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Roy Bennett - Instrumentos de Teclado

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Academic year: 2021

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Cadernos de Música da Universidade de Cambridge

INSTRUMENTOS

DE TECLADO

ROY B E N N E T T

J o r g e Z a h a r E d i t o r

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INSTRUMENTOS DE TECLADO

A série Cadernos de Música da Universidade de Cambridge, de que esta editora já publicou Forma e

Estrutura na Música, Uma Breve

História da Música e Instrumentos da Orquestra, tem sequência agora com

Instrumentos de Teclado - este, como os demais, de autoria do importante musicólogo inglês Roy Bennett.

Pode-se dizer que os primeiros instrumentos criados pelo homem foram as percussões (o tanta) e que a música civilizada surgiu com os sopros (a flauta de Pã) acompanhados pelas cordas tangidas (as liras em suas diversas formas, desde o antigo

Egito - como se vê em vários afrescos - até o ku-tô japonês). Pode-se reivindicar antiguidade

também para os instrumentos de arco, ancestrais do violino, que já eram conhecidos na África e na Ásia em épocas remotas. Dessa forma, a "orquestra" já estaria praticamente completa quando, cerca de trezentos anos antes de Cristo, o primeiro conceito de instrumento de teclado foi criado. O teclado ficaria, assim, no final da "escala evolutiva" - o que significa estar na ponta mais sofisticada.

De fato, se todos os instrumentos são importantes na música, se músicos tão diversos quanto o russo Igor

Stravinsky ou o brasileiro Hermeto Pascoal puderam demonstrar que não há limites para a criatividade

instrumental, foram os instrumentos de teclado, no entanto, que determinaram de forma decisiva o que atualmente se conhece como "música ocidental", a música que hoje ouvimos a cada momento, da erudita à popular. Tendo seu real desenvolvimento começado a partir do século XII de nossa era, o teclado foi a base principal do processo criativo de autores como Buxtehude, Bach, Scarlatti, Haydn, Mozart e Beethoven, até chegar ao apogeu de Chopin e

-*-Liszt. Foi no teclado que Bach levou a música barroca ao seu mais alto desenvolvimento, que a "forma-sonata" foi construída, que Wagner esboçou os primeiros cromatismos de Tristão e

Isolda, que Liszt criou uma escola de interpretação vigente até hoje nas mãos de artistas tão velhos como Horowitz ou tão jovens como Argerich e Pogorelich.

A noção do piano como "o mais nobre dos instrumentos", por ser o de maior âmbito e de mais amplo alcance, não é errada - se a prática é um índice suficientemente bom para determinar o que é certo ou errado. Ouça uma sonata de Scarlatti com Horowitz, uma de Beethoven com Gieseking, valsas de Chopin com Lipatti, peças de Schumann com Richter, ou prelú-dios de Debussy com Michelangeli, e compreenderá isso melhor do que as palavras podem explicar.

Mas toda intenção didática precisa das palavras - e de livros como este. Nestas páginas o leitor interessado irá encontrar uma descrição minuciosa do que são e como são os diversos ins-trumentos de teclado: o órgão, cravo, clavicórdio, virginal e a espineta; e o piano. Diagramas e desenhos explicarão ação e mecanismo. Fotos reproduzirão partituras musicais e os vários tipos de instrumentos, desde os exemplares mais antigos ainda hoje conservados até os mais modernos. E retratos mostrarão os principais

compositores. Como é característico desta coleção, uma ponderada indicação de gravações a serem ouvidas facilita para o leitor um processo seletivo que normalmente leva muitos anos para ser alcançado, ao mesmo tempo em que enfatiza o valor da experiência pessoal na compreensão do fenómeno artístico. Assim, este livro é algo mais do que uma obra dedicada aos estudantes de piano. Seu público é todo o universo leitor interessado em conhecer mais de perto umas das maiores dádivas da civilização: a música - uma arte para a qual os instrumentos de teclado são, hoje, a principal via de acesso.

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CADERNOS DE MÚSICA DA UNIVERSIDADE DE CAMBRIDGE

Volumes da série:

U m a Breve História da Música Forma e Estrutura na Música Instrumentos da Orquestra Instrumentos de Teclado Elementos Básicos da Música

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Roy Bennett

Instrumentos

de Teclado

Tradução:

Teresa Resende Costa

Jorge Zahar Editor

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Título original: Keyboard Instruments

Tradução autorizada da primeira edição inglesa publicada em 1985 por Cambridge University Press, da Inglaterra, na série Cambridge Assignments in Music

Copyright © 1985, Cambridge University Press Copyright © 1989 da edição em língua portuguesa: Jorge Zahar Editor Ltda.

rua México 31 sobreloja 20031 Rio de Janeiro, RJ Todos os direitos reservados.

A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação do copyright. (Lei 5.988) Impressão: Tavares e Tristão Ltda.

ISBN: 0-521-27653-5 (ed. orig.) ISBN: 85-7110-065-9 (JZE, RJ)

Agradecimentos

Pela gentileza de concederem-nos o uso do copyright, o autor e a editora inglesa deste livro agradecem a: BBC Hulton Picture Library, p. 9 o órgão, p. 16 Bach, p. 23 Couperin, p. 43 Haydn, p. 45 -Liszt, p. 49 - Beethoven, e p. 50 - o órgão de igreja; Warwickshire Museum, p. 9 - o cravo (exposto em St. John's House, Warwick); John Broadwood & Sons Ltd., p. 9 - o piano de cauda, p. 41 - o piano vertical e p. 44 - o piano Broadwood de Beethoven; Museu Torteneti de Budapeste, p. 10 - um primitivo órgão de tubos; Biblioteca Universitária, Utrecht, p. 10 - desenho tirado de um livro de salmos; Biblioteca Medicea Laurenziana, Florença, p. 11 - primitivo órgão portátil; British Library, p. 11 - o fragmento Robertsbridge, p. 25 facsímile da partitura do trecho original de "A Hornepype", p. 27 -frontispício de Partheniatp. 3 8 - fac-símile de um rondo de Giustini e p. 50 - um primitivo órgão portátil

reproduzido do livro de salmos de Luttrell; Bayerische Staatsbibliothek, Munique, p. 12 - peça sem título, composta por Baumgartner, que faz parte do volume Buxheim de músicas para órgão; Russell Collection de cravos e clavicórdios, Universidade de Edimburgo, p. 12 - harmónio, p. 21 - o cravo de dois teclados, com uma vista de cima deste instrumento, pp. 28 e 50 a espineta com forma de asa do século XVII, p. 31 - o clavicórdio de teclado preso e p. 32 - o clavicórdio de teclado livre; G. Millet, p. 17 - foto de Lionel Rogg; Decca Record Company, p. 17 - foto de Peter Hurford, p. 47 - piano preparado e p. 49 - Ashkenazy; Malcom Dodd, p. 17 - foto de Jennifer Bate; Greater London Councii, p. 18 - o órgão do Royai Festival Hall; Victoria and Albert Museum (copyright da coroa), p. 19 - o mais antigo dos cravos existentes, p. 22 - o cravo de Hàndel, p. 25 - o virginal fabricado por Loosemore e p. 50 - o cravo de Fritz; Robert Morley & Co. Ltd., pp. 20 e 50 - detalhe das lamelas do cravo, p. 31 - detalhe da mecânica do clavicórdio e p. 50 - detalhe da mecânica do piano; Mansell Collection, p. 22 - Hàndel, p. 24 - Scarlatti, p. 35 - Bach, p. 43 - Mozart e p. 47 - Debussy; Metropolitan Museum of Art, Nova York,p. 26-ovirginar4mãeefUhoM, doação de B.H. Homan, 1929(29.90); Crosby Brown

Collection of Musical Instruments, 1889 (89.4.1219) do Metropolitan Museum of Art, Nova York, p. 37 - o piano de Cristofori; Fitzwilliam Museum, Cambridge, p. 26 - fac-símile do Álbum Fitzwilliam para virginal; Royai College of Music, p. 27 - William Byrd, p. 30 - Wanda Landowska e p. 49 - Inácio Paderewski; o Heather Professor de Música da Oxford University, p. 27 - John Buli e Orlando Gibbons; Photographie Giraudon, Paris. p. 28 - Henry Purcell e p. 45 - F. Chopin; Universidade Karl Marx, Leipzig, p. 32 um clavicórdio antigo; Worcester Art Museum, Worcester, Massachussets, p. 34 -quadro de uma jovem tocando clavicórdio; Coletâneas do Musiksammlung der Õsterreichischen Nationalbibliothek, Viena (Catalogue no: Mus. Hs. 18.707, foi. 11 verso -12 recto), p. 36 - Manuscrito com desenhos ornamentais de Froberger, Steinway & Sons, p. 41 — um Steinway visto de cima; Biblioteca do Congresso, Washington, DC, p. 42 - fac-símile do frontispício de uma partitura de Haydn; Germanisches Nationalmuseum (Dr. Riick Collection), Nuremberg, pp. 43 e 50 - o pianoforte e p. 45 - o piano de Érard; Mary Evans Picture Library, Londres, p. 45 - caricatura de Liszt; Clive Barda e Philips Classics, p. 49 - foto de Alfred Brcndcl; Ashmolean Museum, Oxford, p. 50 - virginal.

