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Urdindo a teia: as linhas e lógicas de acção na emergência e construção do Agrupamento "vertical" de Escolas de Figueiró dos Vinhos

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO

Urdindo a teia:

as linhas e lógicas de acção na emergência e construção

do Agrupam ento “vertica l” de Escolas

de Figueiró dos Vinhos

Graça Maria Jegundo Simões

Dissertação de Mestrado em Ciências da Educação - Área de Administração Educacional Orientada pelo Professor Doutor Natércio Afonso

(3)

AGRADECIMENTOS:

A todos que em mim se cruzaram, Em mim ficaram

E me fa zem caminhar.

A Figueiró dos Vinhos, que me acolheu os passos. A o Professor N atércio Afonso, que os ajudou afirm ar.

(4)

RESUMO

No quadro do “novo modelo de autonomia, administração e gestão das escolas”, lançado em M aio de 1998, para aplicação a partir do ano lectivo seguinte, configurava-se a possibilidade de constituição de agrupamentos “verticais” de escolas, funcionando como unidades organizacionais, destinadas a dar cumprimento a três objectivos fundamentais: a articulação e sequencialidade curricular do ensino básico, a gestão articulada de recursos e projectos e a descentralização e inserção territorial dos projectos educativos.

Entre as tensões criadas pela crítica e pela pressão da tutela, estes agrupamentos têm vindo a formalizar-se no seio e através de processos muito diferenciados, cujas implicações no sistema e na acção educativa são ainda desconhecidas e muito imprevisíveis.

Através do estudo de caso de um destes agrupamentos, cruzando um eixo vertical diacrónico e um eixo horizontal sincrónico, pretendemos apresentar uma leitura possível de um sistema de acção concreto e das lógicas que comandam as suas dinâmicas, no sentido de ajudar a compreender as potencialidades e limitações desta “matriz”.

Trata-se de um estudo qualitativo, de feição etnográfica, construído a partir dos discursos dos actores, plasmados em registos escritos múltiplos e variados, ou apanhados nas interacções, formais e informais, nos vários momentos seleccionados para observação:

O posicionamento epistemológico é simultaneamente interpretativo e crítico, no sèntido de que se procuram interpretar as lógicas dos actores, mas sem perder de vista as teias mais largas em que se geram, crendo que a compreensão das acções é fundamental numa mudança regulada.

A rede teórica baseia-se na análise política e micropolítica, com suporte nos princípios da acção estratégica, mas ensaiando fúgas da sua lógica relativamente fechada e procurando captar e libertar dimensões específicas do universo educativo português e deste contexto particular. A atenção foca-se no sistema concreto e no campo da sua autonomia, mas sem perder de vista o concreto da teia mais ampla em que se insere.

“Urdindo a teia” foi a metáforà que ocorreu, na articulação simbólica da construção permanente de uma base de segurança e de criatividade, ou seja, na configuração do dilema do controle e da liberdade. Teia tolhedora ou vivificadora, será o resultado das opções possíveis e das decisões tomadas pelos actores, dependendo dos sentidos que encontrem e em que se encontrem. Os resultados do estudo apenas isso deixam concluir, procurando fazer a aproximação e desocultação desses sentidos.

(5)

R É SU M É

Dans le cadre du “nouveau model d'autonom ie, administration et gestion des écoles” qui a été lancé en mai 1998, à appliquer l'année scolaire suivante, a été configuré la possibilité de constitution de groupements “verticaux” des écoles, fonctionnant en tant qu’unités organisationnelles, destinées à accom plir trois objectifs essentiels: l'articulation et la séquence du curriculum de l'enseignem ent élémentaire, la gestion articulée des ressources et des projets et la décentralisation et l'insertion territoriale des projets éducatifs.

Parmi les tensions crées par la critique et par la pression de la tutelle administrative, ces groupements sont parvenus à ce form aliser au sein et à travers des procédures très différentes, dont les conséquences attendues dans le système et dans l'action éducative restent méconnues et très imprévisibles.

Par l'étude de cas d'un de ces groupements, en croisant un axe vertical diachronique et un axe horizontal synchronique, on essaie une lecture possible d'un système d'action concrète et des logiques qui commandent leurs dynamiques, dans le sens d 'aid er à comprendre les potentialités de cette matrice.

Il s’agit d'une recherche qualitative, d ’inspiration ethnographique, construite à partir des discours des acteurs, plasmifiés dans plusieurs et variés registres écrits ou attrapés dans les interactions formelles et informelles, selon les différents moments sélectionnés de l'observation.

Le positionnement épistémologique est à la fois interprétatif et critique, dans le sens ou on recherche à interpréter les logiques des acteurs, mais sans perdre de vue les toiles plus larges dans lesquelles elles se gèrent, car notre croyance va dans le sens que la compréhension des actions est fondamentale dans un changem ent réglé.

Soutenu sur les principes de l'actio n stratégique, le réseau théorique se fond sur l'analyse politique e micropolitique, m ais essayant des fuites de sa logique relativement fermée et cherchant d ’obtenir et de libérer des dimensions spécifiques de l'univers éducatif portugais et de ce contexte particulier. O n focalise l'attention sur le système concret et sur le champ de son autonomie, mais ne. perdant pas de vue le concret de la toile plus étendue dans laquelle il s'insère.

- “Ourdir la toile” a été la métaphore qui est survenue, dans l'articulation symbolique de la construction permanente d’une base de sécurité et de créativité, c'est à dire, la configuration du dilemme du contrôle et de la liberté. Toile engourdie ou vivificatrice, elle sera le résultat des options possibles et des décisions prises par les acteurs, dépendant des sens q u 'ils rencontrent et dans lesquels ils se rencontrent. Les résultats de l'étude ne laissent que conclure cela, en recherchant à faire le rapprochem ent et le dévoilement de ses sens.

(6)

ABSTRACT

Within the framework o f the so-called “new model o f autonomy, administration and management o f schools” initiated in May 1998, it became possible to constitute “vertical” groups o f schools which were to be put into practice by September o f the same year. These groups were intendéd to function as organizational bodies with the following three fundamental objectives: the articulation and curricular organisation o f primary education, the articulated management o f resources and projects and the decentralization and geographical insertion o f educational projects.

Despite the tensions created by the criticisms and pressure from the Ministry, these groups have continued to form, but via very different processes. Therefore what they have been able to achieve is still unknown and very unpredictable. By means o f a case study o f one o f these groups, a vertical diachronic line was crossed with a horizontal synchronic line. The intention is to present a possible interpretation o f a concrete system o f action and o f the logistics which control its dynamics, in order to understand the potential and limitations o f this matrix.

This is a qualitative study, o f an ethnographic nature, which has been built around the discussion o f all actors involved, taken from a variety o f written documentation or from both formal and informal interactions within a myriad o f focused observation.

The epistemological point o f view is simultaneously interpretative and critical in the sense that it seeks to interpret the logic o f those involved, but without losing sight o f “the whole”, because we believe that an understanding o f the actions is fundamental for a regulated change.

The theoretical framework is based upon a political and micropolitical analysis and supported within the principles o f strategic action, while attempting to escape from its relatively closed logic and trying to capture and liberate specific dimensions o f the Portuguese educational system and o f this particular context. The focus o f this study is on the system itself and on its autonomy, but without losing sight o f the whole context.

“Spinning the web” was the metaphor which came to mind, as a means o f articulating in a symbolic way, the dialectic between security and creativity, or rather, the dilemma between control and freedom. Is it a web that traps or liberates? That will be the result o f the possible options and decisions that the actors take, depending on the senses they find and may share. The results o f the study only reach this conclusion by trying to approximate and reveal these senses.

