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A TEORIA DA ACTIO LIBERA IN CAUSA E A IMPUTABILIDADE PENAL MESTRADO EM DIREITO

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(1)

A TEORIA DA

ACTIO LIBERA IN CAUSA

E A

IMPUTABILIDADE PENAL

MESTRADO EM DIREITO

PUC/SP

SÃO PAULO

(2)

A TEORIA DA

ACTIO LIBERA IN CAUSA

E A

IMPUTABILIDADE PENAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do titulo de Mestre em Direito das Relações Sociais (Direito Penal), sob orientação do professor doutor Dirceu de Mello.

PUC/SP

SÃO PAULO

(3)

BANCA EXAMINADORA

_________________________________

_________________________________

_________________________________

(4)

“ (...) tem me animado até hoje a idéia de que o

menos que alguém pode fazer, numa época de

atrocidades e injustiças, como a nossa, é

acender sua lâmpada, fazer luz sobre a

realidade de seu mundo, evitando que sobre ela

caia a escuridão... riscar o nosso fósforo, como

sinal de que não desertaremos do nosso posto”.

(5)

“A gratidão é a memória do coração”.

Victor Hugo

Ao meu orientador professor doutor Dirceu de Mello, minha

eterna gratidão por ter tido a felicidade de abeberar-me de seus

profundos ensinamentos.

À professora assistente doutora Waléria Garcelan Loma

Garcia, obrigada pelos seus ensinamentos, confiança e estímulo.

(6)

RESUMO

10

ABSTRACT

12

CAPÍTULO I – IMPUTABILIDADE

1. Imputabilidade

14

1.1. Breve introdução

14

1.2.

Histórico

14

1.2.1. O direito penal romano

15

1.2.2 O direito penal lusitano

16

1.2.3 O direito penal do Brasil Império

17

1.2.4. O direito penal do Brasil República

19

1.3. Os sistemas de determinação da imputabilidade

24

1.4. A imputabilidade no direito comparado

25

1.4.1.

Itália

25

1.4.2.

Argentina

25

1.4.3.

Peru

26

1.4.4. Chile

26

1.4.5.

Cuba

27

1.4.6.

Portugal

27

1.4.7.

Espanha

28

1.4.8.

Alemanha

29

1.4.9. Direito Canônico

29

2. Culpabilidade e responsabilidade

30

2.1. Histórico da evolução dos conceitos

30

2.1.1. Os primórdios da civilização

30

(7)

2.1.4.1. A filosofia do Direito Romano

35

2.1.4.2. Dolo e culpa

37

2.1.5. Direito Penal Germânico

39

2.1.6. Direito Canônico

40

2.1.7. Direito Medieval

40

2.1.8. Período Humanitário

41

2.1.9. Período clássico

44

2.1.9.1. As Escolas Penais

45

2.1.9.1.1. A escola clássica

46

2.1.9.1.2. A escola antropológica

47

2.1.9.1.3. A escola crítica

50

2.2. A responsabilidade no Brasil

52

3. A concepção psicológica da culpabilidade e o conceito

da imputabilidade

56

4. A teoria psicológica-normativa da culpabilidade e o conceito

da imputabilidade

57

5. A teoria finalista ou normativa pura da culpabilidade e o

conceito da imputabilidade.

58

CAPÍTULO II – A

ACTIO LIBERA IN CAUSA

1.

Histórico

59

1.1. Antecedentes históricos da Actio Libera In Causa

59

1.2. Origem do termo actio in libera in causa

62

2. A actio libera in causa

64

2.1.

Conceito

64

(8)

2.2.3. Caráter doloso

67

3. Divergência doutrinária

67

4. A actio libera in causa e os crimes dolosos

70

5. A actio libera in causa e os crimes culposos

70

6. A embriaguez

72

6.1. A embriaguez e a actio libera in causa

74

6.2. A embriaguez culposa

74

6.3. A embriaguez dolosa

76

6.4. A embriaguez preordenada

76

6.5. O caso fortuito e a força maior

77

CAPÍTULO III – EMBRIAGUEZ NO DIREITO COMPARADO

3.1. Breve introdução

80

3.2.

Antiguidade

80

3.3. Idade Média

81

3.4.

Itália

81

3.5. França

83

3.6. Países do Benelux

84

3.7.

Suécia

85

3.8.

Noruega

86

3.9.

Dinamarca

86

3.10.

Finlândia

87

3.11.

Inglaterra

87

3.12. Estados Unidos

88

3.13.

Portugal

89

(9)

4.1. Código Criminal do Império do Brasil (1830)

91

4.2. Código Penal da República Velha (1890)

92

4.2.1. A origem da redação do Código

92

4.2.2. O conceito de embriaguez da época

97

4.2.3. A embriaguez perante o Código

98

4.3. Os projetos Vieira de Araújo (1893)

100

4.4. Projeto Galdino Siqueira (1913)

101

4.5. Projeto Virgílio Sá Pereira (1928)

103

4.6. Consolidação das Leis Penais (1932)

103

4.7. Projeto Alcântara Machado (1938)

104

4.8. Código Penal de 1940

105

4.9. Lei das Contravenções Penais (1941)

107

4.10. Projeto Nélson Hungria (1961 a 1969) e

Código Penal de 1969

108

4.11. Lei de Tóxico (Lei 6368, de 21 de outubro de 1976)

109

4.12. Lei 7209 de 11 de julho - Reforma penal de 1984

110

4.13. Projeto de reforma do Código Penal

114

CONCLUSÃO

115

(10)

RESUMO

Desde os primórdios da civilização existe o consumo de álcool seja por prazer ou para desinibir a personalidade. Porém a partir do consumo excessivo de tal substância ou outras de efeitos análogos advêm problemas sociais e de saúde, e por essa razão torna-se um objeto de estudo da sociedade.

Do ponto de vista da Saúde o alcoolismo é considerado uma doença crônica, progressiva e fatal que pode causar seqüelas físicas e psicológicas.

Em particular e como foco desse trabalho temos a visão jurídica sobre a embriaguez e sobre os efeitos decorrentes da mesma ao longo das décadas. Nosso sistema penal não condena o ato de se embriagar e declara isento de pena o agente que não tiver condição de entender a ilicitude do fato praticado ou de determinar-se de acordo com isso no momento do ato.

Por muito tempo em nosso Código, a embriaguez foi considerada um atenuante para os delitos cometidos sob seu efeito devido a privação parcial ou total do agente de seus sentidos, fato que será abrangido nesse trabalho, assim como a comparação do tratamento da embriaguez na legislação de outros países.

Atualmente, a embriaguez, voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade, a não ser se derivada de caso fortuito ou de força maior. E se o agente tiver se embriagado propositadamente a fim de cometer o crime, seja para se privar parcialmente da consciência, tomar coragem ou ainda tentar usar essa causa como atenuante em sua pena, ao contrário terá um agravante.

Nesses casos de privação parcial da mente entra em ação o instituto das actione liberae in causa, que assumem uma política criminal de responsabilização penal na qual o resultado produzido no estado de inimputabilidade deveria ser possível de ser previsto ou quisto pelo agente, que se colocara em condições de incapacidade de entender ou de querer, para praticar o crime ou então para que tenha uma desculpa para o mesmo.

(11)
(12)

ABSTRACT

Since the beginning of civilization there has been alcoholic use just for simple pleasure or for stimulation. But device excessive alcoholic beverage or another substances of similar effects use has been increased the number of social and health problems, and then, has became an society object of study,

From Health point of view, alcoholism is a chronic, progressive, and fatal disease, which has physical and psychological effects.

Particularly and as object of study of this paper, there is yet the judiciary point of view about drunkenness and its effects throw the decades. Our penal system does not punish the act of drinking and declare free of punishment the individual that who at the moment of the act do not have the capacity of understand the unlawfulness of his act or to behave in accordance with this understanding.

For long time in our Penal Code, drunkenness was considered an attenuate for crimes committed under its effect device the agent partial or complete privation of senses, fact which will be approached in this one, besides the comparison of other countries legislation treatment for this subject.

