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Trabalho Conclusão Curso

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Academic year: 2021

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Wesam Ashour

Identidades, Tradução e Paratradução

em Nur Na Escuridão de Salim Miguel

Florianópolis 2018

Universidade Federal de Santa Catarina

Centro de Comunicação e Expressão

Letras Francês

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Wesam Ashour

Identidades, Tradução e Paratradução

em Nur Na Escuridão de Salim Miguel

Trabalho Conclusão do Curso de Graduação em Letras Francês do Centro de Comunicação e Expressão da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para a obtenção do Título de Bacharel em Letras Francês

Orientadora: Profª. Drª. Luciana Rassier

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2018 Wesam Ashour

Identidades, Tradução e Paratradução

em Nur Na Escuridão de Salim Miguel

Este Trabalho Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título de bacharel em Letras Francês e aprovado em sua forma final pelo Programa

Florianópolis, 09 de Julho de 2018.

________________________ Prof. Dr. Gilles Abes Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

________________________ Prof.ª Dr.ª Luciana Wrege Rassier

Orientadora

Universidade Federal de Santa Catarina

________________________ Prof. Dr. Ronaldo Lima

Universidade Federal de Santa Catarina

________________________ Doutoranda Sheila Cristina dos Santos PGET- Universidade Federal de Santa Catarina

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AGRADECIMENTOS

Esse Trabalho de Conclusão de Curso é o resultado de três anos de conhecimento e aprendizagem. Foi uma longa e gratificante jornada, fundamentada nos valores éticos e morais que me foram ensinados desde cedo por meus familiares. Por isso, agradeço meus pais, irmãos, irmãs e familiares, por todo o apoio moral e emocional, mesmo a uma grande distância.

Agradeço, também, a todos os professores que me guiaram pela jornada acadêmica. Vencer a barreira da língua foi muito difícil, mas todos os professores e servidores fizeram o possível para que eu pudesse aprender e caminhar lado a lado com os meus colegas.

Em especial agradeço à Profa. Dra. Luciana Rassier, minha orientadora, por toda a dedicação e o profundo conhecimento, fundamentais para a realização deste trabalho; também lhe agradeço pela extrema paciência, atenção e tempo dedicado a corrigir minha redação em língua portuguesa, o que me proporcionou um imenso aprendizado: é complexo redigir um trabalho dessa magnitude em uma língua estrangeira.

Aos fiéis amigos que a vida me proporcionou em tão pouco tempo, e aos colegas, sou imensamente grato pelo carinho, apoio e paciência. Longe da minha família, foram vocês que me deram amparo e fizeram parte - uma grande parte - do meu processo de aprendizado na UFSC.

Por fim, quero agradecer ao Brasil, pelo acolhimento dado a um estrangeiro e por me proporcionar a oportunidade de estudar, trabalhar, evoluir e crescer neste lindo país.

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“Tout homme a le droit de partir, c'est son pays qui doit le persuader de rester - quoi qu'en disent les politiques grandiloquents”

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RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso propõe uma reflexão sobre a tradução e a paratradução de Nur na Escuridão (1999), do escritor líbano-brasileiro Salim Miguel (1924-2016), romance que aborda a história de uma família libanesa que migrou para o Brasil em 1927. Após um recapitulativo das ondas de migração do Líbano para o Brasil, apresento as grandes linhas da narrativa literária em questão. Na sequência analiso na tradução desse romance para o árabe, publicada no Líbano em 2013, a partir de quinze trechos do diário do protagonista, intercalados ao relato do narrador. Por fim, proponho a tradução em língua francesa desses quinze trechos.

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RÉSUMÉ

Dans ce travail de fin d’études (Trabalho de Conclusão de Curso) je m’intéresse à la traduction et à la paratraduction de Nur na Escuridão (1999), de l’écrivain libano-brésilien Salim Miguel (1924-2016), un roman qui raconte l’histoire d’une famille libanaise qui migre au Brésil en 1927. Après um bref panorama des vagues de migration du Liban vers le Brésil, je présente les grandes lignes du récit. Ensuite, j’analyse, dans la traduction en arabe de ce roman, publiée au Liban en 2013, quinze extraits du journal du protagoniste, qui sont intercalés au récit du narrateur. Enfin, je propose la traduction de ces quinze extraits en langue française.

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ABSTRACT

This Course Conclusion Work proposes a reflection on the translation and paratranslation of

Nur no Escuridão (1999), by the Lebanese-Brazilian writer Salim Miguel (1924-2016), a

romance that tells the story of a Lebanese family who migrated to the Brazil in 1927. After a recapitulative of the waves of migration from Lebanon to Brazil, I present the main lines of the literary narrative. Next, I analyze the translation into Arabic, published in Lebanon in 2013, from fifteen excerpts from the protagonist's diary, inserted in the story of the narrator. Finally, I propose the French translation of these fifteen excerpts.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Mapa do Líbano...13

Figura 2 - Printscreen com informações sobre a tradução...23

Figura 3 - A contracapa do livro Nur no convite para o lançamento do livro no Líbano...24

Figura 4 - Capas de edições de Nur (português - árabe)...25

Figura 5 - A contracapa do livro de Nur, edição em árabe...26

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 Do Líbano ao Brasil: migrações ... 13

3 Do Brasil ao Líbano: o romance Nur na escuridão ... 17

4 Brasil-Líbano-Brasil: Tradução e Paratradução ... 21

4.1 Análise do paratexto da edição libanesa ... 21

4.2 Análise de tradução de Nur na escuridão em árabe ... 27

4.3 Tradução em francês de trechos de Nur na escuridão: proposta e comentários ... 42

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 55

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1 INTRODUÇÃO

Dentre as disciplinas cursadas no decorrer de minha formação no curso de letras Francês, as cadeiras relacionadas à tradução e à literatura foram as minhas favoritas. Sendo de nacionalidade síria, atuando profissionalmente como professor de inglês e de árabe, e cursando a graduação em Francês, as culturas e as línguas em contato fazem parte de meu percurso pessoal e profissional.

No início da graduação, na disciplina de Literatura Ocidental, apresentei um trabalho sobre o livro Les désorientés (Os desorientados), de Amin Maalouf, um escritor franco-libanês. A obra conta a história de um grupo de amigos que viviam no Líbano e que fugiram para a França, EUA e Brasil quando a guerra civil libanesa começou. O livro aborda a história dos imigrantes e o impacto que a migração causa nas pessoas, mudando suas vidas e suas ideias. No final da graduação, na disciplina Literatura Francesa IV, ministrada pela Profa. Dra. Luciana Rassier em 2017.2, apresentei um trabalho sobre outro livro do mesmo autor, Les identités meurtrières, que também trata de identidades em contexto de migração. Nessa disciplina, estudamos vários textos literários a partir da perspectiva identitária, como por exemplo um romance com elementos autobiográficos de Amélie Nothomb, escritora belga, que nasceu no Japão.

Chegado o momento de refletir sobre a elaboração deste Trabalho de Conclusão de Curso, optei pela redação em língua portuguesa devido a minha condição de estrangeiro no Brasil, pois aprofundar e exercitar a redação acadêmica nesta língua estrangeira seria um grande desafio, mas também a oportunidade de um aprendizado muito útil para uma melhor inserção profissional. Quanto à escolha do objeto de estudo, as questões identitárias me interessavam muito, devido ao meu percurso de vida. Assim, a Profa. Dra. Luciana Rassier sugeriu que eu lesse Nur na escuridão (1999), de Salim Miguel (1924-2016), romance de autor brasileiro nascido no Líbano, que narra a história de uma família libanesa que imigrou para o Brasil em 1927. Ao finalizar a leitura de tal obra, me identifiquei completamente com o assunto, uma vez que a obra relata caso similar ao meu: um imigrante sírio no Brasil. Pude entender os sentimentos daquela família, seu medos e vivências. Além disso, pela proximidade com meu país de origem, pude visitar o Líbano mais de 30 vezes. Assim decidi aprofundar meu estudo nesse livro como objeto de análise de meu Trabalho de Conclusão de Curso.

Várias razões legitimam a escolha desse objeto de estudo: a grade curricular da graduação em letras-Francês também possui disciplinas de literaturas escritas ou traduzidas em língua portuguesa; Salim Miguel foi um dos escritores mais relevantes de Santa Catarina, como atestam vários prêmios recebidos e a indicação de obras suas como leitura obrigatória para o vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina (Nur na escuridão em 2005; Nós em 2017 e 2018); a tradução em árabe desse romance, lançada em 2013, ainda não foi estudada; no âmbito deste

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trabalho, fiz leituras e/ou traduções envolvendo não só minha língua materna (o árabe), como três línguas estrangeiras: francês, português e inglês.

