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MEDIAÇÃO ESCOLAR E REDES DE APOIO: UM ESTUDO DE CASO

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Academic year: 2021

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ISSN 2176-1396

MEDIAÇÃO ESCOLAR E REDES DE APOIO: UM ESTUDO DE CASO

Rafanelly Ferreira Lopes1 - UFF Solange Paes de Matos2 - UFF Arildo dos Santos Amaral3 - UFF Grupo de Trabalho – Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – (CAPES) Resumo

O presente trabalho aborda questões pertinentes de um processo de inclusão escolar tardia de um jovem de 17 anos ainda em alfabetização. Com o objetivo de procurar entender melhor quais as implicações da medicação precoce, das contradições de sua inclusão numa turma de primeiro ano, com idade média de 7 anos, de um contexto econômico desfavorável e da mediação escolar na vida do jovem Paduano que chamaremos de Drico, nome fictício utilizado para manter sua identidade em sigilo, este texto desdobra-se de um ano e meio de trabalho dos Bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) do curso de Pedagogia do Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior (INFES) da Universidade Federal Fluminense (UFF), numa escola pública de ensino fundamental localizada em Santo Antônio de Pádua, Estado do Rio de Janeiro. Entendendo a prática docente como indissociável da sua necessária reflexão crítica, caracterizada num movimento dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer (FREIRE, 1996), esses estudantes atuam como mediador escolar vinculados ao subprojeto Educação e Saúde, que os insere em escolas públicas tendo em vista a necessidade e importância de tratar e incentivar a inclusão como prática docente. Os estudantes se inserem em campo como mediador escolar, atuando

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Graduando em Pedagogia pela Universidade Federal Fluminense – UFF e Bolsista do Programa Institucional de Iniciação à Docência-PIBID da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. E-mail: rafanellylopes@hotmail.com

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Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal Fluminense – UFF e Bolsista do Programa Institucional de Iniciação à Docência-PIBID da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES.

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Graduando em Pedagogia pela Universidade Federal Fluminense – UFF e Bolsista do Programa Institucional de Iniciação à Docência-PIBID da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES.

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como intermediários nas relações que ocorrem em sala de aula, um diálogo e um encontro com as possibilidades na escola e fora dela, mantendo o contato constante com instituições de apoio em todo o processo de inclusão escolar, procurando ir além dos muros da escola. Palavras-chave: Educação inclusiva. Mediação Escolar. Redes de apoio.

Introdução

O presente trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa desenvolvida por Bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) da Coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES) do Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior (INFES) da Universidade Federal Fluminense (UFF), e teve por orientação a Professora Doutora Maria Goretti Andrade Rodrigues. Por meio da inserção de Bolsistas do Pibid na Escola Municipalizada Deputado Armindo Marcílio Doutel de Andrade (EMDAMDA), localizada em Santo Antônio de Pádua -RJ, o iniciar da prática docente tem

suscitado também o iniciar da pesquisa científica.

Entendendo a inclusão escolar como um direito, sobretudo a partir da Declaração de Salamanca (1994), o subprojeto Educação e Saúde insere estudantes do curso de Pedagogia em escolas públicas, tendo em vista a necessidade e importância de tratar e incentivar a inclusão como prática docente. O subprojeto de iniciação à docência via mediação escolar tem por objetivo a formação de professores para o enfrentamento de situações vividas em sala de aula com a inclusão. O mediador escolar atua como intermediário nas questões sociais e de comportamento, nas atividades e/ou brincadeiras escolares, e nas atividades pedagógicas, nas limitações motoras ou da leitura, nos diversos níveis escolares (Mousinho et al, 2010).

A atuação em sala de aula comunica-se com diversas Instituições no sentido de dar potência ao trabalho realizado, como a Universidade, neste caso a Universidade Federal Fluminense (UFF), mais especificamente com o Instituto do Noroeste Fluminense de Educação Superior (INFES), com a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) e o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) e a família, sendo essas as nossas redes de apoio intersetorial (RODRIGUES et al, 2011). O contato com a família, com instituições de atendimento à saúde, com a Escola e a Universidade, vem se caracterizando como elo-chave de um trabalho que procura se estender para além dos muros da escola. Este pequeno texto aborda questões pertinentes de um processo de inclusão escolar tardia de um jovem de 17 anos ainda em alfabetização. Com o objetivo de procurar entender melhor quais as implicações da medicação precoce, do contexto econômico desfavorável e da

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mediação escolar na vida de um jovem Paduano que chamaremos de Drico, nome fictício utilizado para manter sua identidade em sigilo, este texto desdobra-se de um ano e meio de trabalho dos Bolsistas do Pibid com o jovem numa escola pública de ensino fundamental. Partimos para campo numa perspectiva de ''inserção ecológica'' (BRONFENBRENNER, 2011), atuando conjuntamente com uma vasta rede de apoio intersetorial (RODRIGUES et al, 2011). Foi por meio dela, que podemos dar potência ao nosso trabalho cotidiano.

