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Relatório de estágio curricular no juízo central cível do tribunal da comarca de Lisboa

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RELATÓRIO DE ESTÁGIO CURRICULAR NO JUÍZO CENTRAL

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Relatório de estágio com vista à obtenção de grau de Mestre em direito

Orientadora:

Doutora Isabel Alexandre, Professora na Faculdade de direito da Universidade de Lisboa

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III

RELATÓRIO DE

ESTÁGIO

CURRICULAR NO

JUÍZO

CENTRAL

C

ÍVEL DO

T

RIBUNAL DA

C

OMARCA DE

L

ISBOA

AOBTENÇÃO DE PROVA TRANSFRONTEIRIÇA NO ESPAÇO COMUNITÁRIO

TIAGO MEIRELES TEIXEIRA LOPES

Relatório de estágio com vista à obtenção de grau de Mestre em direito Orientadora:

Doutora Isabel Alexandre, Professora na Faculdade de direito da Universidade de Lisboa

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IV

DECLARAÇÃODEANTIPLÁGIO

Declaro por minha honra que o trabalho apresentado é original e que todas as citações estão correctamente identificadas. Tenho consciência de que a utilização de elementos alheios não identificados constitui grave falta ética e disciplinar.

(5)

V

Não podia deixar de começar por agradecer aos meus pais e avós pelo apoio e auxílio incondicionais nesta etapa académica. Sem eles, tudo o que atingi era impossível. Foram e serão sempre a base de qualquer sucesso futuro.

À minha orientadora, Dra. Isabel Alexandre, pela disponibilidade, atenção e conhecimento que me transmitiu ao longo deste estudo. Pelos seus conselhos e comentários sábios, que permitiram o desenvolvimento crítico e criterioso deste trabalho.

À professora Dra. Maria Luísa Duarte pelo apoio e ajuda na elaboração da dissertação.

Ao Juiz Dr. Rui Oliveira pela oportunidade que me proporcionou de o acompanhar neste estágio no Juízo Central Cível de Lisboa. Pela disponibilidade, conselhos, paciência e ensinamentos que me transmitiu, o meu muito obrigado.

A todas as funcionárias do Juiz 11 do Juízo Central Cível de Lisboa pela simpatia e atenção dedicadas.

Por fim, mas não menos importante à Sara e India pela paciência, apoio e carinho em todos os momentos, e pela confiança inabalável que depositam em mim. A elas o meu profundo e maior agradecimento.

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VI

MODODE CITAREOUTRASCONVENÇÕES

i. O presente trabalho foi redigido ao abrigo do anterior acordo ortográfico. Exceptuam-se as citações dos autores que o tenham adoptado.

ii. A bibliografia indicada em nota de rodapé é apresentada de modo abreviado, da seguinte forma: APELIDO, nome de autor, título da obra, página.

iii. A bibliografia final está organizada alfabeticamente e da seguinte forma: APELIDO, nome de autor, título da obra, edição, local, editora, ano, ISBN. Nos artigos e documentos online será ainda indicado o local e data de acesso. iv. A lista de jurisprudência final será referenciada por tribunal, data de acórdão,

processo e partes ou relator.

v. Salvo indicação em contrário, a palavra “Regulamento” diz respeito ao Regulamento nº 1206/2001 de 28 de Maio de 2001.

(7)

VII

Ac. Acórdão

Al./als. Alínea / alíneas Art./art. Artigo / artigos

CC Código Civil

CE Comunidade Europeia

CEDH Convenção Europeia dos Direitos do Homem

Cfr. Conforme

CRP Constituição da República Portuguesa

CPC Código de processo civil

CVM Código dos Valores Mobiliários

DL Decreto-Lei

DUDH Declaração

I.e. Isto é

LOSJ Lei da Organização do Sistema Judiciário

Número

Op. cit. Obra citada

p./pp. Página/páginas

PE Parlamento Europeu

PEPEX Procedimento Extrajudicial Pré-Executivo

Proc. Processo

Reg. Regulamento

RLOSJ Regime Aplicável à Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais

RJCS Regime Jurídico do Contrato de Seguro

RJMS Regime Jurídico de Mediação de Seguros

STJ Supremo Tribunal de Justiça

TC Tribunal Constitucional

TCE Tratado da Comunidade Europeia

TFUE Tratado de Funcionamento da União Europeia

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VIII

TRE Tribunal da Relação de Évora

TRG Tribunal da Relação de Guimarães

TRL Tribunal da Relação de Lisboa

TRP Tribunal da Relação de Porto

UE União Europeia

Vide Ver

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IX

no Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa. Tive a oportunidade de acompanhar a prática quotidiana do Tribunal e contactar com diversos temas jurídicos, alguns dos quais relatarei neste trabalho.

Nesse âmbito, o acesso à prova é indispensável num processo judicial. Num mundo cada vez mais global e numa Comunidade Europa assente na livre circulação de pessoas e bens no espaço comunitário, é cada vez mais comum a necessidade de obtenção de prova existente noutro Estado-Membro. No espaço comunitário, o Regulamento nº 1206/2001 (CE) de 28 de Maio 2001, relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de provas em matéria civil ou comercial foi aprovado com a intenção de trazer simplicidade e rapidez ao sempre controverso procedimento de obtenção de prova transfronteiriça.

Por conseguinte, o presente estudo centra-se na análise o referido Regulamento, das vantagens e desafios que o mesmo apresenta, das inovações que introduz e das questões centrais que deixa por responder, que tanta importância tem em sede de cooperação judiciária comunitária e cuja aplicação é cada vez maior nos Tribunais Portugueses.

Palavras-Chave: Regulamento nº 1206/2001; Obtenção de prova transfronteiriça; Cooperação; Obtenção indirecta de prova; Obtenção directa de prova; Estado-Membro; Tribunal Requerente; Tribunal Requerido; Videoconferência

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X

Abstract: This report was prepared in the context of the curricular internship held in the Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa. I had the opportunity to observe the daily practice of the court, to contact with various legal issues, some of which I will report in this work.

In this context, access to proof is crucial in a judicial process. In an progressively global world and in a European community based on the free movement of people and goods, the need to taking of evidence in another Member State is becoming increasingly common. In the Community, Council Regulation (EC) Nº 1206/2001 of 28 May 2001 on cooperation between the courts of the Member States in the taking of evidence in civil or commercial matters was adopted with the purpose of bringing simplicity and speed to the always controversial procedure for the cross-border taking the evidence.

Therefore, the present study focuses on the analysis of the Council Regulation, the advantages and challenges it presents, the innovations and the central issues it has left unanswered, which is so important for judicial cooperation and the implementation of which is increasing in the Portuguese courts

Keywords: Council Regulation (EC) Nº 1206/2001; Cross-border taking of evidence; Cooperation; Request by the requesting court to the competent court; Direct taking of evidence; Member-State; Requesting Court; Requested Court; Videoconferencing

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11

INTRODUÇÃO

O mestrado em direito na área forense e arbitragem da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa oferece a possibilidade de realizar um estágio curricular no 3º Semestre em detrimento da redacção de uma tese tradicional. Sempre foi a minha opção. Devido à minha preferência pela área civil e processual civil, optei por realizar o estágio num Tribunal Judicial Cível, tendo sido colocado no Juízo Central Cível da Comarca de Lisboa. Assim, num primeiro momento irei descrever sucintamente as actividades realizadas no estágio curricular, bem como relatar alguns dos processos mais marcantes que acompanhei.

