R EV ISITA N D O
o
M ÉTO D O FEN O M EN O LÓ G IC O :
O intervalo entre as reduções
L e o n i F . d e M e I o '
RESUMO
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
E s t e a r t i g o p r e t e n d e r e v i s i t a r a a p l i c a b i l i d a d e d o m é t o d o f e n o m e n o l ó g i c o , m a i s e s p e c i f i c a m e n t e a o f a z e r t e r a p ê u t i c o e s u a s i m p l i c a ç õ e s , c o n s i d e r a n d o a s r e d u ç õ e s c o m o a l g o c o m p l e t a m e n t e i n d i s p e n s á v e l a t o d a a h o r a t e r a p ê u t i c a .
P a l a v r a s c h a v e : F e n o m e n o l o g i a , G e s t e l t - I e r s p i e . E p o c b é , R e l a ç ã o T e r a p ê u t i c a .
V 1SIT IN GT U E PH E N O M E N O L O G lC A LM E T U O D A G A IN :the interval betw een the reductions
ABSTRACT
T h i s e r t i c l e i n t e n d s t o v i s i t a g a i n t h e f e n o m e n o l o g i c a l m e t h o d 's a p l i c a b i l i t y , m o r e s p e c i f i c a l / y e t t h e t h e r a p e u t i c d o i n g a n d i t s i m p l i c a t i o n s , c o n s i d e r i n g t h e r e d u c t i o n s l i k e s o m e t h i n g r e a l / y i n d i s p e n s a b l e i n e v e r y t h e r a p e u t i c m o m e n t o
K e y w o r d s : P h e n o m e n o l o g y , G e s t e l t - T h e r a p y , e p o c h é , t h e r a p e u t i c r e l a t i o n s h i p .
*
xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
Psicóloga. Atualmente coordena a Secretaria do CEGEST (Centro de Estudos de GestaitTerapia) - Brasflia.Revisla de Psicologia, Icrlelezc. V.15(lf2) V.l6(]!2) p.117 - p.123 jan/dez 1997/98 Ana de Publicação 2000
o
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
q u e e s p e r a m o s q u a n d o e s t a m o s d e s e s p e r e -d o s e , m e s m o s s s i m , p r o c u r a m o s u m o u t r o b o -m e -m ? C e r t a m e n t e u m a p r e s e n ç a , p o r m e i o d a q u a l s o m o s i n f o r m a d o s d e q u e , a p e s a r d e t u d o , h á s i g n i f i c a d o . Martin BuberNMLKJIHGFEDCBA
I n t r o d u ç ã o
Desde Platão e Aristóteles. a palavra fenômeno
já era usada na linguagem filosófica. Mas
fenornenolo-gia é um termo que parece ter sido empregado pela
primeira vez em 1764 pelo filósofo, físico e
maternáti-co Johann Heinrich Lambert (1 728~ 1777). que tratou
da fenomenologia ou doutrina da aparência para
de-signar o estudo puramente descritivo do fenômeno, tal
qual este se apresenta à experiência humana.
Conhecer a si mesmo e ao mundo, dar
significa-do à vida, enfim, conhecer a realidade são questões
muito complexas que ocupam as intenções e os
dese-jo s humanos. O dualismo cartesiano e o positivismo se
mostraram insuficientes, principalmente no campo da
Psicologia, para atender a essas questões.
Edmund Husserl. filósofo alemão que inaugurou
a Fenomenologia, inovou na teoria do conhecimento
ao superar a dicotomia entre sujeito que conhece v e r s u s
objeto que é conhecido, entre observador e o fato
ob-servado. Para Husserl. a fenomenologia é também, e
principalmente, uma atitude e um método filosóficos.
A fenomenologia husserliana pretende pôr o agente em
contato com o fenômeno enquanto imediatamente
consciente elevá-lo à evidência primordial. como
con-dição essencial na ciência.
Compreender o que somos é tarefa que
aproxi-ma Fenomenologia e Existencialismo. Estas correntes
de pensamento, mesmo quando vistas
separadamen-te, têm uma igual exigência: a fidelidade ao real. A
quem diz respeito o real? Ao homem, ao ser-af (o
d a s e i n ) . de Heidegger que, no seu propósito de
dis-cutir o Ser, traz a fenomenologia para a ontologia, de
onde influenciou a psicologia.
