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ANÁLISE ESPACIAL DO VOTO: UMA CONTRIBUIÇÃO DA CARTOGRAFIA 1

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ANÁLISE

ESPACIAL

DO

VOTO:

UMA CONTRIBUIÇÃO DA

C

ARTOGRAFIA1

BRUNO MAGNUM PEREIRA

Mestrando do Programa de Pesquisa e Pós-graduação em Geografia da UFG E-mail: magnum.geografia@gmail.com

RESUMO

A Geografia Eleitoral nasce na França com o geógrafo Siegfried no início do século XX, o que não garantiu uma continuidade da disciplina geográfica nos estudos que abrangem os sistemas eleitorais e seus resultados. A Geografia negligenciou tais estudos durante décadas, porém na atualidade o interesse pela espacialização dos votos tem crescido e a necessidade de se reinserir o espaço na análise é eminente. Para isso apresentamos o território como espaço político, onde atores disputam o poder com o objetivo de exercer o controle sobre ele e organizá-lo. As eleições são consideradas assim, palco para tal disputa, onde os candidatos e partidos escolhem suas estratégias para obtenção de votos que serão convertidos em mandatos. Apresentamos ainda os sistemas eleitorais e os efeitos do espaço sobre o comportamento eleitoral. A cartografia é abordada como um dos processos indispensáveis para a efetiva compreensão da distribuição espacial das escolhas dos eleitores. Tudo isso nos levou a considerar que o espaço e o território são um elemento importante para análise e compreensão que busca a Geografia Eleitoral.

PALAVRAS-CHAVES: Geografia Eleitoral, Voto, Território, Cartografia. INTRODUÇÃO

A Geografia Eleitoral nasce no início do século XX na França pelas mãos de um geógrafo. No entanto, isso não foi suficiente para que a ciência geográfica desprendesse toda a atenção merecida à analise espacial do voto, pois, como veremos, mesmo que não tenha sido esquecida totalmente, a Geografia negligenciou esse campo de conhecimento o que levou à Ciência Política se sobressair nos estudos eleitorais.

Um século após a publicação do primeiro trabalho que relacionava o voto à dimensão espacial o interesse pelo assunto parece ter uma ligeira renovação na Geografia. Assim, apresentamos algumas considerações sobre a necessidade de o espaço aparecer nas análises das eleições, sobre tudo nas que analisam o comportamento eleitoral.

Por conseguinte, o objetivo geral deste artigo foi analisar as formas de contribuição que a ciência geográfica pode oferecer aos estudos eleitorais, especificamente a ação de uma

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cartografia que seja capaz de oferecer elementos representativos para a leitura de tendências eleitorais consoantes à sua ligação com o controle do território. Para tanto, consideramos importante discutir como o território se insere nas análises da geografia eleitoral; apresentar algumas ideias que já norteiam os estudos geográficos sobre o assunto e; por fim, compreender o papel da cartografia como meio de representação dos votos no território.

Assim, realizamos uma breve discussão sobre a categoria território, onde este é posto como espaço político, onde atores disputam o poder com o objetivo de exercer o controle sobre ele e organizá-lo da forma que julguem necessário para atender seus interesses. O território então é concebido a partir das relações de poder no espaço.

Na tentativa de melhor explicar o papel do território nas análises eleitorais, fez-se necessário uma abordagem dos sistemas eleitorais como mecanismo de transformação de voto em um mandato político que se dá em um espaço. Abordaram-se os tipos de sistemas majoritários e proporcionais, dos quais são utilizados para eleições do executivo e do legislativo, respectivamente. Posteriormente apresentamos como o espaço tem a capacidade de afetar o comportamento eleitoral, tentando não cair na armadilha do determinismo geográfico. Assim, consideramos que o espaço, além de influenciar, é também essencial para ajudar a explicar o resultado das eleições quando correlacionados com diversas outras variáveis. A cartografia também é abordada, pois é um processo que consideramos indispensável para a efetiva compreensão dos fenômenos eleitorais estudados pela Geografia. Apresentamos esta como uma forma de poder e não deve simplesmente mostrar onde ocorreu o fenômeno, mas sim responder a perguntas mais elaboradas.

