• Nenhum resultado encontrado

A filosofia da libertação no Brasil: a ética e o ecomunitarismo

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A filosofia da libertação no Brasil: a ética e o ecomunitarismo"

Copied!
12
0
0

Texto

(1)

A filosofia da libertação no Brasil:

a ética e o ecomunitarismo

Sirio Lopez Velasco* Resumo: Estudo apresenta os desafios da filosofia da libertação no Brasil,

particularmente desde a proposta ética do Ecomunitarismo. Trata-se de apresentar as exigências a um filosofar da libertação que precisa de uma fundamentação ética rigorosa, independente de pressupostos teológicos ou de decisionismos subjetivistas. Apresenta a proposta de ética acu-mulada nos últimos anos em confronto com várias teorias. Aborda as exigências éticas em confronto com o socialismo no século XXI.

Palavras-chave: Libertação. Ecomunitarismo. Ética. Socialismo.

Quando cheguei no Brasil em meados dos anos 80 criamos na PUCRS o Centro de Estudos de Filosofia Latino-americana (CEFLA), que focou suas atividades na Filosofia da Libertação. Estudando seus autores mais representativos cheguei à conclusão de que o filosofar da libertação pre-cisava de uma fundamentação ética rigorosa, que fosse independente de pressupostos teológicos ou decisionismos subjetivistas (LOPES VE-LASCO, 1991). Então me perguntei se poderia realizar a tarefa de uma fundamentação última da ética pesquisando as condições de felicidade (AUSTIN, 1962) da pergunta que a instaura, a saber, “Que devo fazer?”;

(2)

e digo fundamentação última porque o pensar não consegue ir além da linguagem que o suporta, de tal maneira que uma vez chegados aos ali-cerces da língua não há nenhum outro ponto mais fundamental aonde se possa ir; ao mesmo tempo, constata-se que esse chão é compartilhado por todos aqueles que usam a linguagem (no caso o português ou o espa-nhol, mas a minha hipótese é que o que vale para essas línguas também vale para as demais línguas, pelo menos no domínio indo-europeu), pelo que a nossa dedução tem validade intersubjetiva universal.

Para realizar tal dedução redefini as normas éticas como Quase-ra-ciocínios Causais (QRC), e me apoiei num operador pouco explorado na lógica clássica, que chamo de condicional, que é diferente da implicação, que represento pelo símbolo “*”, que serve para construir as sentenças do tipo “p * q” (que interpretamos como ‘p é condição de q’) e cuja tabela de verdade é a que segue

p q p * q v

v vf vv

f v f

f f v

Faço a seguir um brevíssima resenha dos fundamentos lógico-lin-guísticos da minha dedução das normas fundamentais da ética (ver os detalhes em LOPEZ VELASCO, 2003).

A fundamentação última e argumentativa da ética, a) parte de Austin (1962), mas, b) recuperando o instrumental da lógica formal e fazendo uso em especial do operador que chamo de “condicional”, c) tenta mostrar que é possível se deduzir por via estritamente argumenta-tiva da própria gramática da pergunta que instaura o universo da ética (a saber, “Que devo fazer?”), normas (agora entendidas como quase-ra-ciocínios causais, QRC) de validade intersubjetiva universal. Sustento que as obrigações morais e éticas se constituem somente através da lin-guagem mediante as respostas para a pergunta: “Que devo fazer?”. Mas a obrigação moral e a obrigação ética têm distinta forma linguística. As normas da Moral são imperativos simples. (Exemplos: “Devo respeitar os idosos”, ou, todavia, no caso dos esquimós, “Devo deixar morrer os

(3)

idosos”). Já as normas da Ética são Quase-Raciocínios Causais (QRC) compostos por:

a) um obrigativo do tipo “Devo x”, onde “x” é um sintagma iniciado por um verbo (diferente de “dever”) no infinitivo;

b) o operador não-veritativo “porque”, e,

c) um enunciado E (o qual pode ser simples ou complexo, segundo a análise da lógica clássica).

[No dito QRC o sintagma que segue o verbo “dever” também faz parte do enunciado E].