Entendemos a prática docente como indissociável da sua necessária reflexão crítica, caracterizada num movimento dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer, um dos requisitos básicos para todo educador que deseja provocar em seus educandos o ''pensar certo''. ''Pensar certo'', aqui utilizando um termo de Paulo Freire, envolve a constante pesquisa, requer respeito aos saberes dos educandos, rejeição a qualquer forma de discriminação, criticidade e o movimento dinâmico entre o fazer e o pensar sobre o fazer (FREIRE, 1996). A educação aqui entendida se estende para a vida, não fica restrita a uma noção mercadológica, somente para a entrada de pessoas no mercado de trabalho, tal como os instrumentos de poder tentam a todo o custo naturalizar. A educação, não pode ser usada como instrumento de alienação hegemônico, mas como um ato de libertação, novamente recorrendo a Freire (1996). A educação que aqui deseja e se tenta a todo o custo por em prática, é aquela que não tem nenhum propósito de governabilidade, tal como aconteceu historicamente transferindo-se este poder da igreja para os interesses do capital (CERTEAU, 1998).

É partindo desta premissa crítica e humanista da prática, que o grupo vem dando corpo a produções científicas próprias e, com isso, contribuindo para a disseminação de conhecimentos produzidos no ''chão da escola'' numa região que tem ainda muito por pesquisar. A necessária entrada de estudantes de licenciatura em ambiente escolar permite conhecer bem cedo as contradições desse espaço, seus acertos e seus desafios a enfrentar a partir de sua manifestação cotidiana.

Metodologia

Utilizamos um diário de campo para que pudéssemos registrar nosso processo de trabalho com o aluno que chamaremos de Drico, nome fictício utilizado para preservar a sua identidade. Foi por meio de nosso diário de campo que podemos discutir e refletir a cerca do nosso cotidiano de trabalho e rever seus avanços e contradições no processo de inclusão escolar, bem como suas metodologias de trabalho e avaliação. Partimos para campo numa

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perspectiva de ''inserção ecológica'' (BRONFENBRENNER, 2011), tendo como foco principal nosso local de atuação, a sala de aula onde Drico está inserido e, também, sua escola. Sendo assim, utilizamos esta metodologia de pesquisa com responsabilidade e ética, uma vez que passamos a integrar o cotidiano das pessoas envolvidas no processo de execução da pesquisa. Apesar de focarmos muito na sala de aula e na escola onde Drico está inserido, não deixamos de dialogar constantemente com o contexto externo à escola, com à Universidade, com à família, ou seja, com nossas redes de apoio intersetorial (RODRIGUES et al, 2011). Por meio dessas redes de apoio, tivemos contato com vasto arquivo de tratamento de Drico, bem como o processo que se arrasta no Ministério Público Federal.

Valorizando nosso campo de iniciação à docência e, claro, tendo em vista que toda docência envolve, ou pelo menos deveria envolver, a pesquisa científica, a reflexão crítica sobre o fazer docente, partimos do pressuposto do dialogo constante com uma vasta rede de apoio, buscando potencializar diferentes aspectos do nosso trabalho, como as estratégias de inclusão escolar, de metodologias de trabalho e de uma avaliação diferenciada.

Apresentando Drico

Para a presente pesquisa, numa destas manifestações, focalizamos num aluno especificamente, Drico, nome fictício utilizado para manter sua identidade em sigilo. Drico é um garoto que possui seus 17 anos de idade, nascido em Santo Antônio de Pádua, município localizado na Região Noroeste do Estado do Rio de Janeiro. Filho de pais separados, Drico vive com sua mãe, que chamaremos de Rose, dois irmãos, que chamaremos de Gabriel e Vitória, e seu padrasto, que chamaremos de Chico. Residem numa casa do patrão de Chico, de acesso não muito fácil, feito por meio de estrada de terra, sem iluminação pública, com residência sem mesmo saneamento básico. O contexto social de vida de Drico está longe de ser o ideal. Sem sombra de dúvidas, há implicações neste fator em sua trajetória de vida.

