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Marcela Marques Monteiro Tese de Doutorado janeiro 2017

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Academic year: 2018

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B UL L E T I N D E S O E UV R E S E T M I S S I O NS B É NÉ D I C T I NE S A U B R É S I L (1909-1914); C E NA S G E NÉ R I C A S E PA D R Õ E S R E T ÓR I C O S L I T E R Á R I O S

MA R C E L A MA R QUE S MONT E IR O

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B UL L E T I N D E S O E UV R E S E T M I S S I O NS B É NÉ D I C T I NE S A U B R É S I L (1909-1914); C E NA S G E NÉ R I C A S E PA D R Õ E S R E T ÓR I C O S L I T E R Á R I O S

1 V OL UME

T ese de doutorado submetida ao Programa de Pó s-Graduaçã o em L etras Neolatinas da Universidade F ederal do R io de J aneiro –UF R J , como parte dos requisitos necessários à obtençã o do título de D outor em L etras Neolatinas (E studos L iterários Neolatinos - Opçã o: L iteraturas de L íngua F rancesa).

Orientadora: Professora D outora C elina Maria Moreira de Mello

C oorientador: Professor D outor Henrique F ortuna C airus

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F IC HA C A T A L OGR Á F IC A

Monteiro, Marcela Marques

Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil (1909-1914); cenas genéricas e padrões retóricos literários / Marcela Marques Monteiro. R io de J aneiro: UF R J /F aculdade de L etras, 2017.

155 f.

Orientadora: Professora D outora C elina Maria Moreira de Mello C oorientador: Professor D outor Henrique F ortuna C airus

T ese (doutorado) – UF R J / F L / Programa de Pós-graduaçã o em L etras Neolatinas, 2017.

1. Periódicos 2. D iscurso R eligioso 3. C ena Genérica 4.C ampo religioso 5.Habitus 6. E thos

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Marcela Marques Monteiro

Orientadora: Professora D outora C elina Maria Moreira de Mello C oorientador: Professor D outor Henrique F ortuna C airus

T ese de D outorado submetida ao Programa de Pós-Graduaçã o em L etras Neolatinas da Universidade F ederal do R io de J aneiro – UF R J , como parte dos requisitos necessários à obtençã o do título de D outor em L etras Neolatinas (E studos L iterários Neolatinos - Opçã o: L iteraturas de L íngua F rancesa). Orientadora: Professora D outora C elina Maria Moreira de Mello. C oorientador: Professor D outor Henrique F ortuna C airus

E xaminada por:

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Presidente, Profª. D outora C elina Maria Moreira de Mello - UF R J

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Prof. D outor Henrique F ortuna C airus – UF R J

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Profª. D outora V era L úcia de C arvalho C asa Nova - UF MG

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Prof. D outor Irineu E duardo J ones C orrê a – F B N

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Prof. D outor L eonardo Pinto Mendes – UE R J

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Prof. D outor Pedro Paulo Garcia F erreira C atharina - UF R J

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Profª. D outora F ernanda Maria de S ouza e S ilva - UF R J , S uplente

_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Profª. D outora Mariluci Guberman - UF R J , S uplente

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A GR A D E C IME NT OS

Nos últimos quatro anos, foram vários os que diretamente ou indiretamente colaboraram com esta pesquisa. Gostaria, primeiramente, de agradecer à minha querida orientadora Professora D outora C elina Maria Moreira de Mello, por ter tido a coragem e a paciê ncia de orientar meus estudos e pesquisas; mesmo com todas as dificuldades de distância e comunicaçã o, sempre me apoiou, me incentivou e, sobretudo, guiou-me nos meus estudos

A o Professor D outor Henrique C airus, que na sua coorientaçã o atenciosa mostrou caminhos e viabilizou o desenvolvimento da T ese, meu muitíssimo obrigado.

Gostaria de agradecer também ao Professor D outor Pedro Paulo Garcia F erreira C atharina, ao Professor D outor L eandro Menezes, à Professora D outora F lora D e Paoli F aria e à Professora D outora S onia C ristina R eis, que em suas disciplinas, possibilitaram-me vislumbrar os caminhos desta pesquisa.

Um agradecimento muito especial é dirigido ao Padre V anthuy, que me apresentou ao Bulletin des oeuvres et missions beneditinas au Brésil e possibilitou-me a realizaçã o de um estudo em língua francesa acerca da minha terra natal, R oraima.

Gostaria de agradecer ao B ispo de R oraima, D om R oque, que viabilizou minhas pesquisas nos arquivos da Prelazia de R oraima.

Um especial agradecimento ao D om Mauro F ragoso e ao Irmã o Pascoal do Mosteiro de S ã o B ento, no R io de J aneiro, pelo tempo e atençã o a mim dedicados nas pesquisas aos volumes do Bulletins des oeuvres et missions bénédictines au Brésil do acervo do arquivo do mosteiro. Obrigada pela preciosa ajuda.

A gradeço ainda à Irmã Maria L etícia, da A badia de S anta Maria, em S ã o Paulo, pela atençã o, que me dispensou na busca de exemplares do Bulletin na biblioteca da abadia.

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dias sobre minha pesquisa.

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(1909-1914); cenas genéricas e padrões retóricos literários T ese de D outorado submetida ao Programa de Pós-Graduaçã o em L etras Neolatinas da Universidade F ederal do R io de J aneiro - UF R J , como parte dos requisitos necessários para a obtençã o do título de D outor em L etras Neolatinas, área de concentraçã o E studos literários neolatinos, opçã o L iteraturas de língua francesa. R io de J aneiro, 2017, 155 fls.

R E S UM O

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- UF R J , como parte dos requisitos necessários para a obtençã o do título de D outor em L etras Neolatinas, área de concentraçã o E studos literários neolatinos, opçã o L iteraturas de língua francesa. R io de J aneiro, 2017, 155 fls.

R É S UM É

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- UF R J , como parte dos requisitos necessários para a obtençã o do título de D outor em L etras Neolatinas, área de concentraçã o E studos literários neolatinos, opçã o L iteraturas de língua francesa. R io de J aneiro, 2017, 155 fls.

A B S T R A C T

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S UM Á R I O

1. I NT R O D UÇ Ã O ... 14 2. C E NA G E NÉ R I C A , C A M PO , E T H US E H A B I T US : A S PE C T O S C ONC E I T UA I S 19 3 O S B E NE D I T I NOS NO V A L E D O R I O B R A NC O: L UT A S NO C A M PO D O PO D E R 26

3.1 Missões religiosas na Guyana Portuguesa... 26 3.2. B rasil, B élgica e a Ordem de Sã o B ento ... 31 3.3. Os beneditinos no V ale do R io B ranco ... 35

4 M I S S Õ E S B E NE D I T I NA S NO V A L E D O R I O B R A NC O : D I Á R I O E L I T E R A T UR A D E V I A G E M ... 40 5 O D I S C UR S O R E L IG I O S O E O F A M O S O C A SO D O R I O B R A NC O NO

B UL L E T I N D E S OE UV R E S E T MI S S I ONS B É NÉ D I C T I NE S A U B R É S I L ... 53

5.1 O F amoso C aso do R io B ranco ... 53 5.1.1 L ettre de Rio Branco ... 54 5.1.2 Une journée critique à la Mission du Rio Branco ... 57 5.1.3 Suite des événements du Rio Branco I ... 62 5.1.4. Suite des événements du Rio Branco II ... 63 5.1.5 E vénements du Rio Branco: conclusion ... 67 5.2 A s lutas de poder e o discurso religioso no C aso do R io B ranco ... 69 5.3 O folhetinesco no F amoso C aso do R io Branco ... 77

6. A F UNÇ Ã O D A S PE R S O NA G E NS NA NA R R A T I V A B E NE D I T I NA ... 89

6.1 A distância no discurso narrativo ... 92 6.2 A modalizaçã o na narrativa beneditina ... 94 6.3 A s funções das personagens:entre o salvador e o salvado ... 99 6.3.1 A sequê ncia das funções ... 99 6.3.2 Sequê ncia na narrativa beneditina ... 102

7. C A R T A S D E M I S S Ã O B E NE D I T I NA S E O R E T R A T O F A L A D O D O V A L E D O R I O B R A NC O ... 111

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1. I NT R O D UÇ Ã O

O desejo de realizar um estudo em periódicos de língua francesa, que agregasse novos conhecimentos com um valor cultural para a regiã o da qual sou natural, R oraima, foi o que impulsionou o estudo para esta T ese de D outorado. A localizaçã o político-geográfica de R oraima nã o favorece relações de comunicaçã o entre R oraima e países falantes do francê s, visto que o estado faz fronteira com a R epública C ooperativa da Guyana (país de língua inglesa) e a R epública B olivariana da V enezuela (país de língua espanhola).