Desta maneira devém real, mas num contexto argumentativo que não é refém da “falácia descritiva” e que prescinde de qualquer apelo ao “sentimento”, aquela possibilidade aventada por Russell de que “ a ética contenha proposições que podem ser falsas ou verdadeiras, e não apenas optativas ou imperativas [...]” (RUSSELL, 1946, Cap. IX). A gramática dos QRC é a seguinte: se creio na verdade do enunciado E estou com-prometido com o obrigativo; se o enunciado E resulta falso, então a obri-gação é derrubada por via argumentativa. Por exemplo, o seguinte QRC é candidato a ser uma norma ética: “Devo respeitar os idosos, porque o respeito aos idosos faz a sociedade mais cooperativa e eu quero fazer a sociedade mais cooperativa”.

Com esse instrumental lógico estou preparado para deduzir a partir da gramática da pergunta “Que devo fazer?”, que é a que instaura a Ética na e pela linguagem, as normas éticas capazes de reivindicar validade intersubjetiva universal. [O único pressuposto consiste em postular que desejamos produzir instâncias felizes (AUSTIN, 1962) do ato de fala “ Que devo fazer?”].

As normas da ética

A PROTO-NORMA DA ÉTICA: A descoberta das regras da felici-dade dos atos lingüísticos propostas por Austin (1962) nos permite pos-tular a existência de uma Meta-regra que estipula: “Aceitar (a felicidade) de um ato lingüístico é aceitar que as condições para sua realização (fe-liz) estão dadas (em particular no que se refere e depende do compor-tamento do sujeito envolvido)”. Em continuação há de se perguntar se

(4)

a ação dos sujeitos que aceitam (felicidade de) esse ato e em particular daqueles que são os autores do mesmo não participa de alguma maneira na criação das condições que definem sua realização (feliz). Atendo-nos às regras propostas por Austin, em especial às regras “G” (embora tam-bém podem invocar-se as “A” e “B”), a resposta é positiva. Daí se deriva que “aceitar que as condições para a realização feliz de um speech act estão dadas”, inclui, quando olhamos a situação a partir das regras defi-nidas por Austin, em especial das “G”, a instauração por parte do sujeito que produz-aceita tal ato daquelas condições de sua execução (feliz) que dependam do dito sujeito. Mas isso é precisamente o que afirma, apli-cando-o ao caso da pergunta “Que devo fazer?”, o enunciado que segue o operador “porque” no QRC que explicita a proto-norma da Ética que reza “ Devo fazer o que é condição da pergunta ‘Que devo fazer?’ porque eu faço o que é condição da pergunta ‘Que devo fazer’ é condição de eu pratico uma execução feliz da pergunta ‘Que devo fazer?’”. Tal enun-ciado será verdadeiro à luz da simples Meta-regra da felicidade dos atos lingüísticos. Por outra parte, e agora tendo em conta a tabela veritativa do operador de “condicional”, sabemos que tal enunciado complexo é verdadeiro quando o são os enunciados simples unidos por aquele ope-rador. [Sendo “p” e “q” verdadeiros também o é (“ p * q)]. Assim, uma vez que se reconheceu o operador de “condicional”, seria uma auto-con-tradição lógica rechaçar a verdade do enunciado que vem logo depois do operador “porque”, na medida em que a verdade de tal enunciado deriva da tabela veritativa do operador de “condicional”, porque neste caso tanto “p” (que simboliza o enunciado “Eu faço aquilo que é condição da per-gunta ‘Que devo fazer?’”) como “q” ( que simboliza o enunciado “Eu aceito a pergunta ‘Que devo fazer?’”) são ambos (por hipótese), verdadeiros, e nesse caso também o é a sentença (p * q).

A PRIMEIRA NORMA ÉTICA: A felicidade da pergunta “Que devo fazer?” está condicionada pela possibilidade que eu/nós tenhamos de escolher entre pelos menos duas alternativas de ação. Ora, escolher entre duas alternativas de ação supõe liberdade de decisão. Assim, a li-berdade de decisão é uma condição referente à posição do sujeito que realiza o ato de fala “Que devo fazer?” e faz parte da realização feliz desse ato. Posso portanto dizer:

a) Eu tenho liberdade de decisão é condição de Eu posso realizar mais de uma ação ou tipo de ação diferente.