AGEOGRAFIA ELEITORAL

A Geografia Eleitoral tem sua origem na França em 1913 com a publicação, pelo geógrafo francês André Siegfried, de um trabalho que analisava a espacialização do voto na França durante a 3ª República2. Em sua análise, relacionava o tipo de solo na França com a

orientação política dos eleitores. Para Zanfolin (2006), Siegfried com a utilização da cartografia temática preocupou em explicar os distintos resultados eleitorais. Outro Geógrafo pioneiro nos estudos da geografia eleitoral foi Sauer, americano que fundou a escola americana de geografia eleitoral em 1918 (ZANFOLIN, 2006; TOLEDO Jr, 2007).

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A metodologia de Siegfried e de seus discípulos orientou estudos de posteriores gerações de geógrafos e sociólogos franceses e que também viria influenciar os trabalhos da geografia eleitoral brasileira. Já nos Estados Unidos, a partir da década de 1940 com o desenvolvimento da Geografia quantitativa, as análises tomam rumos mais fundamentados em métodos estatísticos espaciais do que cartográficos (TERRON, 2012).

Terron (2012) faz um levantamento das discussões sobre a Geografia Eleitoral durante o século e demonstra que esta área de estudos nunca foi totalmente abandonada e que importantes cientistas trabalharam para seu desenvolvimento teórico.

Hoje, quase um século após a publicação do clássico, temos grandes avanços na qualidade e disponibilidade dos dados eleitorais – sobretudo no Brasil com a informatização das eleições – e um avanço teórico-conceitual que pode contribuir muito para o entendimento dos dados espacializados.

Apesar de a Geografia eleitoral ter como fundador um geógrafo, podemos dizer que a ciência Geográfica negligenciou a análise da espacialização dos votos durante décadas. Deste modo, as Ciências Políticas abarcaram estes estudos produzindo a maior parte da bibliografia sobre o assunto. Atualmente há um crescente interesse pela Geografia do Voto no Brasil pelas diversas ciências sociais. Na Geografia podemos destacar o trabalho de Castro (2011) que trata da Geografia Eleitoral na perspectiva dos sistemas eleitorais e do comportamento eleitoral.

Entendemos que esta é uma matéria interdisciplinar que existem importantes trabalhos não geográficos que consideraremos importantes para a tentativa de identificar as contribuições da Geografia para esta análise.

Como dito anteriormente, o interesse pela Geografia Eleitoral vem crescendo e não poderia ser diferente na ciência geográfica. Além do interesse também nota-se um entendimento da necessidade de se incorporar as questões do espaço nas análises eleitorais. Toledo Jr. (2007) enfatiza que o espaço, o lugar e o território usado são dimensões conceituais e teóricas que necessitam ser incorporadas pela análise e discussão políticas. Já Terron (2012) coloca que em outros países já vem ocorrendo a reinserção do espaço como categoria analítica nos estudos sociopolíticos.

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Essa utilização do espaço nas análises eleitorais corrobora com as contribuições de Castro (2011, p.144) ao defender a incorporação do “espaço como variável explicativa necessária à compreensão das escolhas dos sistemas eleitorais e dos seus resultados”.

Nosso objetivo é apresentar as contribuições que a Geografia, no campo da Geografia Política, pode oferecer à análise espacial das eleições. Para isso, utilizaremos o Território para compreender a espacialização e a realidade do voto no Brasil. Para tanto, não temos a pretensão de aprofundar na discussão do conceito de Território, porém, pretendemos apresentar as concepções trabalhadas na Geografia Política que mais contribui para a análise espacial do voto.

ACARTOGRAFIADADISPUTAPELOPODER- O TERRITÓRIO EM QUESTÃO

Na Geografia Política tradicional o território surge como o espaço concreto apropriado por um grupo social, e tal grupo criaria raízes e identidades e não seria mais compreendido sem este, pois sua identidade sócio-cultural estaria ligada aos atributos do espaço concreto (SOUZA, 2009). Esse território, segundo o autor, está associado ao recorte do território nacional, ou seja, do Estado-Nação, estando evidentemente no campo de um discurso ideológico. Para Castro (2011), o território, pensado no âmbito da Geografia Política de Ratzel, é constituído por meio do vínculo entre o Estado e o Solo, construído por uma sociedade através da sua história.

Podemos notar que a Geografia Política sempre teve o território como um de seus principais elemento para análises políticas. Isso, mesmo com um conceito rígido de território que se referia ao solo do Estado-nação, ou seja, algo concreto e não como coloca Souza (2009, p.87) quando afirma que “territórios, são no fundo antes relações sociais projetadas no espaço que espaços concretos” (grifo do autor).