No entanto, o objecto principal deste estudo é a analise de um dos procedimentos práticos mais actuais nos tribunais nacionais: a obtenção de prova no estrangeiro. O crescente aumento da litigância internacional, intimamente relacionada com a livre circulação de pessoas e evolução tecnológica, fez com que seja cada vez mais comum a necessidade de obter prova existente no Espaço Comunitário. Sobre este tema trata o Reg. nº 1206/2001 (CE) de 28 de Maio de 2001.

Neste sentido, irei expor as vantagens e os desafios que este diploma comunitário apresenta. Analisarei criticamente as normas constantes no diploma e os regimes de obtenção de prova previstos, sustentado em jurisprudência nacional e europeia. Temas como, o recurso a medidas coercivas, a utilização de meios de comunicação à distância, a celeridade do procedimento e a sua obrigatoriedade, também serão alvo de analise neste trabalho. Por fim, a mais recente proposta de alteração do Reg nº 1206/2001, que ainda se encontra em fase de discussão, será igualmente tratada neste estudo.

Assim, o objectivo deste trabalho não é somente dar a conhecer detalhadamente este diploma comunitário, mas também identificar os desafios que decorrem da sua aplicação. É um diploma importante, com uma utilização cada vez mais comum nos tribunais portugueses e europeus, e como tal, o meu trabalho terá sempre em conta uma grande componente prática que decorre da experiencia que adquiri no estágio curricular que realizei.

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12

CAPÍTULO I-DO ESTÁGIO 1.1.BREVE ENQUADRAMENTO

Concluída a fase curricular do Mestrado, optei por realizar um estágio curricular no Tribunal Cível de Lisboa. Foi-me atribuído o Juiz Orientador Dr. Rui Oliveira, Juiz 11 do Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa.

De acordo com o art.º 81º nº 1 da LOSJ, os tribunais de comarca dividem-se em juízos centrais, com secções de competência especializada e juízos locais. Nos termos do nº 2 da citada norma, podem ser criadas as seguintes secções de competência especializada: Cível; Criminal; Instrução Criminal, Família e Menores, Trabalho, Comércio e Execução.

Na Comarca de Lisboa existem todas estas secções especializadas1, sendo que,

a competência do Tribunal em matéria cível é dividida consoante o valor da causa, entre juízos Centrais Cíveis e Juízos Locais Cíveis. Neste enquadramento, compete, essencialmente, ao Juízo Central Cível2:

i. Preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de processo comum de valor superior €50.000,00;

ii. Nas acções executivas cíveis de valor superior €50.000,00 exercer as competências previstas no CPC, em circunscrições não abrangidas pela competência de juízo ou tribunal;

iii. Preparação e julgamento dos procedimentos cautelares a que correspondam acções da sua competência; E,

iv. Exercer as demais competências conferidas por lei.

Para além de Juiz 11 do Juízo Central Cível, o Dr. Rui Oliveira acumula a função de Magistrado Judicial Coordenador do Juízo Central Cível da Comarca de Lisboa. O Magistrado Judicial Coordenador é uma função facultativa, de auxílio ao Juiz Presidente do Tribunal da Comarca. Em tribunais ou juízos com mais de 5 juízes, pode o Presidente do Tribunal propor ao Conselho Geral da Magistratura a nomeação

1 Cfr. art. º 84º do RLOSJ. 2 Cfr. art. º 117º da LOSJ.

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de um Magistrado Judicial Coordenador. As competências do Magistrado Judicial Coordenador são as delegadas pelo Presidente do Tribunal, e que estão previstas no art. º 94º da LOSJ.

1.2.ACTIVIDADE DESENVOLVIDA

O meu estágio curricular no Juiz 11 do Juízo Central Cível teve início em 20.09.2018 e terminou a 14.02.2019, sob a coordenação e orientação do Juiz Dr. Rui Oliveira.

Durante este tempo tive a oportunidade de acompanhar várias acções declarativas sob processo comum, e até, uma acção especial de prestação de contas. Não tive a possibilidade de acompanhar qualquer providência cautelar. Assisti a mais de duas dezenas de diligências, entre audiências prévias e audiência de Julgamento. Li diversas peças processuais, desde petições inicias, contestações, articulados supervenientes, despachos, sentenças, a até decisões dos Tribunais Superiores. Estudei os mais diversos temas tratados nas diligências processuais e observei a elaboração de vários despachos e sentenças proferidas pelo Dr. Rui Oliveira, que sempre teve o cuidado e atenção de me explicar as posições tomadas.

Incentivado e sob a orientação do Dr. Rui Oliveira, tive ainda oportunidade de elaborar projectos de despachos, despacho-saneador e sentenças dos processos que acompanhei.

No entanto, o que mais realço neste estágio foram as conversas e trocas de ideias que tive com o Dr. Rui Oliveira, antes e após qualquer diligência. A discussão sobre os temas tratados nos processos, as questões processuais abordadas nas diligências, os pequenos pormenores na realização e condução de uma diligência e até a relação existente entre o Tribunal e os restantes intervenientes processuais (Advogados, Partes, Testemunhas, Funcionários Judiciais) são os ensinamentos mais valiosos que retiro deste estágio curricular.

Tratando-se do Juízo Central Cível, os processos que acompanhei foram processos complexos devido ao seu alto valor (superior a €50.000,00), que cuidavam

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dos mais diversos temas civis, comercias e processuais. Neste âmbito, julgo ser indispensável abordar alguns dos temas mais tratados e interessantes que tive a felicidade de acompanhar3.

1) Intermediação Financeira: Muitos dos processos que acompanhei foram relativos à compra e venda de instrumentos financeiros no período antes da crise económica que abalou Portugal e a Europa. A causa de pedir destes processos é complexa, mas redundava sempre na responsabilidade civil dos intermediários financeiros, por violação dos deveres de informação, nos termos do Art.º 304º A do CVM.

Sinteticamente, o que se discute é saber se, numa primeira fase, o Intermediário Financeiro prestou todas as informações essenciais e necessárias ao Cliente para a subscrição informada dos produtos financeiros, como decorre do art.º 312º do CMV. Numa segunda fase, importava igualmente apurar se incumbia ao Intermediário Financeiros prestar informações complementares ao longo da vida do instrumento financeiro, nomeadamente quando ocorre alguma alteração de rating ou dos aspectos financeiros da empresa titular do produto financeiro subscrito.

Ora, a prova da factualidade essencial nestes processos é particularmente complexa. Apenas o Autor e o representante do Intermediário Financeiro que negociou com este, é que têm o pleno conhecimento daquilo que foi conversado entre ambos na altura da subscrição dos produtos financeiros. Normalmente, são conversas particulares, sem testemunhas, pelo que é muito complicada a prova do teor das informações prestadas ou não pelo Intermediário Financeiro.

Nestes casos as partes socorrem-se das declarações de parte4. Porém, muitas

vezes, este meio de prova é insuficiente. As declarações recaem sobre factos ocorridos há muito tempo, com lapsos de memória naturais e sem qualquer sustentação em documentos.

3 O objecto principal deste relatório não é a descrição das actividades desenvolvidas no estágio curricular, mas

sim a dissertação sobre um tema concreto abordado no estágio. Neste sentido, apenas tratarei de forma muito sintética, alguns do temas que marcaram o meu estágio no Juiz 11 do Juízo Central Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa.

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Ora, este tipo de processos são actualmente muito comuns no Juízo Central Cível e captaram a minha atenção pela importância da escolha dos meios de prova e a dificuldade concreta neste tipo de processo. Não basta construir peças processuais muito prolixas, com imensos factos, se no final não há meios de prova que sustentem tal alegação.

2) Responsabilidade Civil das Companhias de Seguros: Este foi um dos processos que mais me marcou pela "injustiça" do regime legal aplicável.