Na atuação clínica da Gestalt-Terapia,
fenome-nologia e existencialismo coexistem. Segundo Merleau~
Ponty, ...q u e r f à . ç a m o s f e n o m e n o l o g i a , q u e r f à . ç a m o s p s i c o l o g i a . . . t r a t e - s e s e m p r e d o m e s m o s u j e i t o , t r e t e - s e s e m p r e d o m e s m o h o m e m . . . o p o r t a d o r d a r e f l e x ã o
(1973:50).
O respeito à liberdade do outro e o
reconheci-mento de que o homem possui a capacidade de
autopreservar-se, desenvolver-se. desvelar-se (na
liber-dade) e ser radicalmente individual e relacional estão
inspirados no Existencialismo. A Fenomenologia
parti-cipa como método a orientar o terapeuta para a
neces-sidade do e p o c h é e de trabalhar na primeira e segunda
reduções fenomenológicas (quando tratarmos
especi-ficamente do método, abordaremos com detalhe estes
conceitos). Atualmente, se fala muito de uma
fenorne-nologia existencial ou existencialismo fenomenológico,
também como a indicar que consciência e fenômeno
não se separam dentro desse enfoque.
Este artigo pretende revisitar a aplicabilidade do
método fenomenológico, inaugurado por Husserl, mais
especificamente ao fazer terapêutico e suas
implica-ções, considerando as reduções como algo completa~.
mente indispensável a toda a hora terapêutica, na
ten-tativa de conhecer o significado da realidade expresso
pelo cliente.
o
M é t o d oO método fenomenológico é um instrumento pelo
qual se pretende conhecer e construir a realidade, a
essência das coisas. Onde está a essência das coisas?
Nas próprias coisas, no seu aparecimento e no seu
re-velar-se à consciência. Em que consiste o método?
Como urilizá-lo para conhecer a realidade? Antes de
descrevê-lo. é necessário mencionar um conceito
cen-tral da Fenomenologia: a intencional idade.
Segundo a Fenomenologia, a consciência
inten-cional é a consciência enquanto voltada para o objeto,
e o objeto intencional é o objeto enquanto visado pela'
consciência.
Intencionalidade é a característica definidora da
consciência, pois é através dela que aquilo que um
objeto é se constitui espontaneamente na consciência.
Isto significa reconhecer que a consciência não é
pas-siva, mas ativa, podendo, por isso mesmo, dar sentido
às coisas. Se toda consciência é consciência de alguma
coisa (Husserl). ela se encontra voltada para os
obje-tos, visando-os: isto é intencionalidade. Ela não é uma
espécie de depósito onde são guardados todos os
ob-jetos que afetam os sentidos, pois que a cada ato da
consciência corresponde um conteúdo da
consciên-cia. A partir daí. nova relação se estabelece entre
sujei-to e objesujei-to, entre observador e o objeto observado,
entre pensamento e ser (Penha, 1982).
E p o c h é é uma palavra de origem grega que quer.
dizer suspensão do juizo. Ela aparecerá mais adiante,
no detalhamento do método. Por agora, ela nos é
inte-ressante para clarear mais o conceito de
intencionalida-de na Fenomenologia. Intencionalidade é aquilo que
torna possível a e p o c h é , pois perceber o livro na mesa,
por exemplo, não significa ter uma miniatura desse livro
no espírito e, sim, visar ao próprio objeto (Giles, 1989).
Mais um conceito necessário para posterior
apre-sentação do método fenomenológico é o termo
fenô-meno. Esta palavra, em sentido geral. significa tudo o
que é percebido, tudo o que aparece aos sentidos e à
consciência, de qualquer modo que seja. Portanto, para
Husserl. fenômeno não são só os objetos da
consciên-cia mas também os próprios atos enquanto
conscien-tes, sejam eles intelectivos. volitivos ou afetivos.
Redução, "em sentido genérico, é uma tentativa
de explicar uma realidade mais complexa em termos
de uma mais simples, que lhe serve de modelo". " ... Na
Fenomenologia de Husserl, significa que se deve
con-centrar a atenção nas coisas mesmas e não nas
teorias"(Jupiassu
&-
Marcondes, 1990).Husserl apresenta o método fenomenológico em
três reduções sucessivas e sugere que elas sejam
prati-cadas consecutivamente até que apareça o que"
pare-ce", até que a realidade possa ser descrita tal como se
apresenta à observação pura.