1

T al fato dificulta um estudo, no qual a língua francesa esteja vinculada a esta realidade local. C ontudo, há um século circulava na E uropa um periódico que, além de ser publicado em francê s, abordava temas referentes à regiã o mais setentrional do B rasil, a regiã o do estado de R oraima.

Os padres beneditinos, vinculados à A badia de S aint A ndré, na B élgica, da Ordem de S ã o B ento, chegaram a B oa V ista, atual capital do estado de R oraima, em 1909. T ais monges produziram uma série de textos acerca da sua vinda e estada nesta regiã o brasileira. E sses textos eram formados por cartas, relatos de viagem e descrições de paisagens, além de algumas línguas indígenas, que foram enviados à A badia de S aint A ndré para a publicaçã o do que seria o Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil. E ste periódico continha, em vários números, a Missã o do Rio Branco como tema de suas matérias publicadas. A cada dois meses um número do periódico era publicado na B élgica.

2

Os beneditinos, impulsionados pelo lema ora et labora, ora e trabalha, construíram a sede da prelazia em B oa V ista, reestruturaram a igreja da cidade dedicada a Nossa S enhora do C armo, instituíram oficinas de carpintaria e mecânica, bem como, dedicaram-se à evangelizaçã o dos índios, principalmente W apichanas e Macuxís, e à chamada desobriga (celebrações pontuais que o padre fazia aos moradores das zonas rurais para se desobrigarem dos sacramentos da confissã o e comunhã o Pascal). E m 1914, os missionários beneditinos se retiraram do V ale do R io B ranco e somente retornaram em 1920. A pós quarenta anos de evangelizaçã o na regiã o, em 1948, os beneditinos deixaram definitivamente o V ale do R io

1

C f. F R E IT A S, A imberê . Geografia e história de Roraima. B oa V ista: D L V , 2001, p.11-13.

2

E m 1909, ano da chegada dos beneditinos, a regiã o que hoje é chamada de estado de R oraima se chamava V ale

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B ranco a pedido de seus superiores do R io de J aneiro e deram lugar à congregaçã o italiana, Nossa S enhora da C onsolata.

3

O estudo dos padrões retóricos literários do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil, dos missionários beneditinos, a partir das cenas genéricas presentes nesse periódico, que foi escrito para os fiéis e benfeitores da obra missionária e publicado pela A bbaye de S aint-A ndré par L ophem, B élgica, desenvolveu-se à luz das teorias da análise do discurso francesa de D ominique Maingueneau e Patrick C haraudeau, dando especial ê nfase à s cenas genéricas e aos modos de organizaçã o discursiva do periódico. F oram também utilizados os conceitos de campo, trajetória, e habitus do sociólogo Pierre B ourdieu.

Procurou-se saber neste estudo quais as cenas genéricas presentes nos artigos do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil? Quais os padrões literários destas cenas genéricas? E como se caracteriza o ethos do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil?

A pós uma leitura de alguns números do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil, supôs-se que o periódico apresentava cenas genéricas narrativas e descritivas; que as cenas genéricas narrativas dos mitos indígenas traziam o interdiscurso literário do conto folclórico ou das lendas populares valorizadas a partir do romantismo, enquanto que as cenas genéricas descritivas projetavam quadros de paisagens pitorescas e exóticas; e que as cenas genéricas do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil eram construídas com um padrã o literário, para servir de fiador a um ethos missionário, e portanto estariam inseridas em um modo de organizaçã o argumentativo, vinculado ao discurso religioso.

Os objetivos do estudo foram: caracterizar as cenas genéricas presentes nos artigos do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil; verificar os padrões retóricos literários das cenas genéricas do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil; caracterizar o ethos do periódico, na interseçã o entre discurso literário e discurso religioso. B uscam-se, em uma análise sociodiscursiva, os padrões literários das cenas genéricas do periódico, no que se refere à organizaçã o dos padrões narrativos, descritivos e argumentativos dos artigos, do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil, no intuito de verificar o que se diz, como se diz, para quem se diz.

3

C f. MONGIA NO, A ldo. Roraima entre profecia e martírio: testemunha de uma Igreja entre os índios nas

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A originalidade se fez presente no tratamento atribuído à pesquisa, que utilizou o periódico como objeto de estudo e nã o apenas como fonte de referê ncias, como podemos ver em C IR INO, 2009 e em V IE IR A , 2003. Outro ponto que concerne ao quesito originalidade foi a abordagem analítica sociodiscursiva dada ao tratamento dos padrões literários dos artigos, que convocou o interdiscurso literário em um periódico inserido no discurso religioso. O período das publicações do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil objeto desta tese abrange os anos de 1909 até o ano de 1914. E ste recorte ocorreu em virtude da falta de acesso, no B rasil, dos outros números do periódico, que estã o disponíveis na A badia de S aint A ndré, na B élgica. O último número do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil encontrado nos arquivos do Mosteiro de S ã o B ento foi referente ao ano de 1914. A o final do último volume, encontra-se uma nota do arquivista-mor do Mosteiro do R io de J aneiro, D om Mateus R amalho R ocha, que informava a suspensã o da aquisiçã o do Bulletin, pelo Mosteiro de S ã o B ento, pois a A badia de S aint A ndré-L ophem em B ruges-B élgica , nã o seria mais responsável pela C ongregaçã o B eneditina do B rasil e em decorrê ncia disto, o Bulletin nã o mais trataria de assuntos referentes ao B rasil.

4

T al fato nã o foi confirmado neste estudo, pois nem os tomos anteriores a 1909 e nem os posteriores a 1914 estã o disponíveis nos arquivos do Mosteiro de S ã o B ento do R io de J aneiro.

Os textos selecionados para a pesquisa foram selecionados a partir do tema "Missã o do R io B ranco", que tratava da missã o beneditina com o objetivo de evangelizar povos indígenas da regiã o Norte do B rasil. A demais, outros textos do Bulletin foram analisados na perspectiva da contextualizaçã o sócio histórica da produçã o literária dos beneditinos, pois tratam da escola claustral, vida e educaçã o monástica entre outros temas.

A pesquisa iniciou-se na B iblioteca da Prelazia de R oraima. E m seguida, buscou-se nos arquivos do Mosteiro de S ã o B ento, no R io de J aneiro, os exemplares originais do Bulletin. V erificou-se na B iblioteca da A badia de S anta Maria, em S ã o Paulo, possíveis exemplares do B ulletin, que nã o se encontravam no Mosteiro de S ã o B ento. Na B iblioteca J osé de A lencar da F aculdade de L etras da Universidade F ederal do R io de J aneiro, na Mediateca da Maison de F rance no R io de J aneiro, no Gabinete R eal Portuguê s do R io de J aneiro, na B iblioteca Nacional do R io de J aneiro e na B iblioteca E stadual do A mazonas, buscou-se títulos que abordassem o contexto social e histórico, bem como os que abordassem temas relacionados ao referencial teórico. A cervos online como o da Gallica

4

C f. Bulletin des Oeuvres et Missions Bénédictines au Brésil. A bbaye de Saint A ndré par L ophem. T omo V , nº

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(http://gallica.bnf.fr/) e, em especial, do site da Hemeroteca da B iblioteca Nacional (http://memoria.bn.br/hdb/periodo.aspx) foram muito importantes para a conclusã o deste estudo.

A presente Introduçã o constitui o primeiro capítulo da dissertaçã o.

No segundo capítulo ─ C ena genérica, ethos, campo e habitus ─ será apresentado o quadro teórico, no qual este estudo se fundamentou, com destaque para as teorias da A nálise do D iscurso proposta por D ominique Maingueneau (2003, 2009, 2010), no que concerne principalmente aos conceitos de cena genérica, posicionamento e ethos, bem como à teoria do campo literário do sociólogo Pierre B ourdieu (1994, 1996, 1999) e os conceitos propostos por ele como capital, habitus, posiçã o.