Drico é um jovem acima do peso, excessivamente medicado e bastante faltoso. Seu histórico de faltas, conforme constatado com uma de nossas redes de apoio, a APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) onde Drico faz tratamento desde 2002, é grande e se estende não somente à escola, mas também aos tratamentos que faz na Instituição. Percebemos que Drico, em todas as escolas que frequentou possuía pouca assiduidade. Quando ia até à escola, nas palavras da psicóloga que chamaremos de Lucí, para preservar sua identidade, ''rabiscava o dever dos colegas'', era ''hiperativo'' e ''agressivo''. Além disso, Drico

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''não conversava com ninguém''. Mais tarde, descobriu-se que Drico tinha Dislalia, uma dificuldade na fala. A agitação de Drico, seu comportamento ''muito agressivo'' e o fato de ''não gostar de ser contrariado'' fez com que o menino fosse rotulado e medicado desde novo. Sem mesmo haver diagnóstico preciso, somente um texto de um psiquiatra relatando ''hiperatividade e distúrbio de conduta'', conforme constatado em eu histórico de atendimento na Instituição APAE, o mesmo encontrado no CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), Drico desde pequeno passou a receber forte medicação, a ponto de Lucí citá-las como sendo em ''doses cavalares''. Com o tempo, após inúmeras viagens para a capital, Rio de Janeiro, em busca de um diagnóstico preciso, as medicações só foram aumentando. Hoje, Drico toma 15 comprimidos por dia, de medicação forte e diversa, além de uma dose única injetável mensal. Todo este excesso de medicação resulta em aumento excessivo de peso, facilmente percebível, muita sonolência e alguns cortes na boca e nos lábios.

Alunos como Drico, que nas palavras de Lucí fora caracterizado como quem ''rabiscava o dever dos colegas'', ''hiperativo'' e ''agressivo'', foge completamente do padrão normatização do sistema educacional. Por apresentar no cotidiano escolar problemas relacionados a comportamentos ''inadequados'' e dificuldades na aprendizagem dos conteúdos aplicados, foi rapidamente normatizado por vias de medicação, num espaço que, muitas vezes, rejeita singularidades produzindo ''subjetividades em série'' (GALLO, 2007, p.289). Com isso, silencia-se a possibilidade de escuta, do diálogo enquanto encontro com possibilidades. Percebendo-as enquanto uma brecha de ação, o subprojeto Educação e Saúde do Programa Institucional de Iniciação à Docência (PIBID) da Coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES) da Universidade Federal Fluminense (UFF), acolheu o caso de Drico na expectativa de iniciar um trabalho diferenciado.

Acolhimento de Drico na Escola

Drico ingressou na Escola Municipalizada Deputado Armindo Marcílio Doutel de Andrade (EMDAMDA) no início do ano de 2014, numa turma de primeiro ano, hoje segundo ano. A média de idade da turma era de 6 a 7 anos, Drico, no entanto, já tinha 16. Como conciliar tamanha disparidade de idade e trajetória escolar promovendo, ao mesmo tempo, inclusão e aprendizado? Em verdade, a entrada de Drico na escola foi, de fato, um desafio que enfrentamos. Drico não queria estudar a noite, numa turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Além disso, sua família achava perigoso que o jovem se locomovesse até à escola num

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período noturno. Havia um grande receio por parte comunidade escolar em colocar Drico numa turma de pessoas mais jovens, com quase a mesma faixa etária, na parte da manhã, pois além da diferença de conteúdos haveria, acreditava-se, certo preconceito dos mais jovens. Por conta disso, e levando-se em conta que a turma de primeiro ano haveria de estar num nível escolar próximo ao de Drico que, a época, não escrevia sequer seu nome ou sabia identificar as vogais, acreditava-se ser melhor inclui-lo, apesar de todas as contradições, numa turma de primeiro ano.

Nas primeiras entradas na escola, nos primeiros contatos com Drico, fomos com a inciativa do acolhimento, num processo que nada mais é do que um momento de necessária abertura ao outro e de sensibilização da comunidade escolar. Não existe uma formação para o acolhimento, senão uma iniciativa conjunta de abertura, de um contato que reconheça enquanto legítima as especificidades desse novo aluno, tal como nos atenta Carlos Skliar (2006). A escola deve abrir-se de maneira acolhedora para aqueles considerados ''diferentes'' e foi esse nosso primeiro passo no momento de inserção e convívio em sala de aula, investindo no diálogo e numa perspectiva bastante acolhedora em todo o processo do iniciar à docência com Drico.