Quanto ao piano de cauda de Haydn (p. 43), não conseguimos localizar o detentor do copyright, mas teremos o maior prazer de chegarmos a um conveniente acordo tão logo nos seja dada uma oportunidade para isso.

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Sumário

i Teclas e teclados Ao Professor 2 O órgão A família do cravo O órgão

O órgão da igreja medieval Os menores tipos de órgão:

Órgão portátil Órgão positivo Regai

Pequeno órgão de sala ou harmónio O órgão de igreja após 1400

"Oitava quebrada ou diminuída"

O mecanismo de um típico órgão de igreja Registros e tubos

Os manuais e a pedaleira A variedade de timbres Exercícios

Outras músicas de órgão para ouvir A música para órgão do século XX

O cravo

O mecanismo do cravo O som do cravo Ornamentos

O cravo como "contínuo" Cravo versus piano

O virginal

O som do virginal

A música elisabetana para virginal

10 10 11 11 12 12 13 13 13 14 15 15 17 18 18 19 20 20 23 24 24 25 25 26 A espineta O som da espineta Exercícios

Outras músicas de cravo, virginal e espineta para ouvir A música para cravo do século XX

28

28 29 30 30

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4 O clavicórdio 31 O clavicórdio O mecanismo do clavicórdio 31

O clavicórdio de teclado preso e o de teclado livre 32

O som do clavicórdio 33 A música para clavicórdio 34

Exercícios 35 Outras músicas de clavicórdio para ouvir 36

5 O piano 37 O piano O primeiro piano 37

A primeira música de piano 38

O piano moderno 38 O mecanismo do moderno piano de cauda 39

Os pedais 40 O moderno piano vertical 42

O progresso do piano 42

A música para piano do século XIX 45 Alguns pianos fora do comum 46 A música para piano do século XX 47

Exercícios 47 Outras músicas de piano para ouvir 49

Mais alguns exercícios 50

Exercício especial 52 Instrumentos eletrônicos de teclado 52

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Ao Professor

Este livro apresenta os principais tipos de instrumentos de teclado, vale dizer, as diversas modalidades de órgão, cravo, virginal e espineta; o clavicórdio e o piano. Cada instrumento se encontra detalhadamente descrito e também mostrado através de diagramas e esboços claros que explicam a ação e o mecanismo.

Muitas ilustrações incluem retratos dos principais compositores de música para teclado, fotografias dos mais antigos instrumentos que conseguiram chegar até os nossos dias, exemplares saídos dos principais fabricantes e alguns tantos que pertenceram a compositores famosos.

Interpondo-se às explicações dos diferentes instrumentos de teclado, acham-se descrições de músicas expressamente escritas para estes, bem como fac-símiles e trechos de músicas (algumas integralmente).

No fim dos principais capítulos, encontram-se diferentes tipos de exercícios — alguns requerem respostas objetivas, outros são de caráter mais pessoal, isto é, dizem respeito ao modo como cada um reage à música ouvida e, por fim, há aqueles que são de natureza mais prática. Encontra-se ainda incluída uma ampla lista com sugestões de peças para serem posteriormente ouvidas.

Roy Bennett

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Teclas e

teclados

Todos os instrumentos descritos neste livro possuem teclado. São eles: os órgãos e os cravos em suas diferentes versões, o clavicórdio e ainda os diversos tipos de pianoforte, ou simplesmente "piano", como é chamado a maioria das vezes.

Embora esses instrumentos possam produzir sons de diferentes maneiras, o som das notas é sempre obtido pelo abaixamento das teclas, dispostas de acordo com determinado desenho que é aquele do teclado.

O diagrama abaixo mostra o teclado do piano atual com o seu conhecido traçado de duas fileiras de teclas: a das brancas, uma ao lado da outra, e a das pretas, mais curtas e dispostas em grupos de duas ou três, num plano mais elevado.

Dó' dó central dó' dó" dó" dó"" oitava

réf> solb láb stb

dó# fá# sol# lá#

dó re i mi sol si

A ideia básica do teclado, assim formado, é anterior ao século III a.C. Os teclados antigos tinham apenas o que costumamos chamar teclas "brancas". Posteriormente, durante o século XII, uma tecla preta mais curta e ressaltada foi acrescentada — o si bemol — cujo som é formado de partes retiradas das teclas brancas que correspondem às notas lá e si. Durante o século XIV, mais duas outras teclas pretas foram adicionadas: o fá sustenido e o sol sustenido e, não muito mais tarde, foram acrescentadas as duas últimas remanescentes: o dó sustenido e o mi bemol. Observe que as notas pretas tomaram os nomes das notas brancas que lhes são vizinhas (veja o diagrama à esquerda) e que cada uma delas possui dois nomes. No início do século XV, a configuração do teclado já estava firmemente estabelecida. O surpreendente é que desde essa época tenha permanecido sempre a mesma, apesar de o número de notas poder variar de instrumento para outro e, em alguns, as cores das teclas estejam ao contrário (como é o caso mostrado na foto menor da página 31).

O propósito e o desenho do teclado permitem que o executante controle o maior número possível de notas com os seus dez dedos (ele usa os polegares como qualquer outro dedo). Igualmente, a extensão da oitava deve ser aquela que, sem esforço, esteja ao alcance da média da mão do ser humano.

Cada tecla tem uma alavanca em balanço cujo movimento lembra o de uma gangorra. Quando o executante aperta a extremidade (visível) da tecia, a outra (dentro do instrumento) levanta, pondo para funcionar o "mecanismo produtor de som" do instrumento.

O quadro a seguir mostra como, a partir das três maneiras básicas de produzir sons em antigos instrumentos (do tipo flauta de Pã, saltério e dulcímer), se chegou, pela introdução do mecanismo das teclas, às várias espécies de instrumentos de teclado.

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Tubos/vento Cordas pinçadas Cordas marteladas flauta de pan I + teclado I órgãos portativo harmónio positivo órgão de igreja regai (c o m pedaleira) saltério i + teclado i família do cravo cravo virginal espineta dulcímer I + teclado

clavicórdio piano [pianoforte]

fortepiano piano vertical piano de cauda piano de concerto

piano de mesa

O ato de comprimir as teclas do órgão provoca a entrada de vento, fazendo vibrar vários tubos de tamanho graduado e, por conseguinte, com a altura do som também graduada. Pode haver três ou mais teclados, chamados manuais, e um teclado para os pés, denominado pedaleira. Tanto no cravo como no piano, a pressão dos dedos sobre as teclas ativa um mecanismo que faz as cordas vibrarem. No cravo, as cordas são pinçadas, enquanto no piano são batidas por martelos.

orgao

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O órgão

De todos os instrumentos de teclado, o órgão é de longe o mais antigo. Sua invenção é creditada ao engenheiro grego Ctesíbio, que viveu durante o século III a.C. Documentos escritos, não muito depois de sua época, descrevem-lhe o invento como "uma das maravilhas do mundo" e dão a entender que o órgão por ele construído estava possivelmente baseado na ideia de utilizar mecanicamente ai

provisão de ar que era levado para um imenso jogo de tubos. Estava, pois, o ar armazenado num "someiro" e já havia inclusive um teclado que controlava a sua saída para os tubos.

O instrumento de Ctesíbio ficou conhecido como hidraulos (palavra construída com os vocábulos gregos que significam água e tubo), pois era a água que mantinha a pressão constante do ar no someiro. Durante o século IV d.C, o princípio

hidráulico começou a ser substituído pelo pneumático (do grego "vento"), no qual

o fornecimento de ar se fazia por meio de foles.