(7)

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ÍNDICE

I - APROXIMAÇÃO . 15

1. A pessoa que investiga... 15

2. Ao problema de investigação... 16

3. Ao objecto de estudo... 17

4. Ao estudo produzido... 18

n - PROBLEMÁTICA... 21

1. Os agrupamentos de escolas no contexto da política educativa... 21

1.1 Planando sobre os princípios... 21

1.1.1. Democracia e modernização... 22

1.1.2. Autonomia e descentralização... 26

1.1.3. Territorialização ... 31

1.2. Mergulhando nas medidas... 43

1.2.1. Escolas Básicas Integradas... 43

1.2.2. Territórios Educativos de Intervenção Prioritária... 47

1.2.3. Agrupamentos de Escolas... 51

1.3. Emergindo nas críticas... 55

2. Os agrupamentos de escolas no contexto das teorias organizacionais... 61

2.1. Da escola ao agrupamento de escolas ... 61

2.2. Burocracia e autonomia... 66

2.3. Estrutura e acção... 70

2.4. Cultura e culturas... 72

2.5. Sistema de acção concreto... 78

2.6. Linhas e lógicas de acção... 81

2.7. Participação e lideranças... 83 2.8. Organizações aprendentes... 89 2.9. Sumário... 91 EH- METODOLOGIA... 93 1. O tipo de investigação... 93 2. O posicionamento epistemológico... 94

3. O problema de investigação e as questões de pesquisa... 97

4. A orientação da pesquisa e o dispositivo de investigação... 100

5. Os eixos de análise e a categorização... 104

(8)

IV- CONTEXTO DO ESTUDO ,... ;... 109

1. O Concelho... 109

2. O Agrupamento de Escolas... 113

V- ESTUDO EMPÍRICO... 117

l aP a rte D inâm icas de aproxim ação... 117

1. De “Escola Integrada” a “Interciclos”... 118

1.1. Integrar recursos... 119

1.2. Integrar alunos... 122

1.3. Integrar docentes... 125

1.4. Integrar o meio... 128

2. Do Centro de Recursos ao Centro de Formação... 129

2.1. Promover o desenvolvimento regional... 132

2.2. M elhorar a actividade docente... 134

3. O Projecto Educativo Concelhio... 136

3.1. Interligar ciclos e escolas...-... 139

3.2. Interligar educação e acção social... 143

3.3. Interligar políticas e actores... 145

4. O PEPT2000 e o “Boa Esperança, Boas Práticas”... 149

4.1. Da legitimação interna da acção à legitimação externa... 150

4.2. Da lógica do supletivo à lógica da interpelação... 153

5. Conclusões... 157

2a P a rte Passos p a ra a form alização... 161

1. Integração na rede de Territórios Educativos de Intervenção P rioritária 161 2. Projecto de Direcção e Gestão Territorial... 163

3. Agrupamento de escolas - primeiros episódios... 166

4. Agrupamento de escolas - desfecho... 168

5. Agrupamento de escolas - reabertura... 170

5.1. O Regulamento Interno... 171

5.2. O Projecto Educativo... 174

5.3. Relação com a Autarquia... 175

6. Conclusões... 176

3a P a rte A acção no contexto do A g ru p am en to ... 179

1. Os planos de acção... 179

1.1. A gestão de recursos... 179

(9)

O

J

1.1.2. 0 financiamento do pré-escolar e 1°CEB... 181

1.1.3. Os docentes... 186 1.1.4. A coordenação... 190 1.1.5. A formação... 193 1.1.6. Pontas e avessos... 195 1.2. A gestão do currículo...:... 197 1.2.1. O projecto curricular... 197

1.2.2. A avaliação dos alunos... 200

1.2.3. A auto-avaliação organizacional... 203

1.2.4. O plano de actividades... 205

1.2.5. Pontas e avessos... 207

1.3. A gestão das fronteiras... 210

1.3.1. A articulação institucional... 210

1.3.2. . O diálogo com o poder local... 213

1.3.3. A incidência local dos currículos... 216

1.3.4. Pontas e avessos ... 219

V.4. Sumário: os planos de acção... 219

2. Os palcos da acção... ;... 223

2.1. O Conselho Executivo... 223

2.2. O Conselho Pedagógico... 230

2.3. As estruturas de orientação educativa... 232

2.3.1. Os Departamentos Curriculares do 2°CEB... 233

2.3.2. O Conselho de Docentes do 10CEB... 234

2.3.3. O Conselho de Docentes do Pré-Escolar... 239

2.4. A Assem bleia... ;... 244

2.5. Sumário: os palcos de acção ... 248

Actores e figurantes... 249 3.1. O M E ... 249 3.2. A A utarquia ... 252 3.3. Os docentes... 253 3.4. Os não-docentes... 257 3.5. Os encarregados de educação ... 259

3.6. Sumário: actores e figurantes... ;... 262

4. As linhas de acção... 263

(10)

4.2. As linhas no currículo... 265

4.3. As linhas nos recursos... 267

4.4. Sumário: as linhas de acção... ... ... 268

5. Os dilemas da acção... 271

5.1. O dilema das fronteiras - entre o “serviço de Estado” e o serviço local.... 272

5.2. O dilema do currículo - entre o nacional e o adaptado... 274

5.3. O dilema dos recursos - entre o equitativo e o diferenciado... 276

5.4. O dilema da participação - entre a regulação e o controle... 277

6. As lógicas de acção... 281

6.1. A lógica burocrática... 282

6.2. A lógica comunitária... 286

6.3. A lógica profissional... 290

7. Sumário: os dilemas e as lógicas... 295

VI- DISTANCIAMENTO... 299

BIBLIOGRAFIA... 305

ANEXOS... 323

Anexo I- Dados referentes à metodologia... 325

Quadro 1- Observação de reuniões... 325

Quadro 2- Visitas e acompanhamento do Conselho Executivo. 325 Quadro 3- Documentação consultada... 326

Quadro 4 - M atriz de categorização... 327

Quadro 5- Exem plo de categorização das notas de campo 329 Anexo II- Dados referentes à caracterização do objecto de estudo 351 Mapas do distrito e do concelho... 351

Quadro 1- Crianças e alunos do Agrupamento em 2001/2002.. 355

Quadro 2- D ocentes do Agrupamento em 2001/2002... 356

Anexo UI- Quadros auxiliares da análise... 357

Quadro 1- Qiiadro-resumo do pro jecto’’Interciclos”... 357

Quadro 2- Evolução das laxas de insucesso e qualidade cb sucesso. 359 Quadro 3- Evolução das taxas de abandono escolar... 359

Quadro 4- Ocupação do Conselho Executivo... 361

Quadro 5- Reuniões do Conselho Pedagógico...:... 365

Quadro 6- Reuniões do Conselho de Docentes- 1°CEB 373 Quadro 7- Reuniões do Conselho de Docentes- Pré-Escolar 377 Quadro 8- Reuniões dos Departamentos do 2°CEB... 379

(11)

ÍN D IC E DE QUADROS E FIG U RA S

Quadro I Da questão de partida às questões de investigação... 99

Quadro H Número de nascimentos registados de 1995 a 2000... 109

Quadro UI Evolução da população activa por sectores de actividade... 110

Quadro IV Dados relativos ao desemprego... 110

Quadro V Estrutura do Projecto Educativo Concelhio... 137

Quadro VI Campos de intervenção e linhas de acção do PEC... 137

Quadro VII ücferanças; exemploscfcfixmasdepaiticjpaç^etípcscfcconversação ... 229

