tem como missão a luta contra a pobreza nos países pobres com credibilidade financeira, ou seja, há um investimento financeiro para que países pobres e em desenvolvimento apliquem propostas voltadas à superação da pobreza, como investimentos em educação, saúde, administração pública, infraestrutura financeira e desenvolvimento do setor privado, da agricultura e gestão ambiental e recursos naturais.

O denominado BM é composto de duas instituições de desenvolvimento que pertencem a 187 países-membros: o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) e a Associação Internacional para o Desenvolvimento (IDA), que têm como foco os países mais pobres do mundo (PORTAL WORLD BANK, 2009). Como consequência do empréstimo financeiro que cria dependência política, há uma forte ingerência dessas organizações na ordem econômica, política, social e educacional do país devedor em cujas políticas públicas podem ser identificados os critérios estabelecidos pelo banco para a concessão de créditos. Por exemplo, na década de 1980, o BM definiu que o desenvolvimento da educação primária constitui a política mais adequada para regiões de concentração de pobreza (FONSECA, 2007); consequentemente, as políticas públicas enfatizaram as iniciativas para a escolarização básica como uma das exigências para a sustentabilidade da economia nacional, evidenciando-se a influência de tais mecanismos nas propostas educacionais brasileiras, sobretudo na educação básica.11

No contexto dos movimentos internacionais promovidos com a finalidade de garantir o direito de todos à educação de boa qualidade, a Conferência Mundial sobre Educação para Todos (UNESCO, 1990) realizada na Tailândia, anuncia a urgência para o estabelecimento de novas diretrizes do final do século XX (FERREIRA, 2006). A urgência justifica-se pela necessidade de combater os índices do analfabetismo e a falta de acesso à educação, fatores que caracterizam o fenômeno da exclusão educacional (idem, idem).

Outro evento importante para o movimento da educação inclusiva é a Conferência Mundial de Salamanca (UNESCO, 1994), pelo fato de explicitar a necessidade dos países signatários desenvolverem políticas educacionais para atender às denominadas necessidades educativas especiais de todas as crianças, mas principalmente das mais vulneráveis e carentes (FERREIRA, 2006).

11 No Brasil, a forte influência das diretrizes do BM está evidenciada no Plano Nacional de Educação (BRASIL,

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Nesse panorama de realização de eventos pautados nas diretrizes da educação para todos e dos documentos decorrentes como a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) e o Marco de Ação de Dakar12 (UNESCO, 2000), esse último decorrente do Fórum Mundial de Educação (idem, idem), intensificou-se o movimento em torno da melhoria educacional em consonância com concepções e diretrizes das organizações multilaterais.

Apesar da Unesco ser a instituição multilateral carro-chefe no movimento da Educação para Todos, a atuação do BM na realização dos eventos e documentos citados marca o inicio de expansão mundial de sua influência no campo das políticas públicas para a educação: o BM tem papel determinante no modo como a cooperação internacional concebe a educação e na definição dos projetos que devem ser apoiados financeira e tecnicamente.

As diretrizes do BM assumem que desenvolvimento humano e educação são inseparáveis (LAPLANE, 2004). Contraditoriamente, todavia, as mesmas diretrizes mercantilizam o direito à educação na medida em que o atrela aos interesses monetários em detrimento do que se considera a tão almejada “qualidade” na educação, tornando “clientes” aqueles que se beneficiam deste direito, condição que, por sua vez, os coloca em posição de subalternidade.

Em uma era de antagonismos e mudanças típicas de um cenário globalizado, de transformações socioeconômicas mundiais e de metas mundiais para o novo milênio, o governo brasileiro institui políticas e estratégias que, ao mesmo tempo, respondam às diretrizes internacionais e às exigências impostas pelas agências multilaterais de financiamento, as quais alinhadamente orientam para a disseminação de políticas públicas por meio da implantação de estratégias de multiplicação.

Como apresentado no início desta seção, no caso do objeto de estudo da presente pesquisa, o documento orientador a partir do qual se define a estratégia de multiplicação como o meio pelo qual será disseminado no Brasil (e em outros países) a política de inclusão, é a citada Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994).

O documento de ampla repercussão no cenário mundial difunde novas perspectivas de ações políticas e educacionais para pessoas com necessidades educativas especiais, o que pode ser considerado um avanço na reformulação dos sistemas de ensino em atendimento às particularidades de diferentes alunos. Até bem pouco tempo havia uma “ausência de

12 Enquanto o movimento da educação para todos tem como meta estimular os governos-membros a impulsionar

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presença” das pessoas com deficiência nos documentos. Hoje, todavia, assistimos a uma efervescência de mudanças sociais que começam a se (des) organizar no recebimento a essas pessoas.

A possibilidade de inserção das questões relativas à inclusão do grupo constituído pelas pessoas com deficiência no campo dos EC, para mim lugar de direito, permite sua analogia com um dos pressupostos fundadores desse campo de estudo, ou seja, a reação às formas dominantes de poder da cultura hegemônica (WOODWARD, 2000; COSTA; SILVEIRA; SOMMER, 2003), já que trazem ao cerne do debate a cultura de grupos excluídos do contexto social que também assistiram à inferiorização de sua própria cultura e negligenciamento das políticas públicas específicas ao atendimento de suas necessidades.