Tubos remanescentes de um órgão de 228 d.C, encontrado em Aquincum, Hungria

O órgão da igreja medieval

(À direita) Desenho do Livro de Salmos de Utrecht (séc. IX), ilustrativo do Salmo 150. Além

do órgão, com dois enérgicos organistas incentivando dois

exaustos sopradores, vemos cornos, pratos, saltério e alaúde.

(Embaixo) O mais antigo dos órgãos existentes, pertencente à Catedral de Salamanca e con-servado tal como era em 1380.

Em vez de teclas, como as do hidraulos, o órgão da igreja medieval possuía réguas

de registros — tábuas de madeira, localizadas entre o someiro e a parte inferior dos

tubos, que se abriam e fechavam. Quando em posição de abertura, os furos das réguas de registros se alinhavam com os da parte de baixo dos tubos, permitindo que o vento entrasse nestes. Se em posição de fechamento, os furos não coincidiam e os

tubos se mantinham silenciosos. Para cada régua de registro, havia diversos tubos e, com isso, cada uma delas podia produzir uma variada "mistura" de diferentes timbres e sons uníssonos: oitavas (oito notas mais altas) e quintas (cinco notas mais altas). Aproximadamente no começo do século XII, as réguas de registros foram substituídas por teclas, na verdade, alavancas grandes e pesadas que precisavam ser pressionadas com a palma da mão, com o pulso e até mesmo com pancadas.

Muitos documentos medievais relatam a alegria que proporcionava aos músicos da época toda aquela potência, todo aquele colossal volume sonoro, de que dispunha o órgão de igreja, ouvido, em alguns casos, a centenas e centenas de passos do lugar onde estava o instrumento. Num relato um tanto fantasioso, Wulfstan, um monge que viveu em Winchester no fim do século X, descreve um gigantesco órgão lá instalado que possuía quatrocentos tubos controlados por dois teclados, cada qual com vinte teclas, o que representa dez vezes mais tubos do que teclas. Eram neces-sários dois organistas, e o suprimento de ar vinha de vinte e seis foles bombeados

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por setenta homens corpulentos, "pingando suor e movimentando os braços sem parar... para que o órgão ribombasse como um trovão... abafando qualquer outro som que não fosse o seu". Infelizmente, não restou nenhum desses fabulosos instru-mentos medievais para que pudéssemos nós mesmos julgar a qualidade de seu som.

Os menores

tipos de órgão Do século XIII para diante, ao lado do grande órgão de igreja, desenvolveu-se uma quantidade de tipos menores de órgão que incluem o portátil, o positivo, o regai e o harmónio ou órgão de sala.

O órgão portátil era suficientemente pequeno para ser carregado pela pessoa que o tocava. Suas teclas estavam de acordo com o tamanho normal dos dedos e eram tocadas com uma das mãos, pois a outra ou o braço tinha os foles para cuidar. Havia em geral duas filas de tubos, com uma extensão de duas oitavas (do dó central para cima), sendo um tubo para cada nota. Era usado indiferentemente em ambientes internos e externos, como em procissões ou festas ao ar livre. Procure ouvir uma melodia de dança medieval, acompanhada por um pandeiro. Além da música, você irá perceber nitidamente o organista pondo os foles para funcionar.

O órgão positivo era bem maior que o portátil, mas ainda podia ser transportado de um lado para outro (positivo, no sentido de que era para ser "posto em posição" no chão ou sobre uma mesa). Os tubos maiores deste instrumento aumentavam a extensão das notas na direção do baixo e para cada tecla havia vários deles, o que fazia da nota uma mistura de diversos sons. O órgão positivo precisava de dois "executantes", um para tocar as notas do teclado e outro para lidar com os foles.

Procure ouvir o começo de outra dança medieval, chamada estampie, tocada num órgão positivo, de preferência a dança que foi uma das primeiras peças ex-pressamente escritas para instrumentos de teclado. Ela provém de um manuscrito incompleto, de duas páginas somente, datado de cerca de 1325, que ficou conhecido

O compositor cego italiano Francesco Landini (c.1325

-1397), famoso por tocar um diminuto órgão portátil.

(Embaixo) Parte do Fragmento Robertsbridge, datado do séc. XIV — ornais antigo dos manuscritos de música para teclado. A parte de cima (para mão direita) está escrita com notas em forma de losangos, numa pauta de cinco linhas. A parte de baixo (para mão esquerda) está escrita com letras do alfabeto, de a até g. (Direita) Um músico do séc. XV que, ajudado por sua mulher, toca um órgão positivo. (O cachorro parece não ser grande amante de música.)

HW M

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bibelórgano como "Fragmento de Robertsbridge", pelo fato de sua descoberta estar ligada a um

velho registro pertencente à Abadia de Robertsbridge, em Sussex.

O regai é um pequeno órgão portátil que esteve em moda a partir da metade do século XV até o século XVII. Os seus sons vivos, "rosnados" — finos, mas poderosos — eram produzidos por palhetas que batiam em tubos muito curtos, chamados ressonadores. Um tipo bastante especial de regai era o bibelórgano. O instrumento, quando fechado, parecia uma enorme bíblia; quando aberto e colocado sobre uma mesa, as duas metades do "livro" se transformavam em foles. Procure ouvir a música de um compositor alemão chamado Baumgartner, tocada num regai. Esta peça sem nome está no Buxheimer Orgelbuch (Livro Buxheimer para Órgão), um importante álbum de peças para teclado que data aproximadamente de 1470 (acima, mostramos a música tal como foi impressa).

O harmónio ou órgão de sala é uma forma posterior do órgão positivo. Era um instrumento usual nas casas e geralmente vinha acomodado dentro de um armário, semelhante a um guarda-louça. Procure ouvir parte da peça do compositor inglês Thomas Tallis (cl505-1585), em arranjo de sua autoria, da canção "O Ye Tender Babes" (veja abaixo a partitura da música). Ela faz parte do Mulliner Book, um álbum de peças para teclado copiado entre 1550 e 1575 pelo organista Thomas Mulliner.

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O órgão de igreja depois de 1400 "Oitava quebrada ou diminuída" O mecanismo de um típico órgão de igreja Como se faz soar a nota

Durante o século XV, várias melhorias importantes foram feitas no órgão de igreja. Por volta do final do século, quase todos estes instrumentos tinham pelo menos dois manuais com teclas para os dedos, que, agora, estavam menores e muito mais sen-síveis ao toque. Alguns órgãos já tinham sido dotados de pedais, o que na Inglaterra, entretanto, só ocorreria já quase no final do século XVIII.

Um dos mais importantes avanços foi a introdução do mecanismo de botão ou puxador para fazer intervir ou cortar fileiras ou jogos inteiros de tubos que cada um dos teclados fazia soar. Assim, em vez da constante mistura de sons produzida pelo órgão medieval, com cada tecla fazendo soar diversos tubos ao mesmo tempo, era agora possível ao organista, quando ele puxasse os botões apropriados (veja a figura da página ff), selecionar apenas os jogos de tubos que produzissem os sons desejados. Igualmente, era-lhe possível obter certas nuanças de sonoridade, fazendo com que os dois teclados soassem diferentemente.

Até o fim do século XVII, os manuais de muitos órgãos — e também dos instrumentos de cordas providos de :eclas — continuavam com o desenho de uma oitava quebrada ou diminuída no baixo. No exemplo à esquerda, a nota mais baixa, que deveria ser mi, é na verdade o dó baixo. O fá sustenido teria som de ré e a tecla do sol sustenido, o som de mi. As teclas restantes soariam as notas como normalmente são ouvidas. A intenção da oitava diminuída era a de economizar espaço e despesa, poupando notas que àquela época dificilmente seriam necessárias.

Faremos agora um exame mais detalhado do modo como funciona um órgão. Na página ao lado encontra-se um diagrama (ele não está em escala) que mostra em linhas gerais o corte em perfil de um órgão de igreja, de tamanho não muito pequeno. Os quatro elementos essenciais deste instrumento são:

1. Um reservatório de vento sob pressão constante, obtida por bombeamento manual ou elétrico.

2. Diversos jogos de tubos, onde cada tubo corresponde a uma nota. Cada jogo tem o seu timbre e há uma gradação no tamanho dos tubos que o compõem, de modo a fornecer uma escala de notas completa.

