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Deslocamentos populacionais como alternativa para enfrentar a pobreza

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Academic year: 2021

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Gt09: estrutura social, dinâmica demográfica e migrações Vania Herédia (UCS)

Maria do Carmo Santos Gonçalves (CAM) Bruna Pandolfi (UCS)

Os estudos migratórios indicam que houve mudanças nos padrões de mobilidade humana nas últimas décadas. Refletem que as migrações não são uniformes e dependem das políticas de desenvolvimento da sociedade de destino, mostrando que as consequências desses movimentos afetam as cidades, não são invisíveis e muitas vezes escapam ao controle do observador pela falta de interesse político, pela ineficácia da máquina pública de enfrentar o dinamismo do próprio fenômeno. Verifica-se que as cidades com menos de 500 mil habitantes são as que mais cresceram no Brasil, o que demonstra a influência da migração, muito embora as grandes cidades continuem concentrando parcela expressiva da população. O presente trabalho tem como objetivo identificar os padrões de mobilidade social numa cidade média, localizada no sul do Brasil, que tem historicamente recebido migrantes, evidenciando alterações significativas nos padrões de mobilidade humana. O estudo, de natureza exploratória, utiliza os dados do último Censo Demográfico do IBGE (2010) e os dados do Cadastro Único dos Programas Sociais do Governo Brasileiro na última década. O cadastro da população envolvida no Programa Bolsa Família desse município evidencia que dos 435.564 mil habitantes do município de Caxias do Sul, 130.614 inscreveram-se no Cadastro Único no período de 2001-2010; desses 31.423 acessaram o programa, o que significa um número representativo de chefes de família que possuem o benefício. Observa-se que o perfil dos migrantes tem novas características e que os mesmos acessam os programas sociais do governo a fim de minimizar as vulnerabilidades sociais, tendo na migração a alternativa para romper com a situação de vulnerabilidade do local de origem. Constata-se que mesmo com os deslocamentos, a situação de pobreza para muitos permanece, apenas transferindo as vulnerabilidades que os cercam.

Palavras-chave: Migrações internas, pobreza, situação de vulnerabilidade. Introdução

A justificativa que os deslocamentos populacionais ocorrem pelo fato de que a população busca novas alternativas de vida, é uma realidade. Diversos estudos têm apontado para esse tipo de afirmação indicando a complexidade que a análise desses fluxos apresenta dado que o fenômeno da mobilidade humana além refletir mudanças das estruturas de produção agregam disposições subjetivas dos sujeitos aí envolvidos. O Núcleo de Estudos do Trabalho e de Políticas Sociais da Universidade de Caxias do Sul tem se dedicado a esse tema, uma vez que a cidade de Caxias do Sul tem sido cenário contínuo de migrações. Os estudos tem apontado para mudanças no perfil das migrações recentes, o que estimula o interesse por novas pesquisas. Como a cidade de Caxias do Sul faz parte do polígono industrial e é um dos polos industriais do Rio Grande do Sul, os deslocamentos populacionais que ocorrem nessa região são frequentes e contínuos. O município conta com uma população de 435.564 habitantes (IBGE, 2010), sendo 96% da população residente na zona urbana, com uma densidade demográfica de 264,89 hab/km² (IBGE, 2010), um PIB per capita de R$ 36.034 (FEE, 2010). Os dados do resultado geral da amostra do Censo de 2010 apontam que 41,91% (182.523) dos habitantes não são naturais de Caxias do

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Sul. Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do Ministério do Trabalho e Emprego, o número de empregos formais corresponde a 174.694, num total de 33.664 estabelecimentos, com destaque para a indústria de transformação com 84.884 empregos formais, em 1º de janeiro de 2013.