O terceiro capítulo ─ Os B eneditinos no V ale do R io B ranco: lutas no campo do poder ─ traz uma contextualizaçã o sócio histórica da formaçã o e ocupaçã o do V ale do R io B ranco, que atualmente compreende o estado mais setentrional do B rasil, R oraima; apresenta as relações e alianças estabelecidas entre B rasil, B élgica e S anta S é, que viabilizaram a vinda dos beneditinos à regiã o do V ale do R io B ranco; narra a chegada dos beneditinos na regiã o do V ale do R io B ranco, e apresenta os membros da missã o e seus objetivos na A mazônia S etentrional.

O quarto capítulo ─ Missões no V ale do R io B ranco: diário e literatura de viagem ─ dispõe acerca dos padrões de publicaçã o do Bulletin beneditino e suas relações com os Annales de la propagation de la foi (1820) e sobre a cena genérica da literatura de viagem.

O quinto capítulo ─ O discurso religioso o famoso C aso do Rio Branco no Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil ─ apresenta o conjunto de cinco textos denominado para este estudo de O F amoso C aso do Rio Branco, publicados entre os anos de 1909 e 1910 de autoria dos monges D om A rchaire e D om A dalbert. O capítulo se desenvolve abordando aspectos relacionados à s lutas de poder e o discurso religioso relacionado ao F amoso C aso do R io B ranco, além de estabelecer uma relaçã o estética dos textos com os romances-folhetins da segunda metade do século X IX .

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2. C E NA G E NÉ R I C A , C A M PO , E T H O S E H A B I T US: A S PE C T O S C O NC E I T UA I S

A dotamos como quadro teórico a Análise do D iscurso francesa de D ominique Maingueneau e Patrick C haraudeau, na qual destacou-se os conceitos de cena genérica, os modos de organizaçã o discursiva e as noções que envolvem as cenas enunciativas. Para a leitura do periódico, recorreu-se, igualmente, à teoria dos campos de Pierre B ourdieu, aliada ao conceito de habitus e trajetória.

O sociólogo Pierre B ourdieu propõe, com a teoria dos campos, uma nova abordagem metodológica dos objetos das ciê ncias sociais, imprimindo, com suas teorias, uma renovaçã o da análise sociológica à s abordagens da literatura. Para B ourdieu, a produçã o de uma obra cultural, que é relativamente autônoma, é marcada pelo tempo/espaço e a sociedade envolvente. D e acordo com a teoria de B ourdieu, a sociedade é concebida como um espaço simbólico de lutas, entre agentes sociais pertencendo a esferas sociais específicas, por ele denominadas de campo. A s lutas sã o conduzidas por agentes que se relacionam e disputam, em um dado campo, por uma posiçã o de prestígio decorrente do acúmulo de capital. E ntende-se na teoria dos campos o capital nã o só como um dos quatro fatores de produçã o da economia, ao lado de terra, trabalho e empreendedorismos, mas também como capital social e cultural

5 .

O capital cultural é compreendido, por B ourdieu, como o arcabouço proveniente da formaçã o escolar ou obtido através da formaçã o de valores da família. Nele está incluído o capital simbólico advindo de rituais promovidos por instituições de prestígio social (prê mios, medalhas, títulos de reconhecimento). A s instituições sociais, que integram um dado campo, levam à formaçã o de redes de relações sociais entre os seus agentes, o que favorece a manutençã o de uma posiçã o de prestigio ou a sua ascendê ncia

6 .

O universo social divide-se, para B ourdieu, em campos autônomos, regidos por regras particulares, entre os quais se inclui o campo literário. C ontudo, apesar de sua aparente autonomia, as forças de um campo podem intervir em outro, como por exemplo, o campo político modificando as tensões e as posições dos agentes no campo literário. No caso

5

C f. B OUR D IE U, Pierre. Pour une science des oeuvres. In: _ _ _ . Raisons pratiques; sur la théorie de l’action.

Paris: S euil, 1994, p. 63.

6

B OUR D IE U, Pierre. C oisas ditas. traduçã o C ássia R . da Silveira e. D enise Moreno Pegorim ;revisã o técnica

(21)

específico do campo literário seus agentes sã o os autores, o público, a imprensa, os editores 7

. D esse modo, a literatura faz parte da sociedade, podendo modificá-la, inclusive, pois compondo esse grande campo, seu discurso é parte integrante do universo social.

No campo literário, há uma tensã o constante de forças que nã o sã o estáveis. S eus agentes sã o dinamicamente dispostos e o capital pode migrar internamente, tanto entre seus agentes quanto de um campo para outro. Isto é decorrente do movimento que é causado por promoções de alianças travadas para se estabelecer uma posiçã o melhor no campo e instituições antagonistas, que rivalizam a fim de ocupar, também, um lugar de prestígio. Para verificar quais as estratégias de produçã o cultural, é necessário estabelecer quais sã o todas as relações existentes entre os agentes e as instituições inerentes ao campo

8 .

C omo em todo espaço de lutas, existem aqueles que sã o dominantes e os que sã o dominados, e pretendem ocupar à posiçã o de dominantes. A s posições de dominaçã o decorrem do acúmulo de capital, porém, no campo literário, estar em uma posiçã o dominante nã o significa necessariamente acumular capital econômico e sim acumular capital social e, principalmente, simbólico específico. Isso decorre das escolhas genéricas, da forma de publicaçã o da obra e das parcerias editoriais.

A s lutas no campo literário sã o para marcar época: “marcar época é, inseparavelmente, fazer existir uma nova posiçã o para além das posições estabelecidas”

9 . Manter uma posiçã o significa pactuar, estabelecer alianças entre os agentes do campo e muitas vezes fora do campo literário, como o campo político e o social. O objetivo dos dominados é justamente quebrar esse paradigma hierárquico para que os novos/dominados ocupem seu lugar de destaque. A s posições dos agentes mudam ou se estabelecem através do volume acumulado ou forma com que os diferentes tipos de capital estã o dispostos

10 .

O projeto de criaçã o de uma obra é fruto de uma negociaçã o do autor entre a sua vontade e as possibilidades disponíveis no campo:

A relaçã o que se estabelece entre as posições e tomadas de posiçã o nada tem,

podemos ver, de determinaçã o mecânica: cada produtor, escritor, artista, estudioso,

7

C f. B OUR D IE U, 1994, p. 68.

8

C f. B OUR D IE U, Pierre. As regras da arte: gê nese e estrutura do campo literário. 2ª ediçã o. T rad. Maria L úcia

Machado. Sã o Paulo: C ompanhia das L etras, 1996. p. 64-68

9

B OUR D IE U, 2010, p. 181

10

(22)

constrói seu próprio projeto criador em funçã o da percepçã o das possibilidades

disponíveis pelas categorias de percepçã o e apreciaçã o inscritas no seu habitus.

11

Para entender a dinâmica do espaço social, juntamente com a teoria dos campos, B ourdieu apresenta o conceito de habitus.

Um indivíduo nasce inserido em uma sociedade e é cingido por representações, pensamentos e práticas sociais específicas desse meio social. D urante toda sua vida, ele absorve esses elementos, que sã o condutores de suas ações e escolhas nas alianças feitas no campo. E , mesmo que inconscientemente, este será parte do projeto criador

12

. Para B ourdieu, habitus é entendido como: “[...] sistema das disposições socialmente constituídas que, enquanto estruturas estruturadas e estruturantes, constituem o princípio gerador e unificador do conjunto das práticas e das ideologias características de um grupo de agentes”

13 .

A primeira exposiçã o ao habitus se dá com a família no seio familiar (pais, irmã os, avós, primos) e é chamado de primário. E m um segundo momento, sã o as instituições como a escola, a universidade e as ideias de agentes dominantes no espaço social que incrementam esse arcabouço de valores e princípios constituídos

14 .

Utilizando-se da teoria dos campos de Pierre B ourdieu, D ominique Maingueneau propõe um método de investigaçã o literária, no qual o autor, instância responsável pela enunciaçã o de uma obra, está inserido em um espaço social e, como agente do campo literário, estáexposto a todas as tensões nele existentes, obedecendo a suas regras específicas.

15

A s escolhas enunciativas, as alianças estabelecidas, o local de produçã o e a intertextualidade sã o exemplos de fatores que mantê m uma relaçã o dinâmica na produçã o literária. Maingueneau afirma que, para a análise literária, nã o basta observar os enunciados de uma obra, mas também as condições de sua produçã o, inscritas em sua enunciaçã o.

A intertextualidade é um procedimento que agrega um duplo movimento: relações temáticas e/ou de linguagem entre textos literários de um mesmo país, ou de países diferentes.