3. Manuais e pedaleiras (teclados de mão e de pé).

4. Registros que determinam quando deve um jogo de tubos soar ou ficar silencioso. O organista usa pelo menos em dois sentidos a palavra registro: para referir-se aos puxadores ou botões, ou para indicar os jogos de tubos que estão sob o controle dos botões. No órgão que apresentamos, há três registros para cada manual e um único para a pedaleira. Os botões de registro podem ser usados separadamente ou combinando-os uns com os outros.

Este órgão possui um mecanismo simples, pois é movido por tirantes e não através de fiações e contatos elétricos. Há também um mecanismo de cópula (invisível no diagrama) que permite tanto acoplar um manual ao outro (para que se toque apenas um deles), como também acoplar os manuais à pedaleira.

Os tubos de cada jogo estão colocados sobre uma caixa chamada someiro. Entre os tubos e o someiro há as réguas de registros, uma para cada jogo de tubos. As réguas se acham ligadas aos registros por alavancas. Assim, sempre que um botão for acionado, a régua se deslocará para o lado. Os furos ao longo dela alinham-se, neste instante, com as extremidades dos tubos, tornando possível a entrada de vento nestes. Há, no entanto, sob a extremidade de cada tubo, uma tampa ou válvula dobradiça, chamada palheta, que impede o suprimento de ar. Somente quando o organista apertar a tecla é que uma série de varetas, denominadas tirantes, abrirá a palheta, deixando que o vento se dirija para o tubo e faça a nota soar. Os tubos dos outros jogos ligados a este teclado permanecem em silêncio, uma vez que os furos

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Diagrama geral mostrando o corte em perfil de um órgão de igreja, de tamanho razoável. Ele

possui três registros para cada manual (são em número de dois) e um único registro para a

peda-leira. Ao conjunto de manuais, registros e pedaleira, dá-se o nome de console. Compare este

órgão com o que é mostrado à pág. 18 (3 jogos de tubos) grande órgão H -3 (5 jogos de tubos) órgão expressivo réguas de registros (em preto) puxadores ligados às réguas por

sistema de alavancas

manual do órgão expressivo r—— manual do grande órgão i M :

pedal expressivo PCdfleÍra /77777A

de suas réguas não coincidem com as extremidades deles até que sejam puxados os botões que lhes são correspondentes.

Registros e tubos Os jogos de tubos são de dois tipos: os de boca ou flautados e os de lingúeta ou

pa-lhetaria. Os flautados são tubos de madeira ou metal que produzem sons de maneira semelhante aos da flauta doce. Os jogos de lingúeta possuem uma palheta batente, isto é, uma lingúeta curva de metal, que vibra dentro de um ressonador cónico ou cilíndrico.

Alguns tubos de órgão soam na altura "normal", aquela que corresponde exatamente a sua tecla no manual. Já outros têm o som uma ou mais oitavas acima ou abaixo do que a altura indicada pelas suas teclas. O registro básico é chamado oito pés de altura, pois o tubo para a nota mais baixa do seu jogo (a nota dó) tem oito pés de comprimento. Assim, o registro, cujas notas estão na altura normal, é denominado registro de oito pés. Um registro de quatro pés (o do tubo mais baixo, com quatro pés de comprimento) tem o som uma oitava acima do registro básico; um de 16 pés soa uma oitava abaixo. Há ainda registros de dois pés, um pé, 32 pés e, em alguns órgãos, até de 64 pés (três oitavas abaixo do registro básico). Um organista, portanto, quando seleciona determinados registros e aperta uma só tecla, ouve não apenas o som da nota correspondente à tecla apertada, mas também essa mesma nota duplicada em oitavas, tanto acima, quanto abaixo.

Há outros tipos de registros cujos sons provêm de intervalos diferentes, acima da altura de oito pés: são os dos jogos de mutação e os dos jogos de mistura. Um jogo de mutação pode, por exemplo, ter um intervalo de décima segunda (o de uma oitava e o de uma quinta) acima do registro básico. Um jogo de mistura tem, para

\

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cada tecla, diversos tubos de diferentes tamanhos que produzem várias alturas acima da nota básica. Tais jogos não são usados isoladamente, mas combinados com os fortes registros da altura normal cujas notas eles abrilhantam e enriquecem com os seus timbres. Os manuais e a pedaleira ECO SOLO EXPRESSIVO GRANDE CORO

Ordem dos teclados em um órgão de cinco manuais

A variedade de timbres

Quatro tipos

de tubos

n

O órgão mostrado à página 14 tem dois manuais, mas os órgãos maiores poderão ter três ou até mais. Cada manual se acha em conexão com determinados jogos de tubos que formam uma divisão no todo do instrumento, embora, em essência, apenas uma das partes dessa divisão constitua, por si só, um órgão completo.

O manual principal, aquele a que está ligado o jogo de tubos mais possante e, consequentemente, também o que produz maior volume sonoro, é chamado o grande. O segundo em importância é o expressivo, cujos tubos estão encerrados numa caixa que tem um dos lados fechado por persianas. Usando o pedal expressivo, o organista pode tirarefeitos de crescendo ediminuendo, avolumando ou diminuindo aos poucos os sons, enquanto as persianas lentamente se abrem e fecham. Muitos órgãos possuem também um terceiro manual, denominado órgão positivo (colocado logo abaixo do grande), cujos registros produzem sons mais suaves e doces, próprios para acompanhamento de coro ou para músicas de caráter sereno. Um instrumento ainda maior pode comportar o órgão solo, com registros que atendem às finalidades de um canto, talvez com acompanhamento executado num dos outros manuais. E podem, também, ter o órgão eco, cujos registros fornecem sons etéreos, suaves, que parecem vir de longe. Em muitos órgãos modernos, o princípio da caixa expressiva está aplicado não só ao manual propriamente dito expressivo, como também a outros manuais; nunca, no entanto, ao grande órgão.

Além dos manuais, há, naturalmente, a pedaleira, que tem a mesma disposição de um teclado, com as suas teclas brancas e pretas (veja a figura da página 9). O organista toca a pedaleira com os calcanhares e a parte da frente dos pés. Os registros da pedaleira principal são de 16 pés (emitem sons uma oitava abaixo da altura normal), mas a estes podem ser acrescentados outros com diferentes alturas, por exemplo, oito pés, algumas vezes quatro pés e 32 pés, e, em alguns poucos órgãos, 64 pés.

A imensa variedade de timbres (ou cor do som) disponível num órgão de grandes proporções provém dos jogos flautado c de boca e é dada pela espécie de material usado na sua fabricação (madeira, metal), pela diferença de pressão do vento e pelos formatos e escalas (os diâmetros) dos tubos. O mais importante e característico som do órgão vem da tubagem flautada e se chama registro básico ou diapasão. Há dois tipos de registro básico: o de tubos "abertos" e o de tubos "tapados", estes com uma tampa no seu topo. Isto modifica a qualidade do som e também a da altura. O "fecha-mento" de um tubo faz com que a nota soe uma oitava abaixo. O principal registro distribuído à pedaleira é denominado bordão. Seulubo mais comprido mede somente oito pés; no entanto, se "tapado" emitirá um som a uma altura de 16 pés (observe o desenho à página 14).

O órgão de grandes proporções pode ter 150 registros, ou até mais. Vários deles emitem sons de outros instrumentos, como o da viola e o dos diversos tipos de flauta (estes dois saídos dos jogos flautados), ou ainda o do trompete, do oboé e da clarineta (todos três provenientes dos jogos de boca).

Tubo tapado Spitzfiõte Trompete Clarineta Se o organista tocaraomesmo tempo em dois manuais diferentes (cada mão tocando

namãdT palheteria n u m deles),ele P°de n à o S(^ combinar uma enorme gama de sons, como também

fazer contrastes de sonoridades. E, se usar os registros de cópula, ele junta, num único teclado, dois ou mais manuais, criando uma rica mistura de timbres e, se for o caso, também um maior volume sonoro. Os órgãos mais modernos costumam ter

(18)

pistões que modificam de uma só vez grupos inteiros de registros, o que é feito com um ligeiro toque de pé ou do polegar para que o fluxo da música permaneça ininterrupto.