Quadro Vffl As linhas de acção... 263

Quadro IX Dilemas e lógicas de acção... 282

Figura 1 Matriz dos dilemas organizacionais do Agrupamento... 272

LIST A DE SIGLAS M AIS FR E Q U E N T E S: 1- Nas notas de cam po:

A P- Associação de Pais e Encarregados de Educação A P O IO - Núcleo de Apoio Educativo

ASS- Assembleia

CD- Conselho de Docentes do Io Ciclo

C ED - (Conselho de Educadoras)-Conselho de Docentes do Pré-Escolar C EX EC - Conselho Executivo

C P- Conselho Pedagógico

D CEN - Departamento de Ciências Exactas e da Natureza D C SC - Departamento das Ciências Sociais e da Comunicação DEX- Departamento de Expressões

R G - Reunião Geral 2- No corpo do texto:

A SE- Acção Social Escolar C A E- Centro da Á rea Educativa C E - Conselho Executivo

CEB - Ciclo do Ensino Básico

C E C - Conselho de Educação Concelhio

C FA E - Centro de Formação de Associação de Escolas C M - Câmara Municipal •

C P- Conselho Pedagógico C R - Centro de Recursos

DEB- Departamento de Educação Básica

D R EC - Direcção Regional de Educação do .Centro E C A E - Equipa Coordenadora de Apoios Educativos E S E L - Escola Superior de Educação de Leiria IG E - Inspecção Geral de Educação

D E - instituto de Inovação Educacional LBSE- Lei de Bases do Sistema Educativo M E - Ministério da Educação

N EE- Necessidades Educativas Especiais P E C - Projecto Educativo Concelhio P E P T - Programa Educação Para Todos • R I- Regulamento Interno

(12)

I-

APROXIMAÇÃO

1. A pessoa que investiga

Após doze anos de permanência na mesma escola, dez dos quais na sua “gestão”, a natural postura implicada e empreendedora foi sendo abalada por cansaços, mas também por muitas incertezas, sobretudo numa hora em que se partia para uma mudança organizacional que, mais do que nunca, catapultava para o desconhecido. Por outro lado, as experiências de formação vividas haviam deixado sempre um défice de sustentação teórica e uma necessidade de fundamentação, que sempre assomava na hora de fazer propostas ou ajudar a tom ar decisões. A p ráxis sem teoria parecia tão estéril como a teoria sem a práxis - “acção sem reflexão é activismo; reflexão sem acção é verbalismo”(Amiguinho, A., 1982). E este não era sentido apenas como um problema pessoal, mas como um problema organizacional. O voluntarismo pela inovação e pela mudança que se vivia na escola parecia às vezes cego, ou pelo menos míope, na dificuldade de ver os avessos, nos quais se poderiam esconder os fracassos.

A motivação para esta formação foi, assim, tanto por razões de satisfação pessoal como de implicação profissional, na convicção de que poderá reverter em favor do contexto que foi simultaneamente pretexto, objecto e destinatário da investigação. E neste “reverter” não está implícito nenhum contributo gestionário, em jeito de soluções para as incertezas, mas tão só um exemplo de leitura compreensiva e crítica, a seduzir e desafiar um posicionamento colectivo mais reflexivo e autónomo. A investigação foi assim assumida como uma “ forma de ensinar a ver, a desmascarar a realidade”, ou ainda como “processo de formação-acção”, já que se produz o efeito de espelho, no qual, olhando o outro, nos vamos descobrindo a nós mesmos (Serrano, G. P., 2000).

Com isto queremos assumir, não apenas a inevitável subjectividade do estudo produzido, mas também o deliberado comprometimento com o objecto de estudo, embora se pense não ficar nele esgotada a sua pertinência, no contributo exploratório que poderá dar para outras investigações nesta temática. No entanto, há que salientar o esforço e estratégias de distanciamento do objecto, sem as quais teria sido impossível a visão que se adianta. A primeira foi o real e formal desligar da organização durante o período de observação, conseguido com a licença sabática; a segunda foi o processo de desconstrução através da pesquisa bibliográfica e da fundamentação teórica; a terceira foi a relação social que se construiu e geriu durante as observações, como se descreverá mais adiante.

(13)

Do que ficou mais firme em term os pessoais depois deste trabalho, salienta-se a iniciai visão, adquirida pela experiência, de que tudo na escola é organizacional e que o valor de cada “parte” depende da sua coerência com o “todo”. Ficou também mais claro que só. uma liderança transformativa, determinada e capaz de im plicar todos os actores nas decisões, levando-os a questionar e partilhar os sentidos das acções, poderá promover mudanças “de fundo”, de que a primeira é a disposição para mudar. Ficou também mais viva a convicção de que, apesar de todos os espartilhos da “centralização burocrática”, existem nas escolas grandes margens de autonomia por desbravar e reivindicar, sobretudo quando inscritas em redes de “solidariedade activa” com os seus contextos, que dêem sentido e pertinência ao que retoricamente se designa por territorialização das políticas educativas.

A.

2. Ao tem a e problem a de investigação

O tem a do estudo situa-se em redor da questão dos agrupamentos de escolas, regulamentados com e a partir do DL 115-A/98, e da sua repercussão no desenvolvimento de projectos educativos locais, ou seja, na configuração da autonomia das escolas. É um tema que convoca e cruza tanto uma problemática política como organizacional e obriga à reflexão sobre conceitos como, por exemplo, descentralização/descentração, estrutura/acção, uniformização/flexibilização, controle/regulação.

Sendo o ponto de partida, como já referido, a situação concreta experienciada num determinado contexto, a questão de partida delimitou desde logo o campo de interesse aos “agrupamentos verticais”, isto é, àqueles que associam estabelecimentos de ensino de vários níveis de escolaridade, formulada da seguinte forma: de que modo o agrupamento “vertical” de escolas pode promover ou limitar a emergência e desenvolvimento de projectos educativos locais? ‘

Sendo clara a impossibilidade de responder globalmente à questão, pelo menos para já e decorrido tão pouco tempo de aplicação deste “modelo” e, antes de mais, com “os recursos” e objectivos da investigadora, ela própria, a questão, remete para a busca de respostas parciais, localizadas nos contextos concretos, de acordo, aliás, com a noção de “sistema de acção concreto”, hoje tão reconhecida na análise organizacional, e com essa outra de “relatividade” do conhecimento, dependente dos contextos, tão reconhecida genericamente na ciência, sobretudo no campo social.

O problema de investigação foi então dirigido a um “sistema de acção concreto”- “o território escolar” do concelho de Figueiró dos Vinhos, entretanto circunscrito a um agrupamento “vertical” de escolas. E o problema foi assim formulado: quais as linhas e

(14)

lógicas de acção que perspectivam e conduzem as dinâmicas de articulação neste território, antes, durante e depois da formalização do Agrupamento?

Esta projecção da investigação para o passado, instigada primeiro pelo senso comum, construído na experiência, de que a singularidade do contexto era produto de um processo, ou pela formação académica, que treinou o convocar do passado para a compreensão do presente, acabou por encontrar uma justificação teórica intrínseca no seio da “análise estratégica”, que não permite o estabelecimento de rupturas entre a “acção organizada” e a organização em si, num sentido de continuidade dos processos e de infinitude da génese, em ciclos “negociais” de conflito-cooperação-estruturação.

Esta investigação do passado não aparece assim num sentido instrumental, de simples ilustração do contexto do estudo, mas como parte integrante do estudo, na pesquisa da singularidade deste “contexto de acção concreto”, construído na interacção de lógicas que o tempo ajudou a urdir, com permanências e mudanças.

