• Nenhum resultado encontrado

ENSINO DE HISTÓRIA E PRODUÇÂO DE SI.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "ENSINO DE HISTÓRIA E PRODUÇÂO DE SI."

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

ENSINO DE HISTÓRIA E PRODUÇÂO DE SI.

LUSMAR DE O. VIEIRA*

Resumo

O presente artigo visa discutir de que maneira o ensino de história pode contribuir para uma vida refletida. Geralmente o ensino de história trabalha com narrativas produzidas sobre o passado, muitas vezes, desconectado da atualidade. Numa perspectiva que prioriza uma reflexão da história a partir do tempo presente têm-se o resgate da figura do narrador e as suas memórias; onde o tema é o próprio sujeito, a sua vida. Larrosa (2004) escreveu sobre a possibilidade da experiência na atualidade, experiência como aquilo que nos acontece, nos atravessa. No entanto, para que algo nos passe, efetivamente, é preciso um gesto de interrupção. Interrupção dos automatismos da vida cotidiana, irrefletida. A partir da experiência do estágio busca-se interrogar como o ensino de história pode ajudar na interrupção desse circuito autômato.

Palavras-chave: Ensino de História. Narrativa. Experiência.

(2)

________________________________________________

* Graduando no curso de Licenciatura em História/UFRB.

(3)

2

“Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo.

Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que este paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto.” (Jorge Luís Borges)

I.

O que é narrar? Iniciar o texto com uma questão ajuda a ir abrindo caminho para, aos poucos, ir avançando e chegando cada vez mais perto do encontro com a resposta, para quem sabe, com o tempo, conseguir encará-la e até mesmo cumprimentá- la. Mas, enquanto tal aceno não é possível, prossigamos neste texto, que, ao ir se formando, no próprio fazer-se já é um tímido avanço em direção a ela, mesmo que ela jamais se mostre.

Compreendemos que o material da narrativa é a linguagem, não só a letra, mas a vida. O humano faz-se e refaz-se humano pela e na linguagem; a experiência da realidade é mediada por ela. O filósofo alemão Martim Heidegger nos ajuda na reflexão, diz ele que:

“Falamos sempre de um jeito ou de outro. Falamos porque falar nos é natural. Falar não provém de uma vontade especial. Costuma-se dizer que por natureza o homem possui linguagem. Guarda-se a concepção de que, à diferença da planta e do animal, o homem é o ser vivo dotado de linguagem. Essa definição não diz apenas que, dentre muitas outras faculdades, o homem também possui a de falar. Nela se diz que a linguagem é o que faculta o homem a ser o ser vivo que ele é enquanto homem. Enquanto aquele que fala, o homem é: homem.”

(HEIDGGER. 2003, p.7)

Ao narrar estamos trabalhando a linguagem, inscrevendo-se mais fortemente no tempo-espaço. Alguns pensadores defendem que toda obra é autobiográfica, mas, específica e intencionalmente a tematização da própria vida promove uma reflexão ainda mais íntima, uma reflexão fundamental para constantemente inventar-se, produzir-se. Dois fragmentos de Clarice Lispector contribuem aqui na discussão, no primeiro ela diz que “a maior necessidade do humano é tornar-se humano”; no outro, que o “seu sexto sentido é a linguagem”. De certa forma, a segunda complementa a

(4)

3 primeira, pois a linguagem contribui no processo de humanização de homens e mulheres.

II

Esse preambulo se fez necessário, pois a proposta do artigo é a de pensar de que forma o ensino de História pode contribuir para uma vida refletida. E, na medida em que a História é ela própria um tipo de narrativa, justifica a questão posta. Então, a contribuição se dá a partir de uma metodologia que privilegia a produção narrativa dos sujeitos, uma atividade inventiva. Diferente de um método de recepção e reprodução de discursos alienantes.