Procure ouvir dois exemplos contrastados de música de órgão. Primeiro, de Johann Sebastian Bach (1685-1750), cujas composições para órgão incluem tocatas, prelúdios e fugas, fantasias e prelúdios-coral, procure ouvir Ich ruf zu dir, Herr

Jesu Christ (Eu Vos invoco, Nosso Senhor Jesus Cristo), um prelúdio-coral escrito

para dois manuais e pedaleira. A música abaixo indica a registração (a escolha de determinados registros) que o organista selecionou.

8' Hohl Flute. 4' Lieblich Flute, 2' Piccolo, 2 23 Harmonic Twelfth, 1 3/5 Harmonic Tierce ('^ti.

MANUAL SOLO (mão direita) MANUAL EXPRESSIVO (mão esquerda) PEDALEIRA rjhH?—rfl? 1 tJ cctcj 1 Pr—1

hm?

(19)

B A C H

[sih la dó si tj

Depois, procure ouvir um trecho da peça de Liszt, Prelúdio e Fuga sobre

B-A-C-H, ou seja, um tema de quatro notas construído com as letras do nome Bach pela

notação alemã, e que corresponde às notas si bemol, lá, dó e si bequadro. Esta música mostra um pouco da formidável extensão de um grande órgão, tanto no que se refere à altura e ao volume, quanto ao timbre — uma extensão sonora que excede a de qualquer outro instrumento.

Alguns organistas famosos: Lionel Rogg; Jennifer Bate; e Peter Hurford

Exercício 1 Descreva as principais diferenças entre os quatro tipos de órgão designados nos

retângulos abaixo:

órgão órgão regai órgão de igreja

portátil positivo regai (c/pedaleira)

Exercício 2 1) Explique cada uma dessas palavras que, de certo modo, estão relacionadas ao

órgão:

manual régua de registro jogo flautado de boca ou palhetaria palheta registração grande expressivo

2) Em quantos sentidos pode o organista usar a palavra "registro"?

Exercício 3 Descreva alguns dos modos como um organista pode variar os sons produzidos por

um grande órgão, no que diz respeito ao timbre, ao volume e à altura.

Exercício 4 Procure ouvir outra vez o prelúdio-coral de Bach, Ich ruf zu dir, Herr Jesu Christ,

cuja música está reproduzida à página 16.

1) Em qual dos manuais o organista toca o canto do coral (na verdade, a melodia de um hino alemão); e em qual toca a figuração do acompanhamento em semicolcheias? Por que o organista não toca estas duas linhas de música no mesmo manual? 2) As notas do baixo deste prelúdio-coral são tocadas na pedaleira com um registro de 16 pés. Estão estes sons:

a) na mesma altura que as notas impressas? b) uma oitava abaixo que as impressas? c) uma oitava acima?

Exercício 5 Se possível, vá a uma igreja e marque hora com o organista de lá. Observe e ouça

ao vivo o órgão, procurando perceber um pouco a maneira como funciona este instrumento.

(20)

Outras músicas de órgão para ouvir

A música para órgão do século XX

Algumas peças de antigos álbuns de música para teclado, como Buxheimer

Orgelbuch (c.1470) e The Mulliner Book (c.1560)

Variações ou uma das fantasias com efeitos de "eco" do compositor holandês Jan Pieterzoon Sweelinck (1562-1621)

Arranjos de hinos e diferencias (variações) sobre melodias populares, pelo compositor cego espanhol Antonio de Cabezon (1510-1560)

Uma tocata ou capricho do compositor italiano Frescobaldi (1583-1643)

Um prelúdio e fuga ou um prelúdio-coral do compositor dinamarquês Dietrich Buxtehude (1637-1707)

Bach: prelúdios e fugas; tocatas e fugas (especialmente a em ré menor); Passacaglia e Fuga em Dó Menor, e prelúdios-coral, como o Wachet auf, In dulci Jubilo zNun

danket alie Gott

Hàndel: concertos de órgão, especialmente o em fá maior, conhecido como "O Cuco e o Rouxinol" e o Opus 4 nQ 6 em si bemol

César Franck: Pasíorale e Pièce Hérolque Schumann: Canon em si menor Opus 56 nQ 5

Widor: Tocata da Sinfonia para Órgão nQ 5

Reger. Fantasia e Fuga sobre B-A-C-H (sobretudo os dois últimos minutos e meio da Fantasia, quando se ouvem sons de órgão muito interessantes)

Váughan Williams: "Rhosymedre" (dos Três Prelúdios sobre Melodias do Hino

Galês)

Poulenc: Concerto para órgão, cordas e tímbale

Hindemith: Concerto para Órgão (Kammermusik Nr. 7, Op. 46 Nr. 2), especialmente o primeiro movimento

Messiaen: Les Corps Glorieux; e as nove meditações de Natal, chamadas La

Nativité du Seigneur

Ligeti: Volumina (embora estranha, a sonoridade é cheia de surpresas e em geral bela; de fato, tocam três instrumentistas, dois dos quais meramente com a função de trocar os registros)', Étude NQ1: "Harmonies" (um estudo com transformações

va-garosas, impalpáveis, tanto no que diz respeito à altura e à harmonia, quanto ao timbre)

O órgão do Royai Festival Hall, em Londres, construído por Harrison e Harrison (1954). Equipado com quatro manuais e

103 registros, trata-se de um instrumento avantajado e complexo, muito embora, em essência, constitua a simples multiplicação dos elementos básicos do órgão da página 14,

tendo apenas a função dos tirantes substituída por um mecanismo "eletropneumático".

(21)

3

A família do

cravo

Os instrumentos de cordas com teclado que pertencem à família do cravo são: o

virginal, a espineta e, naturalmente, o cravo. Em todos estes instrumentos o som

é produzido por cordas pinçadas, diferente do clavicórdio e do piano, que têm as cordas batidas ou marteladas.

cravo virginal espineta

O cravo móvel cordas lamelas cravelhas manual superior manual inferior

O cravo possui um formato semelhante a uma asa (tal como o piano de cauda), com cordas de metal esticadas à frente do executante, formando ângulo reto com o teclado. Os primeiros cravos tinham um só teclado ou manual e uma única corda para cada nota. Já um cravo construído depois do século XVII é bem provável que tenha dois teclados — o segundo colocado em nível mais alto, atrás do primeiro — e é possível que apresente também dois, três ou mesmo quatro jogos de cordas completos.

As cordas são presas às cravelhas que, por sua vez, se acham fixadas no cepo, atrás dos teclados. É girando as cravelhas que se afina o instrumento. Cada corda se acha distendida através de dois cavaletes (um fixado no cepo e o outro sobreposto à tábua de harmonia) e segura por uma aselha que pode estar fixada tanto na extremidade do móvel, pelo lado de dentro, como na tábua de harmonia. Os cavaletes transmitem as vibrações das cordas à tábua de harmonia, cuja ressonância ao mesmo tempo amplia e enriquece a sonoridade.

teclados

O cravo foi desenvolvido durante o século XV (a primeira menção deste instrumento data de 1397). A ilustração mostra o mais antigo dos cravos que chegou até nossos dias. Ele tem uma extensão de quatro oitavas e foi fabricado em 1521 por Jerome de Bologna. Encontra-se noVictoria and Albert Museum, Londres.

(22)

A altura das várias notas depende do comprimento relativo das cordas, bem como da tensão (esticamento) e da espessura delas:

quanto mais curta a corda quanto mais fina a corda quanto mais apertada a corda

mais rapidamente ela vibrará e mais alto soará a nota

O mecanismo do cravo cavalete cavalete lamela Pn corrediça lamela diretriz tecla abafador corda palheta

Na extremidade da tecla, aquela que fica dentro do cravo, há uma régua de madeira, posta verticalmente, chamada lamela (ou saltarelo). Fixada na cabeça desta, encontra-se uma "lingúeta" móvel de madeira que projeta a palheta, feita de pena animal ou de pedaço de couro pontudo. Quando a tecla está em repouso, uma peça de pano, em geral feltro, chamada abafador, impede a corda de vibrar.

Quando a tecla é apertada, a sua extremidade levanta, tal como uma gangorra, impulsionando para cima a lamela. A palheta, então, em sua passagem pela corda, pinça-a, produzindo as vibrações que dão o som da nota. Uma vez a tecla solta, a lamela torna a descer e a lingíieta gira sobre o eixo para que a palheta não volte a ferir a corda novamente. Uma pequenina mola retorna a lingúeta à sua posição vertical. O abafador volta a descansar sobre a corda, "abafando-a" e silenciando a nota.