De algum modo e em alguma medida, o ser
hu-mano está consciente da existência deste mundo que
se estende no espaço e no tempo e que lhe é acessível
pela experiência e pela intuição. As coisas materiais
estão aí. quer o homem se ocupe delas, quer não
(Popper, 1994). O mundo natural é um mundo
exis-tente, uma realidade: eis a tese da atitude natural. diz
Husserl. Mas isto não esgota o mundo para o agente
que está lá, de modo consciente, a cada instante em
que ele, o agente, está vigilante. Por isso, o primeiro
momento do método fenomenológico sugere que seja
colocado em suspenso, entre parênteses da
experiên-cia fenomenológica. todo o juízo existente a respeito
deste mundo. sem nada pressupor. A este procedimento
denomina-se
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
e p o c b é , palavra grega que quer dizersuspensão, cessação. Qualquer juízo sobre o mundo
natural é suspenso, rejeita-se recorrer a pressupostos
ou preconceitos. O termo e p o c h é , na filosofia
rnedie-val, designa o estado de repouso mental através do qual
nada se afirma nem se nega. Não se nega os
condicio-namentos nem as certezas, mas se os ignora no
mo-mento da redução. A famosa exortação de Husserl para
que voltemos às coisas mesmas tem por objetivo
ultra-passar a oposição entre essência e aparência (Penha,
op. cit.). A e p o c h é t e m por função preparar o campo
da experiência na busca da realidade, retirando ou
ten-tando retirar desse campo todos os obstrutores ao
apa-recimento do fenômeno, daquilo que é.
Feita a e p o c h é , ensina Husserl. passa-se para a
segunda redução, denominada de redução eidética, e
toma-se em consideração, reflexivamente, tudo aquilo
que foi retido dentro do parênteses, isto é, as vivências
do mundo, as quais portam consigo as essências que
lhe são inerentes. Porém, não são vistas de uma
pers-pectiva objetiva, mas sim através de uma ótica
subjeti-va. "Tal redução nos leva do indivíduo (por exemplo,
este livro) para a essência ainda empírica (livro
verme-lho) e daí até a essência pura, que é essência em seu
caráter absolutamente necessário (o livro como tal) ...
Surge, portanto, um fenômeno novo que prescinde do
fato ou singularidade, podemos dizer do caráter puro
ou metaernpírico" (Giles, 1989: 74). A consciência
eidética se ocupa da contemplação da essência. do
universalmente válido.
Na redução transcendental ou terceira redução.
o sujeito está envolvido no processo de e p o c h é .
lntui-se nesta redução que todas as essências captadas
fa-zem referência a uma consciência, a um "eu" como
sujeito da e p o c h é . O objeto passa a servir de
referên-cia para a existênreferên-cia da consciência. Neste momento,
o sujeito atinge o conhecimento apodítico,
entenden-do-se por apodítico o juízo que apresenta caracteres
de universalidade e de necessidade. Mas, para tanto, a
prática desta redução deve ser executada num grau'
que iniba todo interesse existencial. toda a
rnundanei-dade, transformando assim a subjetividade psicológica
em subjetividade transcendental. Neste estágio, diz
Giles, é preciso pôr entre parênteses até a própria
exis-tência do eu psicofísico, do eu que reflete, depurando
esse "eu" para que se torne concebível apenas em sua
relação com o objeto, objeto esse que já não se
encon-tra no mundo, sendo objeto apenas como idealidade
pura, desprovido de qualquer caráter psicológico. De
acordo com Giles,
a e x p e r i ê n c i a t r a n s c e n d e n t a l é d i R c i l d e r e a l i z a r p o r q u e é s u p r e m a e i n t e i r a m e n t e a m u n d a n a . M a s é s ó p o r e s s e c a m i n h o q u e p a r e c i a p o s s í v e l a H u s s e r / c o m e ç a r a d a r u m f u n d a m e n t o i n t e i -r a m e n t e -r e d i c e l . e m o -r d e m àc o n s t r u ç ã o d e u m a F I l o s o f i a d e a b s o l u t o r i g o r c i e n t í f i c o " ( e d e s ,
1989:80).