3. Ao objecto de estudo

Este “território escolar”, que compreende sete Jardins de Infancia, dez escolas de l°Ciclo, um a escola de 2o ciclo e um a escola secundária com 3°ciclo, esta última fora do Agrupamento, corresponde à unidade do Concelho de Figueiró dos Vinhos, no norte-interior do Distrito de Leiria.1

O traço da interioridade reflecte-se e define genericamente o contexto sócio-económico e cultural, com evidentes repercussões no desempenho escolar das crianças e jovens, o que terá espoletado, a partir das escolas, dinâmicas dirigidas ao encontro de respostas para as situações mal resolvidas. Como se explicitará mais à frente, estas dinâm icas enquadraram-se num processo continuado, já com mais de dez anos, e foram geridas num a base de articulação entre as escolas, procurando ainda outros parceiros locais, e aproveitando de programas da tutela, como o PEPT2000 e o “Boa Esperança, Boas Práticas5’.

Em 2000/2001 é instalado o Agrupamento “vertical”, que configura tanto elementos de continuidade como de ruptura com essas dinâmicas anteriores, tendo parecido um*-campo propício para o estudo dos aspectos organizacionais no sistema educativo. A sua singularidade não advém de nenhum traço particularmente notório, embora a unidade concelhia e a já longa continuidade das dinâmicas referidas possam sè-Io considerado. Também não se pretende apresentá-io como exemplo de uma realidade educativa e organizacional, embora se deduza a existência de outros contextos similares no País, tendo em conta a predominância do que se

(15)

designa por “interior-rural” e a aplicação simultânea dos normativos gerais emanados da administração central. A sua pertinência assentará,.pois, na singularidade construída a partir de condições não singulares, com o é próprio de qualquer contexto organizacional, que sempre combina traços específicos e com eles constrói uma realidade única.

Já foi referida a relação e ligação da investigadora a este objecto e a justificação da sua pertinência, reiterando-se a vantagem dessa ligação e proximidade para o tipo de estudo produzido, que permitiu não só um a mais fácil equacionação do problema e das questões de pesquisa, mas também um posicionam ento de feição “etnográfica”. Reiteramos ainda a sua pertinência do ponto de vista da produção, ou seja, da visão “meso”, possível contributo para outras análises mais profundas e globais que, por sua vez, contribuam para dar mais luz às opções de política educativa.

4. Ao estudo produzido

Poderemos dizer que o estudo tem muito de exploratório, tanto por ser um campo novo em análise, como pela sua leveza em termos de dispositivo de investigação. O que se apresenta é um estudo de caso, com uma base fortemente descritiva, sobretudo na sua primeira parte, embora com um a direcção interpretativa e crítica, espelhada na própria organização da dissertação.

Nesta organização foi seguido de perto o próprio desenvolvimento do trabalho, com uma entrada pela problemática sugerida pelo tema e direcção das pesquisas bibliográficas e leituras, arrumadas em dois grandes tópicos - as políticas educativas e as teorias organizacionais.

..Depois de um explicitar da metodologia de investigação e de uma breve descrição do contexto do estudo, entra-se no estudo empírico, dividido em três partes, de acordo com os primeiros eixos de pesquisa:

Ia pane: As dinâmicas de aproximação. Aqui se faz um a descrição e análise dos vários projectos locais que em ergiram das escolas a partir de 1991/1992.

2a parte: Os passos para a formalização. Isolados os “momentos críticos” surgidos a propósito de propostas de “institucionalização” da unidade concelhia do sistema educativo, estes são relatados em cinco passos, na tentativa de reconhecer e interpretar as lógicas em confronto.

3a parte: A acção no contexto do Agrupamento. N esta parte trabalham-se as observações recolhidas directam ente no “terreno”, durante o ano lectivo de 2001/2002, primeiro ano de funcionamento pleno dentro da estrutura organizacional de

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. agrupamento. No acom odar dos actores às novas estruturas, ou vice-versa, procuram- se as linhas de acção, os dilemas e as lógicas que se configuram neste sistema de acção concreto, desenhado e vivido entre o seu passado e o seu futuro.

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H- PROBLEMÁTICA

1- Os agrupamentos de escolas no contexto da política educativa

A ancoragem deste primeiro ponto da problemática faz-se a partir do próprio Decreto- Lei 115-A/98, que institui o regime de Autonomia, Administração e Gestão das Escolas, no qual é formulado também o “modelo” dos agrupamentos de escolas, fulcro desta mesma problemática. No entanto, as retrospectivas são inevitáveis, porquanto os princípios nele enunciados são já “históricos”, pelo menos desde a Lei de Bases do Sistema Educativo de

1986, outra das pontas que enquadram a argumentação.

Esta inicia-se com um sobre esses principais princípios veiculados pela retórica

política e “especializada” enr"eflucação, que globalmente poderemos caracterizar como “descentralizadores”, procurando confrontar dilemas e avessos levantados e reflectidos à margem ou em paralelo às disposições normativas, pelos agentes sociais mais activos e com eco de voz, traduzindo “sentires” mais práticos (de que se assume a importância da experiência pessoal), ou mais teóricos, colhidos no labor bibliográfico de fundamentação.

Apresentam-se de seguida “as medidas” políticas de organização do sistema, seleccionadas de acordo com os critérios posteriormente justificados, descrevendo-as criticamente com base em testemunhos também de práticos e teóricos.

Finalmente, e em jeito de conclusão, deixam-se as críticas retrospectivas e prospectivas, baseadas nos processos em curso e nas ainda poucas leituras deles feitas, que, em grande parte, acabam por confluir e coincidir com a leitura própria feita no estudo empírico, mas que deixam também em aberto o lugar para o “diferente”, o campo para a acção e para o fabrico de outros destinos.

1.1. Planando sobre os princípios

«A autonomia das escolas e a descentralização constituem aspectos fundam entais de uma nova organização da educação, com o objectivo de concretizar na vida da escola a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do serviço público de educação.» (Preâmbulo do D.L. II5-A /98 de 4 de Maio)

Neste árranjo sintético de palavras, com que abre um dos diplomas mais conhecidos hoje na esfera educativa, desprendem-se e entrecruzam-se os princípios, mesmo que vestidos de

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fins, que têm sido invocados para legitimar a maioria das medidas de política educativa em Portugal, depois da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n°46/86). “Qualidade do serviço público de educação”, “igualdade de oportunidades” e “democratização” são conceitos tão consensuais no seu valor quão genéricos na sua amplitude. Como princípios, poderão justificar mesmo medidas opostas; como resultados, poderão significar realidades diferentes, dependendo dos indicadores escolhidos para a avaliação. Haverá sempre que ter em conta a diferença entre o ”topus emancipatório”, ou ideia política geral, e o “topus regulatório”, ou efeito prático das decisões (Cortesão, L. et al, 2001). Mas entre um lugar e o outro, estará um campo aberto e complexo de “políticas”, dê que nem sempre são óbvias as ligações a “uma política” e, por isso, fértil para reflexões, que poderão influir no “topus regulatório”.

1.1.1. Democracia e modernização

A realidade portuguesa, tendo as suas especificidades, não deixa de se enquadrar na realidade mais vasta das sociedades ocidentais, simultaneamente seduzidas por imperativos económicos e culpabilizadas pelos seus efeitos nefastos. A educação é apontada como culpada, vitima e salvadora desta desarmonia, o que explica o foco de atenções que nela recai, tanto da parte dos responsáveis políticos como da chamada “sociedade civil” :

* ^

“Nunca tantos deixaram de acreditar na escola. Nimca tantos a desejaram e procuraram.