Em um primeiro momento, interesso-me pelas ondas de migração do Líbano para o Brasil, a partir do século XIX. Essas migrações têm números impressionantes: há mais de 12 milhões de libaneses ou descendentes de libaneses que vivem no Brasil - quase o triplo do número de Libaneses que residem no Líbano, conforme reportagem veiculada pelo Globo Reporter (GLOBO.COM, 2017). Em um segundo momento apresento o romance Nur na Escuridão de Salim Miguel, a partir de alguns artigos acadêmicos sobre essa obra.

A seguir, parto dos conceitos de paratexto (Genette, 1982; 2009) e paratradução (Yuste-Frías, 2015) para analisar a tradução para o árabe de Nur na escuridão, intitulada و ًاباهذ ليزاربلا ةروكلا ًابايا, feita por Yussef Mismar. Em Nur existem quinze trechos retirados do diário do protagonista, inseridos no relato do narrador. Eu analiso e a tradução destes trechos do português para árabe. Na sequência, proponho uma primeira versão de tradução desses trechos em língua francesa.

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2 Do Líbano ao Brasil: migrações

O topônimo árabe Loubnan (نانبل) deriva do idioma fenício, “montanha branca”, e faz referência às montanhas do Líbano, algumas das quais permanecem cobertas de neve durante todo o ano (WORLD CULTURE ENCYCLOPEDIA, 2018). Com uma superfície de pouco mais de dez mil quilômetros quadrados, e cerca de 4 milhões de habitantes, esse país se situa no Oriente Médio, tendo fronteira com a Síria ao norte e ao leste; com o Mar Mediterrâneo a oeste; e com a Palestina ao sul, conforme podemos visualizar na figura abaixo:

Figura n° 1: Mapa do Líbano. Fonte: Canal Monde (2018)

Historicamente, caracteriza-se por ser um território de encontro de culturas, como sintetiza o parágrafo de introdução ao verbete Liban da Encyclopédie Larousse on line:

Héritier de la Phénicie, point de convergence des civilisations de la Mésopotamie, de l'Égypte et de la Grèce, le Liban devient romain et byzantin avant d'être conquis par l'islam au milieu du viie siècle. Éternel refuge des minorités, il est constitué d'une mosaïque de communautés religieuses, chrétiennes et musulmanes, et devient, durant les croisades, le siège d'un royaume chrétien, le royaume latin de Jérusalem. L'autorité de l'islam y est rétablie, à la fin du XIIIe siècle, par les Mamelouks d'Égypte (LAROUSSE, 2018).

Os cananeus, primeiros colonizadores do país, falavam uma língua semítica. Na era helenística, além do aramaico, falava-se grego. Posteriormente, o latim tornou-se comum, mas a

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invasão árabe no oitavo século introduziu e assegurou a hegemonia do idioma árabe. Do século 16 até o início do século 20, o território ficou sob o domínio otomano; na década de 1920, iniciou-se o Mandato francês, e, em 1946, após a Segunda Guerra Mundial, a independência tornou-se efetiva. O papel das “escolas francesas” na difusão da língua e da cultura, em consonância com os interesses políticos da França, são o objeto de vários estudos, como a tese de doutorado de Esther Moeller (2011). Atualmente, os libaneses falam árabe embora uma maioria, especialmente os das classes alta e média, fala francês. O inglês tem se tornado cada vez mais importante (WORLD CULTURE ENCYCLOPEDIA, 2018). Portanto, hoje em dia, a língua oficial do Líbano é o árabe, mas o francês e o inglês são amplamente falados.

A natureza da diversidade cultural e histórica do Líbano resulta das diferentes civilizações que influenciaram o país ao longo dos séculos. No caso específico das relações com o Brasil, a figura-chave é a do imperador Dom Pedro II (1825-1891), cuja viagem ao Líbano em 1876 é analisada por estudiosos como Roberto Khatlab (DANIEL, 2015).

A Avenida Brasília é uma grande avenida na cidade libanesa de Kamed Lauz. Kamed al-Lauz não é uma cidade latino-americana, mas é povoada por muçulmanos sunitas no coração do vale de Bekaa, no Líbano, uma região conservadora na fronteira com a Síria. Nesta e em outras cidades libanesas, como Sultan Yaacoub e Ghazze, a maioria da população é composta por “brasilibaneses”, um neologismo que se refere a cidadãos bi-nacionais (MARSI, 2017). Nesses lugares, que podem ser considerados enclaves brasileiros no Líbano, a distância geográfica e cultural entre o mundo árabe e a América Latina é relativizada de maneira radical. De modo análogo, esses indivíduos, cujo percurso de vida se inscreve no contato entre línguas e culturas, tornam fluídas as fronteiras identitárias, cujo processo é semelhante àquele que Amin Maalouf descreve no capítulo inaugural de Les identités meurtrières:

Depuis que j’ai quitté le Liban em 1976 pour m’installer em France, que de fois m’a-t-on demandé, avec les meilleures intentions du monde, si je me sentais « plutôt français » ou « plutôt libanais ». Je réponds invariablement : « L’un et l’autre ! » Non par quelque souci d’équilibre ou d’équité, mais parce qu’en répondant différemment, je mentirais. Ce qui fait que je suis moi-même et pas un autre, c’est que je suis ainsi à la lisière de deux pays, de deux ou trois langues, de plusieurs traditions culturelles. C’est précisément cela qui définit mon identité (MAALOUF, 1999: 07)

A comunidade de libaneses e de descendentes de libaneses no Brasil, que agrupa quase dez milhões de indivíduos, supera a população do Líbano, que tinha 3,5 milhões de habitantes em 2010, chegando a cerca de quatro milhões nos dias de hoje (Comunidade libanesa no Brasil, 2010). Esse fato resulta de décadas de ondas migratórias, a primeira das quais foi liderada pela comunidade cristã libanesa que fugiu do domínio otomano no final do século XIX (MARSI, 2017).

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Em trechos encontrados no site Tayyar referentes ao livro Migração Libanesa: Realidade e

Perspectivas قافآ و عقاو ،ةينانبللا ةرجهلا, de Haytham Juma, Diretor Geral do Ministério de Expatriados, são descritas cinco etapas da migração libanesa, de 1860 até 2002. No entanto, é possível adicionar uma sexta fase, que começou após 2005 e continua até hoje, tendo como principais causas as condições políticas e de segurança e a diminuição das oportunidades de emprego para a juventude libanesa.

A primeira onda de migração aconteceu do século 19 até a Primeira Guerra Mundial, quando muitos libaneses emigraram para os Estados Unidos da América, o Brasil e a Argentina, especialmente após a visita do segundo imperador do Brasil, Dom Pedro II, a Beirute. Outros grupos foram para países como o Egito, o Canadá e a Austrália, Haytham Juma afirma em seu livro:

A primeira fase começa em Jum'a em meados do século XIX e se estende ao início da Primeira Guerra Mundial em 1914. Esta etapa testemunhou o crescimento da emigração do Líbano e da Síria para os Estados Unidos da América, Brasil e Argentina e outra pequena onda para o Egito, composta de intelectuais. Uma terceira onda também chegou ao Canadá, México, Austrália, Nova Zelândia e Senegal na África. Uma das razões para essa migração tem sido a deterioração das condições políticas e econômicas. A notícia do sucesso dos primeiros imigrantes nas Américas ajudou a aumentar a imigração e encorajar os libaneses a partirem para esses países. O número de migrantes do Monte Líbano neste período foi estimado em cerca de 100.000, cerca de um quarto da população do Líbano na época. (JUMA, s.d.)1

Também de acordo com MARSI (2017), o papel de Dom Pedro II que falava o idioma árabe, foi fundamental, pois ele incitou a comunidade cristã libanesa sitiada a buscar fortuna na América Latina. Vale sublinhar que o clima mais exuberante do continente americano era um poderoso fator para os agricultores de Bekaa, sufocados pela economia feudal libanesa.

A segunda onda de migrações foi entre as duas guerras mundiais: destinos como Austrália e Estados Unidos tornaram-se de difícil acesso para os imigrantes, que começaram a imigrar principalmente para a América Latina e a Àfrica Ocidental, segundo Haytham Juma:

A segunda fase durou de 1914 até o final da Segunda Guerra Mundial. Durante a Primeira Guerra Mundial, a fome matou muitos libaneses. Assim como a propagação da peste e a imposição de recrutamento compulsório pelos otomanos. Durante os anos das guerras, o movimento migratório foi interrompido pelo bloqueio naval imposto ao Líbano. Depois que a guerra terminou, os libaneses emigraram após a notícia do enriquecimento rápido dos emigrantes e das oportunidades para uma vida melhor. Os Estados Unidos e a Austrália impuseram restrições de imigração, o que fez com que os migrantes se destinassem à América Latina e à África Ocidental (JUMA, s.d.).