(5)

b) Eu posso realizar mais de uma ação ou tipo de ação diferente é condição de Eu faço a pergunta “Que devo fazer?”.

c) [porque o operador de condicional respeita a propriedade de transitividade, ou seja, porque a fórmula sentencial que segue é uma tautologia:

(((p * q) . (q * r ) à (p * r)))] eu tenho liberdade de decisão é con-dição de eu pergunto “Que devo fazer?”.

d) Eu quero fazer a pergunta “Que devo fazer?” (numa realização feliz). E por esse procedimento eu deduzo a primeira norma da ética que reza: “ Devo garantir minha liberdade de decisão por-que Eu garanto minha liberdade de decisão é condição de Eu faço a pergunta ‘Que devo fazer?’ (numa realização feliz)”. Esta norma é o fundamento ético de toda crítica a qualquer instân-cia da falta de liberdade de decisão, particularmente quando essa falta resulta de relações alienadas com os outros e comigo próprio. Nota-se que haja vista a condição humana (que é uma condição social) podemos dizer que talvez nunca uma instância da pergunta “Que devo fazer?” será plenamente “feliz”, mas ao mesmo tempo devemos constatar que essa pergunta é o “lugar” da instauração-reafirmação da nossa liberdade de decisão e da luta por consegui-la.

A SEGUNDA NORMA DA ÉTICA: Agora a questão é a seguinte: “É ilimitada a liberdade individual de decisão estabelecida pela primeira norma da ética?”. Inspirado em Karl-Otto Apel (1973) e Oswald Ducrot (1972), proponho que a gramática do ato de “perguntar” inclui como condição da sua “felicidade” os dois princípios seguintes:

a) o indivíduo que formula uma pergunta acredita que seu interlo-cutor responderá à mesma dizendo o que acredita ser verdadeiro ou correto;

b) o indivíduo que formula uma pergunta assume com esse ato uma atitude de busca coletiva e consensual do verdadeiro ou do correto.

[Nota-se que a violação de qualquer um destes princípios é pos-sível, mas nesse caso a pergunta em questão não será “feliz”]. Também postulo que quando se realiza a nível ético a pergunta “Que devo fazer?”

(6)

espera-se como resposta um QRC. Sobre essa base e considerando que qualquer indivíduo que formula a pergunta “Que devo fazer?” está abrin-do por esse ato a porta para a participação na condição de interlocutor válido a qualquer pessoa que entenda a interrogação, advém a segunda norma da ética, que reza o seguinte: “Devo buscar consensualmente uma resposta para cada instância da pergunta ‘Que devo fazer?’ porque Eu busco consensualmente uma resposta para cada instância da pergunta ‘Que devo fazer?’ é condição de a pergunta ‘Que devo fazer?’ é feliz”.

Esta norma traça os limites da liberdade individual de decisão estabelecida pela primeira norma exigindo uma construção e vivência consensual da liberdade. Penso que as pessoas que defendem o dissenso contra o consenso (caso de LYOTARD, 1979) estão confundidas. Em primeiro ligar, chamo a atenção para o fato de que redigir um artigo o um livro para defender a importância do dissenso é uma prova irrefutá-vel da importância do consenso, porque mediante aquele escrito o que se pretende é fazer consenso sobre a importância do dissenso. A oposi-ção simples de “dissenso contra consenso” parece ser uma “contradioposi-ção performativa” (para ser mais fiel a Austin eu a chamaria de “contradição ilocucionária”) na medida em que o conteúdo ilocucionário do ato lin-güístico se contrapõe à força ilocucionária veiculada pelo mesmo (como quando alguém ordena “Não me obedeças!”, porque o próprio da ordem é pressupor e comandar a obediência). Creio que consenso e dissenso estão numa relação dialética onde um se transforma no outro. Se busco o consenso é porque estou no dissenso. Mas, especialmente no caso das normas éticas, o consenso é sempre provisório e pode transformar-se em dissenso a cada instante, bastando para isso que venha a ser falseado argumentativamente o enunciado que dá sustentação ao obrigativo que as integra. Disso também se desprende que não há um problema real na suposta problemática que diferencia entre consensos fáticos e consensos legítimos. Todo consenso é sempre provisório. As normas da ética são históricas e a História está sempre aberta. Mas a segunda norma confir-ma a primeira no sentido de que devemos lutar por uconfir-ma ordem social na qual todas as pessoas sejam o mais livres que for possível em suas deci-sões individuais consensualmente estabelecidas (e criadas e recriadas a cada instante mediante discussão argumentativa).