Nowadays, voluntary or culpable drunkenness does not exclude imputability, unless in cases it is result from accident or majored force. And if the individual has intentionally drunk for practice a crime, or to lose partial or completely conscience, or gain courage, or to try to use this fact as an attenuating excuse, otherwise, it will work as an aggravator.

In these cases of partial or complete mental privation enters the institute of actione liberae in causa, which consist in a criminal politic of penal responsabilization that assumes the produced result in unimputability stage should be estimated or wanted by the agent, and this one had been put himself in this situation for practicing the crime or to have an excuse for it.

(13)
(14)

CAPÍTULO I – IMPUTABILIDADE

1. Imputabilidade

1.1. Breve introdução

Embora o Código Penal trate do termo inimputabilidade, alguns autores preferem tratar o antônimo. Assim, Aníbal Bruno considera imputável o homem mentalmente desenvolvido e mentalmente são, que possui a capacidade de entender o caráter criminoso do seu ato e de determinar-se de acordo com este entendimento que o homem adquire progressivamente, com o desenvolvimento físico e mental, até atingir o seu pleno crescimento.

1.2. Histórico

Os códigos atuais e de outrora não dispõe sobre a imputabilidade, mas sim quanto a inimputabilidade, resultando a imputabilidade em conceito “a contrário senso”. Para que se entenda o conceito moderno é necessário que se analise a evolução ao longo dos anos e dos diferentes códigos. Para tal, devemos lembrar que o Brasil foi colônia portuguesa e, portanto, sofreu influência do código da metrópole, que por sua vez teve sua formação jurídica inspirada no Direito Romano. A vigência deste é demarcada com a criação da Lei das XII Tábuas até a morte de Justiniano, em 565 d.C.1.

(15)

1.2.1. O direito penal romano

Os romanos alcançaram amplo desenvolvimento da doutrina da imputabilidade, da culpabilidade e de seus excludentes, assim como os conceitos de culpa (forma de negligência ou descuido culpável) e dolo (ofensa intencional à lei moral e à lei do Estado). Dentre os avanços da teoria da culpabilidade, garantiram a responsabilidade subjetiva (exigência de dolo e culpa) e pessoal.

Consideravam os infantes (até sete anos) inimputáveis; os impúberes

(entre sete e catorze anos) poderiam ser considerados culpados desde que se demonstrasse que haviam quisto praticar o mal (dolus malus) e os minores (até vinte e cinco anos) poderiam ter reconhecidas condições atenuantes2. No caso de haver se comprovado o discernimento dos impúberes para agir com dolus malus, eram sujeitados apenas à castigatio, por razões educativas ou considerações práticas segundo a legislação justiniânea e a esse instituto deram o nome de ficção da puberdade. O castigatio consistia em assustar os menores infratores e bater neles com uma correia ou uma vara, nunca sendo constituída de tortura. Embora a idade do infrator sempre aparecesse ao lado do nome nos processos, para aqueles com idade próxima à puberdade eram separados o desenvolvimento corporal e o intelectual, podendo, então, não ter alcançado a idade especificada para ser julgado de outro modo, mas o será se for considerado com maturidade e capacidade do dolo. Eram, também, considerados inimputáveis os alienados, assim como os autores de crimes praticados em estado passional de máxima intensidade. Os atos cometidos durante estado de embriaguez, por gerar uma situação de menor lucidez, eram tratados com menor severidade. Os casos de legítima defesa também não eram puníveis desde que se comprovasse o ocorrido. Ou seja, em outras palavras, a imputabilidade no Direito Romano era vista como a condição do indivíduo de

2 Cf. Ferrini, Contardo. Esposizione storica e dottrinale del diritto penale romano, “in”

(16)

praticar determinados atos com discernimento, idéia equivalente à capacidade de Direito Penal apontada por Basileu Garcia3.

1.2.2. O direito penal lusitano

O Direito Penal lusitano passou a vigorar no Brasil após o descobrimento do mesmo. Na Metrópole vigoravam as Ordenações Afonsinas, publicadas em 1446, sob o reinado de D. Afonso V. Em 1521, D. Manuel I determinou sua substituição pelas Ordenações Manuelinas. Essas vigoraram até a Compilação de Duarte Nunes de Leão, em 1569 a mando do rei D. Sebastião. Porém essas ordenações não chegaram a ser eficazes na colônia devido às peculiaridades aqui existentes. Portanto, na realidade, existia uma infindável quantidade de leis e decretos reais para a colônia, que conferiam amplos poderes aos donatários de terras, deixando cada um com autonomia para aplicar o regime jurídico da forma que achasse mais conveniente.

Em 1603, Filipe II promulgou as Ordenações Filipinas com punições cruéis de tortura e predomínio de pena de morte e vigorou por dois séculos. No livro das Ordenações Filipinas não são encontradas normas que digam respeito à imputabilidade, semi-imputabilidade ou inimputabilidade, com exceção ao que se referia ao menor de dezessete anos, contra quem não poderia ser aplicada a pena de morte natural, sendo conferida ao julgador a possibilidade de substituição dela por outra sanção de espécie diversa. Essas ordenações traziam o citado sob o Título CXXXV – Livro V:

“Quando algum homem, ou mulher, que passar de vinte annos, cometter qualquer delicto, dar-se-lhe-há pena total, que lhe seria dada, se de vinte e cinco annos passase.

E se for de idade de dezassete annos até vinte, ficara em arbítrio dos julgadores dar-lhe a pena total, ou diminuir-lha.

3 GARCIA, Basileu. Instituições de Direito Penal, volume I, tomo I, 2ª edição. São Paulo: Max Limonad

(17)

E em este caso olhara o julgador o modo, com que o delicto foi commettido, e as circunstâncias delle, e a pessoa do menor; e se o achar em tanta malicia, que lhe pareça que merece total pena, dar-lhe-há, posto que seja de morte natural.

E parecendo-lhe que a não merece, poder-lha-há diminuir, segundo a qualidade, ou simpleza, com que achar, que o delicto foi comettido.

E quando o delinqüente for menor de dezassete annos cumpridos, postoque o delicto mereça morte natural, em nenhum caso lhe será dada, mas ficara em arbítrio do Julgador dar-lhe outra menor pena. E não sendo o delicto tal, em que caiba pena de morte natural, se guardara a disposição do Direito Commun.”

O Livro V refletia o Direito Penal da época, que tinha a pena de morte como sanção aplicada quase que invariavelmente, e era marcado pela falta de critério na distinção entre os conceitos de pecado e crime, bem como pela forma assistemática e irracional da disposição da matéria criminal, o que retratava a crueldade previamente citada.

1.2.3 O direito penal do Brasil Império

(18)

baseada no Livro V, Baptista Pereira afirmou: “Espelho, onde se refletia, com inteira fidelidade, a dureza das codificações contemporâneas, era um misto de despotismo e de beatice, uma legislação híbrida e feroz, inspirada em falsas idéias religiosas e políticas, que invadindo as fronteiras da jurisdição divina, confundia o crime com o pecado, e absorvia o indivíduo no Estado fazendo dele um instrumento. Na previsão de conter os maus pelo terror, a lei não media a pena, pela gravidade da culpa; na graduação do castigo obedecia, só, ao critério da utilidade.” Ressalta-se que, embora, essa norma pareça agressiva demais à época aos estudiosos do presente e alguns legisladores de tal momento histórico, Rebello Pinho aponta, após análise de outros diplomas penais europeus contemporâneos que as leis portuguesas não destoavam das dos demais povos ditos cultos da Europa4.