11

C f. B OUR D IE U, 1994, p. 71.

“L a relation qui s’établit entre les positions et les prises de position n’a rien, on le voit, d’une détermination

mécanique : chaque producteur, écrivan, artiste, savant, construit son propre projet créateur en fonction de la

perception des possibilités disponibles que lui assurent les catégories de perception et d’appréciation inscrites

dans son habitus.’’ T . da A . exceto quando explicitamente referido.

12

B OUR D IE U, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 7ª E d. T rad. Sérgio Miceli ( et al). Sã o Paulo, E ditora

Perspectiva, 2001, p. 190.

13

B OUR D IE U, 2001, p. 191.

14

C f. B OUR D IE U, 2001, p. 199.

15

C f. MA ING UE NE A U, D ominique. O contexto da obra literária: enunciaçã o, escritor e sociedade. 2ª E d.

(23)

A qui, a intertextualidade é entendida como resultando das relações estabelecidas entre o texto e outros que lhe servirã o de referê ncia explicita ou implicitamente. E la pode ser interna quando essa relaçã o se faz com textos criados em um mesmo campo e externa quando os textos em questã o sã o originários de campos diferentes

16

. Outro procedimento agregador que pode surgir em uma obra é a interdiscursividade. E la é percebida como sendo o conjunto de gê neros presentes numa obra, que pode relacionar-se ainda com outras práticas discursivas nã o literárias

17 .

Na produçã o de uma obra literária, além das questões relativas diretamente ao agente na produçã o cultural, tais como a intertextualidade, a interdiscursividade, as escolhas genéricas, também se observam as relações inter e extra agentes. A compreensã o da estetizaçã o da obra literária é indissociável da observaçã o da tribo à qual pertence o autor e dos espaços sociais onde estã o reunidos os agentes do campo que comungam uma estética, a exemplo das escolas e grupos literários. A s tribos sã o marcadores ideológicos da estética literária, que nã o sã o ligados necessariamente a um espaço físico, mas que mantê m uma intrínseca relaçã o com as instituições e o processo criador. E las estruturam a produçã o artística, pois contatos com outros agentes do campo sã o efetuados possibilitando troca de correspondê ncias, associações com agentes que comungam o mesmo modo de vida.

18 . A s lutas por acúmulo de capital no campo entre as tribos o tornam instável e guiam a produçã o artística nele cingida.

No ato de produçã o literária, o autor está se posicionando no campo. Quando opta por uma estética específica ou mesmo se recusando a tal, querendo produzir algo novo, ele o faz em contraposiçã o e está optando por um posicionamento antagônico a alguma estética pré -existente

19

. A s relações, alianças e querelas, nas quais os criadores se envolvem, revelam o posicionamento do autor no campo literário.

Na vida literária esse posicionamento nã o é constante, ele modifica-se junto com as variações de forças no campo. Quando Maingueneau trata de posicionamento e vida literária, ele destaca a necessidade de analisar o surgimento das obras literárias considerando a

16

C f. C H A R A UD E A U, Patrick; MA ING UE NE A U, D ominique. D icionário de Análise do D iscurso. C oord. de

T rad. F abiana K omesu. Sã o Paulo: E ditora C ontexto, 2008, p. 288-290.

17

C f. MA ING UE NE A U, D ominique. C enas da enunciaçã o. Organizaçã o de Sírio Possenti e Maria C ecília

Pérez de Souza-e-Silva. S ã o Paulo: Parábola E ditorial, 2008, p. 286.

18

C f. MA INGUE NE A U, D ominique. D iscurso literário. T rad. A dail Sobral. S ã o Paulo: E ditora C ontexto, 2009,

p. 96.

19

(24)

trajetória 20

do autor, no campo literário, como uma construçã o identitária irremediavelmente ligada à s diferentes tomadas de posiçã o do autor ao longo de sua vida e à s suas escolhas genéricas. E stas se dã o em funçã o de uma relaçã o com seu espaço de criaçã o circunscrito a uma filiaçã o estética e a sua história de vida; é o que Maingueneau chama de investimento genérico

21

. A s escolhas genéricas que o autor faz e o posicionamento que ele estabelece na sua trajetória de vida lhe conferem uma autoridade enunciativa. A legitimidade do seu enunciado é atribuída pela coerê ncia na construçã o de sua obra ao longo da vida do auctor.

O agente no campo literário ocupa posições. Ocupar uma posiçã o é ocupar um espaço por meio de tomadas de decisões. Os espaços simbólicos no campo literário possuem regras próprias e seus candidatos à ocupaçã o devem possuir qualidades específicas ou procurar desenvolvê -las. E ssas qualidades traçam um perfil ao qual o autor tem que se adequar. A ocupaçã o de uma posiçã o também está vinculada à s escolhas feitas pelos agentes, diante do espaço dos possíveis, ou seja, de acordo com os espaços disponíveis no campo e o perfil dos seus pretensos ocupantes. A permanê ncia no espaço é delicada e se deve a um equilíbrio entre fatores relativos ao acúmulo de capital, à s correntes antagônicas emergentes, filiações e alianças, escolhas genéricas. C ada fator sozinho ou associado a outro pode influenciar para que toda a rede de posições seja afetada.

Para a análise do discurso literário, outras áreas de observaçã o sã o adicionadas ao estudo de uma obra literária, tais como seus suportes de ediçã o, a imprensa, biografias, prefácios e cartas, os quais possibilitam uma ligaçã o direta da obra com seus elementos criadores, a vida do escritor e a sociedade. A enunciaçã o de uma obra é parte da sociedade

22 . A esse processo discursivo, pelo qual o enunciado se constrói e se legitima, Maingueneau chama de cena enunciativa. A cena enunciativa envolve relações entre o enunciador, o co-enunciador, o local e o momento da construçã o do discurso

23

. Maingueneau apresenta trê s cenas que complementam a cena enunciativa. O tipo de discurso empregado na enunciaçã o é denominado cena englobante; possuindo marcas enunciativas próprias, localiza o enunciador em um lócus da sociedade e direciona o discurso a um determinado público. A cena genérica trata das circunstâncias da produçã o verbal, o veículo de expressã o do enunciado relacionando-o a um gê nero que possui marcas enunciativas.

20

C f. B OUR D IE U, 1994, p. 78.

21

C f. MA ING UE NE A U, 2001, p. 151-162.

22

C f. MA ING UE NE A U, 2001, p. 27.

23

(25)

Os fieis da obra missionária beneditina esperam se deparar, em sua leitura, com um padrã o de produçã o escrita oriundo de padres missionários, que esteja de acordo com a formaçã o oferecida pela Igreja C atólica do início do século X X , o que originaria gê neros determinados textuais e legitimaria um tipo específico produçã o escrita, um ethos católico, erudito e europeu.

A cenografia é o processo pelo qual o discurso é apresentado e validado. É uma construçã o que apresenta ao leitor, em primeira instância, o discurso, preparando na obra um terreno próprio para que o enunciado se situe.

24

S egundo Maingueneau, a cenografia é “o centro em torno do qual gira a enunciaçã o: a cena englobante, a cena genérica e a cenografia compõem as partes da cena enunciativa.

25

C ontudo, outros elementos estã o intimamente ligados a ela, como é o caso do ethos.

O ethos retórico é a imagem que é construída a partir da elocuçã o e obtida através de gestos, expressões facial e postural, timbre de voz do locutor. E ntretanto, Maingueneau assevera que o ethos, para a análise do discurso, é uma representaçã o dinâmica que, além de nã o estar limitada especificamente à fala, pode ser percebida, neste caso de forma mais perene, na linguagem escrita, com suas marcas próprias de enunciaçã o. A imagem do autor pode ser “elaborada na confluê ncia de seus gestos e suas palavras de um lado, e das palavras dos diversos públicos que, a títulos diferentes em funções de seus interesses, contribuem para moldá-la”

26 .

O ethos é o resultado de uma inter-relaçã o entre vários tipos de éthe: o ethos pré -discursivo, aquele que vincula o gê nero do discurso a uma determinada imagem do enunciador; o ethos discursivo vinculado ao modo como o enunciador se apresenta; o ethos dito, o que é falado direta ou indiretamente em um enunciado; o ethos afetivo, o que é construído pelo destinatário

27 .