A partir disso, a ideia-proposta para o ensino-aprendizagem de História surge de uma inquietação: o distanciamento dos conteúdos desenvolvidos da realidade dos educandos. O modo tradicional de ensino não tem servido aos fins desejados, a saber:

criticidade e autonomia. A noção de um professor detentor de um repertório de conteúdos, que por sua vez devem ser transmitidos para alunos destituídos é diferente da de um educador interessado em construir algo coletivamente. “Como se o conhecimento se desse sob o modo da informação e como se aprender não fosse outra coisa que adquirir e processar informação.” (Larrosa. 2004. p.155). O educador pode sim contribuir no processo de desenvolvimento de capacidades crítico-reflexivas, mas quando ele participa com os educandos de atividades re-criativas, aproveitando os encontros para produção de sentidos.

Em um artigo que traça o percurso histórico acerca das Histórias de vida em processos formativos, Gaston Pineau (2006) nos fala da importância dessa metodologia nos dias que seguem.

“Neste início de milênio, a vida que busca entrar na história não é mais somente a dos notáveis, mas a de todos aqueles que, querendo tomar suas vidas na mão, se lançam nesse exercício, reservado até aqui à elite. Com que direito? A vulgarização dessa arte singular é taxada de ilusão biográfica por alguns (Bourdieu, 1986) e de revolução biográfica por outros (Sève, 1987). Esse movimento de entrada da vida na história é, portanto, duplo e ambivalente: é aquele de todas as vidas, mas também de todos os viventes. Um outro limiar da modernidade biológica está em vias de ser ultrapassado? Em direção a que história?”(PINEAU, 2006 p.337)

Deixemos por ora a questão lançada por Pineau reverberando. A metodologia consiste, então, basicamente na proposição de uma experiência de si através da

(5)

4 produção de discursos, escritos e orais, pelos educandos. Incentivando neles esse processo de produção de si, repensando e refazendo sua história Configurando-se não como sujeitos a, mas como sujeitos da história, afirmando-se como escritores e personagens principais.

Aí iniciamos a resposta da questão de como podemos contribuir para o processo de ensino-aprendizagem em História? A noção de ensino, se problematizada parece carregar aquela ideia já mencionada, a de que alguém pode ensinar alguma coisa a outro alguém. Mas quais seriam as condições de possibilidade de tal procedimento? É importante pensar nisso, insistir na questão. Educadores e educandos encorajados e encorajando-se diante da questão correm o risco da aprendizagem. Essa parada reflexiva, esse colocar-se em estado de escuta é um caminho, pois como Larrosa diz:

“para que algo nos passe ou nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar e escutar mais devagar;

parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar os outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.” (Larrosa. 2004. P.160)

Para cultivar a arte do encontro é preciso desfazer um modelo hierárquico de saber. A concepção freiriana de ensino-aprendizagem contida na Pedagogia do Oprimido também desfaz a hierarquia de um professor que sabe e ensina ao aluno que não sabe e não ensina. Freire questiona: “como posso dialogar, se me admito como um homem diferente, virtuoso por herança, diante dos outros, meros “isto”, em quem não reconheço outros eu?” (FREIRE, 1996, p.80) O processo de aprendizagem se dá de forma mútua, educandos educadores e educadores educandos. Dessa maneira, as narrativas de si como metodologia colaboram no processo de aprendizagem, pois à medida que vão sobressaindo, todos vão aprendendo uma pouco mais sobre o fato da existência, pois cada ser singular tem algo a ensinar e a aprender.

A intencionalidade e a disposição para o exercício conduz ao autoconhecimento e aprimora o conhecimento da História, pois nesse proceder, inevitavelmente, o outro também surge e o relacionamento é também tematizado.

Nessa perspectiva, não tomamos como ponto de partida a história ocidental, americana ou nacional. Mas, uma história mais íntima e pessoal, componente daquelas

(6)

5 outras. O território é o corpo, o corpo-sujeito; na casa na rua e no sonho. Trata-se em primeira e última instância da vida, histórias de vida; e a maneira singular de dizê-las.

Mais especificamente busca-se resgatar a figura do narrador. Incentivar um espaço de memória e palavra. A partir da ideia de que a palavra tem força, buscamos ativar essas forças. O logos, o discurso ou a linguagem, são reveladores do ser-sujeito constituindo-o como ser da linguagem, uma imbricação ontológica. Em Gênesis, temos a anunciação angelical proclamando que “No princípio era o verbo e o verbo estava em Deus e o verbo era Deus. Ele estava no principio em Deus, onde todas as coisas foram feitas por ele e nada do que se fez foi feito sem ele. A vida estava nele e a vida era a luz dos homens...” Antes, originalmente, pré-coisas, era o verbo, verbo aí sinônimo de linguagem. Verbo, Deus, Vida e Homens todos em contiguidade; interdependendo-se no e para existir.