Nunca tantos a criticaram e nimca, como hoje, foram tão grandes as dúvidas sobre o sentido da sua mudança. ” (Barroso, 2000a:3)

Uma das especificidades da sociedade portuguesa, relativamente aos países mais desenvolvidos da Europa, será o seu carácter “semiperiférico”, que se caracteriza pela descoincidência de um sistema produtivo, que permanece bastante atrasado, e padrões de consumo e aspirações sociais, que se aproximam dos desses países (Santos B. S.,1990). Neste quadro se poderiam explicar os atropelos ou contradições verificados na política educativa, não apenas entre os preâmbulos e as leis e entre estas e a regulamentação das condições para as cumprir, o que já se tomou familiar aos actores educativos, mas também entre os próprios princípios e finalidades:

«Contudo, o que mais nos importa realçar, para tom ar mais compreensível o carácter ambíguo e pouco coerente do discurso oficial, e das medidas em que se traduz, é a

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coexistência entre lógicas distintas e marcadas por profundas contradições que remontam num caso aos anos 60 e 70 ( lógica da "igualdade de oportunidades"), e aos anos 80 e sobretudo 90 (casos da lógica da “qualidade "...)» (Canário,R; Alves,N; Rolo,C.,

2000:143)-Çomo bem explicitam estes autores, teremos uma lógica da “modernização”, subordinada a uma racionalidade económica neoliberal, a par com uma lógica tardia da “democratização”, guiada pela necessidade de acabar a construção da escola de massas. Ou seja, querem fazer-se promessas na “era das incertezas”. Esta dualidade poderá ter disfarçado as opções políticas e mitigado os seus efeitos, deixando a pairar um “contentamento descontente”, que, entretanto, e após um quarto de século de regime democrático, se terá transformado num claro sentimento de descontentamento quanto à situação da educação em Portugal, com diagnósticos vindos de todos os sectores sociais e promovidos pela comunicação social, e que oscilam entre a “desilusão” e a “catástrofe”, no denunciar de uma “crise de soluções” mais grave ainda do que a anterior “crise de problemas” (J. Barroso, 2002).

As reformas ou “experiências inovadoras”, que têm sido lançadas para introduzir mudanças na organização pedagógica da escola, não têm conseguido cumprir as promessas de “igualdade de oportunidades”, mantendo-se níveis elevados de insucesso e de abandono, com as aparentemente fatais regularidades geográficas e sociais. Algumas delas são entendidas como paliativos, que apenas levam ao sucesso simulado, fazendo levantar as vozes dos que se agarram à qualidade, m edida por padrões da “era das certezas”, ou seja, em nome e em defesa das elites. Foi, por exemplo, o caso do regime de avaliação dos alunos, do regime de apoios educativos, dos currículos alternativos. Outras foram entendidas, sobretudo pelos docentes, como diversões ou devaneios de quem não conhece a realidade e a prática educativa. É o caso da “área-escola” e das escolas de “área aberta”. Em bora não possamos generalizar estas posições, porque outras perspectivas vingaram e terão feito as diferenças, no global as mudanças diluíram-se ou não passaram de um “efeito de superfície”. O que faltava então para que se cumprissem? Segundo Barroso (2000b):

«Neste, como em outros domínios, as reformas falharam, não tanto por causa do seu conteúdo, mas p ela sua fo rm a e p ela estratégia de execução.»

A forma era a de medidas avulsas, lançadas em tempos diferentes, de difícil articulação no terreno, sobrepostas numa realidade que não era suposto alterar, mas apenas melhorar. Seriam mudanças de “ Ia ordem”(Watazlawick et al, 1974, referido por Barroso,

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ibid), dirigidas à prática da aula, sem interferir no sentido e modo da organização global, que seriam as mudanças de “2a ordem”.

Quanto à estratégia de execução, seguiram o processo de “ integração normativa”, linear e descendente, separando os que decidem dos que executam, e gerando as chamadas “resistências dos actores”, que numa formulação burocrática são vistas como anomalias, mas que mais não serão do que sistemas de defesa de quem se sente “exterior”, pressionado com mais tarefas, mas alheio aos seus desígnios. M esmo em projectos ministeriais mais recentes, estrategicamente não assumidos como reformas, pelo sentido negativo que se lhe foi associando, como a “Gestão Flexível dos Currículos”, com evolução para a “Reorganização Curricular do Ensino Básico”, embora tenha havido um esforço mais sistemático de aproxim ação' dos actores, começando pelo processo alargado e denominado “Reflexão Participada dos Currículos” e continuando em inúmeros encontros e reuniões com docentes das escolas envolvidas, a participação foi mais do tipo “formal e convergente”, como disse L. Lima (1998), ou ainda na expressão de Touraine, citado pelo mesmo, “uma participação dependente”, qué será uma outra forma de alienação ou de truque para reduzir o conflito social.

Uma das soluções prescritas, aliás, por requisição insistente dos próprios docentes, foi a formação, sobretudo a contínua, mas que, como já provaram muitos estudos, sofreu genericamente do mesmo mal - a exterioridade em relação aos sujeitos e às realidades concretas dos seus contextos de trabalho. E hoje consensual a teoria de que a formação só terá repercussões nas práticas, se for nelas centrada, aliando a reflexão à acção, num processo de se “auto-contar” e questionar. E isto porque:

«A intensificação leva os professores a seguir por atalhos, a economizar esforçosf...) obriga os professores a apoiar-se cada vez mais nos especialistas, a esperar que lhes digam o que fazer, iniciando-se um processo de depreciação da experiência e das capacidades adquiridas ao longo dos anos.(..) Perdem-se competências colectivas à medida que se conquistam competências administrativas. »(Apple <£ Jimgck.,1990, citado p o r N ó vo a , 1992)

E ainda porque:

«Devolver à experiência o lugar que merece na aprendizagem dos conhecimentos necessários à existência ( pessoal, social e profissional), passa pela constatação de que o sujeito constrói o seu saber activamente ao longo do seu percurso de vida. Ninguém se contenta em receber ó saber, como se ele fo sse trazido do exterior pelos que detêm os seus

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segredos formais. A noção de experiência mobiliza uma pedagogia interactiva e dialógica.» (Dominicé, 1990, citado p o r Nóvoa,1992)

Í Em síntese, a democratização e a modernização têm sidoobjectivos perseguidos, mas

não alcançados peias propostas de mudança “diferidas”. Retomando o pensamento de João Barroso, a secular “gramática da escola”, cujo eixo principal é a “classe”, em que se ensina “a todos como se fossem um só”, ainda que beliscada pela urgência de respostas para a crescente heterogeneidade de alunos que chegam às escolas, continua a ser o único padrão de referência, como se assim sempre tivesse sido e como se não pudesse ser de outra forma, quando, afinal, ela resultou de uma evolução racionalizada da organização pedagógica, no final do século XIX, determinada pelo aumento dos que buscavam a escolarização e pela necessidade de lhe associar a fimção de inculcadora de valores e normas sociais (Barroso, J.,

1995).

A rigidez desta organização impedirá a flexibilidade necessária para dar resposta às crescentes e múltiplas funções atribuídas à escola, à diversidade de motivações e de solicitações dos que cham a a si.