O SOm do Cravo Procure ouvir a Gavotte da Quinta Suite Francesa de Bach, tocada em cravo de um

só manual.

No cravo é impossível variar a sonoridade através do toque dos dedos (como ocorre no piano e no clavicórdio). O fato de apertar com força ou de leve as teclas,

pouca ou nenhuma diferença faz para um som que é gerado pelo pinçamento de 4 cordas.

Entretanto, num grande cravo de dois manuais, os sons fortes ou fracos e uma diversidade de timbres contrastantes são perfeitamente exequíveis. Diferentes jogos de lamelas pinçando diferentes jogos de palhetas podem, através de registros

de mão situados acima do teclado ou dos pedais, ser postos em ação. Como mostra a figura ao alto, os jogos de lamelas são dispostos em fileiras, uma atrás da outra, o que torna possível o controle de três ou mais lamelas por uma única tecla. Cada fileira de lamela está engastada numa "lamela diretriz" e numa "lamela corrediça" (veja o diagrama). Por meio dos registros de mão ou dos pedais, pode-se trazer para o lado a fileira de cada lamela corrediça, levando-a à posição de engate para que as palhetas possam ferir as cordas, ou a de desengate, quando a cabeça de cada lamela, inclinada ligeiramente, deixa a palheta fora do alcance das cordas.

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Dessa forma, ao selecionarem-se os registros apropriados, um jogo de cordas, na altura normal (dita "altura oito pés") pode estar sendo tocado no manual de cima, enquanto um jogo de cordas mais curtas, de altura quatro pés (uma oitava acima), está sendo tocado no manual de baixo. (Na altura oito pés, o dó central tem o seu som normal; já na altura quatro pés, ao tocar-se a tecla que lhe corresponde o seu som é ouvido uma oitava acima.) Em certos cravos, há também um jogo de cordas mais compridas, com altura de 16 pés, que soa uma oitava abaixo.

Há ainda outras maneiras de produzir sons contrastantes. A sonoridade mais aveludada e cheia das palhetas de couro pode ser jogada contra a das palhetas de pena, que proporcionam sons bem mais secos. O registro de alaúde aciona uma fi-leira especial de lamelas cujas palhetas pinçam a corda num ponto muito mais pró-ximo do cepo. Isto dá uma espécie de som mais anasalado e fino. O registro de "harpa" ou de "búfalo" põe pequeninos chumaços de feltro ou de pele de búfalo em contato com determinado jogo de cordas, abafando-lhes os sons e tirando um efeito de pizzicato surdo. Um registro de "cópula" permite que dois ou mais jogos de lamelas e cordas sejam tocadas num só teclado, de modo a criar sonoridades volu-mosas, fortes e majestáticas.

A pessoa que toca cravo classifica os vários "timbres", alturas e intensidade sonora de que ela dispõe através dos registros e pedais. E parte do fascínio deste instrumento está justamente na possibilidade dada ao executante de escolher a

registração adequada para os diferentes trechos de uma peça.

Procure ouvir o Minueto da Décima Suite para Cravo de Hãndel. O minueto é seguido de três variações, duas das quais estão mostradas na partitura reproduzida na página seguinte. A registração escolhida pelo cravista está indicada na música, ao alto, à esquerda.

Acima, cravo com duplo manual, feito em 1755, Londres, por um dos mais conhe-cidos fabricantes desse instrumento, Jakob Kirckman. A direita, o mesmo cravo, visto de cima. Ele tem três jogos completos de cordas e quatro jogos de lamelas.

(24)

George Friderick Hàndel (1685-1759)

Minueto

(manual superior, 8' e manual inferior, 8' acoplados)

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J J , J-

^

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Variação 1 (manual superior, 8') Variação 3 (manual inferior, 8' + 16' + 4')

Este cravo pertenceu a Hàndel.

(25)

Você verá que um grande cravo com dois manuais pode produzir uma sonoridade brilhante, vigorosa e muito variada. Alguns cravistas preferem manter uma só registração para a música inteira, a fim de que o contraste, numa suite de danças, por exemplo, só venha a ocorrer entre uma peça e outra. Mas diversos cravistas famosos (como Wanda Lando wska, Fernando Valenti e George Malcolm), que adoram contrastes de volume e timbre, estão a todo instante, do princípio ao fim da peça, trocando a registração.

Contudo, um grande cravo, mesmo com toda a gama de volumes e timbres de que dispõe, não pode proporcionar a mudança gradual de sonoridade, como é possível obter no piano, através exclusivamente do toque de dedos. Toda mudança sonora no cravo só é feita de forma escalonada, em degraus claramente definidos que vão produzindo "camadas" contrastantes, à medida que o instrumentista vá acionando os registros e pedais para engatar ou desengatar os diversos jogos de lamela. Apenas uma exceção, o último dispositivo acrescentado ao instrumento: as "persianas" que mencionamos anteriormente.

Ornamentos

François Couperin (1668-1733). Ele e outros compositores

franceses dos séculos XVII e XVIII, que escreveram música para cravo — como Chambon-nières (1602-1672), Rameau (1683-1764) e Daquin (1694-1672) — são conhecidos como "Les Clavecinistes" fclavecin em francês significa cravo).

Uma vez que a força com que se toca a tecla não tem nenhuma ou quase nenhuma importância para os sons do cravo, a acentuação de determinada nota numa frase é totalmente impossível neste instrumento. Alem disso, tão logo a nota seja atingida,

o seu som já está começando a desaparecer. Desde cedo, os compositores procuraram,

pelo emprego de ornamentos, resolver estes problemas. Como indica a palavra, os ornamentos servem para embelezar a música; no entanto, não se trata apenas de uma questão de embelezamento, pois os trinados longos servem também para sustentar notas que sem eles logo morreriam, e os ornamentos secos e incisivos do tipo de trinados curtos e mordentes vivos (do italiano, significando como uma mordida) dão uma impressão de acento e peso às notas que têm mais importância.

Procure ouvir a peça denominada La Galante, do cravista e compositor francês François Couperin, e preste atenção em alguns efeitos desse tipo que foram obtidos por meio de ornamentos:

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s r 1 y \ v r'

(26)

Domênico Scarlatti (1685-1757)

Um dos maiores compositores e também cravistas de seu tempo foi o italiano Domênico Scarlatti. Ele nasceu em Nápoles, em 1685 (no mesmo ano que Bach e Hãndel), mas os seus últimos anos de vida foram passados na Espanha, onde morreu em 1757, na cidade de Madri. Scarlatti compôs cerca de 550 sonatas de um só movimento para cravo, todas de forma binária, isto é, constituídas de duas partes, cada uma delas geralmente repetida. Procure ouvir a Sonata em Lá Menor (L429; kl75), na qual se encontram muitas características do brilhante e vigoroso estilo de Scarlatti. A música se inicia com uma arrojada ideia baseada num acorde harpejado em lá menor, seguido de impemosa escala descendente que passa como o clarão de um relâmpago (a música está mostrada abaixo e o trecho é indicado pela letra A). Segue-se pouco depois um trecho de acordes dissonantes (letra B). Na segunda parte da sonata, preste atenção às notas repetidas, semelhantes a chilreios de pássaros e à passagem tocada com cruzamento de mãos (letra C), uma das especialidades de Scarlatti.

O cravo como Durante o período Barroco (1600-1750), o cravo, além de usado como instrumento "contínuo" so^0, t m n a o u t r o importante papel: o de acompanhar não só o canto, como também

outros instrumentos. Uma característica encontrada em quase toda música de conjunto dessa época é a presença do cravo (por vezes do órgão) como instrumento

contínuo, vale dizer, como um instrumento que era tocado "continuamente", do

princípio ao fim da peça, de modo que os seus sons completassem as harmonias, ornamentassem a tessitura e, sobretudo, que, através deles, fosse mantida a unidade do conjunto. No final do período Barroco, o cravo, algumas vezes, se viu elevado à condição de instrumento solista nos concertos.