Projetos de Código Criminal foram montados e apresentados a partir de 1826 por Bernardo Pereira de Vasconcelos e Clemente Pereira, fazendo com que a Câmara, em 1828, optasse pela criação de uma comissão bilateral para a análise dos mesmos. Em 1830 finalizou-se a redação do Código que havia sido imposta pela Constituição do Império no seu artigo 179, inciso XVIII. Esse mesmo artigo 179 reúne como premissas do novo regime punitivo alguns dos postulados iniciais do Direito Penal Liberado, os mais opostos ao regime das Ordenações, como o princípio da igualdade de todos perante a lei (inciso XIII) e o de que a pena não passaria da pessoa do criminoso (inciso XX)

Nesse Código ficou estabelecido que não se julgariam pessoas com idade inferior a catorze anos, os loucos de todo gênero que cometessem atos criminosos fora de possível período de lucidez, e aqueles casos que caracterizassem a legítima defesa, ou seja, crimes violentados por força ou por medo irresistíveis. Transcreve-se o Código Criminal do Império em seu artigo 10:

“Art. 10 - Também não se julgarão criminosos:

§1º Os menores de quatorze annos

4 Pinho, Rebello, História do Direito Penal Brasileiro – Período Colonial, São Paulo, José

(19)

§2º Os loucos de todo o gênero, salvo se tiverem lúcidos intervallos e nelles commeterem o crime.

§3º Os que commetterem crimes violentados, por força ou por medo irresistíveis.

§4º Os que commetterem crimes casualmente, no exercício ou pratica de qualquer acto licito,feito com atenção ordinária.”

Apesar da prescrição disposta no artigo 10, o referido código não se fechava à possibilidade de que, mesmo tendo menos de 14 anos de idade, o “menor criminoso” poderia estar agindo de forma consciente e com discernimento, segundo o art. 13:

“Art. 13 - Se se provar que os menores de quatorze annos, que tiverem commettido crimes, obrarão com discernimento, deverão ser recolhidos às casas de correção, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda a idade de dezasete annos”.

Em tal caso deveria ser encerrado em uma casa de correção. Esta prescrição assemelha-se ao direito romano na sua última fase, pois mesmo julgando não criminosos os menores de 14 anos, se agissem com discernimento, poderiam ser considerados relativamente imputáveis.

1.2.4. O direito penal do Brasil República

(20)

aprovado e publicado em 11 de outubro de 1890, de acordo com o decreto 847. Aqui, no Código Penal da República dos Estados Unidos do Brasil, fica definido que os menores de catorze anos que agissem sem discernimento não seriam considerados criminosos, assim como aqueles que apresentassem imbecilidade nativa ou enfraquecimento senil ou que estivessem privados totalmente de seus sentidos e senso no ato do delito ou mesmo dotado de perturbação dos mesmos. Também seriam considerados absolutamente inimputáveis os surdo-mudos que não tivessem recebido educação e instrução para diferenciar o certo do errado e reconhecer seus atos, aqueles que agissem em legítima defesa devido à ameaça violenta real e danosa à vida.

“Art. 27 - Não são criminosos:

§1º Os menores de 9 annos completos;

§2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento;

§3º Os que por imbecibilidade nativa, ou enfraquecimento senil, forem absolutamente incapazes de imputação;

§4º Os que se acharem em estado de completa privação de sentidos e de intelligencia no ato de cometer o crime;

§5º Os que forem impellidos a commeter o crime por violência physica irresistível, ou ameaças acompanhadas de perigo actual;

§6º Os que commetterem o crime casualmente, no exercício ou prática de qualquer acto lícito, feito com attenção ordinária;

(21)

Art. 29 - Os indivíduos isentos de culpabilidade em resultado de affecção mental serão entregues às suas famílias, ou recolhidos a hospitaes de alienados, si o seu estado mental assim exigir para segurança do público.

Art. 30 - Os maiores de 9 annos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento, serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriaes, pelo tempo que ao juiz parecer, comtanto que o recolhimento não exceda à idade de 17 annos”.

Posteriormente, vários projetos visando a revisão do estatuto penal de 1890, destacando-se Galdino Siqueira, Sá Pereira e Vicente Piragibe e Alcântara Machado. O projeto Galdino Siqueira, de 1913, em seu artigo 16, propõe que os inimputáveis perigosos deveriam ser internados em manicômio ou em hospitais de alienados, em seção distinta, à qual poderiam retornar, a cargo da decisão do juiz criminal.

O projeto Virgílio Sá Pereira, de 1928, mencionava os “delinqüentes de imputabilidade restrita” (art. 29, § 3º), e tornava o decreto do juiz de internamento do acusado, que absolvido por falta de imputabilidade, ou por tê-la diminuída, quando manifesta sua “temibilidade” uma obrigatoriedade (art. 171).

A Consolidação das Leis Penais, cujo autor é Vicente Piragibe, aprovada e adotada pelo decreto nº 22.213, de 14 de dezembro de 1932, restabeleceu a maioridade penal aos catorze anos de idade, estipulou regras para a internação dos criminosos de doença mental e, ainda, fixou causas passíveis de reconhecimento de inimputabilidade.

“Art. 27 – Não são criminosos:

(22)

§ 2º Os surdos-mudos de nascimento, que não tiverem recebido educação nem instrução, salvo provando-se que obraram com discernimento;

§ 3º Os que, por imbecilidade nativa, ou enfraquecimento senil, forem totalmente incapazes de imputação;

§ 4º O que se acharem em estado de completa perturbação de sentidos e de inteligência no acto de commetter o crime.

Art.29 - Os indivíduos isentos de culpabilidade em resultado de affecção mental serão entregues as suas famílias, ou recolhidos a hospitais de alienados, si o seu estado mental assim exigir para segurança do publico.Enquanto não possuírem os Estados manicômios criminaes, os alienados delinqüentes e os condemnados alienados somente poderão permanecer em asylos públicos, nos pavilhões que especialmente se lhe reservem”.

Francisco Campos convidou Alcântara Machado para a elaboração do novo código; o anteprojeto foi apresentado em 1938 e foi entregue à comissão revisora integrada por Nélson Hungria, Roberto Lyra, Narcélio de Queiroz e Vieira Braga, com a colaboração de Costa e Silva. Reparos foram feitos no projeto, e assim, Alcântara Machado foi obrigado a refazer seu trabalho, terminando-o em abril de 1940. O novo código foi sancionado pelo decreto n. 2848, de 7 de setembro de 1940 e entrou em vigor em 1 de janeiro de 1942.

O Código Penal de 1940, na parte geral, título III, arts. 22 a 24 refere-se à responsabilidade, tratando da irresponsabilidade penal plena no “caput” do art. 22, artigo 23 e 24 parágrafo 1º e da semi-responsabilidade penal no parágrafo único do artigo 22 e 24, §2º. Trata, ainda, da responsabilidade penal plena no artigo 24, I e II.

(23)

O Código Penal de 1969 substitui em seu texto o título responsabilidade para imputabilidade penal, abrangendo, nos artigos 31 a 34, as figuras pertinentes:

“Art.31 “caput” - Não é imputável quem, no momento, da ação ou da omissão, não possui a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, em virtude de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

Parágrafo único. Se a doença ou a deficiência mental não suprime, mas diminui consideravelmente a capacidade de entendimento da ilicitude do fato ou de autodeterminação, não fica excluída a imputabilidade, mas a pena pode ser atenuada, sem prejuízo do disposto no art. 94.

Art. 32 – Não é igualmente imputável o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esdeterminar-se entendimento.

Art. 33 – O menor de dezoito anos é inimputável.

(24)

Temos, então, o Código resultado segundo o Decreto-Lei nº 1.004, de 21 de outubro de 1969; que foi posteriormente revogado pela Lei nº 6.578 de 11 de outubro de 1978, nunca tendo entrado em vigor, portanto.

1.3. Os sistemas de determinação da imputabilidade

Para determinação da imputabilidade levam-se em conta três sistemas:

1º) biológico ou etiológico: adotado pelo Código Penal francês no artigo 64 e pelo pátrio em 1830 e que não considera crime nem delito o ato cujo autor seja debilitado mentalmente nativo, tal qual desenvolvimento incompleto ou retardo, ou possua alguma enfermidade que o torne incapaz de responder por suas ações ou, ainda, aquele que o cometer devido a uma força irresistível ou tomado por embriaguez completa ou fortuita.

2º) psicológico: acolhido pelo Código dos Estados Unidos do Brasil em 1890 e que torna irresponsável o autor que ao momento do ato não consiga interpretar a ilicitude do mesmo (momento intelectual) e posicionar-se de acordo com essa apreciação (momento volitivo). Ou seja, não há a necessidade de demonstração da insanidade mental.