O co-enunciador atribui ao enunciado um fiador, que, corporalizando as representações coletivas, possibilita uma associaçã o com o discurso no qual o enunciado está inserido e uma adesã o a este discurso. E le é percebido através de indícios que reunidos relacionam a identidade do enunciador com o mundo no qual este está inserido. A ligaçã o entre o texto e um gê nero do discurso ou um posicionamento ideológico sugere expectativas

24

C f. MA ING UE NE A U, 2009, p. 251-253.

25

MA INGUE NE A U, 2009, p. 264.

26

MA ING UE NE A U, 2001, p. 144.

27

(26)

no que concerne ao ethos. “A obra (o mapa) supostamente representa o mundo (o território) do qual sua enunciaçã o de fato participa: as propriedades carnais da enunciaçã o sã o tomadas do mesmo material que o mundo que ela representa”

28 .

Para esta T ese, também foram utilizados, como referê ncia de apoio para as pesquisas em periódicos do século X X , os estudos de Marie-Ève T hérenty, D ominique K alifa, Philippe R égnier e A lain V aillant, acerca da história cultural e literatura da imprensa francesa. Por meio dessas referê ncias, pode-se compreender o funcionamento da imprensa do século X IX e início do século X X , periodizaçã o, tipologia histórica e escrita da imprensa. T al compreensã o contribuiu para o desenvolvimento da leitura objetiva e clara do Bulletin des oeuvres et missions bénédictines au Brésil.

O capítulo seguinte propõe-se a contextualizar histórica e geograficamente a regiã o do V ale do R io B ranco, regiã o que hoje é denominada E stado de R oraima, no extremo norte do B rasil. T ambém visa mostrar como as missões evangelizadoras católicas adentraram à regiã o A mazônica, em especial ao V ale do R io B ranco, culminando com a chegada dos monges missionários da Ordem de S ã o B ento

28

(27)

3 O S B E NE D I T I NOS NO V A L E D O R I O B R A NC O: L UT A S NO C A M PO D O PO D E R

O V ale do R io B ranco, regiã o localizada do extremo norte do B rasil, teve sua história de ocupaçã o semelhante a várias outras regiões brasileiras. D esde o início da colonizaçã o brasileira, agricultores, pecuaristas de outras regiões, imigrantes portugueses, militares e religiosos povoaram a regiã o, que já era ocupada pelos indígenas, unificando o território e protegendo contra invasã o estrangeira.

29

Os beneditinos chegaram à regiã o do V ale do R io B ranco em 1909 com a intençã o de divulgar a fé católica aos índios da regiã o e também fazendo parte da ocupaçã o territorial. E les participaram da vida social da regiã o e deixaram claro seu posicionamento religioso à sociedade envolvente. E ssa ocupaçã o pode ser observada sob a perspectiva da teoria dos campos do sociólogo Pierre B ourdieu (1994) que é uma abordagem metodológica dos objetos das ciê ncias sociais.

30

3.1 M issões r eligiosas na G uyana Por tuguesa

Para que se entenda o campo social e religioso da B acia do R io B ranco é primordial conhecer a história da ocupaçã o política da regiã o, que desde o século X V I teve a circulaçã o em suas terras e rios, de militares e colonos, além da presença, mesmo que pouco constante, de missionários religiosos.

O B rasil desde o início de sua colonizaçã o já possuía extensões continentais. Para constituir o que hoje sã o os seus 8.515.767,049 K m² de área geopolítica

31

, foi necessário, a partir do descobrimento e posterior colonizaçã o, que ele fosse ocupado e suas fronteiras protegidas contra invasã o estrangeira.

A o norte do B rasil, na A mazônia, a história dessa ocupaçã o foi registrada pela imprensa e pelos relatos de viagem dos naturalistas e missionários que estiveram na regiã o. No século X V I, a área que compreendia o estado de R oraima era conhecida como Guyana

29

C f. F R E IT A S, 2001, p.10.

30

C f. B OUR D IE U, Pierre. Pour une science des oeuvres. In: _ _ _ . Raisons pratiques; sur la théorie de l’action.

Paris: S euil, 1994, p. 63.

31

Instituto B rasileiro de Geografia e E statística- IB G E . D isponível em:

http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias

(28)

Portuguesa e compreendia a B acia do R io B ranco, uma parte dos estados do Pará, A mapá e A mazonas. A regiã o, que também era chamada de Nova Mesopotâmia, por C harles M. de L a C ondamine

32

, devido aos interesses imperialistas entre portugueses, ingleses, holandeses, espanhóis e franceses, correspondia à circunscriçã o dos rios C assiquiare, Negro, Orinoco, A mazonas e ainda pelo oceano A tlântico.

33

A coroa portuguesa iniciou, em 1693, a colonizaçã o do V ale do R io B ranco com a finalidade de proteçã o das fronteiras contra invasores. A lém de questões imperialistas, havia a lenda do E l D orado

34

, que trazia à A mazônia setentrional vários aventureiros europeus com o intuito de encontrarem fortuna através da exploraçã o das riquezas minerais da regiã o, em especial o ouro. Os portugueses começaram a se referir à bacia do rio B ranco como V ale do R io B ranco, iniciou-se o processo de ocupaçã o da área por meio de feitorias, que consistiam em unidades de coleta e extraçã o das riquezas silvestres chamadas de “drogas do sertã o”.

35 ,

36 , 37

Para dar continuidade ao processo de ocupaçã o do norte da colônia, Portugal permitiu o assentamento de missionários religiosos. A s ordens reli giosas dividiram seu espaço de atuaçã o na regiã o A mazônica. E stabeleceu-se que o R io A mazonas atuaria como uma linha fronteiriça de assentamento, onde a área ao sul do rio estaria sob a responsabilidade da Ordem dos J esuítas e a área ao norte seria da competê ncia das Ordens dos Mercedários, dos F ranciscanos de S anto A ntônio, dos F ranciscanos da Piedade e dos C armelitas.

38

32

Matemático francê s que foi designado por L uis X V , em 1735, a lançar-se em uma expediçã o ao Peru, cujo

objetivo era verificar a teoria do A chatamento da T erra nas regiões Polares de Isaac Newton, mensurando vários

graus na regiã o da linha do E quador. O retorno dessa expediçã o se fez pelo rio A mazonas, um trajeto mais

longo. A sua expediçã o durou dez anos e o matemático observou também topografia, astronomia e vegetaçã o da

regiã o A mazônica C f. GR E F F E , F lorence. L A C OND AMINE : inventaire. Paris: A C A D E MIE D E S SC IE NC E S ,

1996, p. 3-4.

D isponível em: http://www.academiesciences.fr/activite/archive/dossiers/C ondamine/F onds_ C ondamine.pdf.

A cessado em:16/10/2013.

33

C f. S A NT OS, A dair J . Roraima: história geral. B oa V ista. E ditora da UF R R , 2010, p.19.

34

C onhecida como a C idade do Ouro. C f. S A NT OS, 2010, p. 21.

35

O rio B ranco, afluente do rio Negro, era chamado de Queceuene, foi oficialmente descoberto pela coroa

portuguesa por Guilherme V alente em 1670. A regiã o do V ale do R io B ranco compreendia toda a bacia do rio

B ranco e seus afluentes. C f. S A NT OS, 2010, p. 43, 46.

36

Nome adotado para referir-se à regiã o ao longo de todo deste estudo.

37

C f. S A NT OS, 2010, p. 19.

38

C f. HOOR NA R E T , E duardo. O significado histórico do ciclo missionário carmelitiano na Amazônia

(29)

Os C armelitas, ordem religiosa dedicada à Nossa S enhora do Monte C armel, em 1725, chegaram das fortificações do rio Negro, para estabelecer missões nos aldeamentos (C armo, S anta Maria, S ã o F elipe e C onceiçã o, dentre outras.) da regiã o do V ale do R io B ranco.

39 A lém da missã o evangelizadora, as carmelitas participavam de expedições de D escimentos ou R eduções, que tinham por objetivo convencer os índios a sair da mata e descer aos aldeamentos localizados próximos aos núcleos coloniais

40

. D as E ntradas nas matas, que eram expedições empreendidas pela coroa portuguesa a fim de expandir e estruturar o território, também havia o que se chamou de T ropas de R esgate, movimentos armados que tinham por objetivo capturar índios para comercializaçã o.

41

Nas T ropas de R esgate, os índios das tribos aliadas trocavam seus prisioneiros de guerras intertribais por mercadorias, muitas vezes utilizando a força armada quando nã o havia colaboraçã o por parte dos tuxauas, os chefes das tribos; eram as chamadas Guerras J ustas.

