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AS TEMPORALIDADES E TERRITORIALIDADES QUE CARACTERIZAM A AGRICULTURA FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE MARMELEIRO (PR)

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AS TEMPORALIDADES E TERRITORIALIDADES QUE CARACTERIZAM A AGRICULTURA FAMILIAR NO MUNICÍPIO DE MARMELEIRO (PR)

Luís Carlos Braga. Universidade Estadual de São Paulo (UNESP)

Campus de Presidente Prudente l.karlos2009@hotmail.com

Resumo:

O artigo que segue, apresenta o nosso projeto de pesquisa de doutorado, que está em andamento e alguns resultados preliminares. Nossa proposta de estudo tem como propósito utilizar a abordagem das temporalidades e territorialidades para compreender a heterogeneidade da agricultura familiar de base camponesa praticada no Sudoeste do Paraná. Para obtermos um grau de detalhamento empírico satisfatório, escolhemos como recorte espacial o município de Marmeleiro. Essa temática surgiu após a realização da pesquisa de mestrado sobre a “Territorialização da produção leiteira e fumageira na Linha Itaíba, Marmeleiro (PR)”, em que constatamos a heterogeneidade, a complexidade, as desigualdades, as diferencialidades e os ritmos que estão presentes nas formas e nas relações de produção da agropecuária.

Palavras-chave: territorialidade, temporalidade, agricultura familiar.

Introdução

A análise da agricultura familiar através dos tempos e das temporalidades é uma abordagem inovadora, pois, existem poucas pesquisas empíricas desta natureza e ela nos permitirá entender as conjugações das produções, os diferentes ritmos, a influência dos agentes externos nos tempos dos agricultores, demonstrando que não há o predomínio da agricultura capitalista, mas, ao mesmo tempo, os agricultores não estão desvinculados do mercado.

Com o desenvolvimento da pesquisa pretendemos compreender as diversas temporalidades (ritmos, desigualdades, diferencialidades) que caracterizam a agricultura familiar no município de Marmeleiro, localizado no Sudoeste do Paraná. Essa heterogeneidade de relações da agricultura familiar é resultado da sua luta constante pela sobrevivência, para isso empregam estratégias, em alguns momentos de forma mais planejada com o apoio de políticas públicas, em outros momentos agem por “instinto” utilizando o que está a sua disposição.

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Raffestin etc. Também nos basearemos em estudiosos da questão agrária, tais como: Ariovaldo Umbelino de Oliveira, José Vicente Tavares dos Santos, Eliane Tomiasi Paulino, Bernardo Mançano Fernandes e Alexander Chayanov, dentre outros.

Sendo assim, o presente trabalho, apresenta alguns dados preliminares da pesquisa e também a fundamentação teórica inicial, demonstrando como pretendemos compreender as temporalidades e as territorialidades na realidade dos agricultores. Apresentação do município estudado e alguns dados preliminares

A produção agropecuária do recorte espacial escolhido para o estudo, não difere do restante da região Sudoeste do Paraná, ou seja, baseada nas pequenas unidades de produção rural com mão-de-obra familiar. Segundo dados do IBGE (2006), o município de Marmeleiro possui 13.463 habitantes e uma estrutura fundiária, segundo dados do Censo Agropecuário do IBGE (2006), com predominância de pequenos estabelecimentos agropecuários. A condição do agricultor em relação ao uso da terra é a seguinte: 1301 estabelecimentos próprios; 40 sem titulação definitiva; 94 arrendatários; 45 parceiros e 24 estabelecimentos ocupados, somando 1404 estabelecimentos agropecuários.

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Também estão presentes as produções de outras commodities como soja, trigo e milho, as quais são introduzidas com a modernização da agricultura e que são produzidas também nos pequenos estabelecimentos dos agricultores familiares, combinadas com outras atividades.

Outra produção que cresceu significativamente na região Sudoeste do Paraná, de modo particular no município de Marmeleiro, foi a de leite, tornando-se importante fonte de renda para os agricultores familiares. A caráter de ilustração podemos demonstrar esse aspecto fazendo uso dos dados obtidos junto a prefeitura, os quais revelam que 30% do Produto Interno Bruto (PIB) agropecuário do município de Marmeleiro provêm da produção leiteira. A atividade apresenta na sua dinâmica ritmos diferenciados, pois o leite produzido é comercializado por empresas de lacticínios, mas também por cooperativas criadas pelos agricultores que tentam conseguir mais autonomia.