3º) biopsicológico: acolhido pelo legislador do Código Penal de 1940 e pela Reforma de 1984 e que junta os dois sistemas anteriores como se encontra na Exposição de Motivos do Código Penal, item 18. Em resumo a responsabilidade por esse sistema só é excluída se o autor devido a uma enfermidade ou retardamento mental, era, no momento da ação, incapaz de entendimento ético-jurídico e autodeterminação.

(25)

irresponsabilidade, em antinomia com o interesse da defesa social. O legislador também não quis o método biológico por deixar os juízes na dependência dos peritos médicos, além de não prever os possíveis momentos de bonança que um enfermo, mental ou não, pode apresentar.

Francisco Campos revelou na Exposição de Motivos os critérios da Comissão Revisora, que teve por base o projeto de Alcântara Machado, e preferiu, então, o método biopsicológico que torna, em nosso Código, inimputáveis todos aqueles que estiverem inteiramente incapazes de entendimento ético-jurídico ou de auto-determinação voluntária, ao tempo da ação ou da omissão, em virtude da imaturidade, de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto, de embriaguez completa ou em caso fortuito ou força maior.

1.4. A imputabilidade no direito comparado

1.4.1. Itália

Sancionado pelo Decreto n. 1398 de 19 de outubro de 1930 e posto em execução em 1º de julho de 1931, o Código Penal italiano trata do momento volitivo e intelectual no momento da prática do crime (arts. 42 e 85 a 89). Trata, também, dos casos de doença mental e de embriaguez derivada de caso fortuito ou força maior, que excluem a imputabilidade (art. 91); voluntária ou culposa, que não exclui, nem diminui a imputabilidade, podendo agravar a pena se fora preordenada (art. 92); habitual, que agrava a pena (art. 94); e intoxicação crônica por álcool ou substância psicotrópica, que é abordada no art. 95 com o mesmo tratamento das doenças mentais (arts. 88 e 89).

(26)

O Código Penal argentino, sancionado pelo Decreto n. 3992 em 21 de dezembro de 1984, trata como inimputáveis aqueles que, no momento do fato, são incapazes de compreender a criminalidade do ato ou de dirigir suas ações, por insuficiência das faculdades mentais, alterações mórbidas das mesmas ou, ainda, estado de inconsciência, erro ou ignorância do crime (art. 34).

1.4.3. Peru

Prevê em seu Código Penal, promulgado pelo Decreto n. 635 de 3 de abril de 1991, que estão isentos de responsabilidade penal os portadores de anomalias psíquicas ou aqueles que sofrem de graves alterações na consciência ou na percepção, de modo que comprometa sua capacidade de entender e querer (art. 20). São isentos também os menores de 18 anos, exceto nos casos de crimes de terrorismo, caso em que a maioridade penal cai para 15 anos, de acordo com as modificações impostas pelo Decreto-lei n. 25564 de 17 de junho de 1992. O artigo seguinte trata da atenuação da pena para até o limite inferior mínimo legal que o Juiz pode praticar se não ocorrer algum dos requisitos necessários para que desaparecesse a responsabilidade penal por completo.

Os toxicômanos e os indivíduos usuários de álcool imputáveis podem, por medida de segurança, ser submetidos à internação, antes de cumprir a pena imposta e por um período que não será computado como cumprimento dessa pena, porém dependente do sucesso do tratamento o juiz pode reduzir a sentença ou mesmo decretá-la extinta (arts. 71 e 77).

(27)

O Código Penal, aprovado pelo Decreto n. 663 de 30 de julho de 1999, declara que são isentos de responsabilidade penal os loucos ou dementes, a não ser que tenham agido em um intervalo de lucidez; os menores de 16 anos; os maiores que 16 e menores que 18 anos, a não ser que se comprove que tenham agido com discernimento; e aqueles que agiram em defesa de sua pessoa ou direitos, sob quaisquer das circunstâncias dispostas no § 4º (art. 10).

A embriaguez não é abordada no Código Penal peruano, pois existe uma lei específica (Lei n. 17.105) publicada em 14 de abril de 1969, que sob a rubrica “Sobre alcoholes, bebidas alcoholicas y vinagres” trata unicamente sobre essa questão.

1.4.5. Cuba

No Título V do seu Código Penal, instituído pela Lei n. 62, aprovada pela Assembléia Nacional do Poder Popular em sessão do dia 29 de dezembro de 1987, a questão é tratada sob a rubrica “Pessoas penalmente responsáveis” e determina que a responsabilidade penal das pessoas físicas acima de 16 anos e das pessoas jurídicas. Aqueles que têm entre 16 e 18 anos podem ter suas penas diminuídas à metade com o propósito de reeducá-lo e treiná-lo em uma profissão, assim como aqueles que têm entre 18 e 20 anos podem tê-las reduzidas em até um terço.

O capítulo III trata das exceções à responsabilidade penal, sendo a seção primeira, com o art. 20, dedicada à enfermidade mental.

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Com Código Penal publicado pelo Decreto-lei n. 400 de 23 de setembro de 1982 afirma no art. 20 que é inimputável aquele que possuir anomalia psíquica que o torne incapaz de, no momento da prática do fato, avaliar a ilicitude deste ou de se determinar de acordo com essa avaliação. A inimputabilidade não é excluída quando a anomalia psíquica tiver sido causada pelo próprio agente com a intenção de cometer o fato.

Se o indivíduo, voluntariamente, se colocou em estado de transtorno mental transitório pela ingestão de bebidas alcoólicas ou substâncias psicotrópicas, não se aplica a disposição à respeito da inimputabilidade. Isso também se aplica para outras situações em que poderia ter previsto as conseqüências de suas ações.

Mais à frente, nos artigos 86 e 87, coloca-se que o usuário abusivo de álcool será responsabilizado pelo ato ilícito com uma pena indeterminada, sempre que o crime esteja relacionado com a embriaguez ou com a tendência do agente. A pena imposta corresponde no mínimo à metade da pena de prisão que caberia ao crime em questão e no máximo à pena acrescida de dois anos na primeira condenação e de quatro anos nas restantes.

O princípio da execução da pena é eliminar o alcoolismo do agente ou combater a sua tendência para abusar de bebidas alcoólicas.

1.4.7. Espanha

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É considerada circunstância atenuante o crime cometido sob uso excessivo de álcool ou drogas (art. 21, §2º).

1.4.8. Alemanha

O Código Penal da Alemanha foi inspirado no prussiano, datado de 1851, e prevê em seus arts. 20 e 21, no capítulo “Fundamentos da penalidade”, que atuará sem culpabilidade aquele que no cometimento do crime, por razão de um transtorno mental, de uma consciência alterada ou por razão de deficiência mental ou de outras anomalias mentais graves, esteja incapacitado de perceber a injustiça do crime ou de atuar com esta intenção. Se as capacidades do indivíduo estiverem reduzidas no momento do praticado, sua pena poderá ser atenuada, porém não poderá uma pena de privação perpétua de liberdade ser substituída por penas inferiores a três anos; as penas privativas de liberdade temporárias teriam atenuação máxima equivalente a três quartos do máximo imposto e o limite inferior elevado de uma pena privativa de liberdade se moderará no caso de um mínimo de dez ou cinco anos a dois anos, no caso de um mínimo de três ou dois anos a seis meses, no caso de um mínimo de um ano a três meses e nos demais casos ao mínimo legal (art. 49).

1.4.9. Direito Canônico

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dezesseis anos ou, ainda, aquele que ignorava estar violando uma lei ou preceito; a inadvertência e o erro equiparam-se à ignorância (can. 1323). Pelo mesmo cânon também são inimputáveis aqueles que agiram por violência física ou por caso fortuito que não puderam prever ou remediar, aqueles que agiram forçados por medo grave, necessidade ou grave incômodo (excluindo-se os atos intrinsecamente maus). O Código anterior trazia a semi-imputabilidade aos impúberes e a legítima defesa a cargo do juiz ou superior responsável pelo caso analisar.

O cânon 1324 reúne as circunstâncias atenuantes da pena, tais como uso parcial da razão e embriaguez (§§ 1º e 2º respectivamente), mas deixa livre ao juiz observar outras condições que minimizem a pena (§ 2).