42

C om os decretos-leis do Marquê s de Pombal 43

, que culminaram com a expulsã o dos jesuítas dos territórios portugueses, os carmelitas foram obrigados, em 1755, a entregar os aldeamentos à administraçã o civil. A ssim, os carmelitas passaram a desenvolver suas atividades religiosas no V ale do R io B ranco através das desobrigas, onde ocasionalmente retornavam à regiã o a fim de celebrar missas, batizados, casamentos, extrema-unçã o e comunhã o, utilizando um altar portátil para a celebraçã o dos ritos.

44

No intuito de proteger as fronteiras do norte da colônia, a coroa portuguesa iniciou a construçã o de uma série de fortalezas da foz do rio A mazonas até os seus afluentes, onde a penetraçã o invasora fosse mais facilmente identificada.

45

E m decorrê ncia de uma carta que denunciava entradas holandesas na regiã o do V ale do rio B ranco, de autoria do F rei J osé de Magdalena, V isitador Geral dos C armelitas, em 1751, nas quais o próprio autor fora

39

C f. HOOR NA R E T , 1980 , p.322.

40

C f. S A NT OS, 2010, p. 138.

41

Os padres participavam das T ropas de R esgate para determinar se a captura era justa ou nã o mediante a recusa

ou aceitaçã o do índio em converter-se ao cristianismo. C f. D A S IL V A , 2012, p.13.

42

C f. S A NT OS, 2010, p. 139.

43

Sebastiã o J osé de C arvalho e Melo ( 13/05/1699-08/05/1782) , foi secretário de E stado do R eino durante o

reinado de D . J osé I ( 1750-1777) , C f. K E NNE T H, Maxwell. Marquê s de Pombal: paradoxo do iluminismo. R io

de J aneiro: E ditora T erra e Paz, 1996, p. 1-4.

44

C f. D A SIL V A , 2012, p. 31.

45

F orte do C astelo (B elém-Pará), F ortaleza de Sã o J osé de Macapá ( Macapá-A mapá) , F orte de Guarupé ( Pará),

F ortaleza de Sã o J oã o da B arra (Manaus-A mazonas) , F orte Santarém de T apajós ( rio T apajós-Pará) , F ortaleza

dos Óbidos (Óbidos-A mazonas) , F ortaleza S ã o J osé de Marabitanas ( C ucuí-rio Negro A mazonas) , F ortaleza S ã o

Gabriel ( rio Negro-A mazonas), F ortaleza de T abatinga ( rio S olimões-A mazonas) , F ortaleza Príncipe da B eira

( rio Guaporé),F ortaleza do D esterro, F orte do T oere, F ortaleza de S ã o J oaquim (V ale do R io B ranco) . C f.

(30)

testemunha, o Imperador de Portugal, D om J osé I, enviou uma Ordem R égia ao governador do Pará, F rancisco X avier de Mendonça F urtado, para edificaçã o de uma fortaleza no rio B ranco, em 14 de novembro de 1752. T odavia, devido a questões relacionadas à s grandes distâncias da regiã o e à falta de recursos humanos e dinheiro, a construçã o da fortaleza no rio B ranco se estendeu até 1775, quando, por ocasiã o de outras invasões, no caso, as espanholas, houve uma aceleraçã o da construçã o do forte.

46

A confluê ncia dos rios T acutu e Uraricoera ( IL US T R A Ç Ã O 01) 47

foi a localizaçã o escolhida para a edificaçã o da fortaleza, que coincide com o início geográfico do rio B ranco. E m novembro de 1775, o capitã o engenheiro F elippe S turn, chegou ao local determinado para a construçã o, onde foi responsável pela obra e também primeiro-comandante até o ano de 1830.

48

46

C f. D A SIL V A , 2012, p 114-115.

47

A daptaçã o do mapa da hidrografia do estado de R oraima.

D isponível em: http://www.senado.gov.br/senadores/senador/Mozarild/img/Historia_ de_ R oraima_ img_ 5.jpg.

A cessado em: 24/10/2013.

48

C f. S A NT OS, 2010, p 116.

(31)

A F ortaleza de S ã o J oaquim do R io B ranco, comumente chamada de F orte de S ã o J oaquim, foi construída em formato trapezoidal ( IL UST R A Ç Ã O 02)

49

, com sua maior base voltada para o rio B ranco, e possuía uma capacidade operacional de dezesseis canhoneiras, porém nunca foi aparelhada na sua completude. A s obras foram concluídas em 1779; a fortaleza abrigava o comandante, capelã o, trinta soldados, além de índios e aldeões. T ambém possuía uma capela e a residê ncia do capelã o carmelita que se ocupava da atividade de desobriga.

O brigadeiro Manuel da Gama L obo D 'A lmada, governador da capitania S ã o J osé do R io Negro fez, da F ortaleza de S ã o J oaquim, sua base de atividades junto aos aldeamentos, dos quais era responsável, nos anos de 1776 e 1799. A presença dos carmelitas nos aldeamentos era pouco frequente. A os índios eram impostos os costumes cristã os, além de interdições de práticas que lhes eram peculiares, como a poligamia, a pintura do corpo para seus ritos, o ritual fúnebre de queimar os corpos dos parentes mortos em suas próprias casas e, também, nã o eram permitidas as andanças pela floresta.

50

Nas visitas, por ocasiã o da

49

Plano do F orte S ã o J oaquim do R io B ranco. B iblioteca Nacional. D isponível em:

http://objdigital.bn.br/acervo_ digital/div_ cartografia/cart249894.jpg. A cessada em 23/10/2013.

50

C f. D A SIL V A , 2012, p 33.

IL UST R A Ç Ã O 02: Planta baixa da F ortaleza Sã o J oaquim-Hemeroteca da

(32)

desobriga, os padres ratificavam essas proibições. E m consequê ncia desses fatos, insurreições indígenas ocorreram na regiã o.

51

E m 1790, um levante dos índios da etnia W apixana e Macuxí destruiu, com exceçã o do povoado de Nossa S enhora do C armo, todos os aldeamentos da regiã o. O F rei carmelita J osé do S anto A ntônio era o capelã o do F orte S ã o J oaquim, por ocasiã o do levante. Os colonos, revoltados, iniciaram uma perseguiçã o aos indígenas, com a ajuda dos reforços militares que chegaram após o incidente. A queles índios que se recusaram a render-se foram assassinados. O fato ficou conhecido na regiã o como o "massacre ou revolta da praia de sangue"

52

, pois o genocídio ocorreu em uma das praias do rio B ranco.

A pós 40 anos do massacre, em 1839, houve uma tentativa do frei J osé dos Inocentes de retomar as missões carmelitas na regiã o do V ale do R io B ranco. O frei J osé a batizou de Missã o Pirata, localizada à s margens do rio R apununy e que, posteriormente, foi transferida para as margens do rio Uraricoera. A lém dos ensinamentos religiosos, o frei J osé dos Inocentes introduziu as práticas incipientes de agricultura e silvicultura e construiu uma capela para a celebraçã o dos cultos em honra à padroeira de sua Ordem, Nossa S enhora do C armo.

53

F rei J osé dos Inocentes passou sete anos na regiã o do V ale do R io B ranco e foi substituído pelo padre A ntônio F elipe Pereira. A partir desse momento, os índios começam a abandonar a missã o por causa de maus tratos. A s práticas religiosas locais ficaram reduzidas à s pouco frequentes desobrigas e à s festas religiosas, passando essas a serem realizadas nas fazendas e sítios dos colonos, pois estes construíam capelas nas suas fazendas e convidavam outros colonos para visita-los, a fim ostentarem seu poder econômico e prosperidade.

54

3.2. B r asil, B élgica e a O r dem de S ã o B ento

No B rasil, final do século X IX , fatores advindos do campo econômico, como o advento da exploraçã o da borracha, causaram o aumento exponencial da populaçã o na A mazônia. D e apenas 337 mil habitantes em 1872, passou a populaçã o a 1,1 milhã o em 1906, colocando o B rasil no cenário do comércio mundial. O papa L eã o X III, diante deste fator de

51

C f. D A SIL V A , 2012, p 34.

52

C f. D A SIL V A , 2012, p. 35.

53

C f. D A SIL V A , 2012, p. 36.