Foi por meio dessa abertura afetuosa que Drico foi acolhido na escola. Um novo aluno requer uma nova escola, tal como nos aponta Machado (2013), e foi o que propomos. Essa maneira do acolhimento contribui para a mudança de postura, de visão e entendimento em relação as diferenças. Essas multiplicidades de diferenças existem, apesar de muitas serem constantemente negadas diante da força da hegemonia dominante. Para não cairmos nesta armadilha, Carlos Skliar (2006) nos atenta que devemos olhar para as diferenças enquanto um movimento. Por esse outro olhar, Sckliar nos diz que as diferenças não estão relacionadas a dois pontos que se diferenciam. Na verdade, a diferença está num entremeio, como o imprevisível que nos faz pensar no devir, nos remete ao acontecimento, não carregando uma ideia de oposição. A diferença não é uma distinção ou uma oposição, mas um mo vimento que se refere à alteridade, a uma heterogeneidade que não é, em princípio, oposicional. (SKLIAR, 2006). Podemos pensar através da contribuição de Sckliar, que a diferença, por meio do conceito que aqui se entende, carrega a ideia de uma escola inclusiva, pois não anula as diferenças, não transforma pessoas num padrão de ''normalidade'', mas sim, promove uma noção de alteridade diante do movimento de diferir.

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Os resultados, as contradições e as dificuldades

As contradições do trabalho com Drico são bastante visíveis. Não foi e não é nada fácil todo esse processo. A começar, Drico foi acolhido numa turma de primeiro ano, hoje segundo ano, de média etária de 7 anos de idade. Drico, no entanto, possuia seus 16, hoje seus 17. Por vezes, principalmente no início de sua chegada à escola. Percebemos certo desconforto em permanecer em sala de aula com crianças. Com o passar do tempo, no entanto, com atividades que levavam em conta a sua faixa etária e o diálogo entre seu contexto de vida, Drico permanecia em sala de aula e demonstrava bastante interesse pelo que era proposto.

Nos primeiros meses de trabalho com Drico, o jovem pouco faltava. Mostrava-se assíduo nas aulas com as atividades propostas, apesar de demonstrar sonolência quase todos os dias, devido a forte medicação que ainda toma. Com os meses, no entanto, Drico começou a frequentar com menos frequência. Nestes casos, acionamos nossa rede de apoio intersetorial (RODRIGUES et al, 2011), a família de Drico. Por este motivo, 2 bolsistas foram até sua residência verificar os motivos das faltas. Percebemos que as faltas são constantes quando seus irmãos, Gabriel e Vitória, também deixam de ir à escola. O mesmo acontece quando Gabriel e Vitória faltam a terapia feita com psicólogos do CAPS. Segundo informações da instituição, Gabriel e Vitória fazem terapia mas pouco frequentam. A mãe, Rose, já teve depressão, sendo medicada por conta disso, já frequentou terapia e psiquiatras diversos. No entanto, como os filhos, Rose não frequenta as seções. Talvez, essa relação faltosa estabelecida pelos irmãos em relação à escola e da mãe e irmãos com as instituições de apoio que frequentam, seja um fator importante e de entendimento dos motivos de faltas de Drico. Por conta da não assiduidade, uma escola anterior onde Drico estudava teve de notificar o Conselho Tutelar, pois existiam faltas acima de 50% do percentual permitido em lei, conforme o Artigo 12, Inciso VIII da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL, 2014). Após este contato com o Conselho Tutelar, os problemas de faltas não foram resolvidos. Além disso, Drico continuara a não frequentar os tratamentos que fazia o que resultou num processo no Ministério Público Federal que se arrasta desde 2008, um Pedido de Aplicação de Medidas Preventivas, artigo 147 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 2015). Vez ou outra, funcionários da APAE e do CAPS, além de funcionários de escolas de onde já frequentou, são intimados a ir até o Fórum da cidade de Santo Antônio de Pádua para que aconteça um acompanhamento do caso de Drico. Medidas

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como o tratamento dos dentes, bastante deteriorados, frequência escolar e questões socioeconômicas foram sendo tomadas, no entanto, poucas delas se refletiram em realidade.

Todo o histórico de frequência de Drico nas escolas por onde passou, demonstram muita falta, pouca assiduidade. Nunca havia acontecido uma maneira de recebê-lo que se compreendessem suas dificuldades, sua maneira de relacionar-se com a escola e as tarefas em sala de aula. Se fôssemos olhar para sua história escolar como determinação do que viria a ser seu novo ingresso, diríamos que Drico não prosseguiria nos estudos. No entanto, olhamos para o caso de Drico como um encontro com a possibilidade. Olhamos para Drico, sua história, como possibilidade e não como determinação, já que o mundo não é, ele está sendo (Freire, 1996, p.30).