Contextualizando: O Autor negociou com uma Mediadora de Seguros, a subscrição de dois produtos financeiros no ramo vida, de uma Companhia de Seguros. O Autor assinou uma proposta de subscrição dos referidos produtos e entregou o valor do prémio à Mediadora, no montante de, aproximadamente, €100.000,00. A Mediadora nunca entregou à Companhia de Seguros a proposta assinada nem qualquer valor do prémio pago pelo Autor, pelo que nunca se concretizou qualquer subscrição do produto financeiro. A Mediadora exercia as sua funções em regime de exclusividade para a respectiva Companhia de Seguros sem ter poderes de cobrança. Neste enquadramento, o Autor instaurou uma acção declarativa sob processo comum contra a Mediadora e a Companhia de Seguros. A Mediadora confessou a autoria dos factos. Assim sendo a questão fundamental era saber se a Companhia de Seguros podia ser solidariamente responsável pelos danos sofridos pelo Autor, devido à conduta culposa da Mediadora5.

O Tribunal condenou a Mediadora de Seguros, mas absolveu a Companhia de Seguros de todos os pedidos formulados contra esta. Considerou que não existe qualquer disposição legal do RJMS6 que impute às companhias de seguros, os danos

decorrentes da violação de deveres profissionais dos mediadores de seguros. Assim,

5 À data dos factos, não era obrigatório a constituição de um seguro de responsabilidade civil profissional para

os mediadores de seguros. Neste caso concreto, a Mediadora não possuía qualquer seguro de responsabilidade civil. A Lei nº 7/2019 veio alterar esta situação, impondo a todos os distribuidores de seguros – onde se inclui os mediadores de seguros - a obrigação de celebração de um seguro de responsabilidade civil profissional.

6 Regime Jurídico de Mediação de Seguros, aprovado pelo DL nº 144/2006 de 31.07. Actualmente este diploma

foi revogado pela Lei nº 7/2019, que transpõe a Directiva (UE) 2016/97. Porém, à data dos factos, o regime aplicável era o RJMS.

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a possibilidade de responsabilizar a Companhia de Seguros pelos actos ilícitos da Mediadora, resultará das previsões gerais do Código Civil, mormente o art.º 500º7.

Ora, o mediador de seguros não se encontra sujeito às ordens e instruções ou supervisão da companhia de seguros, exercendo a sua profissão com independência e autonomia. O que afasta, desde logo, a aplicação do art.º 500º do CC, pela inexistência de uma relação de comissão entre um mediador de seguros e a companhia de seguros.

Ponderou ainda o Tribunal a aplicação do art.º 30 do RJCS8. O citado

normativo prevê a figura da representação aparente. Nos termos do nº 3 da referida norma, o contrato de seguro será eficaz perante uma companhia de seguros, mesmo que o mediador actua sem poderes de representação, se existirem motivos ponderosos para que o tomador de seguro de boa-fé confie no mediador de seguro e que a companhia de seguros contribua para fundar essa confiança.

Ora, o Tribunal não deu como provado factos suficientes que demonstrassem uma boa-fé subjectiva ética9 do Autor. Por outro lado, a Companhia de Seguros não

contribuiu para a confiança do Autor para a Mediadora.

7 Estabelece o art.º 500º do CC: «1. Aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de

culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar; 2. A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada.; 3. O comitente que satisfizer a indemnização tem o direito de exigir do comissário o reembolso de tudo quanto haja pago, excepto se houver também culpa da sua parte; neste caso será aplicável o disposto no n.º 2 do artigo 497».

8 Nos termos do art.º 30º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo DL nº 72/08 de 16.04: «1

- O contrato de seguro que o mediador de seguros, agindo em nome do segurador, celebre sem poderes específicos para o efeito é ineficaz em relação a este, se não for por ele ratificado, sem prejuízo do disposto no n.º 3. 2 - Considera-se o contrato de seguro ratificado se o segurador, logo que tenha conhecimento da sua celebração e do conteúdo do mesmo, não manifestar ao tomador do seguro de boa fé, no prazo de cinco dias a contar daquele conhecimento, a respectiva oposição. 3 - O contrato de seguro que o mediador de seguros, agindo em nome do segurador, celebre sem poderes específicos para o efeito é eficaz em relação a este se tiverem existido razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justifiquem a confiança do tomador do seguro de boa fé na legitimidade do mediador de seguros, desde que o segurador tenha igualmente contribuído para fundar a confiança do tomador do seguro».

9 Neste sentido, vide o ac. do TRL de 17.12.2014, proc. nº432/08.6TASCR.L1-3 (Relator: Rui Gonçalves), que

refere: «De boa fé, porém, só poderemos falar numa conceção psicológica (se por boa fé se entende o mero desconhecimento da falta

de representação, admitimos que os lesados estavam de boa fé), mas já não se seguirmos uma conceção subjetiva ética. A lei prescreve no regime de mediação de seguros que o mediador (e, por conseguinte, também o agente de seguros) não representa a seguradora, a não ser que esta lhe conceda, por procuração, esses poderes (cf. os arts. 4.º, n.º 1 do DL n.º 388/91 e 29.º, alínea a) do DL n.º 144/2006). Ora, a ignorância da lei não aproveita a ninguém (cf. art. 6.º do Código Civil). Para além disso, qualquer pessoa tem o poder de exigir a prova dos poderes representativos (art. 260.º n.º 1 do Código Civil). Assim, luz de uma conceção subjetiva ética de boa fé, que entendemos por mais curial, parece-nos que no caso vertente a ignorância dos terceiros lesados sobre a falta de poderes representativos das mediadoras/arguidas é culposa, daí que, não estejam de boa fé. Legalmente, o mediador de seguros não

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Neste Enquadramento, considero que o Tribunal decidiu bem ao absolver a Companhia de Seguros. De facto, a única possibilidade de responsabilizar a Companhia de Seguros seria pela figura da representação aparente e a factualidade provada não permitia tal conclusão.

Contudo, no meu entender, a legislação é pouco protectora do consumidor e algo desfasada da realidade. Apenas o RJCS abre a porta à responsabilização das companhias de seguros10. Porém, a exigência de uma boa-fé subjectiva do tomador

do seguro e um comportamento objectivo da seguradora que contribua para a fundação da confiança, são requisitos bastantes exigentes para o consumidor. Acresce que não existe qualquer obrigação legal do mediador de comunicar os termos concretos do contrato com a companhia de seguros que representa - se é agente exclusivo, se tem ou não poderes de cobrança - o que dificulta o acesso a esses dados pelo consumidor11. Ora, colocar sob o consumidor, o ónus de averiguar os reais

poderes de representação do mediador, quando este não tem qualquer obrigação legal de informar previamente tais informações, é manifestamente excessivo e desproporcional, colocando-o numa posição frágil e susceptivel de enganos e embustes.

3) Prestação de Contas: Este inusitado processo deveu-se a um entendimento peculiar da Vice-Presidente do TRL do art. º 942º do CPC e das regras de competência em função do valor e da matéria.

representa a seguradora, como acima vimos, e os terceiros tinham o poder de exigir a prova dos poderes representativos das arguidas mediadoras (art. 260.º, n.º 1 do Código Civil). Se não o fizeram sibi imputet.».

10 Na verdade, o RJMS não prevê qualquer responsabilização das companhias de seguros pelos actos ilícitos

dos mediadores, sendo que a possibilidade de aplicação do art.º 500º do CC fica frustrada atento à independência e autonomia do mediador de seguros em relação à seguradora. Apesar de o contrato entre o mediador de seguros e a companhia de seguros poder comprimir alguma autonomia do mediador, a verdade é que não existe um vínculo funcional entre ambos, pelo que a relação de comissão não existe.