(7)

A TERCEIRA NORMA ÉTICA: Mas, continuando nossa caminhada, nos perguntamos o que faz possível a existência da pergunta fundadora da ética; e responderemos: a existência da linguagem humana (onde nasce e se perpetua essa pergunta; cf. a regra ‘A’ de Austin) e do próprio ser humano capaz de formulá-la e responde-la; ora para que haja essa lin-guagem e esse ser humano, é preciso que o indivíduo em questão seja saudável; (por exemplo, certas malformações causadas por radiações na vida intra-uterina ou na primeira infância podem provocar no indivíduo deficiências irreparáveis no uso da linguagem da qual a pergunta funda-dora da ética faz parte; e o mesmo acontece com outras alterações patogê-nicas endógenas ou causadas pelo ambiente exterior ao indivíduo adulto, como ocorre na afasia). Daí deriva-se a terceira norma fundamental da ética; a mesma nos obriga a preservar-regenerar uma natureza humana e não humana saudável (pois sem ela, a pergunta fundadora da ética não só não seria ‘feliz’, mas sequer existiria). Em linguagem técnica essa terceira norma reza: “Devo preservar-regenerar a saúde da natureza humana e não humana porque eu preservo a saúde da natureza humana e não hu-mana é condição da pergunta ‘Que devo fazer’ existe (que é condição da pergunta ‘Que devo fazer’ é feliz)”.

Assim as três normas fundamentais da ética me obrigam a realizar consensualmente minha liberdade individual de decisão no contexto de uma práxis que preserva-regenera a saúde da natureza humana e não humana.

Libertação, ecomunitarismo e socialismo do século XXI

Agora definimos a libertação como sendo o processo histórico (in-finito) pelo qual os indivíduos, as comunidades e a humanidade como um todo, tentam realizar de forma consensual sua liberdade individual de decisão, respeitando e promovendo a saúde da natureza humana e não humana; isto é, tentam realizar completamente as três normas fundamentais da ética.

Por sua vez chamo de “Ecomunitarismo” a ordem sócio-ambiental utópica pós-capitalista (talvez nunca alcançável, mas indispensável hori-zonte guia da ação) capaz de se articular com base nas três normas da ética e de manter-se pela postura de seres humanos em atitude de libertação.

(8)

E como disse Eduardo Galeano, citando o intelectual argentino que criou essa idéia, quando se pergunta ‘para que serve a utopia?’, depois de constatar que ao avançarmos dez passos ela afasta-se mais dez, e ao avançarmos cem passos ela afasta-se mais cem, conclui-se que a utopia ‘serve’ precisamente para isso: para não cessarmos de caminhar. Não é por acaso que os donos do poder econômico, político, militar, cultu-ral e mediático no capitalismo acolheram e acolhem com tanto calor o mito do ‘fim das utopias’ (e da história) pois o indivíduo ou grupo social que aceitar essa tese estará confessando que não há outro mundo possível para além do capitalismo (ou seja, precisamente, da ordem na qual aqueles poderosos têm todos os poderes antes citados); por isso é fundamental e faz parte do projeto histórico de qualquer indivíduo ou grupo social o horizonte utópico que a cada dia repete: com esperança, muito saber, muita solidariedade, muito respeito para com a natureza não humana, e muita luta, outro mundo é possível (como apregoa o Foro Social Mundial).

Do ecomunitarismo fazem parte, como projeto de libertação, uma pedagogia ambiental problematizadora (que chamo de educação am-biental ecomunitarista, e da qual faz parte uma educação sexual liber-tária), uma economia ecológica e sem patrões, uma política de todos, e uma comunicação simétrica.

A educação ambiental ecomunitarista apoia-se no conceito frei-reano de conscientização (FREIRE, 1970; 1982), visando o desvelamento crítico da realidade e sua transformação permanente rumo a uma ordem socioambiental sustentável sem opressores nem oprimidos e respeitosa da terceira norma da ética (que prescreve a preservação e regeneração da saúde da natureza humana e não humana). Para tanto realiza a reconstrução dialógica dos conhecimentos, em atividade na qual educador e educandos são educadores e educados, na condição de cidadãos inseridos na luta cidadã para superar o capitalismo rumo ao ecomunitarismo (LOPEZ VELASCO, 2008). Essa educação aborda os conteúdos a partir de problemas socioambientais relevantes (nas diver-sas esferas da ecologia, as opressões e devastações capitalistas, economia ecológica e solidária que supera a pobreza na frugalidade ecológica, a saúde, a democracia direta-participativa-protagónica, a educação sexual libertária, a comunicação, etc.), e fecha cada ciclo gnoseológico imple-mentando entre alunos e comunidade soluções (mesmo que parciais e