54

(33)

concentraçã o populacional, que visava um maior acúmulo de capital econômico, iniciou uma série de ações para reorganizar e intensificar a presença reli giosa católica na A mazônia, sendo que uma delas foi a criaçã o do bispado do A mazonas em 1892.

55

F atores políticos também se fizeram pretextos da reestruturaçã o religiosa brasileira. A pós a proclamaçã o da R epública do B rasil, em 1889, com a separaçã o da Igreja e o E stado, as ordens religiosas foram enfraquecendo no território brasileiro. O governo proibiu os noviciatos no B rasil e, através da lei da "Mã o Morta", pretendia tomar posse dos bens e terras das ordens religiosas, pois transferiria os bens das ordens religiosas para o E stado, após a morte do último representante destas ordens em solo brasileiro, aumentando o patrimônio nacional. Uma das ordens religiosas que sofreu com as medidas do governo foi a Ordem B eneditina do B rasil.

56

A Ordem B eneditina foi criada e batizada com o nome de seu fundador, S ã o B ento. S ã o B ento (480-547) foi o “patriarca do monaquismo ocidental”. C onstruiu o Mosteiro de Monte C assino e implantou a R egra para os seus cenobitas

57

, que sã o normas de conduta para a vida monástica, sob a direçã o de um guia espiritual denominado abade, nome originado do hebraico abbas, que significa pai. A s R egras de S ã o B ento tinham por objetivo: “formar cristã o perfeitos, seguindo os ensinamentos de J esus C risto, mediante a prática dos mandamentos e conselhos evangélicos.” O equilíbrio entre estudo, trabalho, oraçã o e repouso era a filosofia (ora et labora): “oraçã o transformada em trabalho e trabalho em oraçã o, pela fé e pela obediê ncia”.

58

D iante desses fatores de ordem política, na última década do século X IX , a Ordem dos B eneditinos do B rasil, a qual contava apenas com dezenove monges nas sete abadias e mosteiros brasileiros, queria a intervençã o do papa para abrir um noviciado. C ontudo, o representante da S anta S é no B rasil, D om S polverini, se posicionava a favor do fim da C ongregaçã o B eneditina do B rasil, para que o patrimônio beneditino em solo brasileiro fosse redistribuído pelas demais dioceses do território.

59

55

C f. M A T A , Possidônio da. A Igreja católica na Amazônia da atualidade. (p.341-366). In: HOOR NA E R T ,

E duardo ( Org.) . História da Igreja na Amazônia. Petrópolis:1992. p. 343.

56

F R A G OS O, Hugo. A Igreja na formaçã o do estado liberal (p. 141-249). In: B E OZ Z O, J osé Oscar. História da

Igreja no Brasil. Petrópolis: V ozes, 1980, p. 204.

57

Gê nero de monges que vivem em mosteiros e obedecem a uma R egra e a um A bade. C f. S Ã O B E NT O. A

Regra. L atim/Portuguê s. 3ª ed. rev. R io de J aneiro: E ditora L umen C hristi, 2003, p. 21.

58

C ONT I I.M.C ., D om Servílio. O santo do dia. 10ª ed. rev. e atual. Petrópolis – R J : E ditora V ozes, 2006, p

371.

59

(34)

D iante deste posicionamento oposto à causa beneditina do representante da S anta S é, a C ongregaçã o B eneditina do B rasil nomeou seu abade geral, representante dos beneditinos, D om D omingos da T ransfiguraçã o Machado, para ir até a S anta S é e, juntamente com o papa L eã o X III, iniciar a restauraçã o monástica brasil eira. O pontífice incumbiu à C ongregaçã o E uropeia B euronense de reestruturar a C ongregaçã o B eneditina do B rasil. D iante deste encargo, o abade do mosteiro de B euron convocou o monge de Maredsous - B élgica, D om Gerard van C aloen, para tratar das questões brasileiras, ultimando por nomeá-lo segundo arquiabade do B rasil.

60

D om van C aloen era filho de nobres belgas; após ingressar na vida beneditina, publicou o primeiro missal bilíngue em vernáculo e em latim, possibilitando uma participaçã o mais efetiva dos fiéis nas missas, isto lhe deu o título de precursor do movimento litúrgico belga. E m funçã o de seu capital social e simbólico, foi nomeado procurador beuronense em R oma, bem como membro do C omitê de diálogos entre a Igreja católica latina e as do oriente. S ua presença em R oma o expôs ao contato com outras ordens, que ti nham um caráter missionário mais arraigado do que os beneditinos, como os franciscanos e jesuítas, o que lhe rendeu aspirações de construir um mosteiro beneditino destinado à formaçã o de monges missionários

61 .

E m 1895, D om von C aloen chegou ao Mosteiro de Olinda, em Pernambuco, e deu início à obra restauradora monástica no B rasil. E m 1896, já abade eleito em Olinda, começou uma campanha para introduzir um caráter apostólico missionário no Mosteiro. O carisma

62 beneditino remetia a uma vida mais contemplativa e D om M. Horn, enviado pelo primaz

63 , neste mesmo ano, posicionava-se contrário à prática missionária proposta por D om van C aloen. D om M. Horn desejava a prática de uma vida religiosa mais ativa, com visitas e assistê ncia aos doentes e pobres, além do ensino de ofício e artes aos meninos abandonados.

64

C omo em todo espaço de lutas, existem aqueles que sã o dominantes e os que sã o dominados (pretendendo à posiçã o de dominantes), estas posições estã o relacionadas ao campo do poder: "campo do poder é o espaço das relações de força entre agentes ou

60

C f. NE T O, 2000, p. 33.

61

C f. NE T O, 2000, p. 58.

62

C arisma é a predisposiçã o dada, como Graça de D eus, para a prática e o exercício das Ordens R eligiosas para

fins de edificaçã o da Igreja. C f. G ÓME Z , J esús Á lvarez. C arisma e História. Madrid: Publicaciones C laretianas,

2001, p.100-101

63

PR IMA Z ( Primas) : "B ispo que em razã o da S é goza de prerrogativas de honra em relaçã o a outros B ispos da

sua regiã o; tal título nã o comporta nenhuma jurisdiçã o especial, a nã o ser que, por direito particular, se verifique

outra coisa. A bade primaz: superior de uma confederaçã o monástica. C ÓD IGO D E D IR E IT O C A NÔ NIC O,

1983, p. 392.

64

(35)

instituições que tê m em comum possuir o capital necessário para ocupar posições dominantes nos diferentes campos"

65

. A s posições de dominaçã o decorrem do acúmulo de capital, porém, estar em uma posiçã o dominante nã o significa, necessariamente, acumular capital econômico. Pode-se estar em uma posiçã o dominante pelo acúmulo de capital social, cultural ou simbólico

66

. A s alianças estabelecidas e os títulos acumulados sã o armas importantes nas disputas travadas e foi com essas armas, a de suas alianças com a S anta S é e o capital social advindo de sua herança nobre, que D om van C aloen estabeleceu a procuradoria de S aint A ndré, em 1899, localizada ao sul da cidade de B ruges-B élgica, com o objetivo recrutar vocações para o B rasil, isto é, em primeira instância, repovoar os mosteiros brasileiros. No ano seguinte, através de alianças estabelecidas com a S anta S é, em virtude de sua ida à R oma, a procuradoria foi elevada ao status de A badia e publicamente confessa como preparatória para vida monástica missionária.

67

Nas lutas para se conquistar posições no campo há uma tensã o constante de forças que nã o sã o estáveis. S eus agentes sã o dinamicamente dispostos e o capital pode migrar internamente, tanto entre seus agentes quanto de um campo para outro.

68

Isto é decorrente do movimento que é causado por promoções de alianças travadas para se estabelecer melhor no campo e instituições antagonistas que rivalizam a fim de ocupar um lugar de prestígio.

69 O intento de enfatizar o aspecto missionário na C ongregaçã o B eneditina do B rasil levou D om Gerard van C aloen, em 1904, a buscar aliança, isto é, aumentar seu capital social, com o bispo do A mazonas, D om L ourenço da C osta A guiar, que indicou a regiã o da bacia do R io B ranco, que estava desprovida de assistê ncia local religiosa, a fim de que os beneditinos pudessem empreender sua obra missionária.

Investido de capital simbólico, na posiçã o de V igário Geral da C ongregaçã o e A bade do mosteiro do R io de J aneiro, desde o dia 28 de fevereiro de 1905, bem como munido de acordos preestabelecidos com a D iocese do A mazonas, D om van C aloen foi à E uropa apresentar ao papa Pi o X a vontade da Ordem B eneditina B rasileira em ajudar na evangelizaçã o dos índios.