«O modelo de escola actualmente existente baseia-se num modo de organização pedagógica que visa a homogeneização dos alunos e a uniformização das práticas educativas, cuja origem remonta à criação da escola pública. A persistência deste modelo é um dos factores essenciais da desadaptação da escola à sua missão de "educação para to d o s”, "promoção do sucesso educativo” e combate à "exclusão escolar.» (Barroso, J., 1998:13)

M as neste inicio de século, a insistência do discurso da “qualidade” tem abafado os ecos das questões da igualdade e da equidade, ou seja, a preocupação com a “modernização” tem vindo a desvalorizar, como se não fossem mais pertinentes, as preocupações com a “democratização”, num alinhar de propostas de cariz neo-liberal. Os apelos à escola vão sobretudo no sentido de a fazer oLhar e dar resposta às solicitações do mundo económico, “produzindo” cidadãos competentes, num ambiente de rigor e disciplina, eficácia e eficiência (Barroso, J., 2002), numa “dem ocracia do consumo” em que os alunos são perspectivados como “objectos” (Bali, S. ; Van Zanten, A., 1998).

O que haverá então a fazer é criar condições para uma mudança de “2a ordem”, em que se questionem as estruturas e os papeis e se redefinam as metas. M as esta será tarefa desmedida e impossível, se não for dimensionada a um nível próximo, numa contextualização real.

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E assim se enuncia uma outra mudança, de ordem não numérica mas geométrica, interceptante das outras duas - a autonomia das escolas e a descentralização.

1.1.2. Autonomia e descentralização

São estes os aspectos fundamentais, referidos no preâmbulo supra citado, para uma “nova organização da educação”. Designando um mesmo fim, porque um implica o outro, como princípios já serão bastante distintos - enquanto a autonomia parte da periferia, a descentralização,parte do_c.entro.^

Em 1986, na Lei de.Bases do Sistema Educativo, a autonomia aparecia como prerrogativa

referida como princípio geral. A criação das Direcções Regionais de Educação e das Coordenações (depois Centros) das Areas Educativas surgem na linha desta desconcentração, mas que terá tido um efeito recentralizador e não descentralizador - o controlo burocrático era agora mais possível com uma estrutura mais próxima e atenta.

“A administração central encontrou nas direcções regionais o modo próprio para retomar o controlo quase absoluto sobre o sistema, que lhe estava a escapar por incapacidade de tudo conduzir a p a rtir do centro. ” (Pinhal, J ; Dinis, L. V, 2002:22)

As “infidelidades normativas”, que permitiam uma “autonom ia relativa”(Lima, L., 1998) às escolas, nas margens ou buracos legislativos, ficavam agora reduzidas, porque além das determinações—centrais, era preciso ter em conta as múltiplas circulares, muitas vezes sobrepondo-se sobre o mesmo assunto, oriundas destes organism os-regionais. E esta, tendência aparece mais forte, à medida que se vão desenhando vontades de institucionalizar a autonomia.

Com a publicação, em 1989, do Decreto-Lei r chamado “da autonomia”, que

institui o Projecto Educativo como a sua concretização, as'escolas são lançadas na empreitada da sua redacção, porque era necessário remetê-lo para as direcções regionais e apresentá-lo nas inspecções, subvertendo-se o próprio conceito de projecto em algo que cristaliza as acções e não em instrumento da sua direcção. A questão era que tudo parecia já dirigido, ou melhor, enformado, por um sistema educativo centralizado, tanto a nivel curricular, como organizacional, como de recursos, que deixava pouca margem de manobra às escolas. Havia que gerir e não que dirigir e, para isso, bastavam os planos de actividades, com o que de facto

2 Capítulo VI da Lei n°46/86 de 14 de O utubro- Administração do sistema educativo

apenas do ensino superior2, mas a descentralização, associada a desconcentração, era já

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se confundiam os projectos educativos, que, ou ficavam “ implícitos” ou “em mosaico”. (Barroso, J., 1992)

«A sensação que fica, após a consulta destes planos, é que eles não servem para gerir a escola no seu conjunto, mas sim para gerir uma espécie de “baldios pedagógicos” que o Estado não quer ou não pod e controlar e que os professores e p or vezes (poucas, infelizmente) os alunos e os p ais resolvem ocupar em beneficio de pequenos projectos colectivos.» (ibid:49)

Para que o projecto educativo fizesse sentido e emergisse como o verdadeiro orientador da acção educativa das escolas, conciliando a dimensão simbólica com a dimensão operatória, eram necessários mais passos rumo à descentralização do sistema e à construção da autonom ia nas escolas.

A descentralização tem vindo a impor-se como um dos aspectos fundamentais da modernização da administração pública, sobretudo nos países de tradição centralizada. A influência das teorias e práticas de gestão muito determinam esta tendência, aplicando-se o princípio de que o poder deve ser^gansfendo^para onde se exerça com mais eficácia. A semelhança do que se verifica no mundo empresarial, são os estados a admitir que o controlo hierárquico característico das burocracias não é compatível com a complexificação dos sistemas e das relações sociais. Uma maior aproximação dos cidadãos, em que estes se sintam clientes, com direito a exprimir a sua satisfação ou insatisfação pelo serviço, e uma implicação mais alargada nas decisões, pulverizando as responsabilidades, poderá conduzir a uma relegitimação da política e do Estado, que terá a função principal de regulador e de avaliador dos resultados dos “contratos sociais”. Se à partida parecem bons princípios democráticos, o desequilíbrio de forças entre os “contratualizantes” - Estado' e cidadãos - obriga a algumas reservas:

«Com efeito, se a acção pública obedece hoje aos princípios do raciocínio gestionário, é preciso perguntarm o-nos qual é o lugar ocupado pelos procedim entos da contratualização no sistema conceptual que impõem as categorias de julgam ento próprias desta form a de raciocínio.» (Ogien, A., 1999:127)

Neste diploma de que partimos para a reflexão - D.L. 115-A/98, ainda no seu preâmbulo, anuncia-se “a figura inovadora dos contratos de autonomia”, já que “a configuração da autonomia determina que se parta das situações concretas, distinguindo os projectos

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educativos e as escolas quê estejam mais aptas a assumir, em grau mais elevado, essa autonomia, cabendo ao Estado a responsabilidade de garantir a compensação exigida pela desigualdade de situações”.

Apesar de definidos os princípios e as fases do processo, o seu arranque fica dependente de uma portaria do Ministério da Educação, que nunca veio a publicar-se, tendo inclusive adormecido a polémica que se gerou então, sobretudo à volta dos princípios “empresariais” que lhe estariam subjacentes. Para M. Sarm ento^l999:35), trata-se de “um pacto simbólico” entre a Administração e as escolas, logo, “um instrumento de mediação entre o projecto educativo da escola e o projecto educacional público prosseguido pelo Estado”, não fazendo sentido considerá-los como um processo de privatização ou de indução de princípios gestionários. Acrescenta ainda que, afinal, a contratualização já é corrente no sistema, como no caso de programas .e concursos; que sè tratará agora apenas de estendê-los a todas as escolas e à globalidade da organização. No entanto, reconhece “a paisagem perturbadora” resultante da condução política dos processos, que não se encaminham para a construção da autonomia, mas' que se traduzem num “simples expediente de transferência de responsabilidades ' da administração estatal para as suas organizações periféricas”. Por exemplo, è referin d ^ apenas dois aspectos em que se traduziria a negociação e transferência de competências-J a gestão flexível do currículo e gestão de um crédito global de horas (artigo 49° do D.L.115-A/98), eles foram, entretanto, regulamentados, naò deixando qualquer margem de negociação, mas apenas de gestão do que por lei é atribuído. Gomo escreveu J. B§roíío (1998b:53):

«...a tentativa de fa zer trnia “mudança sèm sobressaltos’’ levou os responsáveis pelo Ministério a negociarem compromissos (...) que retiraram clareza política às medidas apróvadas(...) : a autonomia da escola deixou de ser uma questão política de fun do e \estruturante do funcionamento do Ministério e das escolas, para se transformar numa

simples mudança morfológica da gestão.»