Cravo versus Durante a segunda metade do século XVIII, o piano começou a rivalizar-se com o Diano cravo em popularidade. Parte da atração do piano vinha do fato de que, nele, era

^ impossível ir gradualmente aumentando ou diminuindo a sonoridade. Para combater isto, alguns fabricantes de cravo dotaram os seus instrumentos de uma persiana expressiva. Esta se compunha de uma série de tabuinhas, tal como as venezianas de uma janela, e era colocada sobre as cordas (uma ideia semelhante ao princípio que orientou o manual expressivo dos órgãos, veja à página 15). Por meio do pedal, o cravista podia abrir ou fechar as pequeninas tábuas, de modo a dar a impressão de estar aumentando ou diminuindo o som das cordas. Mas, apesar dessa desesperada tentativa de sobrevivência do cravo, o piano continuou a vencê-lo em popularidade e, por volta de 1810, já reinava absoluto. Durante quase todo o século XIX, o cravo esteve esquecido. Entretanto, o século XX o vem ressuscitando e, cada vez mais, é ouvido o vastíssimo repertório que foi composto para ele no período que vai do

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século XV ao XVIII. Diversos compositores de nosso tempo têm escrito obras exclusivamente para cravo, ou onde ele tem uma parte (veja a lista de músicas dada à página 30).

O virginal (em inglês, virginais, pois a palavra é usada a maioria das vezes no plural) é, na verdade, uma modalidade simplificada do cravo. Sua forma mais comum é a oblonga. Possui apenas um teclado situado em algum ponto de um dos seus lados mais compridos, seja mais à direita ou mais à esquerda, ou mais ao centro.

As cordas de arame—uma para cada nota—correm da esquerda para a direita, mais ou menos paralelas ao teclado, sem formar ângulos retos com este, diferente, portanto, do cravo. Como mostra a fotografia abaixo, as cordas se acham esticadas através de dois cavaletes que lhes transmitem as vibrações à tábua de harmonia. As cravelhas estão à direita. As cordas do baixo, as mais longas, estão colocadas defronte das mais curtas, situadas no fundo do instrumento.

O virginal

Vista de cima do virginal fabri-cado por John Loôsemore, de Exeter. A extensão deste instru-mento vai pouco além de quatro oitavas.

O som do virginal As cordas do virginal são pinçadas de maneira semelhante às do cravo. Quando uma

tecla é apertada, uma ripa de madeira, em posição vertical, ou seja, a lamela, locali-zada na outra extremidade da tecla, se levanta dentro do instrumento. Na cabeça da lamela se acha fixada a palheta de pena que, ao se mover, pinça a corda.

Procure ouvir o início da música denominada " A Hornepype", do compositor inglês Hugh Aston (c. 1485-1558). Ela é uma das três mais antigas peças que se sabe terem sido escritas especialmente para virginal; seu manuscrito data aproximadamente de 1530.

Um fragmento do manuscrito original (c.1530), mostrando

o início da musica "A Hornepype", composta

por Hugh Aston.

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Virginal flamengo, fabricado em 1581, por Hans Rúckers. Aqui se acham dois instru-mentos em um só, conhecido como "mãe e

filho". O "filho", à esquerda, pode, tal como uma gaveta, ser puxado para fora e colocado por cima das lamelas que ficam

na parte de trás do teclado da "mãe". Assim, quando as teclas da "mãe" são tocadas, suas lamelas puxam para cima as extremidades posteriores das teclas do "filho", que soam (uma oitava acima) em conjunto com as da "mãe". Como alternativa, o "filho" pode ser usado sozinho, constituindo-se num instrumento inteiramente independente.

A música elisabetana para virginal

O virginal se transformou no instrumento mais popular dos lares elisabetanos. Quase todos os compositores da época que escreveram música para instrumento de teclado tinham frequentemente o virginal em suas mentes, embora muitas peças fossem também tocadas em cravo e outras se mostrassem mais adequadas ao clavi-córdio ou ao órgão.

Apesar da sonoridade do virginal não ser muito rica e possante, e ser menos variada do que a do cravo, suas notas agudas cintilam como brilhantes e as do baixo podem surpreender pelos sons arredondados e cheios. Compare a sonoridade do virginal com a do cravo na peça denominada Muscadin ou Kempe s Morris, uma popular melodia dos tempos elisabetanos, num arranjo de Giles Farnaby (cl 565-1640). O começo da música está tocado em cravo e o restante em virginal. (William Kempe foi um famoso ator cómico e bailarino que, em 1594, representou ao lado de Shakespeare, diante de Elizabeth I; alguns anos mais tarde, realizou a incrível proeza de percorrer todo o caminho de Londres a Norwich—quase 180 quilómetros — dançando uma mourisca ou, em inglês, uma morris dance.)

Uma página do Fitzwilliam Virginal Book (ver pág. 27) com a música Muscadin ou Kempe's

Morris, de Giles Farnaby.

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(29)

As três figuras de proa da música elisabetana para virginal: William Byrd (1543-1623), John Buli (1563-1628) e Orlando Gibbons (1583-1625).

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Os compositores elisabetanos foram os primeiros a elaborar o que de fato se pode chamar de um estilo de música para teclado, caracterizado no uso abundante de acordes harpejados, ornamentos secos e incisivos, escalas ligeiríssimas e passagens carregadas de virtuosismos. Dentre os muitos álbuns de música para teclado dessa época, os principais são:

My Ladye Nevells Booke (1591), no qual se acham 42 peças do maior compositor

elisabetano: William Byrd.

The Fitzwilliam Virginal Book (1609-1619), este contendo a maior coleção de

músicas elisabetanas para teclado. Todas as suas 297 peças foram copiadas a mão por Francis Tregian, da Cornuália. Muitas delas, durante o tempo que passou em Fleet Prison, uma prisão de Londres, onde esteve preso por causa de suas crenças religiosas. São muitos os compositores representados neste álbum, mas os principais são: Byrd, Buli, Gibbons e Farnaby. (Na página 26 mostramos uma folha do Fitzwilliam Virginal Book)

Parthenia é o primeiro álbum impresso de músicas para virginal. Sua publicação

data do final de 1612 ou do início de 1613.Nele,estão21 peças das três figuras de proa da música elisabetana para virginal: Byrd, Buli e Gibbons.

Cerca de 12 anos após o aparecimento de Parthenia, um novo álbum de música para teclado foi publicado com o título de Parthenia In-violata. Todas as peças nele são de compositores anónimos e todas incluem uma parte para viola da gamba. Procure ouvir uma das danças deste álbum, um vivaz Coranto (corrente), tocado em virginal com acompanhamento de viola da gamba.

Uma das formas de composição preferidas dessa época era a de fazer com que cada parte da música fosse seguida por uma repetição ornamentada ou por uma variação. {Muscadin ou Kempe s Morris, de Farnaby, mostrada na página 26, está composta dessa maneira.) Às vezes também o compositor era dado a escrever uma série de variações sobre uma melodia, que iam gradualmente crescendo de interesse pelo emprego cada vez mais abundante de ornamentos e passagens virtuosísticas que saíam de uma mão para outra. Procure ouvir as variações de Byrd sobre uma popular melodia elisabetana, chamada The Carmans Whistle\ a peça se encontra tanto no My Ladye Nevells Booke como no The Fitzwilliam Virginal Book. Como todo o mundo já devia conhecer a melodia, Byrd a reproduz em duas frases somente, a título de lembrete. Seguem-se, então, nove variações.

Variação 1

(30)

A espineta

cordas

lado recurvo teclado

Espineta foi o nome dado na Inglaterra no fim do século XVII a um instrumento de

teclado, com cordas pinçadas, que era uma variante em maior escala do cravo. A espineta possui somente um teclado, um único jogo de cordas e uma corda para cada nota.

A típica espineta é a que tem forma de asa, com o lado direito do móvel fa-zendo uma "curva". As cordas correm diagonalmente da esquerda para a direita, for-mando um ângulo de 45° com o teclado. Elas são seguras pelas cravelhas, fixadas no cravelhal, logo acima do teclado, e esticadas através de dois cavaletes até as aselhas, que as prendem no lado direito. As lamelas, com suas penas de pinçar, estão situadas numa linha imediatamente atrás do cravelhal. As cordas do baixo, na parte de trás do instrumento, são mais compridas do que o teclado, o que dá à espineta a sua característica forma de "pala de carneiro".

Uma espineta com a sua forma de asa e lado recurvo, lembran-do uma "pata de carneiro". Este

instrumento tem uma extensão de cinco oitavas e foi fabricado em 1575 por John Harrison, de

Londres.