11 Neste caso, uma das testemunhas que trabalha na Companhia de Seguros chegou a referir que a Mediadora

em questão já tinha tido outros problemas com atrasos na entrega de dinheiro de clientes, razão pela qual lhe foi retirado os poderes de cobrança. E quando lhe perguntado o porquê de não ter rescindido a relação com a Mediadora, dado os problemas identificados, a testemunha referiu que a Mediadora é boa angariadora de clientes, «apenas não é boa a gerir o dinheiro dos outros».

Este testemunho é demonstrativo do comportamento das companhias de seguros neste campo. Aproveitam a insuficiência da lei, preferindo manter contratos com mediadores com condutas menos própria, desde que sejam bons angariadores de clientes, sabendo que a possibilidade de serem responsabilizadas objectivamente é diminuta.

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A factualidade é muito simples. Foi instaurada uma acção de prestação de contas no Juízo Local Cível de Lisboa. Ora, a acção de prestação de contas é uma acção especial, com tramitação própria, regulada pelos arts. º 941º a 952º do CPC. Sucede que, o Réu contestou a obrigação de prestação de contas. Nestes casos, decorre do art.º 942º nº 3 do CPC que ao processo especial é aplicada os tramites do processo comum, dado não haver condições para o tribunal decidir sumariamente a questão.

Nesse âmbito, o Juízo Local Cível decidiu que, tendo em conta o valor da causa (superior a €50.000,00) e o teor da contestação, o Tribunal competente seria o Juízo Central Cível, nos termos do art.º 117º nº 1 ali. a) da LOSJ.

Por sua vez, o Juízo Central Cível julgou-se incompetente, por considerar que a aplicação dos tramites do processo comum à acção especial de prestação de contas após a contestação não implica uma transformação do processo especial em comum. Como tal, não se enquadra em nenhum dos pontos previstos na lei que delimita a competência do Juízo Central Cível.

O processo subiu para o TRL, e a Vice-Presidente decidiu que o Tribunal competente seria o Juízo Central Cível, sufragando a tese que a expressão “segue os

tramites do processo comum” implica uma transformação do processo especial em

processo comum.

Ora, não podia estar mais em desacordo. Esta interpretação lata da lei por parte da Vice-presidente do TRL vai contra o pensamento do legislador quando criou os processos especiais. De facto, o intuito deste tipo de processos é fomentar a celeridade processual, adequando a um conjunto de acções uma tramitação própria, mais rápida e adequada ao objecto do litígio. A expressão “segue os tramites do processo comum”, encontrada em todas as acções especiais pelo nosso código12, mais não é do que uma

válvula de escape, evitando assim repetir de forma exaustiva, os tramites já descritos no processo comum. Em nenhum momento, esta remissão implica a transmutação

12 Vide por exemplo, o art.º 920º nº 1 do CPC, relativo ao processo especial de consignação em depósito; o

art.º 926º nº3 do CPC, relativo ao processo especial de divisão de coisa comum ou então o art.º 732º nº 2 do CPC, sobre os termos da oposição à execução.

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do processo especial em processo comum13 e comitantemente, a alteração da

competência do Tribunal. Até porque, isso implicaria atrasar o processo, que se pretende célere. Imaginemos que, remetido o processo para o Juízo Central Cível, este julgaria que o réu tinha obrigação de prestar contas. A partir deste momento, o processo converte-se novamente para processo especial? E, em consequência, o processo é novamente remetido para o Juízo Local? Iria para distribuição, ou ficaria no mesmo Juiz do Juízo Local?

Ou seja, segundo este entendimento, o mesmo processo especial de prestação de contas andaria de Juízo em Juízo, atrasando a sua resolução, quando o objectivo do legislador é precisamente o contrário.

Voltando ao caso concreto, em consonância com a decisão do TRL foi agendada audiência prévia no Juízo Central Cível que terminou com um acordo judicial, o que findou o processo sem a eventual necessidade de uma "nova viagem" para o Juízo Local.

4) Incidente de Suspeição: Nos termos do art.º 120º do CPC, as partes podem opor a suspeição do Juiz quando ocorra motivo grave e sério que crie desconfiança sobre a sua imparcialidade.

Num dos processos que acompanhei, tive a oportunidade de assistir à dedução deste invulgar incidente de suspeição. A particularidade deste caso é que o mesmo foi deduzido no início de uma sessão de audiência de julgamento, ditado para a acta, quando a lei prevê que o requerimento seja autuado em apenso, o que normalmente implica a sua apresentação pelo sistema informático CITIUS.

Por outro lado, os factos que fundamentam o pedido de suspeição ocorreram na sessão da audiência de julgamento realizada no dia anterior, pelo que, colocava-se a questão de saber se o requerimento era extemporâneo. Decorre do art.º 121º nº 3 do CPC, que se o fundamento da suspeição for superveniente ao início do processo, a parte denuncia o facto ao juiz logo que tenha conhecimento dele, sob pena de não

13 Neste sentido, vide o ac. do TRL de 16.02.2016, proc. nº 7415/14.5T8LSB-A.L1-1 (Relator: Afonso

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poder mais tarde arguir a suspeição. Neste caso, os factos que fundamentaram o pedido de suspeição ocorreram na sessão da audiência de julgamento realizado no dia anterior. Pelo que, colocava-se a questão de saber qual o sentido e alcance da expressão “logo que tenha conhecimento”.

Não obstante a expressão aludir à necessidade de apresentação do requerimento na data do conhecimento dos factos, a doutrina considera que o prazo para a dedução do incidente é o prazo supletivo de 10 dias após o conhecimento dos factos14.

Neste sentido, o Tribunal considerou o pedido de suspeição tempestivo, tendo respondido aos factos alegados pela parte e declarou suspensa a audiência de julgamento, nos termos do art.º 121º nº 2 do CPC. Mais tarde vim a saber que o TRL indeferiu o pedido de suspeição, mas surpreendentemente, não condenou o recusante em litigância de má fé, nos termos do art.º 123º nº 3 do CPC15.

Este processo foi uma excelente oportunidade de entender melhor o regime e processamento do incidente de suspeição, perdurando o seguinte ensinamento: por mais "trivial" que se preveja ser uma diligência processual, nunca se sabe o que pode ocorrer.

5) Justo Impedimento: Por fim, relato outro inesperado incidente processual que tive a oportunidade de acompanhar e aproveito para criticar alguns expedientes dilatórios que ainda subsistem na nossa lei processual civil.

No dia da audiência de julgamento, a Senhora Advogada da Ré invocou justo impedimento por motivo de doença, o que a impediu de comparecer na diligência. No requerimento apresentado não juntou documento justificativo, mas protestou juntar. Ora, a lei é clara neste ponto, a parte que alega o justo impedimento apresenta

14 Neste sentido, vide COSTA, Salvador da, Incidentes da Instância, p. 347 e FREITAS, José Lebre de e

ALEXANDRE, Isabel, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, anotação ao art.º 121º.

15 É certo que a condenação por litigância de má-fé não é automática, devendo o Tribunal da Relação apreciar

se a conduta cumpre os requisitos do art.º 542º do CPC. Contudo, atento ao fundamento do pedido de suspeição, claramente dilatório, é deveras surpreendente o Tribunal da Relação concluir pela improcedência do pedido e não condenar o recusante em litigante de má-fé. O que demonstra alguma parcimónia dos tribunais superiores em aplicarem este regime para corrigir comportamentos erróneos das partes e seus representantes.

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logo a respectiva prova16. Todavia, é entendimento pacifico dos tribunais superiores

que a parte pode juntar posteriormente a prova, desde que justifique o motivo da apresentação posterior17. Compreende-se esta posição dos tribunais superiores.