Os “graus “ das escolas, ou a sua diferenciação por aptidões, referidos neste preâmbulo e depois correspondentes às duas fases de contratualização descritas no articulado, foi dos aspectos mais contestados, por pressupor a aceitação e divulgação de situações de vantagem e desvantagem entre as escolas. Apesar do contra-argúmento de que essa era já a realidade, a também pressuposta possibilidade de “elevação de grau” deixa claros os princípios gestionários que estarão na base desta “nova organização”.

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0 paradigma gestionário também tem dominado as políticas educativas de muitos países, de que.o exemplo mais conhecido é o “School Based M anagem ent” (EUA, Inglaterra, País de Gales, Canadá, Austrália e Nova Zelândia). Sendo associado genericamente a uma forma racionalizada de gestão de recursos pelas escolas, inclui tam bém outros aspectos, que vão da descentralização à participação alargada dos pais nos processos de decisão e à estimulação da concorrência através da livre escolha da escola pelos pais. Os resultados deste movimento não são uniformes, evidentes nem inquestionáveis, apenas confirmando que os factores de “qualidade” da educação são múltiplos e q[ue, mesmo no chamado “efeito-escola”, entram variáveis diversas que dependem muito do seu contexto. Ou seja, não pondo em causa a vantagem de processos técnicos e racionalizados de gestão, é preciso não esquecer que eles não resolvem todos os problemas com que se deparam as escolas e cujas soluções têm que ser consideradas num espectro mais amplo, no qual entra o jogo de inter-relações dos sistemas humanos, ou seja, o aspecto político e não apenas o administrativo.(Barroso, J., 1996b)

Ainda no âmbito da problemática da centralização ou descentralização dos sistemas educativos, e partindo de dados de fontes diversas, relativos aos níveis de êxito medidos pelas qualificações, num grupo de países com tradições culturais e sistemas políticos bem diversos (Green, A., 1999), poderá concluir-se que aquelas variáveis não são directamente relacionáveis cora estes resultados, contrariando a ideia generalizada de que a descentralização aumentará por si a eficácia do sistema escolar. O que aparece mais associado ao êxito educativo nacional será o de uma certa “cultura educativa”, caracterizada por uma grande valorização das aprendizagens pela sociedade:

«As grandes aspirações da maioria são reforçadas p ela maneira como a educação e os sistemas de form ação institucionalizam normas e expectativas p a ra todos (e não só para as elites), bem como p elo modo como os mercados de trabalho recompensam aqueles que tiveram bons resultados na educação e na formação. Para conseguir estas oportunidades, os sistemas têm geralmente que utilizar um determinado número de soluções que actuam de fo rm a a estandardizar certas práticas que, de outro modo, numa situação de mercado sem regras, se tom ariam altamente diferenciadas como resultado de um mercado desigual.» (Green, A., 1999:89)

Esta leitura poderá gerar algum sentimento de impotência, como aquelas que quiseram provar que “a escola não fazia diferença”, uma vez que tudo dependendo de uma cultura de base e de um sistema instalado, dificilmente se farão mudanças. No entanto, partindo do

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princípio de que os produtos sociais são resultados de processos, ficarão sempre em aberto as alternativas que tenham em conta também estas reflexões.

Embora a questão do “mercado em educação” não seja prioritária em Portugal, sobretudo porque não se põe na maior parte do território, onde não há “clientes” para incentivar a concorrência, o papel regulador do Estado é insistentemente defendido e reclamado por muitos “pensadores” da educação e assumido na “letra da lei” , como neste preâmbulo que se tem referido, precisamente em nome da igualdade e qualidade do serviço público, para compensar os possíveis efeitos negativos da “livre iniciativa”.

«O mercado em educação, como analogia racionalizadora, não é válida, porque nem é livre, nem define regras iguais pa ra as liberdades de todos, perante as opções teóricas que po d e apresentar.» (Sacristan, J. G , 2000:55)

. Mas o que parece deduzir-se, neste preâmbulo do D.L. 115-A/98, não são preocupações

com os resultados dos empreendimentos de “um liberalismo selvagem” (Derouet, 1992), mas m ais com a falta de empreendimento de um sistema “fúncionarizado” De qualquer modo, é assumida uma centração neoliberal nos resultados - o “Estado M áxim o” a definir e a avaliar, em bora “M ínimo” a acompanhar e regular (Pacheco, J. A., 2000b), o que na prática se viria a traduzir em “sobra” de regulamentação e “míngua” de regulação, entendida como acompanhamento de processos e aconselhamento.

Entre a centralização burocrática, de onde se parte, e a descentralização da livre iniciativa e do mercado, desenham-se, e alguns vão apontando, possibilidades e alternativas de construção de realidades socialmente mais justas. O conceito de “autonomia construída” encerra essas possibilidades:

«O conceito de autonomia está etimologicamente ligado à ideia de autogoverno, isto é, à faculdade que os indivíduos ( ou as organizações) têm de se regerem p o r regras próprias. Contudo, se a autonomia pressupõe a liberdade ( e capacidade) de decidir, ela não se confunde com a “independência”. (...) A autonomia é, p o r isso, uma maneira de gerir, orientar, as diversas dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram no seu meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis. ” (Barroso, J , 1997:17)

Interdependência, portanto, num equilíbrio de forças conciliador de interesses, em que o administrativo e o social sejam articulados, no quadro de competências definidas e assumidas por todas as partes - assim se operacionalizaria a autonomia. A questão principal estará na

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sintonia dos dois movimentos - ascendente e descendente. Como escreveu Licínio Lima (2000:73):

«Não ê possível admitir uma -desarticulação constante, total ou sistemática, entre o processo de democratização e de autonomia das escolas e a democratização e

descentralização do sistema educativo...»

Este autor, que destaca a prevalência de uma concepção abstractizante de autonomia na política educativa, “enclausurada nos textos” e ausente nas medidas, defende que esperar que a autonomia conquistada pelas escolas leve à descentralização do sistema, é o mesmo que esperar que a descentralização do sistema leve à autonomia; o que será necessário é um processo global que preveja a simultaneidade destas operações.

Para João BWn^so (1998b), é possível recusar tanto o “fatalismo do mercado”, como a “recentralização” do poder do Estado, devolvendo “o sentido cívico e comunitário da escola pública” através da seguinte fórmula: “Poderes locais fortes; escolas fortes; cidadãos participativos e um Estado atento e interveniente”.

1.1.3. T e rrito ria liz aç ã o

JbOC&Ji ^

«A escola, enquanto centro das políticas educativas, tem, assim, de construir a sua autonomia a p artir da comunidade em que se insere, dos seus problem as e potencialidades, contando com uma nova atitude da administração central, regional e local, que possibilite uma melhor resposta aos desafios da mudança. (...) Trata-se de favorecer decisivamente a dimensão local das políticas educativas e a partilha de responsabilidades.» (Preâmbulo do D.L. 115-A/98 de 4 de Maio)

A associação da autonomia da escola com o meio em qué se insere esteve sempre explícita ou implícita nos normativos e orientações, filiados na Lei de Bases, que estabelece como princípio a “sua interligação com a comunidade” , concretizada através de “adequados graus de participação”, tanto dos elementos da comunidade escolar, como das famílias, das autarquias e de outras instituições (Artigo 43°); é referida ainda a “ integração com unitária”, à propósito da necessidade de mecanismos que favoreçam a fixação local dos docentes (Artigo 45°). No entanto, só agora, com o D.L. 115-A/98, é explicitada a-“dimensão local das políticas educativas”, alargando-se ou aprofúndando-se o âmbito dessa associação, requerendo uma

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visâo e uma actuação mais além do que os projectos “mosaico”, ou de animação comunitária, com que as escolas procuravam demonstrar esse esforço de “ligação ao meio”.