Conforme sublinha Truzzi, o registro oficial da nacionalidade dos migrantes foi durante muito tempo impreciso. Inicialmente, os libaneses e os sírios eram incluídos na categoria “outras

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nacionalidades”, e depois: “Os imigrantes dessa etnia aparecem registrados como turcos (sobretudo até o final da Primeira Guerra Mundial) e depois, ora como Libaneses (a partir de 1920), ora como sírios (a partir de 1922)” (TRUZZI, 1997, p.39).

Já a terceira onda aconteceu entre a Segunda Guerra Mundial e a guerra civil libanesa nos anos 1970. Essa imigração foi principalmente para o Golfo Arábico, Estados Unidos e Austrália. Juma (s.d.) afirma que este movimento cresceu nas décadas de 1960 e 1970, por causa do aumento dos preços, que se deu pelo boom do petróleo. Além disso, os imigrantes libaneses também buscavam uma mudança qualitativa no nível cultural, e, por isso, partiram para esses locais.

Segundo Marsi (2017), após a Segunda Guerra Mundial uma nova onda de migração predominantemente muçulmana deixou o Líbano na esperança de uma vida melhor. Nas décadas que se seguiram, os conflitos que devastaram o país - a guerra civil de 15 anos iniciada em 1975 e a guerra mais curta, mas brutal, com Israel em 2006 - contribuíram a reforçar a crescente comunidade líbano-brasileira.

A quarta onda, que aconteceu durante a guerra civil no Líbano (1975-1990), foi a maior: cerca de 800.000 pessoas deixaram o país, dirigindo-se aos cinco continentes. Haytham Juma (s.d.) comenta que a inflação e baixos salários também foram algumas das razões para que essa migração em massa ocorresse.

Essas razões econômicas foram também as principais razões da quinta onda de migração. Essa fase ocorreu entre o fim da Guerra Civil e a libertação do Líbano, entre 1990 e 2002. Nesse período, o Líbano passou por uma fase de certa estabilidade; porém, a falta de oportunidade de emprego fez com que muitos jovens libaneses buscassem estabilidade financeira e novas oportunidades empregatícias em diversos outros países (JUMA, s.d.) Muitos imigrantes libaneses e sírios, ao chegarem ao Brasil, trabalharam no comércio. No entanto, eles investiram muito na educação de seus filhos; muitos deles tornaram-se advogados, médicos e engenheiros, conforme aponta Oswaldo Truzzi:

Paralelamente à expansão de seus interesses em atividades comerciais e industriais, o acesso de imigrantes e descendentes de sírios e libaneses nas chamadas profissões liberais (advocacia, medicina e engenharia) constituiu a outra alternativa de ascensão sócio-econômica trilhada com bastante êxito por significativas parcelas da colônia (TRUZZI,

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3 Do Brasil ao Líbano: o romance Nur na escuridão

Salim Miguel (1924-2016) nasceu no Líbano e chegou ao Brasil aos três anos de idade. Foi um dos líderes do "Grupo Sul", movimento artístico e literário que modificou o meio cultural de Santa Catarina nas décadas de 1940 e 1950. Além disso, exerceu diversas funções no campo das letras, e foi um dos editores da revista literária carioca Ficção, no fim dos anos 1970. De 1983 a 1996, ocupou cargos de chefia na Editora da UFSC e na fundação cultural de Florianópolis:

Homem de cultura e de ação, homem de palavra e da palavra, Salim Miguel atua desde a década de 1940 escrevendo, lendo, criando projetos, consolidando parcerias. Escritor, jornalista, editor, redator, crítico literário, roteirista, dono de livraria, diretor da Agência Nacional de Santa Catarina e da Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, superintendente da Fundação Cultural Franklin Cascaes, esse respeitado intelectual é múltiplo e uno (RASSIER, 2011, s.p.).

Seu livro de estreia, Velhice e outros contos, foi lançado em 1951. Dentre os mais de trinta livros que publicou, destacam-se os romances A voz submersa (São Paulo: Global, 1984), Primeiro de abril: narrativa da cadeia e Nur na escuridão (Rio de Janeiro: Topbooks, 1999). Este último recebeu prêmios de melhor romance pela Associação Paulista de Críticos de Arte e pela Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo (GLOBAL, 2018).

De acordo com Rassier:

Dentre os escritores brasileiros de origem libanesa mais consagrados (Raduan Nassar, Milton Hatoum e Alberto Moussa), Salim Miguel é o único a ter passado os primeiros anos da infância no Líbano e também o único cuja obra aborda não só a instalação e a vida da família de migrantes no Brasil, mas também trata em detalhe da vida pregressa no Líbano e da viagem até o continente americano [...] (RASSIER, 2015A, p. 420).

Nur na escuridão é uma narrativa ficcional na qual se identificam dados biográficos da

vida do autor. Esse romance conta a história de uma família que migrou do Líbano para o Brasil em 1927, histórias de amor, tristeza, saudades e medo. O casal Yussef e Tamina vivenciam um misto de esperança pela possibilidade de iniciar uma nova vida e de medo desse lugar desconhecido e distante chamado Brasil. Esse romance trata das questões dos imigrantes, de todo o caminho que está cheio de riscos, emoções e esperanças. As dificuldades começam no momento em que as pessoas tomam a decisão de emigrar e

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continuam até o último minuto de suas vidas. O momento em que a família de protagonistas chega ao litoral do Rio de Janeiro é narrado nesses termos:

Tarde, quase noite. A terra cresce, avança, se aproxima. Começa-se a perceber o contorno das praias, pássaros sobrevoam o navio, a água verde-azulada indo-e-vindo torna-se escura, as elevações e depressões dos terrenos se entremostram no lusco-fusco, um miúdo casario, as diferentes tonalidades de verde das árvores, manchadas, de repente, pelo colorido de uma flor que não demora vai se perder na escuridão que rápido se fecha (MIGUEL, 2004, p. 76)

Muitas histórias são contadas sobre as dificuldades de comunicação no começo, pois nem Yussef nem sua esposa, Tamina, falavam português. Como exemplo, podemos tomar o trecho em que Yussef encontra outros libaneses em um boteco:

Comeram uns bolinhos no boteco, tomaram uma pinga e foi preciso esclarecer o que era aquela bebida queimante, pinga, escandindo as sílabas o patrício repita, pin-ga, queria que eles repetissem, extraída da cana-de-açúcar, também chamada caninha, cachaça, aguardente, nada havia de parecido no Líbano, melhor, havia, era uma espécie de arak, sem o tom leitoso, iguais os efeitos para quem não sabia parar. Ali com a pinga, começava a primeira lição de português e de Brasil (MIGUEL, 2004, p. 34)

As diferenças culturais entre o que o patriarca da família, Yussef, viveu no Líbano e o que ele viveu no Brasil são claramente mostradas em Nur. Um exemplo da identidade híbrida desses migrantes é o fato de que Yussef é chamado por diferentes nomes durante a narração da história, dependendo de onde e com quem ele está, conforme aponta Luciana Rassier no artigo "Identidade e imigração em Nur na escuridão, de Salim Miguel":

Ao longo do romance, várias alusões são feitas à maneira pela qual Yussef é chamado, traço identitário revelador da posição que seu interlocutor adota na relação. Assim, já no capítulo inicial, quando Yussef fala a outros libaneses na igreja ortodoxa do Rio de Janeiro, o narrador sublinha que seu nome pode variar: « E tu Yussef (ou José, dependendo do perguntador […]) » (p. 21), « (na igreja o pai volta a ser Yussef) » (p. 23). É em São Pedro de Alcântara que começa a deformação de seu nome para o equivalente em língua portuguesa (Yussef/Josef – p. 98). Ao longo do tempo, os epítetos se multiplicam: seu José, seu Zé, seu Zé Miguel, seu Miguel, seu Zé Gringo, seu Zé Turco, Zé Turco. Até Tamina acaba por interpelá-lo de diferentes maneiras: Yussef, José, e por um nome híbrido, Yusé (p. 181). No entanto, quando ela está preocupada, é em sua língua materna que ela o chama: « (às vezes, entre eles, na intimidade, quando está preocupada, é Yussef) » (p. 123), « a mãe, mais prática, preocupada, costuma repetir: José, precisas cobrar […] um horror as dificuldades, a fome, a miséria, onde vamos parar, Yussef? » (p. 125). (RASSIER, 2011, s.p.)

Durante toda a narrativa, Yussef questiona-se sobre a decisão de migrar, indagando-se indagando-se teria sido ou não a melhor escolha. O romance termina com a morte do patriarca, cercado por sua família. Essa morte representa, de certo modo, o fim do contato com o Líbano

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e com a língua árabe, já que ele era o único na família que ainda dominava o idioma: “Quero ir pra minha bait, minha casa, pra minha terra/Maksuna, por que a tagarrada, emigrar não melhora” (MIGUEL, 2004, p. 255).