De facto, basta imaginar uma situação em que parte, por motivo de doença imprevisível, desloca-se ao hospital no dia da diligência. Ora, quando comunica ao Tribunal o seu impedimento, ainda não tem na sua posse o respectivo atestado médico, pelo que seria impossível oferecer de imediato a prova.

Contudo, esta permissividade implica que o juiz tem o dever de adiar sempre a diligência, se reconhecer que os factos alegados no requerimento correspondem a um caso de justo impedimento, mesmo que não seja oferecida prova de imediato.

Ora, esta inevitabilidade ganhou preponderância no processo que acompanhei. A parte utilizou um conjunto de expedientes dilatórios de forma sucessiva, sem que o Tribunal nada pudesse opor. A ardilosa estratégia utilizada passava pela invocação de um justo impedimento, o que implica o adiamento de audiência final para uma nova data. Aproximando-se da nova data, o Advogado renunciava ao mandato, o que implica novo adiamento da diligência e fixação de 20 dias para a parte constituir novo Advogado. Após constituir novo Advogado, era agendada nova audiência final e repetia-se ciclo. Com este procedimento, o Tribunal nada pode fazer para prosseguir com o processo, pois mesmo que desconfie que se trate de expedientes dilatórios para adiar injustificavelmente o processo, não tem provas ou mesmo indícios sérios de tais factos, dado que é sempre um Advogado diferente que alega o justo impedimento.

Este processo é interessante para demonstrar que ainda existe na nossa lei processual civil formas de atrasar injustificavelmente um processo, sem possibilidade de o Tribunal impedir tal conduta. É certo que a litigância de má-fé e a responsabilização directa dos mandatários é um mecanismo que visa punir essas

16 Cfr art.º 140º nº 2 do CPC.

17 Neste sentido vide, o ac. do TRG de 15.02.2018, proc. nº 532/17.1T8VCT.G1 (Relator: Pedro Damião e

Cunha), ou o ac. do TRE de 05.05.2016, proc. nº 1117/12.4TBVNO.E1 (Relatora: Elisabete Valente), que refere categoricamente: «Considera-se justo impedimento, nos termos do art.º 603.º, n.º 1 do CPC, a situação em que é

comunicado ao tribunal o facto da mandatária se ter sentido mal durante a noite e por esse motivo não possuir capacidade física para se deslocar ao tribunal, pelo que tal situação é motivo de adiamento audiência de julgamento, até porque as partes não se opuseram ao adiamento e tratava-se da 1.ª marcação, não sendo exigível que com a comunicação fosse exibido atestado médico.»

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condutas. Contudo, não resolve o problema de fundo. A função do Tribunal é a descoberta da verdade material, que apenas é possível com o normal andamento dos processos. Pouco vale condenar as partes e respectivos mandatários por utilização de expedientes dilatórios, se no final, o processo continua parado.

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CAPÍTULO II - BREVE RESENHA HISTÓRICA DO REG. Nº 1206/2001 DE 28.05.2001

O direito à prova é um dos princípios corolários do acesso à justiça e de um processo justo e equitativo18. É um direito constitucional, que decorre do art.º 20º da

CRP1920. O direito à prova traduz-se, fundamentalmente, no direito de as partes

acederem e utilizarem todas as provas admissíveis para demonstrar os factos que alegam, bem como para contradizer a factualidade da outra parte21.

O direito à prova é um tema sempre actual e com várias ramificações dignas de estudo e analise. Um dos domínios com maior relevância prática nos dias actuais é a obtenção de prova no estrangeiro. Com a livre circulação de pessoas e bens, a evolução da economia europeia e as facilidades de comunicação por meio virtual, os meios probatórios estão, cada vez mais, espalhados por toda a UE. Para que o Estado consiga garantir uma tutela efectiva dos direitos dos seus cidadãos e residentes necessita da colaboração de outros Estados no domínio da obtenção de prova. O Reg. nº 1206/2001 do Conselho, de 28.05.2001, veio dar resposta a esta necessidade. É o primeiro e único instrumento legal emanado pela UE que permite a prática de

18 O processo justo e equitativo previsto no art.º 20º da CRP, tem ainda expressão no art.º 6 da CEDH e no

art.º 10 da DUDH.

19Como afirmam CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada,

Vol. I, p. 415 e 416, :«A doutrina e a Jurisprudência têm procurado densificar o principio do processo justo e equitativo através de outros princípios:(...)(2)o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas prova(...)(7) Direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar e provar os factos alegados em Juízo».

20 Jurisprudencialmente, o tema tem sido tratado pelo TC. Cumpre destacar, entre muitos outros, o recente ac.

nº 524/18 do TC de 07.11.2018, que citando diversos autores, refere: «No âmbito do direito a um processo equitativo,

está compreendido um “direito constitucional à prova” abrangendo “o direito à prova em sentido lato (poder de demonstrar em juízo o fundamento da própria pretensão) e o direito à prova em sentido restrito (alegando matéria de facto e procedendo à demonstração da sua existência)”(J.J. Gomes Canotilho, “Estudos sobre Direitos Fundamentais”, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, p. 170). Na síntese de M. Teixeira de Sousa, a prova pode ser definida como a atividade direcionada, num processo, à “demonstração convincente (…) de uma afirmação de facto”, com o objetivo de contribuir para que, na mente do julgador, se forme a convicção sobre a realidade dos factos relevantes para a decisão (cfr. M. Teixeira de Sousa, “As partes, o objeto e a prova na ação declarativa”, Lex, Lisboa 1995, p. 195)».

21 BRANCO, Carlos Castelo, A Prova Ilícita: Verdade ou Lealdade, p. 29, citando Michelle Taruffo, define direito

à prova como «direito da parte de utilizar todas as provas que dispõe, de forma a demonstrar a verdade dos factos em que a sia

pretensão se funda»;

Já RANGEL, Rui, O Ónus da Prova no Processo Civil, p. 75, numa definição mais completa: «Em processo civil, o

direito à prova significa que as partes conflituantes, por via da acção e da defesa, tem o direito a utilizarem em seu benefício e como sustentação dos interesses e das pretensões que apresentaram em tribunal. Esse direito à prova confere, ainda, a possibilidade de as partes conflituantes utilizarem para proa de um facto ou factos, o meio de prova que mais lhe convier, o que é determinado pela sua vontade, bem como poderem escolher o momento da sua apresentação, tendo em consideração o encerramento da audiência de discussão e julgamento».

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diligências de recolha de prova no espaço europeu em matéria civil e comercial. Entrou em vigor em 01.07.2001, porém só começou a produzir efeitos a partir de 01.01.200422. Este Regulamento insere-se num conjunto de instrumentos legais na

área do direito processual civil europeu23, que fomentam a cooperação judiciária e são

essenciais para o funcionamento do mercado interno e livre circulação de pessoas24.

O anterior instrumento internacional neste domínio era a Convenção de Haia de 18.03.1970. Porém, o sistema de transmissão de pedidos de obtenção de prova previsto na Convenção de Haia é moroso e pouco eficiente. Acresce que, à data da aprovação do Regulamento, a Convenção de Haia era apenas ratificado por 11 (onze) Estados-Membros da UE. Existia, portanto, uma premente necessidade de aprovação de um instrumento comum a todos os Estados-Membros.

Ora, este Regulamento apresenta duas importantes diferenças em relação à Convenção de Haia. Por um lado, este Regulamento criou um sistema de comunicação rápida e directa entre os tribunais dos Estados-Membros, sem necessidade de intervenção de autoridades centrais. Por outro lado, apresenta uma novidade importante ao permitir a obtenção de prova directamente pelo Tribunal do Estado do foro, num outro Estado-Membro2526.