(9)

modestas) para os problemas estudados. A educação sexual que dessa educação faz parte combate apoiando-se nas três normas fundamentais da ética, o machismo, a homofobia, a condena beata à masturbação e as práticas erótico-sexuais sadomasoquistas e outras que são violatórias de pelo menos algumas daquelas normas (como, por exemplo, o ato sexual praticado com crianças e animais, que não tem a capacidade de decidir livremente de suas ações, conforme o exige a primeira norma, ou o ato sexual praticado sob os efeitos de drogas que impedem o uso da liberdade de decisão, ou ainda as práticas sadomasoquistas que atentam contra a saúde da natureza humana).

A economia ecológica e sem patrões visa superar a alienação exis-tente na economia capitalista (que abrange a alienação em relação ao produto do trabalho, ao próprio trabalho, à atividade produtiva, à na-tureza não humana, ao outro ser humano e a si próprio), orientando-se pelo princípio que reza “de cada um segundo a sua capacidade e a cada um segundo suas necessidades, respeitados os equilíbrios ecológicos”; tal economia permite o desenvolvimento de indivíduos universais, re-conciliados com os demais e com a natureza não humana (objeto do seu respeito e do seu gozo estético); tal economia pratica as “6 R” que exigem Refletir, Recusar a produção-distribuição-consumo consumo insustentável, satisfazer as necessidades de todos e cada um Reduzin-do a produção-distribuição-consumo nos padrões Reduzin-do ecologicamente frugal-sustentável, Reutilizar bens e resíduos, Reciclar bens e resíduos, e Revolucionar o capitalismo rumo ao ecomunitarismo; para tanto tal economia usará sempre que possível energias limpas e renováveis (como o são a solar e a eólica).

A política de todos visa a superação da democracia representativa (em crise pela usurpação da decisão pelas classes dominantes no capi-talismo e pela falta de representação efetiva dos supostos representados pelos supostos representantes), numa democracia participativa e pro-tagónica (sempre quer possível exercida de forma direta, o que em so-ciedades complexas tornou-se possível graças aos recursos da internet), na qual os cargos que forem indispensáveis serão exercidos em rodízio (para evitar a eternização de alguns nas funções diretivas e a corrupção que a esse fenômeno se vincula, e para permitir que cada um suporte a ‘carga’ cidadã que deve significar o exercício de cada ‘cargo’). Por sua vez a comunicação simétrica visa democratizar os instrumentos colocados

(10)

hoje nas mãos de oligopólios mediáticos nacionais e multinacionais, fa-zendo com que cada cidadão participe da elaboração, circulação e dis-cussão das notícias, e seja praticante das mais diversas artes.

Valer a pena salientar que na A. Latina está se inventando o “socia-lismo do século XXI” (LOPEZ VELASCO, 2009; 2010; 2012), que tenta pôr em prática várias das ideias definidoras do ecomunitarismo (mes-mo que o faça, co(mes-mo não poderia deixar de ser, de forma imperfeita e parcial). Essa experiência (em construção em especial na Venezuela e na Bolívia) tem uma abordagem intercultural, que visa resgatar e inte-grar na nova ordem socioambiental toda a riqueza da cultura indígena e das minorias negras da América Latina; também se caracteriza: a) pela permanência do poder de decisão do poder constituinte (a cidadania participante diretamente) mesmo quando instaurados os poderes cons-tituídos de nível local, regional e nacional, b) pela reestruturação das forças armadas para que sejam o povo uniformado, e pela criação de milícias populares, que fazem dos cidadãos comuns os defensores da nação, c) pela perspectiva latino-americanista, que visa criar a Pátria Grande sonhada por Artigas e Bolívar, através de iniciativas como as da UNASUR (União das Nações Suramericanas) e CELAC (Comunidad de Estados da A. Latina e do Caribe) d) pela promoção de uma economia ecológica comunitária destinada ao bem comum e à superação da po-breza, e) pela educação problematizadora plurilíngue, incorporando as línguas indígenas regionais na esfera escolar e administrativa, e, f) pelo exercício da democracia direta, participativa e protagônica através de Conselhos Comunais, Comunas, e/ou órgãos comunitários indígenas.