2. Culpabilidade e responsabilidade

2.1. Histórico da evolução dos conceitos

2.1.1. Os primórdios da civilização

No direito dos povos antigos com relação ao castigo, bastava somente a produção do fato danoso para a punição, ou seja, era o direito penal puramente objetivo. Só importava a causalidade física; a concepção de crime não ultrapassava a noção de dano, não se cogitava de qualquer outra ligação entre o agente e o resultado danoso, importando apenas o resultado, bastava o simples nexo causal entre a conduta e o resultado, o que viria a ser conhecido por responsabilidade objetiva.

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deuses era apaziguada com proibições religiosas, sociais e políticas que ficaram conhecidas por "tabu"5. Se as proibições não fossem obedecidas, vinha o

castigo. Desse castigo ao infrator, participavam todos os elementos do grupo, a fim de se eximirem da vingança sobrenatural.

Várias foram as fases de evolução da vingança penal, as quais não se sucederam sistematicamente, com épocas de transição e adoção de princípios diversos, normalmente envolvidos em sentido religioso, como era de se esperar pelo exposto acima. Para facilitar a exposição, lançamos mão da divisão estabelecida por Magalhães de Noronha6, que distingue as fases de vingança em:

- privada: a prática de um crime era seguida de uma reação da vítima, que não guardava proporções com ofensa, dando lugar a brigas de grupos e famílias, que, normalmente, terminavam por se extinguir. Devido a essa dizimação, a sociedade preocupou-se em evitar a vingança, sob uma forma análoga da Lei do Talião, ou seja, pondo um peso na vingança, um peso proporcional ao da ofensa. A Lei do Talião foi adotada no Código de Hamurabi (2067-2025 a.C., Babilônia), no Êxodo (Povo Hebraico) e na Lei das XII Tábuas (em torno de 450 a.C., Roma). Tempo decorrido aparece a fase da composição, que consistia na oferta, pelo ofensor, de uma recompensa pelo dano causado. Com isso retirava-se a possibilidade de recair o castigo físico sobre a pessoa do ofensor, ou ainda, como podia ocorrer, de ser estendido aos membros de sua família. O agente livrava-se do castigo com a compra de sua liberdade com pagamento em moeda, gado, armas ou outro material estipulado entre as partes. Foi adotada também pelo Código de Hamurabi, pelo Pentateuco e pelo Código de Manu (aproximadamente entre 1300 e 800 a.C., Índia), foi a composição largamente aceita pelo Direito Germânico, sendo a origem remota das formas modernas de indenização do Direito do Direito Civil e da multa do Direito Penal.

- vingança divina: essa fase deve-se à influência divina da religião na vida dos

5 palavra de origem polinésia que não comporta tradução, significa ao mesmo tempo o sagrado e o

proibido, o impuro, o terríbel. Cf. PIMENTEL, Manoel Pedro. O Crime e a Pena na Atualidade, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1983, p.119.

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povos antigos como exposto no início desse item. O Direito Penal era entendido como uma repressão do crime para satisfação dos deuses pela ofensa praticada no grupo social. A punição era rigorosa, já que o castigo deveria guardar proporção com grandeza do Deus ofendido. Assim a alma do criminoso ficaria purificada, podendo ser alcançada a Bem-Aventurança. Trata-se, aqui, do direito penal religioso, teocrático e sacerdotal, representada por uma legislação típica como a da Índia (Mânava, Dharma, Sastra), mas esses princípios foram adotados, também, na Babilônia, na China (Livros das Cinco Penas), no Egito (cinco livros), na Pérsia (Avesta) e pelo povo de Israel (Pentateuco). Nessas culturas os rigores e intolerância a que são conduzidas as legislações de espírito teocrático, junta a hierarquia de castas criam conclusões intoleráveis para o nosso sentido de justiça igualitária. Também de inspiração religiosa outras leis de velhos povos, como as da China Antiga.

- vingança pública: com a evolução social e dos costumes, visando à segurança do soberano com a aplicação da pena, a pena foi se libertando de seu caráter religioso e a responsabilidade foi se tornando individual, isto é, dirigida ao agente. Este período apresentou enorme avanço em relação aos anteriores, já que salientou o interesse coletivo ao individual, eliminando-se o caráter místico da vingança divina. Embora se caracterize pela segurança dos soberanos através da intimidação do povo pelas leis e punições severas, a aplicação das sanções agia no interesse da sociedade.

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2.1.2. Direito Penal dos Hebreus

O direito hebraico acompanhou as modificações do Talmud, processo no qual ocorreu uma suavização da rigidez da Lei de Talião, como por exemplo, a mudança da vingança primitiva para práticas dos últimos tempos7. Os crimes poderiam ser classificados em duas espécies: delitos contra a divindade e crimes contra o semelhante.

A lei mosaica foi substituída pela multa, prisão e gravames físicos. A pena capital foi tirada de prática e substituída pela aplicação da prisão perpétua, sem trabalhos forçados.

2.1.3. Direito Penal Grego

O Direito Grego, extremamente relevante à nossa filosofia jurídica contemporânea, vem a nossa ciência através de sua literatura, de seus filósofos, poetas e oradores da época em questão. Dos poemas Homéricos depreende-se a informação da participação dos deuses na vida e na luta dos homens, sendo todos submetidos ao destino, paixões e fraquezas humanas. Vale ressaltar que os poetas não são fontes seguras da jurisprudência grega.

A pena que decorria do crime, tinha a idéia de expiação deixando claro o vínculo com a religião e juntamente com o resquício da idéia da purificação, verificada, por exemplo, na obra Eumênides de Ésquilo. Os gregos acreditavam que o mal era companheiro do pecado e que o culpável levava em si a pureza, e com a mancha do pecado, tornava-se responsável. Isso tinha para eles, um caráter humano e sagrado, pois a insubordinação podia ser entre homens ou contra Deus, caso no qual a intervenção divina dava lugar a vingança. A idéia de justiça desenvolveu-se baseada na culpa: num primeiro estágio verifica-se a

7 Essas informações são verificadas nos livros da Bíblia e em particular no Êxodo, no Levítico e, sobretudo

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pura responsabilidade objetiva, essa decorrente do simples fato lesivo, não se perquiria da culpa do autor da conduta, isto é, do elemento subjetivo do comportamento.

Segundo o Direito Penal Grego, especialmente o ateniense, os delitos poderiam ser cometidos contra os deuses, contra o Estado, ou contra os particulares. Assim, as penas eram classificadas em:

- aflitivas: a pena de morte, cominada nos casos de homicídio com premeditação, do sacrilégio, de traição; a pena de desterro, que às vezes era substitutiva da pena capital; a escravidão penal e o cárcere, reservadas geralmente para os indivíduos que não gozavam das prerrogativas de cidadão grego; e a flagelação somente imposta aos escravos.

- infamantes: a privação de sepultura que podia seguir-se a uma sentença póstuma; a proibição imposta às adúlteras, de ostentar adereços e de entrar nos templos; a inscrição ultrajante a ser ostentada pelo condenado. Existiam ainda as penas pecuniárias que consistiam na confiscação total ou parcial dos bens do condenado, como forma de ressarcimento de danos e prejuízos causados pelo delito.

A responsabilidade objetiva cede lugar, posteriormente, à idéia de retribuição pela culpa. Com Sócrates iniciando o movimento no século IV a.C., os demais filósofos gregos trazem novos princípios, tais como fundamento do direito de punir e da finalidade da pena, não discutidos por povos anteriores, assim como Platão que alcança uma concepção de pena como instrumento de defesa social, de prevenção do crime e não de repressão. Já Aristóteles fez penetrar por fim, nas suas construções éticas (Ética Nicomáquea) e jurídicas, a idéia do livre arbítrio, que não se sabe que ação possa ter tido nas práticas gregas, mas que veio exercer considerável influência no Direito Penal do Ocidente. Muitas de suas idéias foram defendidas posteriormente em Roma, tendo-se tornado a nota principal do movimento renovador do Direito Penal8. É

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comum ainda naqueles costumes a vingança, que era também uma prática dos deuses, mas relativo a essa religiosidade vinculada, em Atenas inicia-se a distinguir o que ofende um bem do Estado ou da religião, ou apenas um bem particular, reservando-se para o primeiro o máximo rigor penal.