22 Cfr. art.º 24º nº 2 do Regulamento.

23 Entre vários exemplos de legislação aprovada no domínio da cooperação judiciária em matéria civil e

comercial destaca-se: Reg. n.º 44/2001, de 22.12.2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Bruxelas I); Reg. n.º 2201/2003, de 27.11.2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental; Reg. n.º 805/2004, de 21.04.2004, que cria o título executivo europeu para créditos não contestados; Reg. n.º 1393/2007, de 13.11.2007, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados-Membros; Reg. n.º 1215/2012, de 12.12.2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Bruxelas II).

24 Neste sentido, vide considerando 1 e 2 do Regulamento.

25 Neste sentido, SOUSA, Miguel Teixeira de, Linhas Gerais do Regulamento (CE) nº 1206/2001 relativo à obtenção

de provas em matéria civil e comercial, p. 34-35.

26 O cap. II da Convenção de Haia trata da obtenção de provas por agentes diplomáticos ou consulares e por

comissários. A figura do comissário - art.º 17º da Convenção de Haia - consiste numa pessoa investida de poderes pelo Estado para obter prova, sem meios coercivos, existente noutro Estado. Portugal apresentou uma reserva sobre esta matéria, pelo que, não existem comissários Portugueses, nem comissários estrangeiros em Portugal. Ora, pode-se afirmar que o regime de obtenção directa de prova criado pelo Regulamento foi inspirado na figura do comissário. Porém, a obtenção directa de prova vai mais além. Não só é o próprio Tribunal do foro que tem poder para obter directamente a prova e não uma outra figura, como o Regulamento não permite qualquer reserva dos Estados-Membros, pelo que este regime é obrigatório.

Sobre este assunto, vide FIALHO, Antônio Carvalho, Obtenção Transnacional de Prova em Matéria Civil e Comercial:

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Até à data, o Regulamento apenas sofreu uma alteração sobre a atribuição de competências à Comissão Europeia para introduzir alterações técnicas nos formulários constantes do seu Anexo D, em 04.12.2008.

Actualmente, encontra-se pendente uma proposta de alteração do Regulamento, apresentada Comissão Europeia em 31.05.201827. Esta proposta

apresenta algumas alterações ao nível da agilização e simplificação do processo de obtenção de prova, com especial relevo para a estimulação da transmissão electrónica de dados e o reconhecimento mútuo de provas digitais. São igualmente propostas alterações mais profundas, como a criação de um novo regime de obtenção de prova por agentes diplomáticos e consulares, esclarecimento de alguns conceitos chaves e a remodelação do processo de utilização de videoconferência.

27 Vide proposta de alteração da Comissão Europeia ao Reg. nº 1206/2001, disponível em <URL:

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CAPÍTULO III- DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO REGULAMENTO

O Regulamento é um instrumento legislativo de caracter procedimental que regula os aspectos organizativos na relação entre as autoridades competentes de cada Estado-Membro para a obtenção de prova transfronteiriça.

Como esclarece Niilo Jääskinen28: «O princípio subjacente neste domínio é o da

soberania territorial dos Estados-Membros(...). Tradicionalmente, o exercício do poder público tem um caráter territorial. Não é, em princípio, possível exercê-lo fora do Estado-Membro ao qual pertencem o órgão jurisdicional ou outra autoridade nacional pertencem, salvo com o acordo do «poder soberano» local, ou seja, com o acordo das autoridades do outro Estado-Membro no território do qual este poder deve ser exercido.(...) O Regulamento n. o 1206/2001 procura lutar contra esta compartimentação dos poderes no seio da União, facilitando a circulação das pessoas que devem participar em atos de instrução e, por este meio, a transmissão de provas de um Estado-Membro para outro, na base de uma confiança mútuo »

Neste sentido, o objectivo deste regulamento não é, de todo, harmonizar as normas de direito probatório dos vários Estados-Membros. O objectivo do Regulamento é a criação de um sistema simples, célere e eficiente de obtenção de prova no espaço comunitário, através de uma cooperação activa entre os Tribunais dos Estados-Membros. Com este Regulamento, o legislador comunitário pretende garantir um correcto funcionamento do mercado interno e promover a livre circulação de pessoas e bens, ao tentar eliminar os obstáculos jurídicos que as fronteiras terrestres criam no domínio da obtenção de prova.

Neste âmbito, é possível identificar quatro premissas estruturantes29 que

norteiam a aplicação do Regulamento Comunitário.

A primeira premissa consiste na simplificação. O procedimento é baseado em formulários simples, acessíveis e bastante intuitivos. Promove-se ainda uma

28 Advogado-Geral do TJUE, no âmbito do proc. nº C-322/11, de 06.09.2012, Conclusões 47 e 48.

29 Em sentido idêntico vide BESSO, Chiara, Cooperation in the Taking of Evidence: The European Attitude, p. 74, que

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comunicação informal através de meios tecnológicos, o que simplifica todo o processo de comunicação entre os Estados-Membros.

Outro princípio chave é o princípio da celeridade. Este regulamento impõe limites temporais para a actuação das autoridades competentes. Por exemplo, o pedido de obtenção indirecta de prova deve ser executado num prazo máximo de 90 dias, sendo que no regime de obtenção directa de prova, a autoridade central tem 30 dias para informar o Tribunal competente se aceita o pedido. 30 dias é igualmente o prazo de resposta, caso o pedido esteja incompleto. Sem prejuízo de querer incutir rapidez no processo, o Regulamento não estabelece qualquer sanção para o não cumprimento dos prazos.

A terceira premissa consiste na eficiência. Todo procedimento de obtenção de prova está construído de forma a ter a maior eficiência possível, sendo exemplo disso, a promoção de utilização de meios tecnológicos, seja nas comunicações entre os Estados-Membros, seja na própria obtenção de prova através da utilização de videoconferência ou meio tecnológico semelhante. Por outro, o art.º 21º nº 2 permite a celebração de outros acordos ou convénios entre os Estados-Membros com o intuito de facilitarem a obtenção de prova, o que indica que o Regulamento tem como principal objectivo tornar mais eficiente a obtenção de prova, mesmo que para isso se tenha de afastar a sua aplicação.

Por fim, a cooperação. Palavra-chave deste regulamento, que estabelece um processo de obtenção de prova assente na cooperação leal entre os Estados-Membros. Exemplo disso é o sistema instituído de transmissão directa de pedidos de obtenção de prova entre os Tribunais ou a excepcionalidade dos motivos de recusa de execução, que impele os Estados-Membros a colaborarem entre si. Numa face mais visível, podemos ainda destacar a cooperação intensa entre os Estados-Membros que o Regulamento estabelece, seja através de uma conduta activa na prática de actos de obtenção de prova ou através de uma conduta mais passiva resultante na permissão de inferência de um Estado-Membro no seu território para recolher directamente prova.

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«1. O presente regulamento é aplicável em matéria civil ou comercial, sempre que um tribunal

de um Estado-Membro, requeira, nos termos da sua legislação nacional: a) Ao tribunal competente de outro Estado-Membro a obtenção de provas; ou b) A obtenção de provas directamente noutro Estado-Membro.

2. Não será requerida a obtenção de provas que não se destinem a ser utilizadas num processo judicial já iniciado ou previsto.

3. No presente regulamento, a expressão "Estados-Membros" designa todos os Estados-Membros com excepção da Dinamarca.»

De acordo com a norma citada, o Tribunal Requerente dispõe de dois métodos de cooperação:

i. Método de obtenção indirecta de prova, através de uma comunicação directa entre Tribunal onde corre a acção (Tribunal Requerente) e o Tribunal do Estado onde se encontra a prova (Tribunal Requerido), cabendo a este último realizar a diligência probatória, nos termos da sua lei nacional3031.

ii. Método de obtenção directa de prova, através recolha directa pelo Tribunal Requerente no Estado-Membro Requerido, nos termos da sua legislação3233.