Cabe salientar que Salim Miguel escolheu uma palavra em árabe para utilizar no título do romance: Nur, que significa “luz” em português. Sobre esse termo, Ana Cláudia de Oliveira da Silva afirma, em "Oriente/Ocidente: memórias da imigração no relato de Salim Miguel":

Nur, vocábulo árabe que compõe o título e significa luz, será a primeira palavra

aprendida no novo país por Yussef: palavra que jamais esqueceria e [que] lhe abre as portas do novo mundo (p.2). A luz será uma busca constante em meio à escuridão do passado, das memórias incompletas, perdidas no mais fundo do tempo, no escuro abismo (p.15). Esforço empreendido não apenas pelas personagens que rememoram, mas também pelo narrador, que procura, com pertinente monotonia, em busca de uma ilusória eficácia, [...] unir os fios, harmonicamente se possível (p.166) (SILVA, 2011, p.2).

Os capítulos de Nur não estão em ordem cronológica, como Elisângela Brito Martins Pessanha escreve em "O papel da família no processo de integração dos imigrantes libaneses: uma leitura de sua voz e dois irmãos":

Em Nur na escuridão, os elementos autobiográficos se misturam à ficção. O romance não apresenta uma narrativa cronológica, embora comece com a chegada da família ao porto da Praça Mauá, quando o autor tinha três anos de idade. Em várias instâncias de flashback, o narrador relata dados da vida de seus pais no Líbano - o modo como se conheceram; as dificuldades do início do casamento; os motivos da viagem e os problemas enfrentados; os conselhos dos parentes para que desistissem - para só então narrar efetivamente a história da família Miguel no Brasil, a sua passagem por Magé, São Pedro de Alcântara e Biguaçu, até estabelecer-se em Florianópolis. (PESSANHA, 2011, p. 25)

Sendo uma vertente do gênero literário biográfico, ou ainda, um subgênero das biografias, a autobiografia é caracterizada pela narração da própria vida do autor, é uma narração das experiências individuais do autor. Esse gênero literário pode ser definido como: “Narrativa em prosa que uma pessoa real faz de sua própria existência, quando focaliza sua história individual, em particular a história de sua personalidade” (LEJEUNE, 2008, p.14). Ainda, de acordo com Darde (2012), na autobiografia existe a história de uma pessoa, escrita por ela mesma, e focada na formação da identidade do autor.

Um dos recursos que o escritor Salim Miguel utiliza para criar um jogo complexo entre ficção e realidade é a inserção, ao longo do romance, de quinze trechos do diário que o patriarca, Yussef, escreveu em árabe e que foi traduzido para o português após sua morte. É o

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estudo e a tradução desses trechos que me interessam mais especificamente nas próximas partes deste trabalho.

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4 Tradução e Paratradução

No âmbito deste trabalho, parto do princípio que a tradução vai muito além do simples aspecto, ampliando visões de mundo, como afirma Flávia Westphalen: “O processo da tradução, por sua vez, lida com fenômenos culturais e linguísticos diversos, buscando transcender a palavra escrita, captar o não-dito e depois reproduzi-lo na concretude das palavras da língua alvo” (2010, p .333). No que diz respeito à tradução literária, considero-a como um processo criativo. Portanto, a análise que faço da tradução em árabe não se restringe a apontar diferenças ou aspectos que eu consideraria como “erros” da tradução. Meu objetivo é aguçar meu olhar sobre desafios e modificações presentes na tradução para, a partir dessa aprendizagem, trabalhar na tradução desses trechos para a língua francesa.Em uma primeira etapa do estudo da tradução árabe de Nur na escuridão, interessei-me pela análise do paratexto. Esse conceito, desenvolvido por Gérard Genette em Seuils (1987), refere-se a elementos que constituem um livro mas que são externos ao texto literário. O “epitexto” remete a elementos externos ao objeto livro (“privados”, como diários, correspondências ou “públicos”, como entrevistas do autor, artigos acadêmicos ou de imprensa, informações no site da editora, etc) enquanto que o “peritexto” faz parte do objeto livro (título, texto de contracapa, texto de orelha, ilustrações, capa, prefácio, etc). Conforme aponta Rodrigo da Costa Araújo, em resenha da tradução brasileira da obra de Genette, publicada em 2009, com o título de Paratextos editoriais: “Ao delimitar a obra, o paratexto funciona ainda como a sua porta de entrada, estabelecendo a ponte entre um dentro e um fora, mais precisamente, instaurando os acessos ao seu interior, provocando, assim, estranhamentos e descobertas” (ARAÚJO, 2010, p.03). Portanto, os elementos paratextuais podem alterar a recepção de um texto ou sua interpretação pelo público. Yuste-Frías sublinha o papel fundamental da “paratradução”, ou seja, do paratexto nas traduções, que pode influenciar o modo como um novo público percebe a literatura traduzida (2015, p. 322).

4.1 Análise do paratexto da edição libanesa

A editora libanesa "Dar Saer el Mashreq" (قرشملا رئاس راد - Casa de Todo o Oriente) publica livros em árabe, inglês e francês. Em seu site, disponível apenas em árabe, encontram-se as encontram-seguintes informações sobre a tradução de Nur na escuridão. Em uma faixa azul existe a menção “Nossas publicações” seguida da indicação dos três idiomas publicados pela editora

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(árabe, francês e inglês). Logo abaixo, em uma faixa amarela, aparece o título da tradução. A seguir, há uma coluna à direita da tela, com as seguintes rubricas, que traduzo abaixo:

Autor: Salim Miguel.

Biografia do autor: (nada consta) Edição: primeira.

Editora: Saer El Mashreq. (uma linha em branco) Preço: 13 dólares

Um pouco mais abaixo, a palavra هاوحف (“conteúdo”, “resumo”) introduz um curto texto, que traduzo a seguir:

Este é o fim da história de Yussef Meghal, que deixou o Líbano com sua família em 1927 e nunca mais voltou. Seu filho, Salim, escritor e premiado jornalista, acompanhou seu pai na aventura de emigração de Kfar Saron quando tinha três anos de idade. Como seu pai, ele sente nostalgia de suas origens. Depois de sete décadas, Salim Meghal escreve a história da imigração da família para o Brasil e está ansioso para traduzi-la para o árabe e publicá-la no Líbano. Trata-se da saga ou do mito do desenraizamento dos libaneses e de sua nostalgia permanente pela terra dos pais e dos avós.

نانبل هتلئاع عم رداغ يذلا لاغيم فسوي ةياكح ةياهن اهنإ ةنس 1927 زرابلا يفاحصلاو بتاكلا ميلس هنبا اهاور .طق هيلإ دعي ملو ، نم ةرجهلا ةرماغم يف هدلاو قفار يذلاو زئاوجلا نم ديدعلا ىلع زئاحلا ميلس ّنحي ،هيبأ رارغ ىلع .تاونس ثلاث رمعلا نم هلو نوراص رفك ىلإ لاغيم عبس دعب ليزاربلا ىلإ ةلئاعلا ةرجه ةصق بتكيو ،تايادبلا ةغاس اهنإ .نانبل يف اهرشنو ةيبرعلا ىلإ اهتمجرت ىلع صرحيو ،دوقع دادجلأاو ءابلآا ضرأ ىلإ مئادلا مهنينحو نيينانبللا علاتقا ةروطسأ وأ.

(Fonte: site da editora Dar Saer El Mashreq)

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Figura n° 2: Printscreen com informações sobre a tradução. Fonte: site da editora Dar Saer El Mashreq.

O responsável pela tradução dessa obra é o libanês naturalizado brasileiro Youssef H. Mousmar. Nascido na cidade de Hermel em 05/04/1943, o tradutor emigrou para o Brasil no final de 1969. De acordo com sua biografia (BIOGRAFIA, 2018) Youssef realiza traduções juramentadas, dá aulas de árabe e atua em várias organizações culturais líbano-brasileiras. Escreveu também, em 1980, o primeiro dicionário árabe-português/ português-árabe.

Na pesquisa em sites em língua portuguesa, há informações esparsas mas relevantes sobre o lançamento da edição libanesa de Nur na escuridão. Assim, em “Salim Miguel publica livro no Líbano”, publicado no site das Agência de Notícias Brasil-Árabe, o próprio escritor líbano-catarinense indica que a publicação foi possível graças à articulação feita por Roberto Khatlab, diretor do Centro de Estudos e Culturas da América Latina da Universidade Saint-Esprit de Kaslik (DANIEL, 2013). Outro dado que deve ser destacado é que a tradução recebeu bolsa de apoio do Ministério da Cultura através da Fundação Biblioteca Nacional do Brasil – sendo que poucos são os países de língua árabe contemplados com esse incentivo, conforme afirma Isaura Daniel em “Mais tradução de livros brasileiros para o exterior” (2011).