2.1.4. Direito Romano

2.1.4.1. A filosofia do Direito Romano

Direito e Religião separam-se na capital italiana evoluindo-se das fases de vingança, por meio do talião e da composição, bem como da vingança divina na época da realeza. O Direito Romano era, assim, dividido em duas seções:

- o Direito Público, isto é, o conjunto de normas relativas aos organismos e grupos de que se compõe a comunidade romana e às suas relações com os deuses, com os outros Estados e com os membros pertencentes à própria comunidade;

- e o Direito Privado que compreendia tudo quanto regulasse a situação jurídica dos particulares e as relações de uns com outros.

Mas, a divisão entre crime público e crime privado era mais de natureza processual, isto é, conforme a iniciativa do processo estivesse relacionado a qualquer pessoa do povo ou somente ao ofendido ou à sua família. Depreende-se dessa distinção, que o crime passou a Depreende-ser considerado mais um atentado contra a ordem pública e menos uma violação ao interesse privado.

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pelo Poder Público, perdendo, assim, a conotação de vingança privada. Esses delitos formavam-se em torno do perduenllio (traição) e do parricidium (morte do

pater). A lei definia explicitamente uma série de delitos públicos: crime magistatis (crimes contra o rei), ambitus (corrupção do leitor), repetundae,

sacrilegium e peculatus (furto de dinheiro público), homicidium, crimen vis,

falsum, e outros que foram definidos durante a República. Esses crimes eram julgados por um tribunal de jurados (quaestio perpetua).

Os delitos privados eram perseguidos pelos particulares em seu próprio interesse, enquanto os públicos eram contra o próprio Estado e contra o homem livre (desde que o Estado tivesse interesse na persecução). Posteriormente, o Estado começa a perseguir todas as ofensas ao homem livre e aplica penas públicas por meio do chamado procedimento extraordinário. Finalmente, a pena torna-se via de regra, pública. As sanções são mitigadas, e é praticamente abolida a pena de morte, substituída pelo exílio e pela deportação (interdictio acquae et igni).

Contribuiu o Direito Romano decisivamente para a evolução do Direito Penal com a criação de princípios penais sobre o erro, culpa, dolo (bonus e

malus), imputabilidade, coação irresistível, agravantes, atenuantes, legítima defesa, entre outros.

O Direito Romano não reconhecia o princípio nullum crimen, nulla poena sine lege9. Adversos a essa opinião são os pensadores Francis Bacon e

Pufendorf, que escreveram sobre o assunto e afirmam que o postulado poderia ser atribuído ao Direito Romano, quando no Digesto estava expresso: “Poena non irrogatur, nisi quae quaque lege vel que alio jure specialiter huic delicto

9 Princípio com origem histórica na

Magna Charta Libertatum (séc. XIII), no Bill of Rights na América do

Norte e na Déclaration des Droits de l´Homme et du Citoyen, da Revolução Francesa e com origem

ideológica no pensamento do Iluminismo. Tal princípio nasceu para impedir o absolutismo, protegendo o homem, e dando-lhe um valor prioritário. Afinal, o indivíduo, é anterior ao Estado, não em termos de idéia cronológica, mas em termos axiológicos. O Estado existe, pelo homem, para o homem, encontrando nele seu objetivo. Daí porque, ele deve estar organizado para preservar e garantir os direitos do ser humano. Embora o marco histórico inicial seja controverso, é ponto passivo que Cesare Beccaria, na sua famosa obra “Dei Delitti e delle Pene”, tratou de forma clara e abundante, o assunto relacionado, o qual, posteriormente, seria conhecido como princípio da reserva legal. Escreveu Beccaria que “Solo las leyes pueden decretar las penas correspondientes a los delitos, y esta autoridad no puede resisdir sino en el legislador”. Daí por diante, o pensamento iluminista, valorizando sobremaneira o homem como ser pleno,

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imposita est”. Contestado por Luis Jiménez de Asúa, que corroborando a opinião anterior, afirma que apesar da formulação em latim o postulado não tem origem romana.

O poder penal do pater e do rei era arbitrário e os delitos podiam ser punidos, ainda que a pena não estivesse cominada em lei anterior.

Em resumo o Direito Penal Romano foi caracterizado pelos seguintes princípios e elementos:

- a afirmação do caráter público desse direito, não obstante a distinção entre delitos privados e públicos;

- o amplo desenvolvimento alcançado pela doutrina de imputabilidade e da culpabilidade, e das causas que excluem, especialmente o erro;

- determinação e diferenciação do elemento subjetivo, com influência sobre a espécie da pena: ao fato doloso se seguia a poenitio; ao culposo se aplicava a

castigario, que tinha um fim de intimação e com tal sentido se aplicava aos menores e às pessoas coletivas;

- a teoria da tentativa não alcançou pleno desenvolvimento;

- a ilicitude penal não estava sujeito ao princípio de reserva e à proibição de analogia. Os crimina extraordinário não estavam sujeitos a uma pena cominada pela lei; eram puníveis ad exemplum legis.

Vale ressaltar que, apesar de grandes juristas, os romanos não sistematizaram doutrinariamente os conceitos fundamentais do direito de punir. O Direito para eles era uma prática do justo, aplicada a fatos rotineiros do dia a dia.

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Quanto ao conceito de dolo, inicialmente, abrangia toda a esfera criminal, não cabendo, por isso, ação nos crimes praticados por irresponsáveis, loucos, impúberes e naqueles cometidos sem o propósito de violar o direito.

Corcullo é veemente na afirmação que faz de que no direito romano não há crime sem dolo, sendo que o grau deste é que dá o grau de gravidade do delito. Acredita que na apreciação do dolo, o mais importante para os romanos, era a causa que lhe dava origem, ou seja, o motivo. A pena era graduada conforme o motivo.

A culpa, nesse período, só era admitida como fator jurídico de indenização civil. A ação culposa pertencia à ação privada, segundo a Lex Aquilia, sendo certo que os delitos não intencionais eram considerados como uma causalidade.

Numa fase posterior, a culpa criminal libertou-se por um lado da culpa civil e por outro do "casus", como antítese do "dolus".

A ciência jurídica do tempo da República fez com que o conceito de responsabilidade tivesse uma evolução, fazendo distinção do dano causado intencionalmente e o derivado de desatenção ou descuido.

Houve também diferenciação entre o cuidado que todo homem tem que ter com seu próximo, do cuidado que as pessoas devem ter nas relações contratuais. A lei nessa época, passou a ser a base do direito penal e a partir daí houve exigências da fixação dos elementos constitutivos de cada ato delituoso.

Leis posteriores, com maior alcance, regularam que o fundamento ético da vontade antijurídica poderia ocorrer como descuido às leis morais e às do Estado (culpa) ou como ofensa intencional na observância das mesmas (dolo).

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Com essas contribuições, os romanos libertaram o direito do domínio da religião. Assim a culpabilidade conseguiu superar a responsabilidade pelo resultado e a mera culpa moral dos gregos, assumindo um sentido jurídico.

Destarte, os legados deixados pelos romanos foram decisivos para a evolução do Direito Penal da Culpa.

Em Roma superou-se a concepção simplória da responsabilidade decorrente do resultado danoso, revestindo-se a culpa moral desenvolvida pelos gregos de caráter jurídico. Antes da República Romana, a palavra culpa era empregada em sentido amplo, como sinônimo de culpabilidade (não se referia a negligência ou a imprudência). Mais tarde o tempo passou a ser empregado para designar tanto a culpa latu sensu quanto a falta de cuidado devido.

Cumpre destacar o significativo papel desempenhado pelo direito romano ao identificar o dolo do agente como característica essencial do delito. A pena (poenitio), na concepção dos romanos, só poderia decorrer de uma conduta dolosa.

2.1.5. Direito Penal Germânico

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2.1.6. Direito Canônico

O Direito Canônico foi elaborado pela Igreja Católica Apostólica Romana, aplicando-se somente aos religiosos, mas ganha amplitude aplicando-se às demais pessoas juntamente com a expansão do poder da Igreja.