O som da espineta

A espineta tornou-se extremamente popular na Inglaterra, sobretudo no período que vai do final do século XVII até as últimas décadas do século XVIII. Era um instrumento mais barato do que o cravo, além de tomar bem menos espaço nas casas.

O seu som é claro e "argentino", mais semelhante ao do cravo do que ao do virginal. Não é tão "cavernoso" quanto o deste último, pois um de seus cavaletes está montado na tábua da harmonia e o outro fixado no cravelhal. (No virginal, ambos os cavaletes estão montados na tábua da harmonia.)

Procure ouvir duas peças de Purcell, "A New Scotch Tune" (Uma Ária Escocesa) e "March" (Marcha), tocadas numa espineta ingjesa do século XVIII. As músicas fazem parte de um álbum chamado Musick's Handmaid que contém 12 peças para serem tocadas em virginal, cravo ou espineta. Damos, logo abaixo, a música de "A New Scotch Tune":

Henry Purcell (1659-1695)

(31)

2) Descreva como são produzidos os sons nestes três instrumentos.

Exercício 7 Procure ouvir outra vez a peça de Couperin La Galante (página 23). Couperin

compôs esta pequena peça na forma binária:

Seção A Seção A x v . Seção B Seção B

repetida repetida

Na execução, o cravista, através do emprego de diferentes registros (ver página 21), varia a sonoridade, para dar maior interesse à peça. Acompanhe a música e, enquanto estiver ouvindo, anote os lugares onde o cravista:

(a) usa o registro de "harpa";

(b) acrescenta a altura quatro pés para o timbre revelar-se mais brilhante, com as notas ouvidas uma oitava acima.

Exercício 8 Muitos dos timbres contrastantes de que dispõe um grande cravo são devidos (a) ao

material de que é feita a palheta e (b) ao lugar na corda em que a palheta a belisca. Se você tiver uma guitarra à mão, procure fazer a seguinte experiência, descrevendo os diferentes sons que tirar do instrumento. Fira a corda mais alta com: (1) a parte de trás da unha

(2) a ponta do polegar (3) uma pena dura

(4) uma borracha em forma de cunha

A) por cima da roseta ou ouvido (B) bem próximo do cavalete (C) bem na parte de baixo do braço

ou ponto

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Outras músicas de cravo, virginal e espineta para ouvir

Música para cravo do século XX

A cravista polonesa Wanda

Lan-Outras peças de antigos álbuns de música para teclado, como The Fitzwilliam

Virginal Book e Parthenia.

Tocatas e danças para cravo do compositor italiano Frescobaldi (1583-1643). Algumas peças mais dos "clavecinistes" franceses, como Soeur Monique e Les

Moissoneurs (Os Ceifeiros), de Couperin; Tambourin e La Poule (A Galinha),,de

Rameau; Le Coucou de Daquin.

Danças de algumas suites de Purcell, Bach e Hãndel.

Bach: Prelúdios e Fugas do Cravo Bem Temperado ("Os 48"), tocados ao cravo;

Variações Goldberg-, Fantasia Cromática e Fuga e o Concerto Italiano, e mais

ainda os Concertos para cravo e orquestra de cordas.

Danças e movimentos de sonatas, tocados em espineta ou cravo, de compositores ingleses como Byrd, William Croft, Thomas Arne.

Obras de compositores barrocos nas quais o cravo é usado como contínuo. Falia: Concerto para cravo, flauta, oboé, clarineta e violoncelo (1923-6) Poulenc: Concert Champêtre para cravo e orquestra (1927-8)

Martinú: Concerto para cravo e orquestra de câmara (1935), no qual também o piano desempenha uma parte importante.

Frank Martin: Concerto para cravo e pequena orquestra (1952) e Petite Symphonie

Concertante para harpa, cravo, piano e duas orquestras de corda (1945).

John Cage: HPSCHD (1967-9) para de um a sete cravos e de uma a 51 gravações de computador (na peça se encontram também passagens de obras para teclado de compositores como Mozart, Beethoven, Chopin, Schumann e Schoenberg). O sôm do cravo tem sido muitas vezes amplificado eletronicamente e a ele, com frequência, se tem dado uma parte nas músicas de fundo para cinema e televisão.

pessoas que, no século XX, restituiu ao cravo a posição que lhe era devida. Inspirados pelas suas arrebatadas interpretações da música do século XVIII, Falia

e Poulenc escreveram concertos dowska (1879-1959), tocando num cravo moderno, fabricado Landowska foi das primeiras pela firma francesa Pleyel.

especialmente para ela.

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A A forma do clavicórdio é semelhante à de uma caixa oblonga, e o seu teclado fica num dos lados mais compridos desta caixa. As cordas de arame vão da esquerda para D rJíH/ipnrHifl a ciireitaí m a i s o u m e n o s paralelas ao teclado. Elas partem das aselhas, seguem por

V^r L i a v l t U l U %J c-m a foçias (d0 ia(j0 de e na altura do meio destas) e, depois de passarem

pelo cavalete e a tábua de harmonia, chegam às aselhas, no lado direito. Perto das aselhas encontram-se tiras de panos, trançadas por entre as cordas.

Enquanto as cordas do cravo, do virginal e da espineta são pinçadas, as do clavicórdio são levemente marteladas ou batidas.

Vista decima de um clavicórdio de teclado preso, datado

apro-ximadamente de 1700.

O mecanismo do Dos instrumentos de teclado, o clavicórdio é o que tem a ação ou o mecanismo clavicórdio produtor de som mais simples. Fixada na extremidade de cada tecla, se acha uma

pequenina lâmina de bronze, na vertical, chamada tangente. Quando a tecla é abaixada, a sua extremidade oposta se levanta, tal como uma gangorra, fazendo a tangente bater no par de cordas, logo acima. A tangente, até que a tecla seja solta, permanece exercendo pressão sobre as cordas.

Quando a tangente bate contra um par de cordas, ela está, na realidade, "bloqueando-as", do mesmo modo que faz um violinista ao apertar uma corda com o dedo da mão esquerda, para torná-la muda. A tangente divide as cordas em duas seções. O impacto da batida leva uma das seções para a sua direita, ou seja, para um ponto entre ela e o cavalete, onde a corda vibra, produzindo a nota desejada. Contudo, a seção da corda à esquerda da tangente não pode vibrar, pois está "abafada" (silenciosa, portanto) pelas tiras de pano. Quando o executante solta a tecla, a tangente cai, interrompendo imediatamente o som, pois, neste instante, as tiras de pano estão amortecendo todo o comprimento da corda.

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Embora não sejam muito co-nhecidos os dados do clavicór-dio no seu passado mais remoto,

ele, sem dúvida, já existia no princípio do século XV. A fo-tografia ao lado mostra o mais antigo dos clavicórdios

existen-tes (mais hexagonal do que oblongo), feito pelo famoso j fabricante de instrumentos

Do-mênico Pesaro, em 1543. O clavicórdio de teclado preso e o de teclado livre teclado preso teclado livre

O ponto exato onde a tangente atinge o par de cordas determina o comprimento das ondas vibratórias, o que, por sua vez, determina a altura do som. Quanto menor for o comprimento das ondas vibratórias, mais alto irá soar a nota. Devido a esse fato, é possível a duas ou mais teclas, com as suas respectivas tangentes, compartilharem do mesmo par de cordas, fazendo, assim, soar diferentes notas, de acordo com os diferentes pontos atingidos pelas tangentes. Naturalmente, estas notas não podem soar ao mesmo tempo. No entanto, os primeiros fabricantes de clavicórdios trataram de assegurar que apenas as notas separadas por um semitom (por conseguinte, jamais tocadas simultaneamente na música dessa época) saíssem do mesmo par de cordas.

Os clavicórdios que têm as suas cordas compartilhadas por duas ou mais teclas são chamados de teclado preso. Aqueles, onde há um par de cordas para cada tecla, são ditos de teclado livre. Os primeiros clavicórdios de teclado livre foram fabricados no fim do século XVII, mas os de teclado preso continuaram sendo fabricadosvainda em pleno século XVIII. Estes, por terem um número reduzido de

cordas, eram menores, de fabricação mais barata e mais fáceis de ser afinados. O clavicórdio mostrado ao alto desta página tem somente 22 pares de cordas, embora possua uma extensão de quatro oitavas, com uma oitava mais curta no baixo (ver página 13).

Referências

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