Nascimento, vida e morte. Uma trajetória deve ser cumprida. Um dever.

Vidamorte. Nota-se amor intercedendo no percurso, no entre, no intervalo. Podemos pensar no amor como sinônimo de cuidado. A precisão de cuidar desse entre, de produzi-lo e produzir-se. O ser é esse fazer-se no caminho que ele é.

Cada ser-sujeito, de alguma forma, guarda em si as marcas de outros seres- sujeitos de outros caminhos e, ainda interfere na formação dos sujeitos que estão por vir, tudo confluindo. Oxímoro: tudo se desfaz, mas tudo dura no caminho que é a gente mesmo.

III

“Uma vida sem sentido”. Esse é o título de um fanzine produzido durante o estágio por uma menina. O que podemos pensar sobre esse título? Inicialmente, podemos tentar uma breve reflexão sobre a vida: ela por si só possui algum sentido?

Talvez o sentido maior seja a morte, a meta final, o sentido último. Mas, antes dele o que se passa? O que se passa nesse intervalo entre nascimento e morte, o que pode esse intervalo? É exatamente aí, nesse meio, nessa terceira margem que reside toda implicação de existir. Aí os seres sujeitos devem, minimamente, decidir sobre si; eles não devem deixar que decidam. Processo de autonomia e heteronomia. A prevalência do segundo nos dias que seguem tem provocado essa sensação de vazio, de ausência de sentido. Até a autonomia muitas vezes é tida como impossibilidade e utopia, mas é necessário insistir nela. Uma de suas principais características é a produção de sentido pelo ser-sujeito, a partir da compreensão do sem sentido da vida, cumpre criá-lo,

(7)

6 inventá-lo. Produzir caminho, produzir sentido e caminhar, reinventando-se a cada passo, pois os sujeitos assim se fazem, sendo e sentindo o caminho que ele próprio é e faz.

O título do fanzine nos revela ainda um aspecto muito comum dos modos de vida na atualidade. As experiências se tornaram empobrecidas. Conforme precisamente refletiu Walter Benjamim num ensaio intitulado Experiência e pobreza de 1933, o modo de vida determinado pelo modo de produção capitalista tornou a vida morna, desencantada. Questiona Benjamin:

“qual o valor de todo o nosso patrimônio cultural, se a experiência não mais o vincula a nós? A horrível mixórdia de estilos e concepções do mundo do século passado mostrou-nos com tanta clareza aonde esses valores culturais podem nos conduzir, quando a experiência nos é subtraída, hipócrita ou sorrateiramente, que é hoje em dia uma prova de honradez confessar nossa pobreza. Sim, é preferível confessar que essa pobreza de experiência não é mais privada, mas de toda a humanidade. Surge assim uma nova barbárie.” (BENJAMIN, 1987, p.115).

Baixa estima, baixa intensidade e ausência de sentido podem caracterizar um tipo de experiência empobrecida. Mas, retornando o fanzine produzido pela menina da vida sem-sentido; já aí ela iniciou a produzir-se, pois dar-se conta dos despropósitos da existência provoca um descompasso no ritmo inflexível do automatismo cotidiano.

Iniciando um passo novo, antecipando uma possível coreografia por vir.

Outra menina, que insistentemente dizia não ter nada de interessante para contar:

“acordo, mexo no celular, almoço, vou pra escola, durmo, acordo...”. Sem saber, ou sabendo, ela já contava, já dizia um pouco-muito de si. Ela insistia que sua vida era muito desinteressante, que nada acontecia. Podemos questionar que tipo de ação provoca tais reflexões?

Outra história interessante, de interrupção: um menino que sonhava em ser jogador de futebol, ganhou uma chuteira do tio, saiu do recôncavo e foi para capital, treinou no Vitória, mas, lembrou-se da mãe no interior, sozinha. Voltou, porque conforme suas palavras “sonhos a gente tem demais, mãe só tem uma”. Neste exemplo podemos perceber como o outro surge tematizado a partir do exercício sobre si mesmo.