Ao mesmo tempo, existem as produções alternativas. As mais significativas são a orgânica e a agroecológica por estarem baseadas em outros princípios, dos quais destacam-se a maior valorização da qualidade de vida, a produção de um alimento limpo e mais saboroso, a não contaminação dos recursos hídricos e a não utilização de agrotóxicos. Nos últimos anos, está tentando-se formar uma organização de redes próprias para a comercialização dessas produções.

No município, também é significativa a produção de alimentos para a subsistência da família. A título de ilustração, em Braga (2010), constatamos que, de uma amostragem de 21 agricultores, 90% dos entrevistados produzem algum produto para a subsistência e realizam também o abate de animais para o consumo. São produtos básicos, porém, são significativos para a economia da família.

Não é possível estudarmos as temporalidades dos agricultores do município de Marmeleiro, sem analisarmos o papel das chamadas Cooperativas de Interação Solidária, devido à quantidade e a influência que essas entidades exercem na agricultura familiar. Além disso, é consenso entre os envolvidos com o cooperativismo (idealizadores e dirigentes) que a região Sudoeste do Paraná tem potencial e capacidade de organização para o cooperativismo diferenciado.

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Solidária (CRESOL). Essas cooperativas exercem um papel importante no processo de produção, comercialização e acesso ao crédito da agricultura familiar, porém, elas passam por um processo de desvirtuamento dos seus pressupostos.

A produção agropecuária do município de Marmeleiro é afetada por elementos de ordem mundial. Esse processo ocorre porque os agricultores estão inseridos em diversas tramas territoriais. Isso é possível, devido à sobreposição dos territórios, aonde as diversas territorialidades e temporalidades fundem-se. “[...] as redes de circulação e comunicação, as relações de poder, as contradições e a identidade, interligam-se, fundem-se uma nas outras numa trama relacional (multitemporal e multiescalar) indissociável.” (SAQUET, 2007, p. 159).

Diante dessa realidade, complexa e conflituosa, entendemos que a análise das temporalidades nos permitirá entender melhor as conjugações das formas de produções, as relações de poder impostas pelos agentes do capital aos agricultores e as tentativas de organizações políticas dos agricultores que resultam em arranjos territoriais e temporalidades inacabadas e sobrepostas.

Um dos principais fatores que gera os diferentes ritmos e desigualdades é a distribuição social das formas de produção, que orienta a produção, a circulação, a troca e o consumo.

Podemos, então, dizer que a distribuição dos atributos sociais das formas de produção é anterior à produção. Segundo Marx (1983, p. 214), a distribuição, antes de ser a concepção banal da repartição dos produtos, é: “[...] distribuição dos instrumentos de produção e, [...] distribuição dos membros da sociedade pelos diferentes gêneros de produção [...]”; deve-se levar em conta essa distribuição porque “[...] a distribuição dos produtos é implicada por esta distribuição, que constitui na origem um fator de produção [...]” (Idem,p. 214).

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movimentos são oficializados através do contrato de integração, a onde o agricultor é obrigado a comprar os insumos e vender o seu produto para a empresa integradora. Assim, o sistema é construído pelos atores e suas relações de poder, os quais produzem dinâmicas sociais que imprimem as características de cada território, determinando limitações e transposições dos limites políticos e administrativos através de ligações em redes.

As redes da produção, circulação, troca e consumo permeiam o espaço agrário, somando-se com as formas de produção já existentes e criando estruturas necessárias as novas produções.

As malhas dos circuitos são resultados das várias relações sociais e espaciais, estabelecidas entre as diferentes escalas geográficas, que envolvem distintas articulações, econômicas, políticas e culturais.

Fundamentação teórica

Para melhor compreender as temporalidades e territorialidades da produção agropecuária, aprofundaremos a discussão dos conceitos de tempo, temporalidade, território, territorialidade.

Fernand Braudel (1992) tem no centro de suas reflexões o tempo histórico. “[...] a história é a soma de todas as histórias possíveis – uma coleção de misteres e de pontos de vista, de ontem, de hoje, de amanhã” (p.53).

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produção, divisão territorial do trabalho e dos atributos da produção, religiões, crenças, costumes, enfim, processos que levaram milhares de anos para se constituírem.