NMLKJIHGFEDCBA
A s R e d u ç õ e s c o m o I n s t r u m e n t o
Descrito o método concebido por Husserl, há que
torná-lo. agora, como instrumento de trabalho da
Gesralt-Terapia (GT). O interesse mais imediato da GT pelo
método fenomenológico está atrelado às duas primeiras
reduções. A aplicabilidade destas duas reduções na
prá-tica terapêuprá-tica será o nosso alvo, deste ponto em diante.
119
A Gestalt-Terapia é fenomenologia aplicada
(Fromm e Miller, apud Perls, 1997). Utilizando-se das
reduções, ela caminha em direção ao conhecimento
revelado. Sobre qual conhecimento recai seu
interes-se? No ambiente de psicoterapia interessa ao
psicoterapeuta buscar conhecer o significado da
vivência de situações experimentadas pelo cliente. A
essência do percebido, do experenciado pelo cliente,
o significado que ele empresta a um dado fenômeno,
isto é o seu objeto de trabalho. Então, de acordo com
o método, transpondo-o agora para o "locus" da
psicoterapia, o terapeuta, no primeiro momento da
re-dução, tenta colocar entre parênteses a sua própria
experiência, as suas vivências, os seus preconceitos e
conceitos acerca do tema que está sendo abordado pelo
cliente. Trata-se de uma atitude do terapeuta de voltar
às coisas mesmas, visando abrir-se ao contato com o
outro, de modo a poder se impactar com o que está
sendo relatado e vivido pelo cliente, com o que
apare-ce do que é mostrado.
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
E m o u t r a s p a l avras, o p e s q u i s a d o r p r e c i s a i n i c i -a r s e u t r -a b -a l h o p r o c u r -a n d o s a i r d e u m a a t i t u d e i n t e l e c t u a l i z a d a p a r a s e s o l t a r a o f l u i r d e s u a p r ó -p r i a v i v ê n c i a . . -p a r a d e i x a r s u r g i r a i n t u i ç ã o , p e r -c e p ç ã o , s e n t i m e n t o s e s e n s a ç õ e s q u e b r o t a m d e u m a t o t e l i d e d e , p r o p o r c i o n a n d o - l h e u m a c o m -p r e e n s ã o g l o b a l , i n t u i t i v a e p r e - r e t l e x i v e d e s s a
v i v ê n c i a (Forghieri, 1993:60).
Após esse momento, o terapeuta toma um certo
recuo dessa vivência. volta às suas referências
científi-cas, na tentativa de refletir sobre o significado dessa
vivência para o cliente (Forghieri. op. cit.). buscando
conhecer a realidade. E assim se sucedem as reduções
como p o s s i b i l i d a d e d e o p e n s a m e n t o , q u e p e r i o d i c a -m e n t e s e t r a n s f o r m a e s o m e n t e a s s i m p e r m a n e c e , c o r r e s p o n d e r a o a p e l o d o q u e d e v e s e r p e n s a d o
(Heidegger, apud Giles, op. cit.).
O maior ensinamento da redução é a
impossibili-dade de uma redução completa (Merleau-Ponty, apud
Forghieri. op. cit.). Esta lição é interessante e mesmo
fundamental para a prática terapêutica de base
fenomenológica, tendo em vista que ela informa o
terapeuta também acerca do limite existente à
conse-cução do pleno conhecimento como algo de que
po-deria se apropriar. Isto o isenta do poder de tudo
co-nhecer, sem, todavia, ficar dispensado da imperiosa
necessidade de tentar conhecer o que lhe é mostrado .:
Na prática psicoterápica, o emprego do método
fenomenológico se dá num processo, que dizer, num
fluxo contínuo e sucessivo entre a primeira e a
segun-da reduções.
É
mesmo esse movimento alternado quepossibilita a revelação do fenômeno, sem os
interva-los que, às vezes, o modo didático de abordá-tos
dei-xa transparecer.
É
interessante sublinhar que entre aprimeira e a segunda reduções fenomenológicas,
quando o terapeuta retorna às suas referências mais
íntimas, num trabalho de reflexão e de busca de
sig-nificado acerca do que acabara de vivenciar com o
cliente, poderá ocorrer um certo abandono do
clien-te pelo clien-terapeuta.