A noção de que o território é “um espaço definido e delimitado por e a partir de relação de poder” (SOUZA, 2009) leva a pensar que este não é restrito apenas à escala nacional e associado ao Estado. Para o mesmo autor,

Territórios existem e são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas escalas, da mais acanhada à internacional; territórios são construídos (e desconstruídos) dentre de escalas temporais as mais diferentes: séculos, décadas, anos, meses ou dias; territórios podem ter um caráter permanente, mas também podem ter uma existência periódica, cíclica. (p.81)

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O território, dessa maneira, pode ser percebido em diferentes escalas desde as pequenas como o controle do tráfico de drogas nos bairros e que pode ter duração curta, até as escalas internacionais e de longa duração.

Um autor que discute esta categoria é Raffestin (1993). Para ele o território é uma produção que parte do espaço, ou seja, para o autor o território é posterior ao espaço. Este último seria um dado a priori, como uma matéria-prima que através do trabalho e das relações de poder passaria produzir o território. Estas considerações geraram algumas críticas à Raffestin (1993) no sentido de reduzir o espaço ao espaço natural e colocar o território como substrato, ou espaço social, e não como um campo de forças (SOUZA, 2009). Haesbaert (2010) concorda com tais críticas e afirma que Raffestin se confunde ao alegar que Lefebvre partilha dessa passagem do espaço para o território. Para ele, Lefebvre não coloca o espaço como a priori e sim como socialmente produzido. O território é concebido por Haesbaert (2004) a partir da imbricação de múltiplas relações de poder.

Entretanto, as contribuições de Raffestin (1993, p.60) são relevantes no tocante a considerar o “território com espaço político por excelência”. Para Souza (2003) o território não é mais entendido apenas como limite político administrativo, mas também como espaço efetivamente usado pela sociedade e pelas empresas.

Para Santos e Silveira (2008) a palavra território é um nome político para o espaço de um país. O espaço territorial seria então o espaço, o Estado e uma ou mais nações. Para estes autores o que devemos levar em consideração ao analisarmos uma parte do território é, então, o

território usado, uma categoria que considera “a interdependência e a inseparabilidade entre a

materialidade, que inclui a natureza, e o uso, que inclui a ação humana, isto é, o trabalho e a política” (SANTOS e SILVEIRA, 2008, p. 247). O que os autores colocam é que o território é assim sinônimo de espaço geográfico e esse território pode ser definido pelo seu uso. Portanto, o território é resultado de processos históricos.

O que podemos notar é que o território deixa de ser apenas uma expressão vinculada ao território nacional e passa a ser concebido a partir das relações de poder no espaço, partindo de diferentes escalas e em diferentes contextos. Com isso podemos levar em conta o poder almejado por sujeitos – ou melhor, grupos representados por um sujeito – em campanhas eleitorais, por exemplo.

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Baseada nas contribuições de Milton Santos, Zanfolin (2006, p.12) afirma que “as instituições – junto com os objetos, as empresas e as pessoas – participam da constituição do território usado e competem entre si para usá-lo”. Deste modo, podemos considerar que os partidos políticos e os candidatos eleitorais têm em suas campanhas o instrumento de disputa pelo território. Segundo Castro (2011) é importante saber como esse interesse pelo território resulta em estratégias para obtenção de respostas positivas nas eleições.

O espaço é relevante, portanto, na escolha do sistema eleitoral. Nesse sentido, Castro (2011) afirma que para a Geografia Eleitoral é importante entender “os sistemas eleitorais como processos de transformação de voto em voz [...]”. Para Tavares (1994), os sistemas eleitorais são construções institucionais políticas e estrategicamente concebidas, e tecnicamente realizadas, para viabilizar e sancionar a representação política em regimes políticos. Em outras palavras, é o mecanismo que converte o voto em um mandato político. É necessário analisar as condições existentes no espaço de vida, de interesses, de produção e de circulação das sociedades para compreender os conceitos e práticas dos sistemas eleitorais, da representação política e da democracia (CASTRO, 2011). Desta forma, existem dois tipos de sistemas eleitorais, o majoritário e o proporcional, e um terceiro que resulta da utilização de formas dos dois, este é denominado misto.