Entendemos que as concepções de Braudel (1992) são fundamentais para uma pesquisa com base geográfica, pois necessitamos entender o processo histórico, sendo assim, ela constitui-se em um elemento importante principalmente porque sua abordagem supera a análise imediata/superficial do tempo, permitindo analisar as relações de poder, oscilações, as conflitualidades que formaram a base da sociedade, e não somente os acontecimentos que “saltam aos olhos”.

Outra abordagem importante para nossa pesquisa é a do tempo das coexistências. Para Santos (1997), a coexistência seria simultaneamente o tempo da vida de todos, ou seja, o tempo concreto. Ainda segundo Santos (2008), todos os lugares relacionam-se com um tempo do mundo, que é um tempo mais externo, do modo de produção dominante, e os lugares diferenciam seu tempo pela intensidade quantitativa e qualitativa com que são atingidos por esse tempo do mundo. Os eventos seguem uma ordem temporal, mas não acontecem desvinculados uns dos outros. “[...] O espaço é que reúne a todos, com suas múltiplas possibilidades, que são possibilidades diferentes de uso do espaço (do território) relacionados com possibilidades diferentes de uso do tempo” (SANTOS, 2008, p. 160).

Em cada lugar, o tempo das diversas ações e dos diversos atores e a maneira como utilizam o tempo social não são os mesmos. No viver comum de cada instante, os eventos não são sucessivos, mas concomitantes. Temos, aqui, o eixo das coexistências (SANTOS, 2008, p.159).

Para analisarmos os tempos e as temporalidades, é preciso entendê-los de forma contínua, identificando as transformações e permanências, pois:

O tempo é um fluxo contínuo. Por isso, a definição de períodos, começos e fins é relativa, [...] O tempo presente, passado e futuro, indica uma processualidade e, também, a simultaneidade; significa transtemporalidade. O presente ou o passado pode estar sendo vivido por diferentes indivíduos, no mesmo instante (SAQUET, 2007, p.170).

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que as inovações e o “desenvolvimento” não chegam instantaneamente a todos os lugares. O tempo é formado por tempos lentos e tempos mais rápidos (SAQUET, 2000).

[...] não há uma homogeneidade do espaço, mas uma heterogeneidade de tempos e espaços em cada unidade espacial de análise [...] No processo de apropriação e produção do espaço geográfico, onde as partes relacionam-se desigualmente entre si e com o todo, dá-se o desenvolvimento desigual entre lugares, atividades e pessoas, no interior de uma sociedade cada vez mais mundializada. Os tempos são múltiplos. O novo não chega a todos os lugares no mesmo momento histórico. Aliás, é das desigualdades sócio-econômicas e político-culturais, no espaço, que o capitalismo se renova cada vez mais forte (SAQUET, 2000, p.152).

Assim também, a modernização da agricultura não é homogênea, ela desenvolve-se sobre a base histórica, que possui especificidades em cada território, resultando em um desenvolvimento desigual. “Todo devir é começo: o que não era, o que não é, vai ser; passa do nada ao ser. E todo devir é fim. O que termina deixa de ser, vai do ser ao nada” (LEFEBVRE, 1995, p.190), mas, também ocorre um processo de conjugação pois, “[...] o velho não é suprimido, eliminado, mas superado, permanecendo, parcialmente, no novo [...] O novo contém em si o velho [...] ”(SAQUET, 2007, p.163). Esse processo de complementação ocorre porque, segundo Sposito (2008), o território é resultado de um processo histórico, mas é também o devir para a construção de novas territorialidades. É o processo de acumulação do tempo histórico e da conjugação dos diferentes ritmos de tempo, que possibilita a apreensão do passado, a constituição do presente e a projeção do futuro. Então é esse processo que, segundo Marques (2008), diferencia tempo e temporalidade. O tempo “[...] É o presente absoluto da ação, já que não é passado nem futuro.” (MARQUES, 2008, p.45). A temporalidade é a compreensão da relação entre passado, presente e futuro.

Para a autora, se não existir na consciência do ser humano, a unidade do presente, passado e futuro, não há temporalidade, apenas o tempo em si. O tempo é destituído de sentido, mas a temporalidade só tem sentido na experiência vivida, medida pelo ser humano.

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em si, mas o das ações que animam os objetos técnicos. Mesmo assim, são estes que oferecem as possibilidades e dão os limites” (SANTOS, 2008, p.267).