O lançamento da edição libanesa aconteceu em 07 de março de 2013, durante a Feira do Livro Libanês, evento anual, em Antelias سايلطنأ, localidade próxima a Beirute. No convite, reproduzido no blog do crítico de música Antônio Carlos Miguel, filho de Salim Miguel, o nome do tradutor aparece na imagem da capa do livro, conforme imagem abaixo:

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Salim Miguel

El koura el Brasil Ida e Volta

Romance

Traduzido do Português por Youssef H. Mousmar

Dar Saer El Mashreq

Figura n° 3: A contracapa do livro Nur no convite para o lançamento do livro no Líbano. Fonte: Blog de Antônio Carlos Miguel (2013).

Mas na capa da tradução, não consta o nome do tradutor.

A capa da edição original em português apresenta, na parte superior, desenhos em estilo oriental, e, na parte inferior, uma fotografia em preto e branco do porto do Rio de Janeiro, que remete à época da chegada da família de protagonistas ao Brasil. Já a capa da tradução em árabe traz à direita a figura do Cristo Redentor, mundialmente conhecida e associada ao Brasil e ao Rio de Janeiro, e, à esquerda, ruínas de uma construção antiga, como podemos constatar nas imagens abaixo:

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Figura n° 4: Capas de edições de Nur (português - árabe).

Fonte: Miguel (2004), Migal (2013).

O título em árabe não é a tradução de Nur na escuridão. É " ًابايا و ًاباهذ ليزاربلا ةروكلا" que significa em português "El Koura, o Brasil, ida e volta", indicando claramente que o livro é sobre migração. Optei por traduzir a palavra “ ًابايا ” por volta, e não por “retorno”, pois ًابايا é a expressão empregada para designar percursos de “ida e volta” em viagens.

No processo de tradução, os editores desempenham um grande papel na mudança de alguns aspectos, dependendo do público que desejam alcançar, ou do objetivo de escolher alguns escritores específicos e livros específicos para serem traduzidos, especialmente quando a questão é a capa do livro e o título. Esses elementos paratextuais são uma chave fundamental para indicar ao leitor de que tipo de livro se trata. No verbete Tradução de

Viagens, Deslocamentos, Espaços (2016), Lilian De Paula comenta que as modificações dos

títulos de livros correspondem à intenção de “Adaptar para melhor agradar e informar (2016, p.322). Isso é o que podemos ver na tradução árabe do romance Nur na escuridão. O título - "El Koura, O Brasil, Ida e Volta" . ًابايا و ًاباهذ ليزاربلا ةروكلا - foi completamente modificado, e indica o nome do país de destino, "Brasil", e o nome de uma famosa região libanesa, de onde a família de personagens é originária.

Na capa do livro em árabe há o nome do escritor Salim Miguel no topo, em letras brancas; mais abaixo, em letras vermelhas e maiores, o título. Mais abaixo, em letras menores,

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o gênero “romance”. Na parte inferior da capa, são indicados os prêmios “Prêmio Zaffari &

Bourbon & Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA)”.

Já na contracapa, há dois textos em árabe e uma foto de Salim Miguel. O primeiro texto é retirado do último capítulo do livro (XXX - Sementes), que narra o delírio de Yussef, pouco antes de morrer, no qual o patriarca mistura passado e presente, e os idiomas árabe e português

[...] geme, chama, treme-lhe a voz, oms, oms, quer a mãe perto, qual, a mulher, Tamina, ou aquela mãe de quem tão pouco fala. Chama pelas duas? Mistura palavras de português e árabe, diz: quero ir pra minha bait, minha casa, pra minha terra/Maksuna, por que a tagarrada, emigrar não melhora ... se perde, cala um tempo [...] e de repente eia uma única palavra que repetia, garib, repetindo-a para todos que vinham visitá-lo nos últimos tempos, dizia para os filhos, para amigos e parentes, por mais que a pessoa lute por se adaptar, ela continua, mesmo sem querer, ás vezes sentindo-se estrangeira, logo recua, envergonhado, não, garib como, se aqui é minha querida maksuna? (Miguel, 2004, p. 255)

Figura n° 5: A contracapa do livro de Nur, edição em árabe.

Fonte: Migal (2013).

O segundo texto a mesma apresentação do livro que consta no site da editora, conforme evoquei anteriormente.

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4.2 Análise de tradução de Nur na escuridão em árabe

A fim de definir o objeto exato deste trabalho, eu li na íntegra o romance Nur na

escuridão em português e também sua tradução. Depois, efetuei uma releitura cotejando,

parágrafo a parágrafo, as duas narrativas. Percebi que alguns trechos não foram traduzidos, sendo o exemplo mais relevante o capítulo "Biguaçu", que foi suprimido na edição libanesa. Esse título remete a um vilarejo próximo a Florianópolis, onde a família de libaneses se instala durante certo tempo. Sobre a importância desse capítulo, Rassier comenta:

Ainsi, le toponyme Biguaçu, en lettres capitales, figure-t-il dans le titre du chapitre dix-huit, lequel s’ouvre sur un bref paragraphe de synthèse : « 1932/1943 : em Biguaçu. A família aumenta. Os filhos crescem. Tempo de definição de vida. Período conturbado. No Estado. No país. No mundo » (MIGUEL, 2004, p. 109). S’ensuit un paragraphe unique qui s’étend sur trois pages et qui porte sur les habitants, les anecdotes, les lieux et la topographie du village. Le lien très étroit entre Biguaçu et l’identité de la famille de migrants est ensuite mis en évidence dans ces deux phrases : « Nesta Biguaçu, mítica e real, se fixou a família. Se formou a família. Biguaçu passou a ser a terra dos Miguéis » (MIGUEL, 2004, p. 112). En effet, l’univers de ce village fait l’objet de deux chapitres qui correspondent à presque un tiers du roman. « Fios » est constitué par une suite de dix-neuf histoires courtes, commençant toutes par la même expression (« Nítida a cena »). Le chapitre suivant, « Perfis » présente neuf fragments numérotés dont les titres renvoient à des habitants de Biguaçu,[…] (RASSIER, 2015 B, p. 161).

No romance em português, vocábulos em árabe mostram a ligação de Yussef ao passado. Ana Maria Lisboa de Mello escreve em "Memórias e Traços Identitários em Nur na

Escuridão":

No momento da morte de Yussef, a língua materna, o árabe, torna-se quase tão presente quanto no momento de sua chegada ao Brasil e os primeiros anos de vida longe de sua terra. [...] sente-se até um garib, um estrangeiro, apesar de todo tempo vivido no Brasil, mas foi incorporando à sua identidade a cultura de acolhida, da Biguaçu onde fez amigos. [...] A rememoração do passado, quando efetuada oralmente pelo pai ou em excertos de sua autobiografa, traz consigo os sentimentos do imigrante apartado de sua terra e o estranhamento experimentado nos seus deslocamentos pelo país de destino. No romance, os vocábulos árabes são os que melhor que expressam sentimentos pungentes e indeléveis, próprios da condição dos que vivem em um entre lugar cultural (MELLO, 2014, p.180).

Não há indicação na tradução de que algumas palavras estão em árabe na edição brasileira. A tradução de alguns elementos da cultura brasileira também merece nossa atenção, como a palavra “pinga”, que é traduzida para o árabe diretamente como “arak brasileiro”. (MIGUEL, 2004, p.35).

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Analisei, no romance em português e na tradução em árabe, os quinze trechos em que o diário de Yussef aparece. Observei modificações no registro da língua e no vocabulário; o alongamentos das frases em árabe; a transformação de trechos em discurso e/ou indireto, etc. Nos quadros de análise a seguir, justaponho o trecho em português e a sua tradução em árabe, e comento os aspectos que me pareceram mais relevantes.