Diante desse cenário, utilizando os dados do Censo Demográfico de 2010, constata-se que Caxias do Sul cresceu 20,85% em relação ao Censo de 2000. Isso indica que o município tem sido um polo receptor de mão de obra que provêm de outras localidades do próprio estado bem como fora dele. Vários municípios vizinhos apresentaram taxas de crescimento populacional semelhante ao de Caxias, o que reflete que a região também teve um saldo positivo no conjunto de seus municípios. O objetivo desse estudo foi realizar uma análise que pudesse relacionar os dados dos usuários do Programa Bolsa Família com os dados sobre os resultados das migrações que ocorrem nessa cidade, a fim de explicitar que as vulnerabilidades que afetam parte da população residente em Caxias e que tem demandado do município a implementação de serviços, programas e projetos na área social. O estudo, de natureza exploratória, utilizou os dados do último Censo Demográfico do IBGE (2010) e os dados do Cadastro Único dos Programas Sociais do Governo Brasileiro, na última década. O cadastro da população envolvida no Programa Bolsa Família desse município evidencia que dos 435.564 mil habitantes do município de Caxias do Sul, 130.614 inscreveram-se no Cadastro Único no período de 2001-2010; desses 31.423 acessaram o programa, o que significa um número representativo de chefes de família que acessam o benefício. Como referências teóricas, foram utilizados os estudos de Koucher (2006), Maria de Lurdes Jardim e Tanya Barcellos (2011) para discutir os deslocamentos populacionais a partir de processos de concentração e de desconcentração populacional, no espaço urbano regional no Rio Grande do Sul, as análises realizadas pelo IPEA sobre os programas sociais e os estudos promovidos pela CELADE, com apoio da UNFPA, que tratam dos impactos sociodemográficos das migrações internas no Cone Sul da América Latina. O avanço em nossas pesquisas deve-se a contribuição dada desses estudos que caracterizam as migrações internas, relacionadas à pobreza e ao desenvolvimento econômico em alguns territórios.

Os estudos migratórios têm apontado para mudanças que tem ocorrido nos padrões estabelecidos pelos fluxos migratórios uma vez que os mesmos sofreram alteração em características que os identificavam. Nessa direção, Busso (2000, p. 2) afirma que “os enfoques sobre desigualdades sociais (pobreza, exclusão e vulnerabilidade, etc.) tem uma capacidade heurística em sua vinculação com as variáveis da dinâmica e da estrutura da população”. Esse raciocínio aponta para os impactos que as dinâmicas migratórias causam quando ocorrem deslocamentos de população que alteram os padrões estabelecidos pela própria dinâmica. A mudança desses padrões revela uma série de alterações nos indicadores que os caracterizavam. No caso de Caxias do Sul, percebe-se que historicamente as migrações eram promovidas por deslocamentos de populações internas o que não afeta o grau de inserção e de exigências culturais no processo. Entretanto, nas últimas décadas, além das migrações ultrapassarem as fronteiras do estado, também ultrapassaram as fronteiras nacionais.

Programa Bolsa Família e as vulnerabilidades sociais

O Programa Bolsa Família está vinculado à política pública de Assistência Social. Até a Constituição Federal de 1988, a Assistência Social não era considerada política pública. É justamente com a promulgação da chamada Constituição Cidadã, que ela ganha importância e passa a integrar o tripé da Seguridade Social ao lado da Saúde e da Previdência Social. Na sequência, foram promulgadas normativas que garantem em lei a constituição da política pública de Assistência Social, tais como a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS-1993), a Política Nacional de Assistência Social

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(PNAS-2004), a NOB-SUAS que criou o Sistema Único de Assistência Social e a NOBSUAS-RH que vincula e caracteriza os recursos humanos necessários para a implementação dos serviços socioassistencias. Isso significa que essa política apresenta um passado recente de constituição. Além disso, a política de Assistência Social não pode ser dissociada do atual contexto social, regido pelo modelo neoliberal que prevê a redução de direitos e um Estado mínimo.

O Programa Bolsa Família foi criado em outubro de 2003, mas é regulamentado pela Lei 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Sua criação tem por finalidade unificar os programas sociais já existentes, como Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio-Gás, entre outros. É um programa de transferência de renda com condicionalidades, o qual atende aos indivíduos e famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade social, com foco na extrema pobreza. Os benefícios podem ser básicos ou variáveis, que se alteram conforme a situação de pobreza e o número de filhos (tanto crianças quanto adolescentes), com um repasse mensal de um valor em dinheiro. No caso do Município de Caxias do Sul, o valor médio recebido pelas famílias é de R$ 122,76 reais, correspondente ao pagamento mês de março de 2013. Nesse mesmo período, o número de famílias beneficiadas era de 8.341.