70

65

C f. B OUR D IE U, Pierre. As regras da arte: gê nese e estrutura do campo literário. 2ª ediçã o. T rad. Maria

L úcia Machado. Sã o Paulo: C ompanhia das L etras, 1996, p. 244.

66

C f. B OUR D IE U,1996, p.20.

67

C f. NE T O, 2000, p. 59.

68

C f. B OUR D IE U, 1996, p. 147-148.

69

C f. B OUR D IE U, 1996. p. 64-68

70

(36)

Um dos resultados das alianças travadas por D om Gerard foi a elevaçã o da A badia de Nossa S enhora de Monserrate do R io de J aneiro ao estatuto de nullius

71

, através do D ecreto da S agrada C ongregaçã o C onsistorial de 15 de agosto de 1907, recebendo a regiã o do V ale do R io B ranco por jurisdiçã o, o que possibilitou a D om G erard realizar o projeto da obra missionária beneditina.

72

3.3. O s beneditinos no V ale do R io B r anco

A A badia de S aint A ndré enviou, em 1909, quatro monges e dois irmã os convertidos para o B rasil, a fim de darem início ao projeto missionário beneditino no V ale do R io B ranco ( IL UST R A Ç Ã O 03)

73

. E les aportaram inicialmente no R io de J aneiro e foram recebidos por D om Gerard no Mosteiro do R io de J aneiro, onde participaram de uma celebraçã o, em 25 de abril de 1909, em açã o de graças ao início da missã o beneditina, na qual lhes foram entregues a cruz abençoada para a nova missã o e uma cópia da R egra de S ã o B ento e o L ivro de S almos.

74

A pós a celebraçã o, o grupo beneditino embarcou no navio Brazil para seguir viagem pela costa brasileira até o extremo norte da A mazônia, no V ale do R io B ranco. O grupo beneditino fez paradas em S ã o L uiz no Maranhã o, em B elém, Marajó e S antarém no Pará, e em Manaus no A mazonas, antes de chegar a B oa V ista no V ale do R io B ranco.

75

71

"C ân. 370 A prelatura territorial ou a abadia territorial é uma porçã o do povo de D eus, circunscrita

territorialmente, cujo cuidado pastoral, em virtude de circunstâncias especiais, é cometido a um Prelado ou

A bade, que a governa como seu pastor próprio, à maneira de B ispo diocesano". C ÓD IGO D E D IR E IT O

C A NÔ NIC O. Promulgado por S .S. J oã o Paulo II. 4ª ed.V ersã o portuguesa de A ntónio L eite, S .J ., revista por D .

Serafim F erreira e Silva, Samuel S. R odrigues, V . Melícias L opes, O.F .M., e Manuel L uís Marques, O.F .M.

L isboa, 1983, p. 67.

D isponível em: http://www.vatican.va/archive/cod-iuris-canonici/portuguese/codex-iuris-canonici_ po.pdf.

A cessado em:17/11/2013.

72

C f. NE T O, R aimundo V anthui. D irigir almas e servir, ao jeito de muitos: a missã o dos beneditinos junto aos

povos indígenas de Roraima – 1909/1948. D issertaçã o de Mestrado. Pontifícia F aculdade de Nossa Senhora da

A ssunçã o. Sã o Paulo. 2000, p. 30-31.

73

C f. L E F E B V R E , D . Gaspard. Un premier départ pour le Rio Branco (69-73). In: Bulletin des Oeuvres et

Missions Bénédictines au Brésil. A bbaye de S aint A ndré par L ophem. T omo III, nº 4. 1909, p.71.

74

C f. L E F E B V R E . T omo III, nº 4. 1909, p. 72.

75

C f. D E MUY NC K , D . A chaire. D e Rio-de-J aneiro à Bôa V ista: Rio-Branco dans l'Amazonie (74-80) . In:

Bulletin des Oeuvres et Missions Bénédictines au Brésil. A bbaye de Saint A ndré par L ophem. T omo III, nº 4.

(37)

L ogo após a partida do navio a vapor do R io de J aneiro, D om A chaire D emuynck, V igário Geral da missã o beneditina iniciou a produçã o de uma série de relatos de viagem para, posteriormente, enviar à A badia de S aint A ndré na B élgica os resultados da evoluçã o da obra missionária na A mazônia:

IL UST R A Ç Ã O 03: Membros da missã o beneditina do V ale do R io B ranco- Bulletin des oeuvres et missions

bénédictines au Brésil-V ol.. III- A rquivo do Mosteiro de S ã o B ento/R io de J aneiro

D a esquerda para direita, sentados: D . A rchaire D emuynck, vigário geral do R io B ranco; D . Gerard van

C aloen, V igário G eral do Mosteiro de Sã o B ento, D . B onaventure B arbier,

D a esquerda para direita, em pé: Irmã o Melchior D oering, Irmã o G aspar E lsenbusch, D . B è da Goppert e D .

(38)

E n commençant les notes de voyage destinées aux bienveillants lecteurs du Bulletin

des Oeuvres Bénédictines au Brésil, l'auteur de ces lignes ne peut s'empê cher de

donner les prémices de ses souvenirs et de ses sentiments à D ieu, au P è re céleste de

qui descend tout bien, le bénissant d'avoir jeté un regard de bienveillance sur notre

jeune C ongrégation bénédictine du Brésil et d'avoir choisi dans son sein six humbles

moines pour aller porter la Bonne Nouvelle aux pauvres Indiens abandonnés du

Rio-Branco, territoire amazonien annexé à l’Abbaye Nulius de N.S. du Mont Serrat

de Rio-de-J aneiro.

76

D urante a viagem, nas paradas das cidades costeiras do B rasil, os beneditinos tiveram a oportunidade de travar conhecimento com personalidades públicas do V ale do R io B ranco, que estavam também em trânsito: Innocencio Ignácio D iniz de F arias, fazendeiro, que estav a em B elém passando o verã o com a família, lhes forneceu informações sobre a regiã o, clima, vegetaçã o, etc.; R odolfo Pinto de A lmeida, oficial da A rmada, antigo comandante do F orte S ã o J oaquim.

77

Os monges beneditinos chegaram a B oa V ista do R io B ranco em 7 de junho de 1909. Uma das suas primeiras atividades foi a preparaçã o da capela de B oa V ista para os ritos de celebraçã o da missa. A lém destes, trê s tuxauas

78

de localidades diferentes do V ale do R io B ranco chegaram de suas malocas a B oa V ista para darem boas-vindas aos monges e os convidarem a conhecer suas malocas: tuxaua Ignácio, da regiã o do rio Uraricoera; tuxaua Idelfonso, da regiã o do rio S urumú; e, tuxaua B éré, da regiã o do rio Mahú, afluente do rio T acutú, na montanha R oraima.

79

Os indígenas da regiã o mais setentrional do V ale do R io B ranco, como o caso dos chefiados pelo tuxaua B éré na fronteira com a Guyana Inglesa, já haviam estabelecido contato prévio com os missionários protestantes das regiões limítrofes daquele país com o B rasil. T al fato despertou o interesse dos beneditinos em penetrar nas terras indígenas ao nordeste do

76

D E MUY NC K , D . A chaire. T omo III, nº 4. 1909, p.74. L ivre traduçã o: C omeçando as notas de viagem

destinadas aos benevolentes leitores do Bulletin des Oeuvres Bénédictines au Brésil,o autor destas linhas nã o

pode se impedir de dar as premissas de suas lembranças e de seus sentimentos a D eus, ao Pai celeste de quem

vem todo bem, louvando de ter lançado um olhar de benevolê ncia sobre nossa jovem C ongregaçã o B eneditina do

B rasil e de ter escolhido no seu seio seis humildes monges para levar a B oa Nova aos pobres indígenas

abandonados do R io B ranco, território amazônico anexado à A badia Nullius de Nossa Senhora de Monsserart do

R io de J aneiro.

77

C f. L E F E B V R E . T omo III, nº 4. 1909. 79-80.

78

C hefe indígena

79

C f. D E MUY NC K , D . A chaire. L ettre du Supérieur de la Mission du Rio Branco à l'abbaye de S. André

(120-124) . In: Bulletin des Oeuvres et Missions Bénédictines au Brésil. A bbaye de Saint A ndré par L ophem. T omo

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