Trecho 1 (Capítulo II - Abrigo): “Um homem abriu a porta, perguntou, em árabe, o que desejava. Gostaria, por favor, que me indique uma pousada onde possa passar a noite, pois chegamos hoje de viagem e não conhecemos a língua daqui – respondi-lhe. De que parte você é e qual seu nome? Sou de sua cidade e seu parente – respondi,

lhe dizendo meu nome. Ele então

efusivamente, abraçou-me, dizendo: seja bem-vindo, entra, entra, está em sua casa. Perdão, meu parente, mas não estou só. Minha família está comigo. Onde estão? Naquele carro. Ele chamou o motorista, dizendo-lhe que trouxesse o veículo até perto da entrada. Minha esposa, meus filhos e

meu cunhado desceram e nosso parente

pagou a corrida. Entramos em sua casa, ele chamou pela esposa e filhos para nos apresentar. Também a família nos deu boas-vindas” (MIGUEL, 2004, p. 29)2 ةغللاب لاؤسلا اذه يل ًاهجوم لجر بابلا حتف و" ىلع ينلدت نأ كلضف نم ديرأ :هتبجأف ؟بغرت اذام :ةيبرعلا نم مويلا انلصو اننلأ ,ةليللا هذه هيف يضقأ نأ نكمي لزن .دلابلا ةغل فرعن لا و رفسلا نم انأ هتبجأ ؟كمسا امو ؟تنأ دلاب يأ نم :لاق أ نأ لبق و .كبراقأ دحأ و كتدلب لجرلا ينقناع ,يمسا لوق يف تنأ ,لخدأ ,لخدأ !كب ابحرم :لاق و ةمراع ةرارحب دقل ,يدحو تسل انأف يبيرق اي يل حمسا :هل تلقف !كتيب .يترسأ عم تيتأ كلت يف اهنإ :تلقف ؟نلآا كترسأ يه نيأ و :لاق كترايسب مدقت :هل لاق و قئاسلا ىدان اهدنع .كانه ةرايسلا .لخدملا باب ىتح أ و ,فراعتلا أدب و ,ةرايسلا نم عيمجلا لزن لخدملا مام و يدلاوأ و يتجوز هل تمدقف يمع نبا ,يتجوز قيقش ,فارصنلااب قئاسلا رمأ و ةرايسلا ةرجأ انبيرق عفد اهدعب و هتجوز ىعدتسا و ,هلزنم ىلا ًاعيمج انلخد و انب بحر مث ترسأ انب تبحرف ,نيتلئاعلا نيب فراعت ءاقل ناك و هءانبأ ه "بيحرت لمجأ (MIGAL, 2013, p. 36)

Em português há um único parágrafo, mas em árabe há frases com recuo. As palavras sublinhadas em árabe são expressões que indicam o discurso indireto: “ele disse:, eu disse, etc.”. Em português, diz-se que ele veio com sua esposa, filhos e cunhado. Em árabe há

2 Nas citações, o grifo é meu.

(29)

um detalhe adicional: seu cunhado é seu primo (em árabe, ele é o filho do irmão de seu pai, especificamente).

Na tradução árabe, observamos que o verbo está conjugado no modo imperativo (“entra, entra”). Em árabe, o verbo está conjugado no presente. لخدأ

Trecho 2 (IV. Conhecer):

“De manhã, meu parente quis saber mais notícias da terra natal. Depois do desjejum, convidou-me a ir com ele aos correios e telégrafos, onde enviou um telegrama á minha irmã. Pedi-lhe, então, que fosse comigo até a Alfandega, para trazermos a bagagem que eu havia deixando no depósito” (MIGUEL, 2004, p.39) ديزملا ةفرعم يبيرق دارأ دغلا حابص يف" نم .نطولا رابخأ و ديربلا بتكم ىلإ هتقفرب باهذلل يناعد روطفلا دعب بهذي نأ هنم تبلطف .يتقيقش ىلإ ةيقرب لسرأ يك فارغلتلا رامجلا بتكم ىلإ يعم يف كانه اهتكرت ةبيقح بلجل ك "عدوتسملا (MIGAL, 2013, p.47)

Aqui podemos ver claramente que em árabe temos três frases longas, enquanto podemos ver muitas nove frases curtas em português. Em árabe, existem alguns erros ortográficos نم.

Trecho 3 (V. Gente)

“No terceiro dia, minha irmã veio ver-nos e levar-nos para sua casa. Indescritível sua alegria ao encontrar-nos. Beijava-me e à

minha esposa e às crianças. Sentava-se

alguns segundos, para voltar a levantar e afogar-nos com seus beijos. Que irmã afetuosa, sensível e amorosa! Arrumamos nossas coisas, agradecemos tudo que

haviam feito por nós e nos despedimos,

indo para a estação do trem, onde adquirimos os bilhetes” (MIGUEL, 2004, p.41) .اهتيب ىلإ انتذخأ و انتيؤرل يتخأ تءاج ثلاثلا مويلا يف" ينتلبق .انب تقتلا امدنع فصوت لا اهتحرف تناك ةرارحب و تداع و تماق مث ناوث عضبل تسلج يلافطأ و يتجوز تلبق !ةبحم و ةنونح ةقيقش نم اهل اي .ديدج نم انليبقت و انقانعل نيذلا لزنملا باحصأ انركش و انضارغأ انبضو اونسحأ انلابقتسا .انعم هولعف ام لك انريدقت نع مهل انلعأ و مث انبهذ و مهانعدو يتقيقش ةقفرب انهجتا و راطقلا ةطحم ىلإ "ركاذتلا ءارش زكرم ىلإ ةرشابم (MIGAL, 2013, p. 49)

(30)

No trecho “Beijava-me e à minha esposa e às crianças”, na tradução árabe há mais uma palavra descrevendo esse beijo como um beijo mais carinhoso - que em árabe se diz um beijo “quente” ةرارحب. Na tradução árabe há mais duas frases que não estão no livro original em português: é indicado que Yussef e sua família foram para a estação de trem com a irmã

dele “يتقيقش ةقفرب”, e também que eles agradeceram à família por tê-los recebido e por tudo

o que fizeram por eles “انعم هولعف ام لك انريدقت نع مهل انلعأ و”

Trecho 4 (VI. Amor):

“Larguei meus amigos e os folguedos e corri para casa, que ficava bem próxima de onde eu brincava. Quando me acercava da porta da entrada vi, junto a ela, duas mulheres

paradas, uma de cada lado e, no meio, uma menina pequena, a qual tinha nas mãos uma carta que lia com toda correção.

Estaquei e fiquei ouvindo sua leitura escorreita, sua voz suave e maviosa. Quando aquela voz soou em meus ouvidos, senti como se uma corrente elétrica percorresse

todo meu corpo. Acometeu-me um

estremecimento e as batidas do meu coração se aceleraram. Quanto mais ela se aprofundava na leitura e eu em ouvi-la, mais aumentava o ritmo das minhas pulsações. Magra, cútis morena, olhos cor de mel, nos quais resplandecia a luz da inteligência. O cabelo castanho caía-lhe pelos ombros, cobrindo-lhe as costas até a cintura. A beleza fulgurava em seu rosto. O pescoço assemelhava-se ao de uma gazela ligeira” (MIGUEL, 2004, p. 45) تضكر و مهعم وهلأ تنك نيذلا يبارتأ تكرت" .هيف بعلأ تنك يذلا بيرقلا لزنملا وحن ىلإ تلصو امل و ةاتف لمهنيب و نيتفقاو نيتأرما همامأ تيأر يماملأا بابلا اهحراوج لكب اهأرقت ةلاسر اهدي يف ةريغص و تفقوت . اهتوص ذخأف ,ةئداهلا ىحضاولا اهتئارق ىلإ يصأ تحر عمسم يف باسني لغلغت ًايئابرهك ًارايت نأ ول امك رعشأف ,ي و ,دولا و فطعلاب غاط روعش ينباتنا دقل .يمسج ءاجنأ يف .ةءارقلا يف تنعمأ املك عراستت يبلق تاقد تحار نيتللا نينيعلا ةيلسع ,ةرشبلا ءامس ,ةقيقر ةاتف ءاكذلا رون امهنم عشي ىلع ىلدتي معان يئانتسك رعش و , هرهظ يطغي و اهيفتك لامجلا ناك .اهرصخ ىلإ لصيل ا هبشي معان قنع قوف عفترملا اههجو نم خفطي لازغ قنع فيطل ". (MIGAL, 2013, p.53)

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No romance em português, o personagem-narrador dá destaque à menina, enquanto que a tradução árabe é mais descritiva, sem emoções, o que seria em português: "quando cheguei vi duas mulheres com uma menina lendo uma carta" تيأر يماملأا بابلا ىلإ تلصو امل و

اهحراوج لكب اهأرقت ةلاسر اهدي يف ةريغص ةاتف لمهنيب و نيتفقاو نيتأرما همامأ. A descrição dos “olhos cor

de mel” foi traduzida para o árabe literalmente, o que não faz sentido. A descrição da menina em português é toda escrita no passado, enquanto o tempo presente é usado na tradução árabe. A metáfora utilizada para comparar o pescoço da menina ao de “uma gazela ligeira” foi traduzida para o árabe como " uma gazela gentil", o que não faz sentido. Como em outros trechos, as frases em árabe mais são longas do que as frases em português.

Trecho 5 (VII. Nome):

“Acho que quem ler isto me acusará de mentir ou exagerar.

Mas volto a jurar, por tudo que é mais sagrado, que tudo se passou exatamente dessa forma.