As condicionalidades têm um papel central dentro do Programa Bolsa Família, pois é o seu cumprimento que garante o recebimento do valor mensal. Estão relacionadas aos compromissos que as famílias beneficiárias assumem, ao aderirem ao programa, ou seja, à frequência escolar das crianças/adolescentes da família e ao acompanhamento nos serviços de saúde.

O Programa Bolsa Família está diretamente relacionado a situações de vulnerabilidade medidas pelo viés da renda familiar. As vulnerabilidades sociais consistem numa expressão nova, que vem ganhando ênfase nos últimos anos para as políticas sociais. A Política Nacional de Assistência Social de 2004 (BRASIL, 2004) estabelece como seu público usuário as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social e risco, porém não traz o conceito que explicita essa expressão. Na literatura estrangeira, Busso (2001) aponta que a vulnerabilidade social estaria relacionada aos ativos físicos, financeiros, humanos e sociais que os indivíduos e os lugares possuem, assim como as estratégias de uso e o conjunto de oportunidades. Esse autor também afirma que a vulnerabilidade social é um processo multidimensional, que está relacionado ao risco ou à probabilidade. Nessa linha, os usuários do Programa Bolsa Família são pessoas em situação de vulnerabilidade pela condição de pobreza em que se encontram, ou seja, os ativos que possuem não são suficientes para garantir a sua sobrevivência. Nesse sentido, o Programa Bolsa Família insere-se no contexto da Politica de Assistência Social que compõe o sistema de seguridade social. Isso implica no envolvimento da análise das condicionalidades já que as mesmas foram pensadas a fim de garantir a intersetorialidade principalmente na relação entre saúde e educação.

Falsas impressões

É comum a explicação de que os problemas que o município possui são causados pelos migrantes. O estudo mostra o contrário, ou seja, que o acesso aos benefícios é feito por uma parcela expressiva de pessoas naturais. A população que se encontra em situação de pobreza se beneficia do programa e as vulnerabilidades sociais atingem a população natural e não natural.

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Tabela 1 − Distribuição absoluta e percentual da naturalidade da população beneficiada pelo Programa Bolsa Família em 2010 NATURALIDADE Frequência Absoluta Percentual Caxias do Sul 18.772 59,74 Outros municípios do RS 9.237 29,39

Demais estados brasileiros 2.441 7,77

NI 973 3,10

Total Geral 31.423 100,00

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Elaboração das autoras.

A naturalidade dos usuários do Programa Bolsa Família mostra a predominância que ocorre de naturais (59,74%), em relação aos não naturais (37,16%). Esses dados evidenciam que 29,39% são migrantes de municípios gaúchos, excluindo Caxias do Sul, e 7,77% e de outros estados brasileiros, como Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Bahia. É oportuno destacar que dos usuários apenas 0,07% são estrangeiros, o que mostra a força das migrações internas nessa região no período avaliado.

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Dentre os principais municípios de naturalidade da população cadastrada no Programa Bolsa Família, conforme o mapa 1, apenas duas cidades integram a região metropolitana do Rio Grande do Sul, são elas a capital gaúcha Porto Alegre e a cidade de São Leopoldo. Essas duas cidades tiveram crescimento no último Censo Demográfico de 3,58% e 10,61% respectivamente, percentual menor em comparação ao de Caxias do Sul que cresceu 20,85%. Esse dado reforça a tese da atratividade das cidades médias no Brasil nas últimas décadas e corrobora com os estudos realizados por Oswaldo Amorim Filho e Rodrigo Valente Serra (2001, p.1) que definem as cidades médias pela “oferta de emprego, ou mesmo subemprego, pela existência de infraestrutura básica, pelas oportunidades de acesso à informação, pelos melhores recursos educacionais”.