Tratando-se de “política educativa”, o conteúdo extravasa a educação e a competência da escola, mesmo com os seus mecanismos de participação alargada. Pressupõe-se, pois, um

n ív e ljie jie g o c ia ç ^ pense a acção educativa de forma global

e articulada com os outros sectores sociais. Pressupõe-se também uma “escola forte” e um poder local forte, com capacidade de negociação com o poder central.

Em outros países, como a França (Derouet, 1998), em que se operou de facto uma descentralização, no campo educativo, primeiro assumiu-se a escola como o pólo, afastada do poder local e, só mais tarde, se redefiniram as competências e se instituiu a territorialização, ficando as escolas sujeitas às autoridades locais e regionais, em círculos mais alargados, conforme o aumento do nível de ensino e o alargamento da área de recrutamento. O compasso de espera teria dado tempo ao poder local para reorganizar as suas estruturas e serviços técnicos, de modo a assumir essas competências no campo educativo. Esta “dependência” foi inicialmente muito contestada sobretudo pelos professores e, embora não estudados completamente os seus efeitos, haverá muitas reservas a considerar. A que desde logo foi posta foi a do-aproveitamento político e da submissão dos interesses educativos aos interesses partidários,- nomeadamente no favorecer das melhores escolas, o que traria mais dividendos eleitorais. Conforme demonstra Derouet, tal não terá acontecido e os maiores investimentos foram feitos tendo em vista a “paz social, a segurança das ruas e a socialização da juventude”, ou seja, abrangendo as escolas com mais problemas, o que, afinal, não deixaria também de ter benefícios eleitorais. Mas a m aior reserva situa-se precisamente nas consequências de desigualdade, geradas pela disparidade das escolas em recursos e em visão:

. «De qualquer forma, uma desigualdade aparece entre as escolas inscritas nas redes

alargadas e as escolas de proximidade. Com a autonomia das escolas, algumas estabelecem relações de amplitude europeia (...) Ao seu lado, outras escolas preparam os seus alunos para qualificações confinadas ao mercado de emprego local e dificilmente transportáveis em

caso'de crise.» (Derouet, J .-L .J 998:29)

O dilema entre a globalização e a territorialização é assim enunciado na contradição entre os princípios e as práticas: só no local se gere a diversidade, mas o resultado, sendo ele mesmo diverso, pode pôr em causa o global. E se os recursos materiais e a assimetria da sua distribuição, que pode, nomeadamente e m . Portugal, deduzir-se das assimetrias socio- económicas e do poder local, podem gerar ou acentuar desigualdade de oportunidades, sendo

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transferidas as responsabilidades de financiamento da educação, como em França, o aspecto dos recursos humanos e da formação e informação também serão um dos factores a considerar. Em França, Derouet (1998:20) fala do sentido depreciativo que é dado a comunidade:

«A ideia de comunidade não existe quase, e, quando existe, é vista como um factor de clausura, opressão dos indivíduos e estreiteza de. espirito. Historicamente, a escola da República construiu-se contra as comimidades locais, que eram dominadas pelos notáveis e pela Igreja.»

Em Portugal, independentemente da evolução dos propósitos políticos e ideológicos, poderá dizer-se, do mesmo modo,- que a escola pública nasceu ’“contra as comunidades”, impondo um a cultura universal “mais elevada”, correctiva de “ignorâncias” e de atavismos. M esmo tendo-se diluído nos últimos anos o preconceito de “provincianismo”, a migração para os grandes centros poderá ter deixado o interior rural sem quadros técnicos e profissionais que participem nas decisões políticas com uma visão actualizada e amplamente esclarecida, ou seja, entregue a “notáveis”, confinados a “mundos pequenos”. Independentemente da amplitude da visão dos responsáveis, em princípio corrigível pela amplitude da participação, haverá sempre o perigo d a redução da escala a que se equacionam os problemas e as soluções, levar a outras dificuldades de gestão e a desperdícios.

Estas serão algumas das razões que explicam as cautelas e hesitações, tanto de teóricos como de políticos, na definição do papel das autarquias neste processo, de “autonomia das escolas”. M esmo reconhecendo-se inevitável e desejável a sua intervenção, ela é concebida no âmbito das parcerias que a escola deve procurar ou no de financiador delegado da

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-Administração. Por exemplo, “nos contratos de autonomi; .L. 115-A/98) figura a

administração municipal como um a das três partes contratualizantes obrigatórias (Artigo 48°),

envolvidos”, aliás, em conformidade com a LBSE (Lei 46/86), que “acaba por integrar os municípios no conjunto das instituições- privadas que colaboram, participam ou préstam serviços educativos- ou seja com um estatuto privado e não um verdadeiro estatuto público^ (Fernandes, A de Sousa, 1996). No mesmo trabalho, este autor traduzirá bem os “desabafos” de muitos autarcas, quando afirma que o sentido da descentralização, no que respeita ao nível autárquico, “não tem passado de-uma metáfora semântica através da qual se tem procurado disfarçar um a transferência de ónus financeiros”(ibid: 116)..

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A não conclusão do processo de transferência de com petências. para as Autarquias, provavelmente perturbado pela polém ica ensombrada da regionalização, contribuirá para este balançar. No entanto, logo no estudo prévio que realizou para o ME, João Barroso (1996a:10), apesar de reconhecer que “o reforço da autonomia da escola não pode ser definido de um modo isolado”, declara que as suas propostas “foram concebidas tendo em conta a situação actual e coniinam-se a um campo de decisão que se entende dever ser preservado para as escolas”. Alerta ainda para uma das perversões tipificada em outros contextos de descentralização, que é a “centralidade que o poder local assume sobre as escolas, colocadas na sua periferia”. Para ele, o Estado deverá partilhar os seus poderes, simultaneamente, com as escolas e as autarquias.

descentralizado, nomeadamente no seu sistema educativo, em que as escolas dependiam de autoridades locais, mas que, n o jm a ljio s anos_oitenta^ iniciou uma orientação inversa, tendo muitas escolas trocado essa dependência local pela central. Paralelamènte, são definidas orientações nacionais, sobretudo no aspecto curricular.

Como escreveu Bem ard Charlot (1994: 27):

. «Estas evoluções inversas levam a pensar que o que está em jo g o na redistribuição do

poder não é administrativo-jurídico, m as releva de lógicas nacionais mais latas.»

Derivando de opções políticas, elas deveriam ser clarificadas e enfrentadas, para evitar derivas e equívocos. No caso português mais pertinente se tom a este alerta, já que tudo parece fazer-se com a urgência da recuperação do atraso, com registos sobrepostos, em medidas que não encaixam, ou em suspenso, em medidas que se não tomam. Como explicita João Barroso (1998a: 34):

«A territorialização é um fenóm eno essencialmente Doliticn e implica um conjunto de opÇÕes que têm p o r pano de fund o um conflito de legitimidades entre o Estado e a Sociedade, entre o público e o privado, entre o interesse comum e os interesses individuais, entre o Central e o Local. »

Para o mesmo autor, a territorialização deveria passar por um processo de “mobilização” das comunidades, sem pôr em causa o papel do Estado na produção de uma identidade nacional e como “instância integradora da coesão social”.

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