Três meses após nosso casamento, um feriado depois do almoço, coloquei meu travesseiro sobre a esteira no meio da casa e recostei-me para fazer a sesta. O sono venceu-me e dormi. Sonhei.

Vi um ancião venerável entrar em minha casa. Sua idade, cerca de oitenta anos. Alto e elegante, o rosto fulgurava como de um jovem. Tinha uma barba alva como a neve do Líbano. O aspecto era de um Santo. Chamou-me pelo noChamou-me:

Yussef!

Que desejais, senhor?

Tua esposa está grávida e dará a luz a um menino, ao qual chamarás Salim.

E depois de um breve silencio:

وأ بذكلاب ينمهتي فوس اذه أرقي نم نأ دقتعأ" اذه لك نأ سدقم وه ام لكب مسقأ و دوعأ ينكل .ةغلابملا ىلع رهشأ ةثلاث دعب :طبضلاب لكشلا اذهب و ًلاعف لصح تعضو ,ءادغلا لوانت دعب و ةلطع موي يف و ,انفافز اهيلع تيقلتسا و تيبلا طسو يف ةريصح ىلع يتداسو تف ,ًلايلق حيرتسلأ ملحلا يف تيأر و .توفغ و مونلا يلع بلغ ناك .يلزنم لخدي راقولا حملام هيلع رهظت ًازوجع ًلاجر جهوتم هنكل هرمع نم نينامثلا يف هنأك ,ًاقينأ و ةماقلا ليوط جلثك ءاضيب هتيحل نأ عم ,بابشلا زع يف ىتف هنأك هجولا ,سيدقك يل ادبف ,نانبل يندان :ًلائاق يمساب !فسوي غرت اذام ؟يديس اي ب و ًايبص دلتس و لماح كتجوز هيدانتس مساب :لاق و هملاك دواع ,ليوط تمص دعب و !ميلس ,سنت لا مس !ميلس لفطلا اهنيح و ,هسفن رملأا ررك و داع جورخلاب مه امدنع و و .ءاوهلا يف قبعت روخب ةحئار قشنتسأ يننأك ترعش ملحلا كلذ يتجوز ىلع تصصق مونلا نم تظقيتسا امدنع تيور نيموي دعب و .ملح درجم هنإ يل تلاق و تكحضف رظتنن انعد(( :هل لوقأ انأ و ردنكسا يراجل ملحلا ةصق

(32)

Não te esqueças. Chama o menino de Salim. E quando ia partir, voltou a lembrar-me. Quando saiu, aspirei e senti como se o perfume do incenso permeasse o ar.

Ao acordar contei o sonho a minha esposa, que riu, dizendo-me que era apenas um sonho.

Dias depois contei meu sonho ao meu vizinho Iskandar e lhe disse:

Vamos aguardar para ver se se concretiza” (MIGUEL, 2004, p. 50)

"))!ًلاعف ققحتيس كلذ ناك اذإ ىرنل (MIGAL, 2013, p.60)

Como em outros trechos, as frases em árabe são mais longas do que as frases em português. Podemos ver que em português o verbo “contar” é utilizado duas vezes, enquanto que na tradução árabe há sinônimos. Na frase “ao qual chamarás Salim”, em português é usado o verbo ''chamar'' para dar nome a um bebê recém-nascido, enquanto em árabe há um verbo específico para dizer isso, mas o tradutor traduziu o verbo ''chamar'' literalmente هيدانتس , مس

Trecho 6 (IX. Partida):

“Para que país tem a intenção de viajar? – inquiriu.

Para o México.

A entrada naquele país é muito difícil, para quem tem qualquer problema de inflamação na vista. Devo avisá-lo de que, em lá chegando e sendo examinado por um médico governamental, se o diagnóstico for alguma doença ocular, principalmente inflamação, sua entrada será impedida pelo governo, que o deportará no mesmo navio em que fez a travessia” (MIGUEL, 2004, p. 58). دلب يأ ىلإ" يونت ىلإ :باوجلا ؟رفسلا !كيسكملا يناعي صخش يأ ىلع ًادج بعص دلبلا كلذ ىلإ لوخدلا نإ يف نكمتي نم نأ كلذك فارتعلاا بجي و .هينيع يف ةلكشم دي ىلع ًايمسر هصحف ةداعإ نم دب لا كانه ىلإ لوصولا عنمي نينيعلا يف ًاضرم بيبطلا فشتكا اذإف ,يموكح بيبط لا ىلع هتدوعب رمأي و دلابلا ىلإ باصملا لوخد ةنيفس "اهسفن (MIGAL, 2013, p.69)

(33)

Na pergunta “Para que país tem a intenção de viajar?”, em árabe o tradutor usou um verbo que significa em português “pretender”يونت . O trecho “principalmente inflamação”

não é traduzido.

Na tradução árabe, uma passagem que não pertence ao diário de Yussef, e que está no corpo da narrativa, é anexada a esse trecho do diário: ( تناك كيسكملا ىلا رفسلا نم ةياغلا نأ ةقيقحلا

لا هاجتاب رفسلا ةهجو رييغت نم دبلا ناك ،كلذب حيرصتلا نكمي لا هنأ امب نكل و ،ةدحتملا تايلاولا ىلا روبعلل ةنيفسلا رحبت .ليزارب

ءاقدصلأا و لهلأا اهب موقيس يتلا عادولا مسارم متت نأ دعب ةيردنكسلاا هاجتا يف توريب نم.), o que corresponde à seguinte passagem: “O destino nem era o México. Pelo México, chegar aos Estados Unidos. Só que tal explicação nem podia ser dita. Solução: Brasil. O navio partia de Beirute. A primeira parada em Alexandria. A despedida dos parentes e amigos é assim relatada” (MIGUEL, 2004, p. 59). Essa passagem aparece entre o sexto e o sétimo trechos do diário de Yussef. Na edição libanesa, esses dois trechos são apresentados em um único, já que tal transição é inserida entre eles, como se fosse parte do diário.

Trecho 7 (IX. Partida):

“No outro dia, todos parentes e amigos já tinham conhecimento data e horário de nossa viagem. Reuniram-se para as despedidas. Ah, que instante de majestade, aquele da despedida! A pessoa dá adeus aos familiares, parentes, amigos, vizinhos; às casas, aos solos, às pedras, ao céu, à água, a tudo aquilo a que se afeiçoou na mocidade. Nasceu, cresceu, desabrochou, tendo sempre ante os olhos a sua visão, sempre aspirando seu ar. É uma hora portentosa e triste!

Mais de sessenta minutos levamos dizendo adeus, os olhos mareados não podendo conter as lágrimas, que rolavam livres pelas faces, o coração batendo desalentado. Ao entrarmos, os lenços brancos agitaram-se em

لوقي امدنع !عادولا ةظحل ةبيهم يه مك هآ" ل ,هناريجل ,هئاقدصلأ ,هتلئاعل ًاعادو ناسنلاا ,ضرلأل ,تويبل و ,نانحب هوحن رعش ام و نم لكل و ,ءاملل ,ءامسلل ,ةراجحلل ناك و ربك و دلو ثيح ,هبابش و هتلوفطب هطبري ام لكل اهنإ .ميسنلا كلذب هسفن و,رظانملا كلتب هينيع عتمي ًامئاد !بيهملا نزحلا نم ةلهذم ةعاس ةقلاع اهل و لاإ عمست ةملك لاو ةعاس تضم يعلا .عادولاب .ىسأب قفخت ةنيزح بولقلا و ,ةعماد ةغئاز نو تعفترا ىتح ةرخابلا وحن ةلئاعلا دارفأ هجوت نإ ام و حولي و هليدنم فسوي عفريف .عادولاب ةحولم ضيبلا ليدانملا (( :ددري وه و هب عادولا انقفوي و انعم نوكي الله !عادولا ! ".))ىرخأ ةرم مكعم عمتجنل (MIGAL, 2013, p.69)

(34)

despedidas. Levantei o meu, bradando:

adeus, adeus, que Deus permita que voltemos a nos reencontrar”.” (MIGUEL,

2004, p. 59).

As duas primeiras frases não são traduzidas para o árabe. Já a última frase, que faz parte do diário de Yussef, em árabe é atribuída ao narrador, o que significaria em português: "Yussef dizia: Adeus! Adeus! عادولا "

Trecho 8 (IX. Partida):

“Fixávamos as montanhas até que

desaparecessem de nossas vistas enevoadas pelas lágrimas, produtos da amargura da separação. O navio ia rápido e logo com a graça de Deus estávamos entre céu e mar. Ao chegar a noite, um marinheiro francês veio até nós, falando também em árabe: - venham

jantar”.” (MIGUEL, 2004, p. 59 ) عومدلا للاخ نم لابجلا رظنمب ةقدحم انراظنأ تتبث دقل" ةرارم انيلع تنميهف ,انع تفتخا ىتح ,اننيعأ تشغ يتلا ,الله ةيانعب و ,ةعرسب ةنيفسلا انب ترحبأ .اندلاب ع ليحرلا راحب انم مدقت ,ليللا طوبه عم و .ءامسلا و رحبلا نيب ام سنرفلا بناج ىلإ ةيبرعلاب انعم ملكت و يسنرف ةي انوعديل ءاشعلا ىلإ " (MIGAL, 2013, p.70)

O convite do marinheiro francês é traduzido em discurso indireto (ele veio nos convidar para jantar).ءاشعلا ىلإ انوعديل

Trecho 9 (X. Opção):

“Nossos papéis haviam ficado com o diretor da companhia. Três dias após nossa chegada, mandou chamar-me.