De acordo com os dados presentes no mapa, pode-se observar que as migrações provêm principalmente de duas regiões do estado do Rio Grande do Sul: uma próxima a Caxias do Sul, conhecida como Campos de Cima da Serra e outra mais distante da cidade, localizada na região de Fronteira na divisa com o Uruguai. Esses dois grupos de migrantes constantes nesse momento representam a força do movimento migratório em Caxias do Sul. O primeiro, constituído por naturais dos Campos de Cima da Serra, migração mais antiga que se estabeleceu na cidade por volta da década de cinquenta do século passado e continua tendo Caxias do Sul como principal destino, e a migração proveniente dos municípios fronteiriços, fenômeno mais recente, característico da última década. Essas duas regiões do Estado carregam diferenças culturais conforme estudos realizados por Herédia, Mocelin e Gonçalves (2012).

Além da procedência das regiões acima apontadas, também aparecem no mapa a presença de outras duas cidades médias, caso de Passo Fundo e Pelotas. Essas duas cidades também não tiveram um expressivo crescimento populacional na última década, apresentando o percentual 9,72% e 1,58% respectivamente. Esses dados demonstram que apesar de serem cidades médias, não apresentam o mesmo dinamismo e características que outras cidades de elevado crescimento populacional apresentaram.

Outro aspecto que chama a atenção no mapa 1, é a presença também de municípios vizinhos a Caxias do Sul, caso de Farroupilha, Bento Gonçalves e São Marcos. A procedência dessas cidades se deve, entre outros fatores, a proximidade geográfica que facilita o deslocamento. Esses municípios, assim como Caxias do Sul, apresentaram altos índices de crescimento populacional, caso de Farroupilha (15,06%) e Bento Gonçalves (17,26%).

Além disso, pode-se a apontar que a grande maioria das cidades de naturalidade da população beneficiária do Programa Bolsa Família apresentam baixos índices de Pib per capita no ano de 2010, conforme dados da Fundação de Economia e Estatística (FEE). Pode-se citar os casos de: Vacaria (R$ 20.448), Bom Jesus (R$ 18.593), São Francisco de Paula (R$ 15.911), Lagoa Vermelha (R$ 18.260), Sant'Ana do Livramento (R$ 12.241), Barracão (R$ 22.090), São José do Ouro (R$ 20.227), Esmeralda (R$ 26.583), São Gabriel (R$ 19.912), Bagé (R$ 12.252), Dom Pedrito (R$ 19.014), Cambará do Sul (R$ 17.604), Uruguaiana (R$ 21.084), Jaquirana (R$ 11.413). A maioria desses municípios encontra-se com um Pib per capita abaixo do Rio Grande do Sul que foi de R$ 23.606 e de Caxias do Sul que apresentou um valor de R$ 36.034. Apesar desse dado não ser conclusivo, indica que a depressão econômica desses municípios levou um grande contingente de pessoas a migrar para municípios considerados mais prósperos do ponto de vista econômico. Ao migrar esse contingente populacional mobiliza como ativo de superação da pobreza no município de origem o próprio poder de deslocamento, ao mesmo tempo em que esse ativo parece não ser suficiente, expondo parte dessa população a uma situação de maior vulnerabilidade daquela a que estava sujeita anteriormente em seus municípios de origem. Os dados sobre o número de transferências de benefícios do PBF indicam que do contingente de pessoas não naturais de Caxias do Sul, a maior parte acessou o benefício no

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município, ou seja, após ter empreendido o percurso migratório, evidenciando que a própria migração pode ser uma causa de vulnerabilidade e risco social.

Perfil dos usuários do Programa Bolsa Família

No caso das 31.423 pessoas beneficiadas pelo Programa Bolsa Família em Caxias do Sul, 57,62% são do sexo feminino e 42,38% do sexo masculino. O percentual mais elevado de mulheres se deve, entre outros motivos, pela preferência da titularidade feminina do benefício, ou seja, as mulheres são as responsáveis legais pela transferência de renda que recebem mensalmente.

Tabela 2− Distribuição absoluta e percentual do sexo das pessoas beneficiadas pelo Programa Bolsa Família SEXO Frequência Absoluta Percentual Feminino 18.107 57,62 Masculino 13.316 42,38 Total 31.423 100,00

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Elaboração das autoras.

Quanto à idade das pessoas beneficiadas pelo Programa, chama a atenção o alto número de crianças e adolescentes. Mas este número se justifica pelo foco do Programa estar voltado justamente para os filhos das famílias em situação de extrema pobreza, numa tentativa de romper com a pobreza intergeracional ao garantir a transferência de renda com condicionalidades (acesso a educação e saúde).