Saquet (2006) analisando a obra de Chayanov (1974), afirma que o trabalho da família na unidade campesina tem como objetivo, não o lucro, mas a sobrevivência/suprimento das necessidades da família. A sua lógica interna é regulada pela necessidade da reprodução familiar. Essa reprodução passa pela relação da exploração da força de trabalho e o consumo da família. No interior da família, existe uma divisão técnica do trabalho. Cada membro desempenha um trabalho útil e concreto, dependendo do momento e da necessidade, articulando um processo de cooperação, em que os membros da família formam uma jornada combinada de trabalho (SANTOS, 1978). Sendo assim, a lógica organizacional, as temporalidades da unidade econômica campesina difere da lógica organizacional do agronegócio. Porém, a unidade familiar não está desvinculada do mercado capitalista e do capital financeiro, ocorrendo ai disputas de poder.

Para entendermos essas relações de poder presentes no território é preciso superar o conceito de território somente como espaço de governança, porque está visão é utilizada “[...] como forma de ocultar os diversos territórios e garantir a manutenção da subalternidade entre relações e territórios dominantes e dominados [...]” (FERNANDES, 2009, p. 200). O território quando é compreendido pela sua “[...] diferencialidade pode ser utilizado para a compreensão das diversidades e das conflitualidades das disputas territoriais” (FERNANDES, 2009, p. 200)

Em Braga (2010), identificamos na produção do fumo, um exemplo de disputa de poder, através do sistema de integração da empresa fumageira Souza Cruz, aonde o agricultor é subordinado, porém:

Compreender o campesinato como um sistema subalterno não significa ter uma visão mecânica, mas sim considerar a estrutura e as dimensões que compreendem seu modo de vida, a partir de seu território, sua cultura e identidade, seus valores, suas formas de luta e resistência no enfrentamento com o capital. Condições essenciais para continuar sendo camponês. [...] a predominância do trabalho familiar é uma característica do campesinato (e não do capital). O campesinato não promove diferentes tipos de concentração: terra, capital, poder etc. Ao contrário, ao realizar a sua reprodução ampliada por meio da mais-valia, o capital supera os limites de tempo e espaço, o que lhe possibilita o crescimento e a necessidade da concentração para continuar crescendo (FERNANDES, 2008 p.166-167).

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O subdesenvolvimento, como o desenvolvimento, ocorre em todas as escalas espaciais e o capital tenta se movimentar geograficamente de tal maneira que continuamente explora as oportunidades de desenvolvimento, sem sofrer os custos econômicos do subdesenvolvimento (SMITH, 1988, p. 213).

Entendemos que, para nossa análise, seja importante dissociar território de territorialidade, pois compreendemos o território como conseqüência do processo de territorialização.

Ele constitui um lugar de vida. Este processo é condicionado e gera as territorialidades, que são todas as relações diárias que efetivamos, (i) materiais, no trabalho, na família, na igreja, nas lojas, nos bancos, na escola etc. Estas relações, as territorialidades, é que constituem o território de vida de cada pessoa ou grupo social num determinado espaço geográfico (SAQUET, 2006, p.62).

Ainda “[...] As territorialidades são as representações dos tipos de uso dos territórios” (FERNANDES, 2009, p. 205).

Sendo assim, geramos e somos introduzidos em territorialidades a todo momento, objetivamente ou subjetivamente, e essas territorialidades combinam diferentes temporalidades.

Em relação aos agricultores familiares, os ritmos de tempos coexistem por causa da flexibilidade dos mesmos em combinar diferentes formas de produção para sobreviverem. Existe uma flexibilidade singular na economia familiar que lhe propicia “[...] adaptar-se às condições das mais adversas, ao preço da permanência no mais baixo patamar da sociedade no que diz respeito ao usufruto da riqueza” (PAULINO, 2008, p.219).

A questão não é que os agricultores familiares não podem ser inseridos em tempos rápidos, o que se questiona são as formas de inserção dos mesmos nesse tempo, as suas funções, objetivos. Da forma como está distribuído o acesso a tecnologia “[...] é mínima a parcela das pessoas que, mesmo nos países mais ricos, se beneficiam plenamente dos novos meios de circulação [...]” (SANTOS, 2008, p. 202). Os agricultores precisam ter acesso à tecnologia menos degradante e subordinante, que não comprometa as suas condições financeiras e também a saúde, ele não deve negar o mercado, mas as relações sociais devem ser modificadas.