- Analisei sua documentação e verifiquei que não está de acordo – disse-me. – Primeiro, sua viagem era para o México e, agora, está indo para o Brasil.

Relatei o que me acontecera com o médico

ريدم ىدل انتادنتسم و انقاروأ انكرت دق انك" ةثلاثب انلوصو دعب يناعدتسا يذلا ,ةكرشلا دقل(( :لاقف ,مايأ ًلاوأ تنأف ,لوصلأل ةيعارم اهدجأ ملو تادنتسملا يف تققد ىلإ نلآا بهاذ تنأ اه و ,كيسكملا ىلإ ًاهجوت تنك نويعلا بيبط دنع ىرج ام هل تحضوأ ,اهدنع .))ليزاربلا ىلإ كيسكملا نم ةلحرلا تلوح فيك و ,سلبارط يف ق .ءاقدصلأا ضعب حارتقا ىلع ءانب ,ليزاربلا دقل(( :لا ددجت نأ كيلع نلآا و ,يقيدص اي كحصن يف اوأطخأ ,ًانسح(( :تبجأ .))رفسلا نأ عيطتست نلف لاإ و ,انه كقاروأ

(35)

em Trípoli e como transferi a documentação,

por sugestão dele e dos funcionários.

- Meu amigo, eles cometeram um erro com

você. Aconselho-o a renovar seus

documentos aqui, sob pena de não poder viajar.

- Muito bem, faça como achar mais conveniente.

Iniciamos então as providências para os novos documentos, que ficaram prontos em dois dias. A companhia mandou-me a conta: 400 francos. E eu possuía 600, assim, só me sobraram 200 francos.

Fiquei pensando no que iria fazer. De que maneira chegaríamos ao país estranho, sem conhecer o idioma e onde talvez não conseguisse encontrar os parentes: ou, quem sabe, não tivessem possibilidade de ajudar-nos. Esta pequena importância seria suficiente?

Disse-me minha esposa: - Não te preocupes, vou mandar imediatamente um telegrama para meu irmão, nos Estados Unidos, contando-lhe o que aconteceu e ele nos mandará o que puder.

- De maneira alguma. Deus nos ajudará. - Não, vou escrever ao meu irmão. Vem comigo até o diretor.

Fomos até lá e expusemos a situação. Ele nos pediu o nome e o endereço da pessoa em questão. Fornecemos-lhe: depois de 10 dias chegava a resposta, acompanhada de 1.000 francos. ,انقاروأ ديدجت ىلع انلمع كلذل ,ًابسانم هارت ام لعفأ عبرأ ينم تبلط دق ةكرشلا تناك و ,نيموي للاخ تزجنأف ( كنرف ةئم 400 ( كنرف ةئمتس كلمأ تنك ذإ و ,) 600 ,) ( كنرف يتئم طقف يعم يقبف 200 .) فرصتأ فيك ,هلعف بجي ام يف ركفأ تأدب لا و ةغللا ديجن لا نحن و ,ديدجلا دلبلا ىلإ لصأ امدنع له و ؟ًاروف انبراقأب يقتلنس له ؟هدصقن ًاناكم فرعن يقبتملا ليئضلا غلبملا له و ؟انتدعاسم ىلع نوردقيس بح يتجوز تعطاق ؟تقولا ضعب انيفكيس لا(( :اهلوقب يتر ,ةدحتملا تايلاولا يف يخأ ىلإ ةيقرب ًاروف لسرأس ,قلقت مغر .))ةيلام ةدعاسم هنم بلطأ و ,انباصم نع اهيف هربخأ ريدملا بتكم انلخدف ,يتجوز ترصأ ,ةركفلل يلولأا يضفر نود نأ لاإ هنم ناك امف ,انعم ثدح ام وج يف هانعضو و ةيقربلا لسرأ و ,يتجوز خأ ناونع ,مايأ ةرشع دعب و ... ( كنرف فلأأب ًاقفرم درلا انلصو 1000 .) انيلع هنأ و ,ةنيفسلا لوصو ةكرشلا انتغلبأ ,ءانثلأا هذه يف نم ةسماخلا ةعاسلا يف و .يلاتلا مويلا يف رفسلل دادعتسلاا رهظ دعب 30 ناسين 1927 تناك يتلا ةنيفسلا ىلإ اندعص , ( يفلأ ىلإ اهباكر ددع لصو ,ةمخض 2000 نم رفاسم ) ,سانجلأا عيمج "ةيبونجلا اكريمأ ىلإ انب ترحبأف (MIGAL, 2013, p.73)

(36)

A companhia nos informou que o navio em que partiríamos havia chegado. Deveríamos estar prontos no dia seguinte.

Em 30 de abril de 1927, às 5 horas da tarde, embarcamos. O navio moveu-se, zarpou. Era enorme e o número de passageiros atingia 2.000, de todo tipo de pessoas. Direção:

América do Sul”.” (MIGUEL, 2004, p. 61).

Na tradução árabe, os diálogos são apresentados dentro de parênteses. A primeira frase em português é escrita de forma passiva “Nossos papéis haviam ficado”, mas em árabe está na forma ativa, o que significaria em português: “Deixamos nossos papéis e documentos”. Yussef diz ao diretor que o destino foi mudado do México para o Brasil por causa do que aconteceu com o médico em Trípoli, e com base na sugestão dos funcionários. Em árabe, a sugestão é feita por alguns amigos. Yussef usa o verbo “fazer” no imperativo "Faça", quando se dirige ao diretor. Em árabe este verbo é conjugado na primeira pessoa do singular, "faço", no presente. Todos os números mencionados nesta parte são escritos em palavras e em numerais na tradução árabe. Quando Tamina insiste em enviar uma carta ao irmão, sua fala é transcrita: “- Não, vou escrever ao meu irmão. Vem comigo até o diretor.” Em árabe, sua fala não é transcrita, é Yussef que indica: "Minha esposa insistiu". A última frase é destacada, separada do texto: "Direção: América do Sul". Mas em árabe temos a frase: "O navio navegou conosco para a América do Sul"."ةيبونجلا اكريمأ ىلإ انب ترحبأف

Trecho 10 (XII. Temor):

“Soou a campainha para o almoço. Pensei em minha esposa, com fome. Graças a deus ela iria alimentar-se, consequentemente, ao bebe. Sentamo-nos à mesa e, quando a refeição foi servida, ela disse, enjoada:

- A comida do navio chegou aqui antes de nós. Não consigo digerir isto. Macarrão, macarrão, só macarrão.

- Mas tens que comer, por ti e por causa da

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nossa filhinha.

Ela tentou engolir um pouco e levantou-se da mesa insatisfeita”.” (MIGUEL, 2004, p.80)

Esta parte não foi traduzida para o árabe.

Trecho 11 (XIII. Mascate):

“- De quem é filha a tua mulher?

- Então não sabes quem é ela e filha de quem? Mas se tu és a causa da minha felicidade. Tu foste quem interveio para que eu tivesse essa companheira fiel, essa jóia preciosa, esposa perfeita.

- Mas meu irmão, eu te deixei uma criança, ainda. Como posso ser a causadora da tua felicidade:

- Ouve, então! Lembras-te do teu companheiro de viagem, quando vieste para cá, o tempo que perderam em Marselha por haverem sido enganados por um dos outros companheiros?

- Sim, claro.

- Pois minha esposa é exatamente a filha do teu companheiro”. (MIGUEL, 2004, p. 84)

Esta parte não foi traduzida para o árabe.

Esta parte não foi traduzida para o árabe.

Trecho 12 (XVI. Gringo):

“Minha casa ficava perto da igreja local, que estava em construção. Dos habitantes da cidade, se não todos, pelo menos 90% eram

و .ءاشنلإا ديق لازت ام تناك يتلا ةسينكلا برق يلزنم ناك" ,ةينامللأا ةيعباتلا نم اوناك ناكسلا نم ةئملا يف نوعست ءايمع ةعاط ةعيطم اهنكل و ,ةيلاغتربلا ملكتت لا مهتيبلاغ

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