Aqui se inicia a análise do elemento subjetivo do crime, da responsabilidade do agente e do sistema de penas visando à regeneração ou emenda do criminoso, sendo banidas as ordálias e a resolução pela força do direito germânico, quando esse foi influenciado pelo canônico. As penas severas foram mantidas, porém a pena de morte não fora tolerada, já que a intenção era de se salvar a alma do criminoso, os réus eram, então, entregues ao poder civil.

Considerando o vínculo sacral existente, introduz-se o princípio de igualdade, já que todas os homens são iguais perante o Criador.

2.1.7. Direito Medieval

O direito em vigor na Idade Média é decorrente da intersecção entre os direitos romanos, canônico e outros locais. Portanto, era caracterizado por penas cruéis visando a intimidação do agente. As sanções tomadas eram diferentes pra cada indivíduo levando-se em conta a condição social e opinião política do réu. Essa arbitrariedade causava desassossego e terror entre a população.

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Relativo à contribuição do direito germânico, admite diversas formas de culpabilidade, atenuando a objetividade do código em questão. Do direito canônico, aproveita o vínculo sacral e introduz o processo inquisitorial.

2.1.8. Período Humanitário

No decorrer do Iluminismo, os pensadores colocaram-se contra a arbitrariedade das sentenças e contra os monarcas absolutistas, que faziam uso da primeira e da crueldade. Nesse período sobressai-se Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, discípulo de Rousseau e Montesquieu.

Com base no contrato social de Rousseau, chamou a atenção sobre as vantagens sociais que poderiam ser distribuídas na aplicação da justiça penal. Seu conteúdo foi elogiado publicamente por Catarina, a Grande, que em 1767 ordena a elaboração de um novo código, Frederico, o Grande da Prússia e José II da Áustria, além de ter sido citado por Voltaire, Thomas Jefferson e John Adams. O seu sucesso é explicado pelo impacto prático que teria logo em muitos países e encontra-se no fato de que os princípios de uma reforma penal foram expressos pela primeira vez de uma maneira sistemática e concisa com os argumentos os mais lógicos. Foi publicado em muitas línguas no mundo todo e foi influente na criação e na reforma de sistemas penais através do globo. O seu texto trazia discussões sobre crime e direitos humanos que era expressamente discutido e pertinente nesse tempo, e foi escrito de uma maneira que fosse objetivo e claro.

Propôs, baseado nos pensamentos de seus mestres, que as controvérsias jurídicas deveriam ser resolvidas por meio de um órgão, o juiz, que ouviria as partes interessadas, o chefe de Estado que afirma a violação do contrato social e o acusado que a nega. Beccaria escreve a respeito que:

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- juizes em casos criminais não podem interpretar as leis; leis devem estar claras e sem necessidade de nenhuma interpretação;

- o criminoso deve ter o direito para recusar alguns jurados;

- nenhuma acusação secreta pode ser feito pelo governo;

- os juizes devem buscar de forma imparcial a verdade e os juizes não devem transformar-se parte da Tesouraria de modo que não olhe os criminosos como forma de fazer o dinheiro.

Reafirma a importância de as leis serem claras e sabidas, porque uma pessoa dotada de discernimento não pode fazer uma escolha racional para não cometer um ato se não souberem que o ato é proibido. Afirmou, ainda, que quando o número daqueles que podem compreender o Código Penal, a freqüência dos crimes tenderá a diminuir, porque indubitavelmente a ignorância e incerteza das punições adicionam muito ao momento volitivo e intelectual.

Em seu livro “Dei Delitti e delle Pene” (1764) aponta diversas modificações a serem feitas nos códigos dos países de forma a atenuar as penas, diminuir o poder das autoridades vigentes e proteger os direitos humanos. Para retirar a arbitrariedade das decisões das autoridades competentes estabelece a relação de proporção entre o delito e a pena. Também se um indivíduo foi aprisionado antes do julgamento, os de crime severo devem ter menos tempo no tribunal e mais na prisão, se condenados culpados. Se alguém fosse aprisionado por crime não tão severo, dever-se-ia gastar muito tempo no tribunal, mas menos tempo na prisão, se culpados.

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crimes. Enquanto os indivíduos procurarão de forma racional seu melhor interesse, isto pode envolver atos ilícitos e a Lei, cujo objetivo é preservar o contrato social; tentará, portanto, impedir e penalizar esses atos. O terceiro ponto em que se apóia a teoria de Beccaria é o motriz humano; os motivos dos homens ao longo dos anos e ao redor do globo fazem com que as ações dos mesmos tornem-se previsíveis e controláveis. Em outras palavras, o trabalho do sistema criminal da justiça deve ser controlar todos os atos ilícitos que um indivíduo com poder do livre arbítrio e raciocínio lógico faz na perseguição do prazer pessoal. Temos aí reunidos os momentos intelectual e volitivo e isto é feito mais facilmente pelo fato de que as ações humanas são previsíveis e controláveis. Com a punição ou a ameaça certa o sistema criminal da justiça pode controlar o livre arbítrio do ser humano racional. O problema que o sistema criminal da justiça tem, está, então, em encontrar a punição ou as ameaças corretas e cabíveis em cada situação.

Beccaria expressa não somente a necessidade para o sistema criminal da justiça, mas também o direito do Governo de ter leis e punições. Acredita no contrato social, ou na idéia que os indivíduos com livre arbítrio e racionais fazem uma escolha para viver em uma sociedade ao invés de viver isolado. Quando um indivíduo escolhe viver em uma sociedade, a seguir escolhe desistir de algumas liberdades pessoais na troca de segurança e conforto de uma sociedade. As leis são projetadas como a estrutura da sociedade e as regras para que os atos sejam incentivados ou proibidos. As leis são as condições de uma sociedade dotada de momento volitivo e intelectual. Há uma necessidade de haver algum sistema acertado a fim de se assegurar de que os indivíduos na sociedade estejam protegidos de todos os indivíduos ou grupos que queiram prejudicar as liberdades pessoais de outros na sociedade. Em sua obra, Beccaria afirma: “mas meramente estabelecer este depósito não era suficiente; teria que ser defendido contra a usurpação de indivíduos que tentam sempre retirar não somente sua própria parte mas também para a dos outros”. Assim há uma necessidade de se ter leis e um sistema criminal da justiça para assegurar que todos os indivíduos na sociedade obedeçam ou sigam o contrato social.

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radicalmente contrário às punições cruéis e arbitrárias da época, mas sabia que o governo tinha o direito e o dever de punir aqueles indivíduos que ameaçavam a sociedade. O governo tinha somente o direito de infligir as punições que eram necessárias para o crime, ele afirma: “para que uma punição alcance seu fim, o mal que é infligido tem que exceder somente a vantagem oriunda do crime; deve incluir certamente da punição e da perda do bom que o crime pôde ter produzido. Tudo além deste é supérfluo”. Assim quando o governo poderia punir não poderia ultrapassar o que era necessário para a segurança da sociedade.

Para determinar que quantidade de punição é necessária para que preserve a segurança e o que é excessivo, os legisladores devem definir as punições para cada crime. Então, membros da sociedade racionais com livre arbítrio, cometerão atos se o prazer desse valer a pena. Para impedir indivíduos de cometer atos proibidos, as punições devem ser ajustadas de tal forma a contrabalancear o prazer que os indivíduos possam receber dos atos ilícitos. Toda a punição brutal ou ligeiramente sobre a quantidade necessária para inibir indivíduos de cometer atos proibidos seria considerada injusta.

2.1.9. Período clássico

Sob a denominação de período clássico encontram-se aqueles que escreveram durante a primeira metade do século XIX influenciados pelas idéias oriundas do período humanitário e, conseqüentemente, do Iluminismo.

Francesco Carrara, nome de destaque pertencente a essa época, em sua obra Programa del Corso di Diritto Criminale (1859) aponta que o delito é um ente jurídico constituído por por duas forças: a física (movimento corpóreo e o dano do crime) e a moral (vontade livre e consciente do criminoso). Torna-se então, o livre arbítrio pressuposto da afirmação da responsabilidade e da aplicação das pena e o crime deixa de ser uma ação para ser uma infração.