Neste âmbito, Carlos Marinho 34 apresenta quatro condições gerais de

aplicação do presente Regulamento:

i. Colheita de prova no espaço comunitário;

ii. Tal prova deve incidir sobre matéria civil ou comercial;

iii. O pedido deve ser apresentado pelo Tribunal de um Estado Membro; iv. A prova pretendida destina-se a um processo judicial pendente ou previsto.

Acrescento uma quinta condição, que é a definição do conceito de prova. Irei, de seguida, esmiuçar cada uma destas condições.

30 Cfr. art.º 1 nº1 ali. a) do Regulamento.

31 MARINHO, Carlos M.G. de Melo, Textos de Cooperação Judiciaria Europeia em Matéria Civil e Comercial, p. 15,

designa este método de obtenção de prova como «cooperação judiciária activa». Já SOUSA, Miguel Teixeira de, in op. cit., p. 39, refere-se a este mesmo método como «entreajuda activa».

32 Cfr. art.º 1 nº 1 ali. b) do Regulamento.

33 MARINHO, Carlos M.G. de Melo, in op. cit., p. 15, designa este método de obtenção de prova como

«cooperação judiciária passiva». Já Sousa, Miguel Teixeira de, in op. cita, p. 39, refere-se a este mesmo método como «entreajuda passiva».

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3.1.ÂMBITO ESPACIAL

Conforme decorre o artº. 1º nº 3, este regulamento aplica-se à obtenção de prova existente num Estado-Membro que não coincide com o Estado-Membro no qual corre ou está previsto correr uma acção judicial. A única excepção é a Dinamarca. Para as relações entre os Estados-Membros e a Dinamarca aplica-se a Convenção de Haia de 1970. Significa que, por exemplo, para ouvir uma testemunha residente na Dinamarca, no âmbito de uma acção declarativa que corre termos em Portugal, é aplicável o regime previsto na Convenção de Haia e não o Regulamento.

Outro aspecto relevante relativo ao âmbito espacial é a sua força vinculativa35.

Neste campo vigora o princípio da prevalência, dado este regulamento é vinculativo entre os Estados-Membros - excepto a Dinamarca - e prevalece sobre outros acordos celebrados entre os Estados-Membros relativos à obtenção de prova transfronteiriça. Contudo, tal não impede que os Estados-Membros celebrem novos acordos destinados a facilitar ainda mais a obtenção de Prova36, desde que não sejam

incompatíveis com o presente regulamento, conforme resulta do considerando 17 e do art.º 21º do Regulamento.

3.2.ÂMBITO MATERIAL

O art.º 1º é inequívoco ao referir que o Regulamento é aplicável à obtenção de prova em “matéria civil e comercial”. Esta referência deve ser interpretada de forma autónoma e não deve ser orientada pelo direito interno de cada um dos Estados-Membros.

Este conceito não é único deste Regulamento. É igualmente usado para definir o escopo do Reg. Bruxelas I e II ou o Reg n.º 1393/2007, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados-Membros. Também o TJUE já se pronunciou diversas vezes, sobre a definição deste conceito, principalmente no âmbito do Reg. Bruxelas I. A jurisprudência do TJUE é tem sido bastante importante, sobretudo na delimitação de

35 Mais desenvolvimentos sobre este tema, vide infra cap. 8.1.

36 Neste sentido, vide RIBEIRO, António da Costa Neves, Processo Civil da União Europeia, Principais aspectos -

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casos limites sobre conflitos entre entidades públicas e privadas. A título de exemplo, importa realçar o ac. de 14/11/200237 que refere que «O Tribunal de Justiça considerou

que, embora determinadas decisões proferidas em litígios que opõem uma autoridade pública a uma entidade privada possam entrar no âmbito de aplicação da Convenção de Bruxelas, o mesmo já não acontece se a autoridade pública actuar como entidade dotada de jus imperium»

Nesta enquadramento, podemos fixar o âmbito de aplicação do Reg. nº 1206/2001 tanto pela negativa, como pela positiva. Pela positiva, o presente regulamento é aplicável às matérias cíveis e comerciais, incluindo o estado e a capacidade das pessoas singulares, testamentos, sucessões, insolvência e processos análogos Pela negativa, está excluído do objecto do Regulamento, as matérias penais, as matérias fiscais, aduaneira e administrativa e a responsabilidade dos Estado por actos no exercício do seu poder de autoridade38.

3.3.NOÇÃO DE TRIBUNAL

Todo o processo de obtenção de provas se inicia com o pedido do Tribunal do Estado onde corre a acção. Este é um dos principais traços distintivos deste regulamento face a outros instrumentos internacionais no mesmo domínio. A comunicação entre os Estados-membros será efectuada por iniciativa de um Tribunal do Estado do foro, e terá como interlocutor outro Tribunal do Estado da situação da prova, ou a autoridade central39. Neste âmbito, é fundamental uma correcta e precisa

concretização do conceito de Tribunal. Porém, também nesta área não é fornecida qualquer definição de tribunal pelo legislador comunitário.

Uma interpretação mais restritiva considera que integra o conceito de “Tribunal”, apenas os órgãos jurisdicionais de cada Estado com poderes decisórios sobre o Direito. Por outro lado, uma interpretação mais ampla inclui outras autoridades judiciárias que de acordo com a lei nacional estejam habilitadas para proceder à obtenção de prova.

37 Processo nº C-271/00, (Gemeente Steenbergen vs Luc Baten).

38 Neste sentido, MARINHO, Carlos M.G. de Melo, in op. cit., p. 10 e 11.

39 A proposta de alteração de 31.05.2018 da Comissão Europeia acrescenta outra forma de comunicação através

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Esta incerteza na definição do conceito de Tribunal fez com que a Comissão Europeia apresentasse uma proposta de alteração do Regulamento onde é aditado ao art.º 1 o seguinte nº 4 :«Para efeitos do presente regulamento, entende-se por «tribunal» qualquer

autoridade judiciária de um Estado-Membro que seja competente para obter provas ao abrigo do presente regulamento.».

No meu entender esta proposta apenas vem introduzir a necessidade de uma interpretação sistemática do conceito de Tribunal, no âmbito do Regulamento. Senão vejamos: nos termos do art.º 2 nº 2, cada Estado-Membro elaborará uma lista dos tribunais competentes para a obtenção de provas. É através desta lista que o Tribunal Requerente saberá qual é o Tribunal Requerido competente para executar o pedido de obtenção de prova. O que significa que, a problemática de se determinar se certo órgão nacional integra o conceito de “Tribunal” só se coloca em relação à legitimidade do Órgão Requerente40.

Ora, se a proposta apresentada define como Tribunal «qualquer autoridade

judiciária de um Estado-Membro que seja competente para obter provas ao abrigo do presente regulamento», sendo que cada Estado-Membro indicará a lista de tribunais competentes

para a obtenção de prova, resulta claro que integra o conceito de “Tribunal” para o presente regulamento, as autoridades judiciárias indicadas pelos Estados-Membros na lista referida no art.º 2 nº 241. Assim, não terá legitimidade para requerer a recolha de

prova qualquer entidade do Estado-Membro que não esteja identificada como tribunal competente para obtenção de prova na lista supra referida.

Contudo, não parece ser este o sentido e alcance da proposta de alteração da Comissão Europeia de 31.08.2018. Mais recentemente, o PE aprovou uma Resolução Legislativa sobre a referida proposta de alteração do Reg. n.º 1206/2001 da Comissão

40 Neste sentido, MARINHO, Carlos M.G. de Melo, in op. cit.., p. 13, que refere: «A existência desta lista produz

como efeito que a questão da definição do conceito de tribunal só releve quanto à legitimação do Órgão requerente, já que o Tribunal Requerido é sempre determinado mediante recurso a tal lista».