Os sistemas majoritários se baseiam pelo fato de o território ser caracterizado como circunscrição, colégio ou distrito eleitoral, sendo eleito o partido ou os candidatos que obtiverem os maiores números de votos. No caso do Brasil este modelo de sistema eleitoral é utilizado na eleição de prefeitos, governadores, senadores da república e para eleger o presidente da república.

O sistema eleitoral proporcional é utilizado no Brasil para escolha do legislativo. O pressuposto fundamental de legitimação do sistema, segundo Barroso (2006), é a ideia de que o Parlamento deve refletir a pluralidade que caracteriza o meio social. Para isso, o sistema proporcional leva em conta que a participação do partido no governo é proporcional ao número de eleitores. Essa proporcionalidade é assegurada a partir do coeficiente eleitoral3 que

determinará a quantidade de deputados cada partido ou coligação elegerá.

3 "Determina-se o quociente eleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher

em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior" (Código Eleitoral, art. 106).

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Existem ainda os sistemas mistos que combinam procedimentos dos dois outros sistemas, formando assim um novo sistema único e complexo.

Alguns estudos que envolvem as eleições no Brasil foram revisados e classificados por Deus (2002) de acordo com o recorte escolhido: estudos que analisam o comportamento eleitoral para eleições majoritárias e estudos que privilegia as eleições proporcionais. Em seu trabalho, o autor constata que no Brasil os estudos da distribuição espacial do voto concentram-se nas regiões sudeste e sul, ficando as outras regiões em total prejuízo.

Para a Geografia Eleitoral é importante entender que “cada formula adotada só pode ser compreendida no quadro dos interesses de base territorial e dos conflitos do poder inerente ao corpo político de cada sociedade” (CASTRO, 2011, p.153). Isso porque, segunda a mesma autora, “em toda disputa política há interesses que estão vinculados aos territórios em que os atores sociais habitam, trabalham, produzem riqueza e lutam para se apropriar de parte dela” (p.140).

As eleições são dotadas de complexos conceitos que, em uma sociedade democrática, têm o objetivo de transformar o voto de cada eleitor em uma voz da sociedade como um todo. Entretanto, o voto não é distribuído homogeneamente no território. Assim, tanto a forma como se transforma o voto em um mandato, ou seja, o sistema eleitoral, quanto a distribuição territorial deles são influenciados pelo espaço, pois estas são formas de disputa pelo poder no território.

A partir do processo eleitoral os candidatos recebem votos que são espacialmente distribuídos no território. Esta distribuição pode ser concentrada ou dispersa, isso vai depender de sua influência e da diversidade territorial do estado ou país onde ocorrem as eleições.

O estudo do comportamento eleitoral na geografia tem como objetivo principal a explicação dos resultados das eleições como consequência da racionalidade do eleitor, das suas condições de vida e do sistema eleitoral em vigor (CASTRO, 2011). Para isso, os resultados devem ser correlacionados com diferentes aspectos sociais, econômicos, culturais, políticos etc.

Para a mesma autora,

A geografia eleitoral contribui, em particular, para dar visibilidade aos marcos espaciais daqueles fatores, ou condições, que afetam o voto e os resultados das eleições. Neste sentido, tanto os sistemas eleitorais como os resultados

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das eleições podem ser analisados através do que apontamos com razões espaciais (CASTRO, 2011, p.159).

Segundo Castro (2011, p.161), o espaço pode afetar o comportamento eleitoral partindo de efeitos como: votos “dos amigos e vizinhos, que faz com que o candidato obtenha mais votos no lugar de nascimento ou de residência” ou “identidades religiosas ou étnicas”; a “proteção local” define os votos de acordo com temas interessantes para determinados territórios; os efeitos da “campanha eleitoral” dependem das estratégias dos partidos e candidatos e; o “efeito vizinhança” explica a concentração de votos em áreas mais homogêneas onde são mais fortes em seus bastidores e há segmentos sociais dominantes, como classes trabalhadoras, etnias ou elites para citar exemplos.

A Cartografia tem fundamental importância na Geografia Eleitoral, pois esta tem a função de representar a realidade espacial dos votos a partir dos mapas. A presença destes na análise do voto é marcada já no trabalho de Siegfried, que como já destacamos, elaborou a primeira obra que analisa o voto partindo da perspectiva geográfica. O mapa de Siegfried aqui reproduzido mostra a predominância da esquerda ou direita no departamento de Vendée nas eleições parlamentares de 1906 na França (Figura 1).