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ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso”.

Esmiuçando-se o postulado, temos que só é considerada infração, aquela decorrente do princípio da legalidade, ou seja, somente o fato que infrige a lei. A palavra promulgada é utilizada para que se excluam as “leis” morais e religiosas. O delito torna-se um ente jurídico ao passo em que é um fato em que se viola a tutela do Estado dos bens jurídicos, infringindo-se a lei, resultante do único ser capaz de delinqüir: o Homem. Considerado um ato externo por não ser punível a mera intenção ou cogitação criminosa e seu ato pode ser positivo quando se refere a ação (fazer) ou negativo quando da omissão (não fazer o devido). A vinculação da escola clássica com o livre-arbítrio, como fator de responsabilização criminal, fez do crime e conseqüente aplicação da pena um fator derivado da responsabilidade moral do homem, afimando José Salgado Martins10 que

conseqüentemente não poderia ser politicamente responsável por um ato do qual não fosse antes responsável moralmente. A imputabilidade moral é o precedente indispensável da imputabilidade política”.

Ou seja, o criminoso seria moralmente imputável já que seu ato baseia-se no livre arbítrio de que dispõe, desde que fosse são e o ilícito seria politicamente danoso, pois há um vitimado que fora perturbado e a própria sociedade, que é posta em estado de instabilidade, insegurança e deve tratar com as respectivas repercussões sociais.

2.1.9.1. As Escolas Penais

10 MARTINS, José salgado.

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De acordo com a nomenclatura de Sodré de Aragão podemos sintetizar em três escolas as concepções sobre a culpabilidade ao longo dos anos: clássica, antropológica e crítica11.

2.1.9.1.1. A escola clássica

Edgard Magalhães Noronha12 separa a escola clássica em dois grandes períodos. O primeiro, filosófico ou teórico, correspondente a Beccaria, no qual surge o discernimento para a separação da justiça humana da divina, combatendo o absolutismo e as crueldades contemporâneas, e o segundo, jurídico ou prático, no qual houve a construção técnica, ressaltando Francesco Carrara.

A Escola Clássica prevê uma pena a cada réu culpado, que por ter praticado um crime de forma livre e consciente torna-se moralmente responsável, e assim, também o é penalmente. René Ariel Dotti13 afirma que a

escola surgiu inicialmente como “Escola Jurídica Italiana” à luz das concepções de Carrara e Beccaria. Portanto, desconsidera fatores antropológicos ou sociais, e dogmatiza a liberdade volitiva, de tal forma que todos têm livre arbítrio em suas escolhas, sendo assim puníveis pela sociedade com um castigo justo e proporcionado por qualquer crime cometido. A responsabilidade penal somente seria excluída ou diminuída caso esse livre arbítrio tivesse sido diminuído, já que a primeira é fundamentada no segundo.

O método investigativo que deve ser utilizado para as cabíveis averiguações deve ser o dedutivo ou lógico-abstrato, e não experimental, já que se baseia nas ciências naturais. A pena, dentro ainda da concepção dos pensadores citados, é vista como proteção aos bens jurídicos tutelados

11 ARAGÃO, Antônio Moniz Sodré, As Três Escolas Penais: Estudo Comparativo. 6ª edição: Rio

de Janeiro, Editora Livraria Freitas Bastos S. A., 1955.

12 NORONHA, E. Magalhães de. Direito Penal, vol, 1, atualizado por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha, , 37ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 30;

13 DOTTI, René Ariel. Curso de Direito Penal, Parte Geral,

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penalmente. A sanção tomada é proporcional ao dano causado, jamais podendo ser arbitrária, como caráter de defesa social.

Em oposição a essa idéia de pena, em mesma época, colocam-se Luís Jiménez de Asúa, Carlos Cristian Frederico Krause e Carlos David Augusto Roeder (Escola Correlacionista) que acreditam que a pena não pode ser determinada aprioristicamente, já que tem caráter de recuperação do agente e deve, portanto, ter o tempo necessário para tal. Ainda na discussão relativa a pena, Eugenio Cuello Calón14 aponta que a Escola Clássica não tinha unanimidade sobre o caráter da pena, se retributivo (Carmignani15 – Teoria Absoluta) ou preventivo (Rossi).

Roberto Lyra16 buscou sintetizar em poucas linhas o pensamento clássico que governa a escola:

“é livre arbitrista, individualista e liberal. Considera o crime fenômeno jurídico e a pena (castigo) meio de tutela jurídica. Adota o chamado método lógico abstrato e defende a autonomia do Direito Penal, valendo-se, como simples auxiliares, das então denominadas ciências políticas e morais”.

2.1.9.1.2. A escola antropológica

Com a evolução do pensamento científico e os métodos de investigação da natureza por volta do ano de 1850 houve a preocupação com o homem que infringe a lei e a razão pela qual a infringe. Foi por uma busca científica de tais questões que surge o positivismo, visto que a pena retributiva não se mostrava

14 Derecho Penal, tomo I, 10ª ed. Barcelona: Bosch, 1951, p. 46: “ La pena en si misma no

puede concebirse sino como la retribución de un mal por el mal, realizada por un juez legítimo, con poderación y medida. El fin esencial del derecho penal es “el restablecimiento del ordem social perturbado por el delito”.

15 Considerado o lançador da pedra fundamental da Escola que escreveu a “Teoria das Leis de

Segurança Social e Elementa Iris Criminalis”

16 LYRA, Roberto. Expressão mais simples do Direito Penal.Rio de Janeiro: José Kofino, 1953,

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suficiente para o combate da criminalidade. Assim gera-se uma mudança no objetivo da pena que passa de um caráter retributivo para um meio de defesa social, diferentemente dos clássicos. O crime passa a ser encarado como fenômeno natural e social, já que a responsabilidade é decorrente da convivência social, como será explicitado em seqüência.

A Escola Antropológica tentou tornar o Direito Penal uma ciência quase que exata, aproximando-se do positivismo científico supracitado, por isso também denominada de Escola Positiva. Destarte, não existe o livre arbítrio, e, portanto, não se pode admitir a pena como simples castigo. Não há castigo possível para o inevitável e o criminoso não é livre de sua essência, ou seja, o agente regridiu ao primitivismo, e assim como alguns nascem sábios ou doentes, outros nascem delinqüentes. Esses apresentam características físicas e morfológicas específicas, tais como: assimetria da caixa craniana, barba escassa e face ampla e larga, com cabelos abundantes, entre outras. Seriam ainda, resistentes ao traumatismo, canhotos ou ambidestros, moralmente insensíveis, vaidosos, impulsivos e preguiçosos.

Essa corrente, inspirada nos estudos antropológicos de Lombroso17, Ferri18 e Garófalo19, baseava-se nas características naturais do indivíduo para justificar sua conduta ilícita. Portanto, de acordo com Lombroso, o crime é um fenômeno biológico, perdendo a condição de ente jurídico de Carrara, e assim, deve-se usar o método experimental para investigá-lo. Lombroso, sob o enfoque do crime devido a uma condição de nascimento (criminoso nato) estudava os cadáveres de criminosos procurando encontrar algum elemento que permitisse distinguir o homem normal do louco.

Para Ferri, a responsabilidade vinha do simples fato de o homem viver em sociedade, indo de encontro ao determinismo. Considera que além do criminoso nato de Lombroso (aquele que nasce delinqüente), existem outras

17 Médico italiano e professor em Turim, publicou no fim da década de 70 do século XIX o livro L’uomo delinqüente studiato in rapporto, all’antropologia, alla medicina legale e alle discipline carcerarie.

Juntamente com as teorias vigentes biológicas e evolucionistas (Lamarck e Darwin) analisou o crime como uma manisfestação da personalidade humana e produto de várias causas.

18 Criador da Sociologia Criminal ao publicar livro de mesmo nome e discípulo de Lombroso defendia o

trinômio causal do delito: fatores antropológicos, sociais e físicos.

19 Rafael Garófalo introduz na Itália os termos referentes ao Positivismo em sua obra

Referências

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