Tais mudanças obviamente necessitam ser bem analisadas. As próprias regulamentações legais, a exemplo das citadas nesse texto, requerem a compreensão de sua natureza tomada num contexto econômico, político e social. Além dos interesses internacionais, algo que discutimos, é notável que historicamente os padrões sociais responderam às expectativas das pessoas sem deficiência („normais‟) enquanto uma significativa parcela da sociedade teve limitados e, muitas vezes, impedidos a realização de suas potencialidades, necessidades pessoais, seus sonhos e desejos pelas barreiras que enfrentam (FIGUEIRA, 2008; JANNUZZI, 2006; FERREIRA; GUIMARÃES, 2003). As condições minimizadoras e empobrecedoras de acesso a contextos sociais das pessoas com deficiência estão hoje no cerne do debate sobre o valor da diversidade humana e do respeito às diferenças.

Nesse contexto caracterizado por mudanças de toda ordem, o processo de

multiplicação é utilizado como estratégia econômica no âmbito das ações governamentais

para disseminar as novas concepções e apoiar a construção de sistemas educacionais inclusivos. Mais uma vez, é importante compreender que a educação é determinada por uma agenda internacional impulsionada por organizações multilaterais, particularmente o Banco Mundial, o que implica compreender suas variáveis, porque

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Na perspectiva de Oliveira (2007), as reformas implantadas no Brasil nos últimos anos não são nem a “receita das organizações internacionais nem a expressão pura das concepções neoliberais” (OLIVEIRA, 2007, p. 664), uma vez que por mais que a influência das agências multilaterais deva ser considerada na análise de políticas públicas, estas não são idealizadas e implementadas somente a partir dessas concepções. Por exemplo, o texto introdutório da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL 2008) explicita que houve consulta pública e a constituição de grupos de trabalho com experts nas áreas foco da política a ser definida, com a participação de instituições de ensino superior, órgãos governamentais, ou seja, muitos atores que têm agendas próprias e reivindicações distintas. Além disso, grupos constituídos por pessoas com deficiência possuem, dentro do próprio grupo, divisões de acordo com os interesses específicos nas áreas de deficiência visual, deficiência auditiva etc.

Assim, investigar o processo de multiplicação no âmbito de uma política pública de inclusão implica caracterizar o contexto dentro do qual foi implantada, a fim de entender como se deu seu processo de disseminação em um país de vasta extensão territorial e profundas desigualdades sociais como é o Brasil. As seções a seguir, portanto, têm como objetivo delinear o panorama político da política de inclusão da Seesp e a estratégia de

multiplicação da mesma.

Inicio com a caracterização do governo Lula e a propagação de políticas voltadas à atenuação das desigualdades sociais. Em seguida, apresento os processos de municipalização e descentralização das ações do governo federal, processos importantes para a análise do processo de multiplicação. No tópico “a esfera federal e ações para oferta de atendimento às

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1.3 A política de inclusão social do governo Lula e atenção a grupos vulneráveis

No Brasil “desde os anos 90, o governo federal tem implantado e/ou fomentado um conjunto de ações nas várias áreas dos serviços públicos, como parte do que tem sido denominado “política de inclusão social” (KASSAR; ARRUDA; BENATTI, 2007, p. 21).As mudanças socioeconômicas ocorridas no século XX geraram uma série de expectativas quanto ao governo Lula e sua orientação política como reflexos da eleição de um representante da classe trabalhadora. Em meio às propostas governamentais, o presidente eleito em 2002, Luís Inácio Lula da Silva, lançou o Programa Fome Zero (BRASIL, 2003), principal programa de governo e que tem como objetivo o combate à fome (de todo o tipo: nutritiva, cultural, educacional etc.) (FERREIRA, 2006).

De acordo com informações contidas no programa de governo do Partido dos Trabalhadores,13 em 2002, o Programa Fome Zero (BRASIL, 2003) inclui, além de medidas estruturais, uma política de apoio efetivo à agricultura familiar; o direito à Previdência Social para todos os trabalhadores familiares, da economia rural ou da economia informal urbana, garantindo a universalização prevista na Constituição; o direito à complementação de renda para que todas as crianças das famílias pobres pudessem ter formação educacional adequada; a ampliação da merenda escolar, atingindo todas as crianças que frequentassem escolas públicas, inclusive creches. O Programa, assim, institui a necessidade de combater as mazelas socioeconômicas características da parcela de baixo poder aquisitivo da população e, dessa forma, promover condições de inclusão social a todos os segmentos da sociedade, em especial aos que se encontram em situação de desvantagem.

A proposta de implantação de um projeto inclusivo no país foi incorporada às ações do MEC ao definir a inclusão social como um dos eixos estratégicos da política educacional para o Brasil (MOEHLECKE, 2009), cujas metas relacionam-se à melhoria da qualidade educacional para todos, mas em particular para os educandos em situação de vulnerabilidade escolar que por razões distintas encontram barreiras para ter acesso aos conteúdos escolares, ou ainda aqueles que sofrem discriminação, entre os quais: aqueles em situação de desvantagem ou impedimento aos conteúdos escolares e ou participação social por qualquer discriminação ou condição física, mental, étnica, cultural, econômica ou social, como mulheres, negros, meninos de rua, pessoas com deficiência, ciganos, homossexuais, albinos, entre outros.

13 Disponível em:

Imagem

Figura 03 – Diagrama do Fluxo de Multiplicação.

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