Dentre os muitos aspectos que apontam para a
incompletude das reduções de que fala
Merleau-Ponry, o hiato entre a primeira e a segunda redução.
pode ser um deles. Dependendo da intensidade da
dor ou da alegria que o cliente esteja experimentando
diante de uma dada situação, ao praticar a segunda
redução o terapeuta pode estar abandonando o
cli-ente de forma muito definitiva naquele momento. As
conseqüências desse provável abandono poderão
sig-nificar muito dano não apenas ao cliente, na sua
alteridade. como também à relação cliente/terapeuta.
Por exemplo, experiências emocionais vividas pelo
cliente, sejam de dor, sejam de alegria, "convidam" o
terapeuta a partilhar com sua presença, com o outro,
nessa relação tão delicada que é a terapêutica.
Nes-ses momentos, então, qualquer elaboração teórica fica
afastada. A escolha terapêutica será sempre a de ficar
com o cliente, abandonando a segunda redução ou a
tentativa de fazê-Ia'. Isto é preferível a deixar o
clien-te, mesmo que seja por um instante, só com a sua dor
ou com o seu desespero.
É
oportuno destacar uma sutileza: o terapeuta,imbuído da intenção mesma de não abandonar o
clien-te, está sempre tentando compreender-lhe os
significa-dos, e isto o leva irremediavelmente à segunda
redu-ção. Estas questões são factuais e ocorrem efetivamente
no processo terapêutico. Se o terapeuta está atento a
isto, ser-lhe-à possível abandonar menos o cliente e
di-rigir mais sua presença à relação terapêutica.
Parafraseando Buber, h á m u i t o o q u e a p r e n d e r c o m e l e (o método), m a s n ã o a ú l t i m a l i ç ã o
(Buber, 1982:97).
I Esta idéia não é minha, é de Walter Ferreira da Rosa Ribeiro, Gestalt-Terapeuta, que a expressou a um grupo de estudos de Gestalt-Terapia (CEGEST - Brasília). Por estar inteiramente de acordo com tal postura terapêutica, animei-me a organizá-Ia mais sisternaticarnen- . te.
A R e la ç ã o T e r a p ê u t ic a
xwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
A base filosófica da Gestalt-Terapia possibilita ao terapeuta, numa dinâmica consciente, levantar ques-tões sobre ser, conhecer, estar e agir junto ao cliente.
O homem é um ser-com, é o Ser-aí (Heidegger, apud Giles, op. cit.) no mundo das coisas e dos outros homens, dos entes e dos seres. Neste sentido, até tal-vez para corroborar com a pertinência da atitude tera-pêutica que valida a relação como variável de cura, enfatiza-se a importância do uso do método também para oficializar o "fazer" psicoterápico, o qual se con-trapõe a uma prática diletante.
Nessa medida, o cliente não deve ser visto como um meio para a aplicabilidade da ciência - a ciência até utiliza a experiência, a prática, para desenvolver e aplicar suas teorias -, mas considerado como um fim em si, segundo o princípio ético kantiano. No campo da psicoterapia, o profissional com atribuição para
atender o cliente é outro ser humano. Por isso mes-mo, o diálogo na relação terapêutica e a presença qualificada do terapeuta junto ao cliente são variáveis também indispensáveis ao processo psicoterápico, que só apresentará algum resultado favorável se puder preencher-se da intersubjetividade. Vale dizer, se o sentido da experiência do cliente for compartilhado pelo terapeuta
C o n s id e r a ç õ e s F in a is
É
imprescindível considerar todo o "edifício" da. Gestalt-Terapia como indispensável ao "fazer" terapêutico. O edifício da Gestalt-Terapia é uma cons-trução feita por Walter Ribeiro (1988), que pretende demonstrar didaticamente as partes interdependentes (princípios, conceitos e procedimentos) que compõem o todo que é a Gestalt. Este edifício também pode ser assim representado:F O diálogo e outros procedimentos que Técnicas facilitem o processo do outro.