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Para facilitar a compreensão, didaticamente, dividimos as temporalidades e as territorialidades, porém, ambas ocorrem ao mesmo tempo, ou seja, são multidimensionais, econômicas, políticas e culturais (SAQUET, 2011). Todas as relações diárias das pessoas no território correspondem às territorialidades, são intencionalidades, conflitos, interações e práticas. As relações são intencionais e são permeadas pelo poder, conforme os objetivos e as necessidades de cada sujeito, tanto no espaço rural quanto na cidade.

Já as temporalidades correspondem aos ritmos de vida das pessoas, que também são econômicos, políticos e culturais. Algumas pessoas das grandes cidades, por exemplo, estão inseridas em redes complexas, velozes e internacionais. Outras pessoas, nas mesmas cidades, têm um ritmo cotidiano mais cadenciado, vinculado diretamente às suas condições de vida. No espaço rural, algumas famílias têm maior mecanização, produzem maior quantidade de mercadorias e estão mais inseridas no mercado, portanto, têm um ritmo acelerado de trabalho e de vida; utilizam os bancos, viajam mais seguidamente, participam de sindicatos etc., enquanto que outros agricultores ainda utilizam o arado e a carroça (carro de bois), equipamentos simples de trabalho (como enxadas, matracas), produzem pequenas quantidades de mercadorias (como o fumo), viajam pouco e, quando se deslocam, dirigem-se às cidades mais próximas em busca de assistência médica. Eles têm um ritmo de vida mais lento, diretamente vinculado à produção vinculada à subsistência familiar, sem a intencionalidade de valorização do capital.

É preciso entender como os tempos dos agricultores coexistem e são influenciados pelos tempos externos, das organizações comerciais que compram o seu produto, das indústrias que vendem os insumos, dos sindicatos, dos bancos que financiam as produções. Essa influência no ritmo dos agricultores vai além da questão dos horários bancários, por exemplo, está relacionada à assimilação/adequação de tecnologias, aos efeitos de um processo histórico de modernização agrícola que não deu condições para os pequenos produtores se modernizarem, mas atingiu todos os espaços agrícolas, induzindo-os a atingirem escalas maiores de produção; terem o valor dos seus produtos cada vez mais definidos por lógicas financeiras globais.

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Entendemos que para uma pesquisa com essa abordagem é necessária a realização de uma análise empírica detalhada das atividades agropecuárias, para podermos entender em quais temporalidades ela está inserida, ou seja, estudar quais os objetivos dos agricultores familiares, as estratégias territoriais em que estão inseridos e como ocorrem as ações das entidades ligadas à agricultura familiar e das empresas capitalistas no território desses agricultores. As ações dessas instituições são fundamentais na definição dos ritmos, das desigualdades e das territorialidades na agricultura familiar.

Podemos compreender as diferentes temporalidades dos agricultores através da análise das suas territorialidades cotidianas. Como o tempo dos agricultores vem sendo alterado através do aumento da mercantilização da produção, conjugando produções realizadas com técnicas rudimentares voltadas ao consumo da família com outras voltadas para a comercialização.

Cada produção tem suas peculiaridades e temporalidades vinculadas ao período do ano, às técnicas, às tecnologias e à comercialização. A produção do fumo exige mais trabalho braçal, a produção de grãos é mais mecanizada, a produção de leite ainda é vinculada a uma organização mais regional que facilita sua comercialização, porém, precisa ser resfriado, recolhido todos os dias porque é um produto perecível. As temporalidades mais visíveis podem ser analisadas na territorialidade cotidiana do agricultor, no ritmo das tarefas realizadas na produção e noutras atividades rotineiras, na utilização das máquinas e dos equipamentos e por meio da sua mobilidade no espaço rural (relações de vizinhança, por exemplo) e para a cidade (relações normalmente mercantis).

Toda a heterogeneidade de temporalidades existente nos permite apontar que a agricultura do município em questão, não pode ser entendida como uma agricultura do agronegócio, aonde o agricultor é um empregado assalariado, sem ação, sem participação na tomada de decisões e que não utiliza mais formas de produção tradicionais. Ao mesmo tempo, não é possível ignorar a infiltração do capitalismo no campo, e afirmar que o agricultor não está inserido no mercado e que ele busca negar o mercado, o que ocorre é uma conjugação de diferentes temporalidades e territorialidades que possibilita a sobrevivência do agricultor familiar.

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