O fato de acreditarmos no nosso trabalho com Drico possibilitou o andamento de um trabalho que, quem observa de fora, diria ser impossível. Nas instituições de apoio onde estivemos poucos acreditaram numa possibilidade de Drico prosseguir nos estudos. Nós, ao contrário, apesar de todas as questões pertencentes as faltas constantes, continuamos com o olhar atento e voltado para o prosseguimento de Drico nos estudos. Apesar de fazer tudo ao alcance para que encontros aconteçam, por vezes, percebemos que o encontro com a possibilidade é um encontro com o acaso. Não sabemos quando iremos conseguir, de fato, com que Drico passe a ser assíduo nas aulas. Neste ano, 2015, Drico tem faltado bastante. Dialogamos constantemente com nossas redes de apoio no sentido de entender melhor os motivos de suas faltas, são motivos diversos, acreditamos. É preciso levar em conta, que Drico vive num ''outro mundo'', acostumado com andar livremente, de maneira bastante autônoma, pelas ruas da cidade onde mora.

Conclusão

O trabalho com Drico foi-nos, desde o início, um desafio. Drico é um caso de linha de fuga. Num sistema forte, que cria aparelhos de hegemonia, Drico não se enquadrou no padrão de normalidade imposto, nem mesmo por vias de medicação. Acostumado a subverter as lógicas do sistema, quanto mais suas condições de vida e a lógica hegemônica o oprimem, mais meios para escapar ele constrói, como rotas silenciosas de fuga (CERTEAU, 1998). As rotas construídas por Drico transformaram-no num caso particular e complexo, mas ainda assim, possível. Seu contexto de vida difícil, o fato de ser excessivamente medicado precocemente sem mesmo haver qualquer diagnóstico que seja, pouca fonte de renda

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familiar, falta de assiduidade familiar e intervenção sobre assuntos relacionados a sua vida escolar, influenciaram diretamente para a atual complexidade de intervenção em sua vida. O jovem construiu ao longo de seu percurso de vida, um mundo seu que lhe é próprio e, para intervir neste seu mundo, não é tarefa nada fácil. Em casos como o de Drico, uma intervenção precoce é fundamental. Iniciamos o trabalho com Drico quando o mesmo já tinha seus 16 anos de idade, um percurso de vida todo já construído. Apesar de todas as contradições do nosso trabalho com Drico, procuramos burlá-las e intervir de maneira eficaz em seu caso. Mesmo inserido numa turma de primeiro ano e, hoje, numa se segundo ano, com alunos de media de idade de 7 anos, nosso trabalho rendeu frutos que percebemos. Procuramos trabalhar com questões que ultrapassavam os muros da escola. Questões de higiene foram muito importantes. Escovação dentária, lavar as mãos antes das refeições, depois de ir ao banheiro, entre outras questões. Cuidar melhor de si foi muito trabalhado com Drico. Temos em mente que Drico tem hoje 17 anos de idade, prestes a completar seus 18. Logo, não terá mais o amparo do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O quanto antes trabalharmos questões que envolvam uma maior autonomia, melhor. Foi esse um dos pilares do nosso trabalho.

REFERÊNCIAS:

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necessidades educativas especiais. Brasília: MAS/CORDE, 1994.

BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, versão atualizada, 2014.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, versão atualizada, 2015. BRONFENBRENNER, Urie. Bioecologia do Desenvolvimento: tornando os seres humanos mais humanos. Porto Alegre, Artmed, 2011.

CERTEAU, M. de. A invenção do cotidiano. Rio de Janeiro: Vozes, 1998.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GALLO, S. Em torno de uma educação voltada à singularidade: entre Nietzsche e Deleuze. Rio de Janeiro. Editora Forense Universitária, 2007.

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MACHADO, A. M. Uma nova criança exige uma nova escola: a criação do novo na luta micropolítica.. Novas Capturas, antigos diagnósticos na era dos transtornos.

1ed.Campinas,: Mercado das Letras, 2013, v. 1, p. 191-202.

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RODRIGUES, M. G. A. ; GOLDENZWEIG, R.E. ; SANTOS, L. C. S. ; LEMOS, M. R. . Educação Inclusiva e Redes de Apoio: acolhimento às famílias na escola. In: X Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional: caminhos trilhados, caminhos a percorrer, 2011, Maringá. Anais do X Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional: caminhos trilhados, caminhos a percorrer. Maringá: UEM, 2011. v. 1. p. 1-14.

SKLIAR, C.. A inclusão que é ''nossa'' e a diferença que é do ''outro''. Inclusão e Educação: Doze olhares sobre a educação inclusiva. São Paulo: Summus, 2006, p.16-34.

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