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Figura 1 - Mapa político do departamento de Vendée eleições parlamentares de 1906. Fonte: Siegfried (1995, p.34)

Para os estudos eleitorais, além da distribuição espacial dos votos, os mapas devem conter ainda uma relação com outras variáveis importantes, como indicadores econômicos, sociais, étnicos, educacionais etc., a fim de enriquecer, ou mesmo, tornar válida à análise geográfica dos resultados eleitorais. Assim, a cartografia se apresenta como indispensável para uma abordagem que contribua efetivamente para a compreensão dos efeitos do espaço sobre as escolha dos eleitores.

Dessa forma entendemos a Cartografia não apenas como uma forma simples representação do mundo, mas também, como um instrumento que oferece ao mapeador (com toda sua subjetividade e intencionalidade) e ao leitor uma forma eficaz de conhecimento e controle do território. Pois como afirma Martinelli (2003, p.26), não é suficiente que “os mapas respondam apenas à pergunta ‘onde fica? ’. Hoje, eles precisam responder também a outras perguntas com ‘por que?’, ‘quando?’, ‘por quem?’, ‘para que finalidade?’ e ‘para quem?’” .

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Hoje, o que podemos observar é que a Cartografia evoluiu tanto no tocante aos conhecimentos técnicos como no que se refere aos conceitos, diversificando-se em múltiplas cartografias.

No entanto, devemos levar em conta o papel exercido por ela na elaboração dos mapas que representam o território atualmente, considerando ainda as intencionalidades do mapeador, pois segundo Harley (2009) os mapas nunca são imagens desprovidas de juízos de valor. O autor coloca a Cartografia como “uma forma de conhecimento e uma forma de poder”. Para Lacoste (2008, p. 23), “a confecção de uma carta implica num certo domínio político e matemático do espaço representado, e é um instrumento de poder sobre esse espaço e sobre as pessoas que ali vivem”. Os mapas são, portanto, formas de saber socialmente construído que estão atrelados ao poder (MARTINELLI, 2003).

Ora, trabalhar com a cartografia nas análises eleitorais torna-se um desafio para o geógrafo ou qualquer outro cientista social. Haja vista que o conhecimento produzido corre o risco de se tornar um instrumento de dominação sobre as parcelas da sociedade que não têm acesso aos mapas ou conhecimento para interpretá-los. É importante abordar essa preocupação, pois o intuito das análises espaciais do voto não é atender aos interesses políticos de candidatos e partidos, e sim de compreender, de forma científica os efeitos no/do espaço geográfico da/na escolha dos eleitores, identificando tendências políticas, ou até mesmo denunciando costumes arcaicos de domínio oligárquicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O que podemos concluir a partir das ideias expostas, é que a Geografia Eleitoral, apesar de ter sido “esquecida” pela ciência geográfica por décadas, tem no território uma categoria importante para análise e compreensão das suas diversas faces e componentes, que vão desde a escolha do sistema eleitoral, até a configuração territorial das decisões dos eleitores.

A Geografia política, enquanto campo da ciência geográfica, tem o papel de analisar e explicar as relações políticas que ocorrem no território e o organizam de acordo com interesses particulares ou coletivos.

O território, então, tem o papel de base para a sociedade, onde os indivíduos organizados lutam pelo seu controle, para poder usá-lo e organizá-lo de acordo com seus interesses e necessidades. Deste modo, as eleições se apresentam como campo de batalha

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para conquista do poder no território, por meio dos votos obtidos pelos candidatos. A análise da escolha do modelo de conversão de votos em mandatos, ou seja, o sistema eleitoral é também importante para evidenciar como se darão as disputas pelo território.

Por fim, a cartografia é tida como um importante processo para a eficaz compreensão do comportamento eleitoral. Devemos, no entanto, estarmos sempre cientes da necessidade de não utilizar os mapas apenas como ilustrações, mas sim relacionando a distribuição espacial do voto com variáveis diversas. Isso é necessário, pois, o mapa é um instrumento de poder que deve servir não aos interesses alheios à sociedade.

Esperamos com este trabalho contribuir para as discussões sobre o assunto de forma geográfica, resgatando suas essências e empenhando para que os resultados sejam frutíferos e colaborem para uma compreensão política e geográfica da sociedade.

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