Tabela 3- Distribuição absoluta e percentual da data de nascimento da população cadastrada no programa Bolsa Família

DATA DE NASCIMENTO Frequência

Absoluta Percentual 1910 a 1919 4 0,01 1920 a 1929 13 0,04 1930 a 1939 82 0,26 1940 a 1949 329 1,05 1950 a 1959 1.180 3,75 1960 a 1969 2.962 9,43 1970 a 1979 4.468 14,22 1980 a 1989 3.425 10,90 1990 a 1999 9.796 31,17 2000 a 2009 9.077 28,89 2010 87 0,28 Total 31.423 100,00

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Elaboração das autoras.

Na questão da raça, a predominância é de pessoas brancas em 74,22% dos casos, seguido da raça parda com 13,62% e a raça negra com 4,54%. Por ser uma região de colonização italiana, e assim por predominância branca, a raça negra enfrenta um estigma de inferioridade, que continua presente nos dias atuais, principalmente na busca por vagas de trabalho. É oportuno lembrar que na ocupação da terra pelos imigrantes europeus, não era possível, devido a política de colonização dispor de escravos. Essa cláusula referia-se apenas as zonas de ocupação europeia que se beneficiaram da compra de lotes coloniais após a Lei de Terras de 1850. Isso representou que não existiu mão de obra negra no desenvolvimento inicial das colônias, devido a restrição das políticas governamentais.

Quanto ao estado civil, 79,62% das pessoas estão cadastradas na opção solteiro, seguido de 8,11% de casados e 2,68% de separados. O alto número de solteiros pode indicar que muitas dessas famílias são chefiadas por um dos parceiros, principalmente as mulheres, que acabam por assumir a responsabilidade sobre os filhos e a manutenção da casa.

No que se refere à escolaridade das pessoas beneficiadas pelo Programa Bolsa Família, percebe-se, conforme se observa na tabela abaixo, que há um percentual significativo de analfabetos 20,99%. O ensino fundamental completo corresponde a apenas 4,33% dos casos e o ensino médio completo a 2,90% das pessoas. Esses dados demonstram que a escolaridade ainda é muito baixa entre os beneficiários, o que gera dificuldades principalmente na inserção no mercado de trabalho formal. Tabela 4- Distribuição absoluta e percentual do grau de instrução da população cadastrada no programa

Bolsa Família, entre 2001 e 2010

GRAU DE INSTRUÇÃO Frequência

Absoluta Percentual

Analfabeto 6.597 20,99

Até a 4ª série incompleta do ensino fundamental 8.306 26,44 Com a 4ª série completa do ensino fundamental 1.152 3,67 Da 5ª à 8ª série do ensino fundamental 8.447 26,88

Ensino fundamental completo 1.362 4,33

Ensino médio incompleto 1.865 5,93

Ensino médio completo 912 2,90

Superior incompleto 34 0,11

Superior completo 11 0,03

Especialização 2 0,01

Não informado 2.735 8,71

Total 31.423 100,00

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Elaboração das autoras.

A situação no mercado de trabalho é um dado necessário para identificar o perfil dessa população. Não exercem atividade remunerada no mercado de trabalho formal, 76,99% das pessoas cadastradas. Sem uma renda fixa agrava-se mais ainda a situação de vulnerabilidade dessas famílias que vivenciam a extrema pobreza. Em alguns casos, sua inserção acontece em atividades informais, os chamados bicos, que são incertos e precários. Também chama a atenção o percentual de 15,45% de autônomos sem previdência social, ou seja, descobertos de qualquer proteção pública em caso de

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acidente de trabalho e sem realizar contribuição para receber na velhice a aposentadoria. Dado que uma boa porcentagem dos beneficiados são mulheres com filhos dependentes deve-se considerar que o município de Caxias do Sul possui um déficit muito grande de creches e escolas infantis que poderiam viabilizar que essas mulheres pudessem obter o tempo livre necessário para a inserção no mercado de trabalho ou em programas de capacitação profissional.