Método fenomenológico aplicado à
E psicoterapia, objetivando facilitar a Metodologia
"e w e r e n e s s '
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
e o contato.Teoria fundamentada no
D
restabelecimento do contato Teoria Terapêutica e do fluxo de "e w e r e n e s s 'C Teoria de Base relaciona!. Formação do Teoria da Personalidade Self (verdadeiro e falso) e/ou do desenvolvimento
B
Psicologia da GestaltTeoria de Campo Fundamentação Teórica Teoria Organísmica
A
Teoria do Conhecimento:Fenomenologia Fundamentação Filosófica Ontologia: Existencialismo
121
Na base do "edifício" estão a Teoria do
conheci-mento, representada pela Fenomenologia husserliana,
e a Ontolcgia/ Existencialismo. O mundo vivido não é
um mundo em si mesmo, mas um mundo para a
cons-ciência e esta é sempre intencional, sempre
"consciên-cia de", voltada para o objeto. Dessa maneira, sujeito e
mundo são coexistentes.
Imediatamente acima, a base científica, formada
pela Psicologia da Gestalt. a Teoria de Campo e a
Te-oria Organísmica. Tal base informa também acerca da
auro-regulação organísmica à luz de conceitos da
Psi-cologia da Gestalt e da Gestalt-Ierapia. como figura e
fundo, aqui-e-agora, experiências individuais
estruturadas em totalidades que se desdobram num
campo. Segundo Isadore Fromm e Michael Vincent
Miller (1997), o local primordial da experiência
psico-lógica, para onde a teoria e a prática psicoterapêuticas
têm de dirigir sua atenção, é o próprio contato, o lugar
onde self e ambiente organizam seu encontro e se
en-volvem mutuamente. Organismo e ambiente são as
peças do contato. Tanto fatores internos (organísrnicos).
quanto estímulos externos organizam/desorganizam
uma situação dada.
Depois, a Teoria da Personalidade e/ou do
De-senvolvimento, com enfoque para o desenvolvimento
da personalidade a partir dos primeiros contatos da
criança com o seu mundo, desde a concepção. São
importantes, portanto, o aspecto relacional na
forma-ção do
ZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA
s e l f e as condições de prevalência na expressãodo falso e do verdadeiro s e l f
A Teoria Terapêutica está fundamentada no
es-tabelecimento do contato e do fluxo de " e w e r e n e s s ',
Nela é indispensável a crença de que o homem, se
puder tornar-se "aware" de sua condição e contar com
alguma parcela de ambiente (mundo) favorável, irá
restabelecer o contato consigo mesmo, reconhecer e
aceitar seu verdadeiro s e l f A relação terapêutica
po-derá ajudar neste sentido, munindo-se da aceitação e
do diálogo terapêuticos.
Aparece, então, a metodologia que, utilizando o
método fenomenológico, orienta como trabalhar junto
ao cliente, na busca de ampliar seu contato e atualizar
seu processo de e w e r e n e s s , observando sua
singulari-dade e o significado que empresta às suas experiências.
E, no último patamar do "edifício" estão as
téc-nicas, termo que abriga o diálogo e outros
procedi-mentos que visem "advogar a causa" do cliente,
dar-lhe suporte, aceitar sua condição de pessoa e propiciem
um ambiente terapêutico facilitador da
auto-expres-são do indivíduo a partir do contato possível consigo e
com o mundo.
Nenhuma peça desse edifício pode ser
dispensa-da, bem como nenhum aspecto do conjunto da GT.
seja filosófico, metodológico, técnico ou científico pode
ser privilegiado em detrimento de outro. A prática da
Gestalt-Terapia reúne, num ritmo dinâmico, todos
es-ses aspectos acima mencionados. O método
fenomenológico como instrumento do trabalho
terapêutico tem sua aplicabilidade e importância na
medida em que "baliza" a consciência do terapeuta a
privilegiar a busca da realidade, conforme é vivida pelo
cliente. Este é um aspecto. Isto deve ser observado com
rigor metodológico.
O outro aspecto é a relação terapêutica, que é
essencial para a Gestalt-Terapia, e é composta do Eu e
do Tu, na linguagem buberiana. Nessa relação, o que
é fenômeno são o objeto e a consciência, que o visam
- consciência do cliente e do terapeuta a visar um
obje-to, seja a dor, a alegria, enfim, as vicissitudes da vida. A
intencionalidade, do ponto de vista da consciência do
terapeuta, nunca deve visar por objeto o cliente.
Obje-to visado pela consciência pode ser até a energia que o
cliente empresta a uma dada realidade, mas não a
pes-soa dele. Nas palavras de Buber: ... o c l i e n t e n ã o é u m ' f e n ô m e n o d o m e u E u , m a s é o m e u T u . . .
(Buber, 1982:92).
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