41 Na lista enviada por Portugal, são competentes os Tribunais Judiciais da Comarca para a obtenção de

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Europeia42, onde introduziu diversas alterações. Neste âmbito43, esclarece o

Considerando 2-A da Resolução Legislativa do PE sobre o aditamento do nº 4 do art.º 1 que: «Para efeitos do presente regulamento, o termo «órgão jurisdicional» deverá, por

conseguinte, ser interpretado em sentido lato, de modo a abranger não só os tribunais na aceção estrita do termo, que exercem funções jurisdicionais, mas também outros organismos ou autoridades competentes nos termos do direito nacional para proceder à obtenção de provas em conformidade com o presente regulamento, designadamente as autoridades responsáveis pela aplicação da lei ou os notários em alguns Estados-Membros e em situações específicas».

Neste sentido, a proposta parece aderir a uma interpretação extensiva do conceito de tribunal, numa clara opção pelos movimentos de desjudicialização de alguns Estados-Membros, em detrimento de uma interpretação mais sistemática do Regulamento. Ou seja, para além dos tribunais indicados na lista referido no art.º 2º nº 2, podem ainda actuar como Órgão Requerente, todos os organismos ou autoridades que são competentes para procederem à obtenção de prova nos termos do direito nacional do Estado Requerente e em conformidade com o Regulamento.

Não critico a adesão da proposta a uma interpretação mais ampla do conceito de Tribunal. Apenas critico a redacção do eventual nº 4 do art.º 1, que sem o Considerando 2-A, pode levar a uma interpretação diversa da que se pretende.

Por fim, importa referir que a exclusividade da iniciativa pelo Tribunal Requerente para iniciar o processo de obtenção de prova no Espaço Comunitário não colide com o princípio do dispositivo, na vertente do domínio das partes sobre a prova a produzir. Para o fim deste regulamento é irrelevante se o pedido emana das partes, ao abrigo do princípio do dispositivo, ou até pelo próprio tribunal, ao abrigo do princípio do inquisitório. O que revela é que a comunicação entre os dois

42 Vide Resolução legislativa do Parlamento Europeu, de 13.02.2019, sobre a proposta de regulamento do

Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Reg. n.º 1206/2001 de 28.05.2001, relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de provas em matéria civil ou comercial.

Disponível em: <URL:

https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/?qid=1557348260285&uri=EP:P8_TA(2019)0103>.

43 Relativamente ao nº 4 do art.º 1, o PE propõe a seguinte alteração à proposta da Comissão Europeia: «4. Para

efeitos do presente regulamento, entende-se por «tribunal» qualquer autoridade judiciária de um Estado-Membro que seja

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Membros seja iniciada por um Tribunal do Estado Requerente competente para o efeito.

3.4.NOÇÃO DE PROVA

O Regulamento também não apresenta uma definição de "prova". Compreende-se tal decisão, uma vez que o objectivo do regulamento é agilizar o processo de obtenção de prova transfronteiriça, tornando-o mais simples e célere e aplicando-o ao maior número possível de situações. Seria nocivo uma definição de "prova" que limitasse a aplicação do Regulamento, diminuindo a eficácia dos processos judiciais no domínio civil e comercial44.

Ora, o conceito de "prova" apresenta vários significados, sendo que no âmbito de um processo judicial, podemos apontar três:

i. "Prova", como confirmação de um facto, que no âmbito de um processo judicial é amplamente utilizado na fase da fundamentação da sentença;

ii. "Prova", como instrumento para a demonstração de determinada realidade, que no fundo se traduz nos meios de prova4546.

iii. "Prova", actividade processual que visa convencer o juiz da causa de determinada realidade, previamente alegada pelas partes.

Este diploma comunitário versa sobre a segunda vertente do conceito, i.e., obtenção de meio de prova existente num Estado-Membro diferente do Estado do foro. Nesse âmbito, o Regulamento abrange a prova pessoal47, prova documental e

44 Neste sentido, vide Marinho, Carlos M.G. de Melo in op. cit., p. 12 «(...) parece que o que se quis foi criar um

mecanismo que responda a todas as necessidades de produção de prova no espaço da União em coerência com o desiderato de construir uma zona comum de justiça, garantido que «os processos judicias em matéria civil ou comercial sejam eficazes». No mesmo

sentido, ESTEBAN DE LA ROSA, Gloria, Prueba Judicial Y Práctica Del Discovery En La Unión Europea, «De otro lado, la expresión “prueba” es utilizada intencionadamente de forma imprecisa para proporcionar –en la medida de lo

posibleun marco común entre los Estados comunitarios, de tal manera que esta noción comprenda cualquier estructura de prueba reconocida por los dos Estados miembros, que participan en su obtención en el extranjero».

45 Na nossa lei processual civil estão previstos os seguintes meios de prova: (i)Prova por documentos (arts.º

423º a 451º do CPC); (ii) Prova por confissão (arts.º 452º a 465º do CPC); (iii) Declarações de parte (art.º 466º do CPC); (iv) Prova Pericial (art.º 467º a 489º do CPC ); (v) Prova por inspecção judicial (artsº. 490º a 493º do CPC) (vi) Verificações não Judiciais (art.º 494º do CPC ); (vii) Prova Testemunhal (art.º 495º a 526º do CPC).

46 Para um estudo mais aprofundado sobre os meios de prova em concreto, vide FREITAS, José Lebres de e

ALEXANDRE, Isabel, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pp. 238 a 416, e RODRIGUES, Fernando Pereira, Os Meios de Prova em Processo Civil, pp. 51 a 235.

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outros objectos e prova pericial. Outros meios de prova menos comuns, como a inspecção judicial ou até verificações não judiciais estão a abrangidas pelo escopo deste regulamento, sobretudo na modalidade de recolha directa de prova pelo Tribunal Requerente.

Todavia, a ampla abrangência deste regulamento quanto à prova não significa que o tema seja unanime. De facto, um dos obstáculos que se coloca na aplicação deste Regulamento é quando o meio de prova solicitado não está previsto na legislação nacional do Estado Requerido. Deixo para mais adiante a analise deste problema48.

3.5.NOÇÃO DE "PROCESSO JUDICIAL PENDENTE OU PREVISTO"

O último requisito que decorre do art.º 1 do Regulamento é a necessidade da prova ser utilizada num processo judicial pendente ou previsto. O intuito deste requisito é excluir as actividades instrutórias arbitrárias, traduzidas em simples diligências de investigação. Neste contexto, se a expressão "processo judicial pendente" não levanta qualquer questão, o mesmo já não se pode dizer sobre "processo judicial

previsto".

3.5.1 Produção antecipada de prova e Medidas Cautelares

“Processo judicial previsto" inclui todas as diligências de obtenção de prova antes do início do processo judicial em que as provas vão ser utilizadas. No direito português, a figura da produção antecipada de prova – art. º419º do CPC – é o meio indicado quando há a necessidade de antecipar a produção de prova para um antes do início da acção judicial. Consiste num procedimento de produção de prova prévio ao julgamento quando está em causa o risco de conservação da prova ou grande dificuldade em produzi-la49.

Figura diversa da produção antecipada de prova é o procedimento cautelar probatório. O procedimento cautelar probatório é um processo judicial que está

48 Vide infra cap. 5.1.5.

49 Sobre a figura de produção antecipada de prova, vide FREITAS, José Lebres de e ALEXANDRE, Isabel, in

Referências

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