Tabela 5 - Distribuição absoluta e percentual da situação no mercado de trabalho da população no programa Bolsa Família

MERCADO DE TRABALHO Frequência

Absoluta Percentual

Empregador 8 0,02

Assalariado com carteira de trabalho 1.610 5,13 Assalariado sem carteira de trabalho 115 0,37

Autônomo com previdência social 167 0,53

Autônomo sem previdência social 4.852 15,45

Aposentado/pensionista 407 1,29 Trabalhador rural 53 0,17 Empregador rural 4 0,01 Não trabalha 24.193 76,99 Outro 14 0,04 Total 31.423 100,00

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Elaboração das autoras.

Quanto ao perfil dos domicílios das pessoas beneficiárias do Programa Bolsa Família, destaca-se que 94,71% estão localizados na zona urbana. Esdestaca-se dado está em consonância com os dados do IBGE, que apontam que a população do Município está concentrada na cidade, ou seja, segundo o último censo do IBGE, o município de Caxias possui 96% de população urbana e 4% rural. A situação do domicílio é própria em 43,50% dos casos. Porém, cabe uma ressalva, que também é feita por Costanzi e Fagundes (2010), de que esses domicílios próprios, em muitos dos casos, são precários, não garantindo condições adequadas de moradia. As residências são construídas em madeira em 49,70% ou com tijolo/alvenaria em 48,73% dos casos. Por ser uma região com um inverno muito rigoroso, as casas construídas com madeira acabam por proteger menos do vento e do frio essas famílias, submetendo-as à condições mais precárias de moradia. São residências em que também não há tratamento de água em 69,63% dos casos.

Com a constituição desse perfil, é possível subsidiar os programas e as políticas que atendem essa população no Município de Caxias do Sul, principalmente através da identificação das vulnerabilidades sociais apresentadas, tais como: baixa escolaridade, sem renda ou baixa renda e precariedade habitacional. Logo, o Programa Bolsa Família representa um avanço social dos últimos anos, pois contribui para minimizar a situação de extrema pobreza, porém sua aplicação isolada é insuficiente para resolver de fato as vulnerabilidades que essa população possui e promover a superação dessa situação, pois os valores repassados são mínimos e as condicionalidades impostas não

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asseguram o afastamento das situações promotoras do risco social a que estão sujeitas, principalmente aquelas famílias migrantes.

Considerações finais

O estudo contribui para discutir o perfil dos usuários do Programa Bolsa Família e, ao mesmo tempo, esclarecer que um número considerável de beneficiários é natural do município e que a maioria dos que recebem o benefício é de origem gaúcha, o que permite desmitificar a visão de que todos os vulneráveis do município são migrantes. Essa primeira constatação aponta para entender que, independentemente do local de origem, o programa ajuda a minimizar a situação de extrema pobreza, sem resolver de fato as vulnerabilidades que essa população enfrenta para viver. Tem-se ciência de que o programa já é um passo para a superação da pobreza, mesmo que não consiga enfrentá-la nas suas causas.

As vulnerabilidades da população que participa do Programa Bolsa Família são muitas para serem resolvidas apenas com a transferência de renda, mesmo que seja garantido o mínimo para sobreviver. Constata-se, portanto, a necessidade de ampliar as políticas sociais para atender essas demandas básicas da população em situação de pobreza, diminuindo as contradições provocadas pelo modelo econômico.

Entretanto, é comum a explicação que os problemas que o município possui serem atribuídos aos migrantes. O estudo ajuda a pontuar as características dos usuários do Programa Bolsa Família, identificando seu perfil, o que contribui para modificar a posição que os habitantes da cidade têm em relação aos migrantes e a população que se encontra em situação de vulnerabilidade, mas são naturais do local.

Diante de um contexto neoliberal, em que os programas sociais são focalizados na extrema pobreza, reforça-se a necessidade de mais estudos sobre essa temática, a fim de que as discussões tenham mais força teórica e possam contribuir para subsidiar políticas sociais que contribuam para a superação da pobreza e não só a extrema pobreza. As novas dinâmicas populacionais apontam as modificações nos padrões de mobilidades anteriores, colocando a migração como estratégia que indivíduos e grupos utilizam para sair da situação de pobreza.

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