Referências

APEL, K. O. (1973). Transformation der Philosophie. Frankfurt: Suhrkamp, 1988. [La Transformación de la Filosofía. Madrid: Taurus, 1985].

AUSTIN, J. L. (1962). How to do things with words. London; New York: Oxford University Press, 1984.

DUCROT, O. Dire et ne pas dire. Paris: Hermann, 1972. DUSSEL, E. Filosofía de la Liberación. México: Edicol, 1977.

(11)

FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a Liberdade. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

______. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. KANT, Immanuel. (1786). Grundlegung zur Metaphysik der Sitten. Frankfurt: Suhrkamp, 1989.

______. (1788). Kritik der praktischen Vernunft. Frankfurt: Suhrkamp, 1989.

______. (1790). Kritik der Urteilskraft. Sttutgart: Reclam, 1991. LOPEZ VELASCO, Sirio. Ecomunitarismo, socialismo del siglo XXI e

interculturalidad. Rio Grande: FURG, 2009.

______. El socialismo del siglo XXI em perspectiva ecomunitarista. México: UASLP, 2010.

______. Ética para mis hijos y no iniciados. Barcelona: Anthropos, 2003b.

______. Ética para o século XXI: rumo ao ecomunitarismo. São Leopoldo: Unisinos, 2003a.

______. Fundamentos lógico-linguísticos da ética argumentativa. São Leopoldo: Nova Harmonia, 2003.

______. Ideias para o socialismo do século XXI com visão marxiana-

ecomunitarista. Rio Grande: FURG, 2012.

______. Introdução à Educação Ambiental Ecomunitarista. Rio Grande: FURG, 2008.

______. Reflexões sobre a Filosofia da Libertação. Campo Grande: CEFIL, 1991.

LYOTARD, J. F. La condition postmoderne. Paris: Minuit, 1979 [La condición Postmoderna. Barcelona: Planeta-Agostini, 1993].

MARX, Karl. (1844). Ökonomische-Philosophische Manuskripte 1844. Hamburg: Rowohlt Taschenbuch Verlag, 1968 [Manuscritos de Economía

y Filosofía. Madrid: Alianza, 1970].

______. (1864-1894). Das Kapital. Frankfurt; Berlin: Ullstein, 1969. 3 Bände. (El Capital. La Habana: Pueblo y Educación, 1973, 1983].

(12)

MIES, M.; SHIVA, V. Ecofeminismo. Barcelona: Icaria, 1997. PIRES, Cecília P. (Org.). Ética e cidadania. Porto Alegre: Dacasa; Palmarinca, 1999.

RUSSELL, Bertrand (1946). Human society in Ethics and Politics. A sociedade humana na ética e na política. São Paulo:

Cia. Editora Nacional, 1956.

WITTGESNTEIN, Ludwig (1921). Tractatus logico-philosophicus. Madrid: Revista de Occidente [Ed. bilingüe alemán-español], 1957. ______. (1953). Investigações Filosóficas [Philosophische

Referências

Documentos relacionados

Como já destacado anteriormente, o campus Viamão (campus da última fase de expansão da instituição), possui o mesmo número de grupos de pesquisa que alguns dos campi

O teste de tetrazólio é resultado de muitas pesquisas e sua aplicação em embriões zigóticos para estudo da viabilidade de sementes de coqueiro é importante por possibilitar

Equipamentos de emergência imediatamente acessíveis, com instruções de utilização. Assegurar-se que os lava- olhos e os chuveiros de segurança estejam próximos ao local de

Para essa discussão, selecionamos o programa musical televisivo O fino da bossa, apresentado por Elis Regina e Jair Rodrigues, na TV Record de São Paulo, entre os anos de 1965 e

A prova do ENADE/2011, aplicada aos estudantes da Área de Tecnologia em Redes de Computadores, com duração total de 4 horas, apresentou questões discursivas e de múltipla

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

Este estudo apresenta como tema central a análise sobre os processos de inclusão social de jovens e adultos com deficiência, alunos da APAE , assim, percorrendo