Outra atividade: a história da ponte D. Pedro II e as histórias na ponte D. Pedro II. Podemos usar a imagem da ponte como metáfora da História, que promove encontros, permite atravessamentos. A história, assim como a ponte é um elo que liga o passado ao presente, “um e outro inseparáveis” conforme definição do historiador francês Fernand Braudel. É na experiência singular dos sujeitos do presente que ela se

(8)

7 atualiza. No encontro cotidiano com Antônio e seus quebra queixos, há quase uma década adoçando o trajeto. Quais as sensações experiências na travessia? Andando, de moto, carro ou ônibus? E se passa o trem?

Em uma grande folha em branco as meninas e os meninos narraram através de crônicas, escritas e imagens a experiência da travessia, formando um grande mural.

Enfim, lembrança, esquecimento, narrativas e uma maior compreensão de si e da vida.

IV.

Mas explicitamente: de que maneira as Histórias de vida podem contribuir para o ensino de História? Porque partindo do agora, do instante-já e dos espaços corpo- mente, casa, rua, cidade – da experiência reflexiva dos sujeitos inseridos no aqui-agora permite um envolvimento mais intenso com a realidade, com a sua trajetória.

. Ao colocarmos a conhecida questão existencial: quem sou eu? Quem seria mais indicado para respondê-la se não o próprio questionador. Podemos utilizar a palavra especular e aí pensarmos metaforicamente, a imagem do sujeito que mira o espelho, a especulação.

Então, as narrativas de si como metodologia para o ensino de História contribuem para uma reflexão da existência. Estamos falando de um tipo de conhecimento histórico, estamos falando de vida. Não se trata daquele tempo remoto, daquilo que aconteceu, mas do que está acontecendo. O que está acontecendo?

Essa questão leva-nos até um sujeito, o sujeito do acontecimento - aquele a quem a coisa acontece. Aquilo que se passa com alguém. A experiência. Através de algumas sugestões que se insinuam no plano do sensível. Uma música, uma imagem, uma recordação. Um retorno a si mesmo para poder melhor dizer de si. Esse si produz e pode produzir mais intensamente sua imagem e identidade. Larrosa nos ajuda nesse sentido, ele diz que “quando fazemos coisas com as palavras, do que se trata é de como damos sentido ao que somos e ao que nos acontece, de como juntamos as palavras e as coisas, de como nomeamos o que vemos ou o que sentimos e de como vemos ou sentimos o que nomeamos.” (LAROSSA. 2004. p. 153).

Iniciar com os educandos um processo de construção narrativa acerca de si onde qualquer indício do presente contribui para a investigação de sua própria história.

Fragmentos de memória, uma fotografia antiga, um bilhete esquecido no fundo de uma gaveta, cartas, registros e etc. Pensar sobre sua própria história é um importante exercício de autoconhecimento, produzir e compartilhar narrativas pode fazer emergir

(9)

8 singularidades, mas também demonstrar aspectos comuns, que evidenciem o pertencimento o determinado grupo, determinada cultura.

Partindo do pressuposto de que a História não é o que de fato se viveu, mas sim o que se conta sobre o vivido e principalmente, o modo escolhido para se contar.

Podemos extrair aí duas questões básicas e muito caras à História: o que se conta? E, como se conta? Nesse processo de seleção e construção podemos ir aos poucos detectando propósitos. A História comumente ensinada nas escolas escapa muito à realidade dos educandos, é muito distante. É quase sempre a história do outro, de outro tempo e de outro espaço. Do outro lado do Atlântico, dum século distante que dificilmente se conecta aos dias de hoje.

O processo histórico é incessante. A História acontece, está acontecendo. Nós, nesse tempo presente que insiste em nos escapar, atravessamos e somos atravessados por ela, pela História e pelos discursos que são produzidos sobre essa experiência instauradora da realidade. Os discursos produzidos são fundamentais na conformação do imaginário. A possibilidade de produção de discursos sobre a História interrompe o ciclo recepção e reprodução, inserindo uma versão própria, uma produção discursiva própria. Possibilita autonomia aos sujeitos quando incentiva o autoproduzir-se.

Afinal, como podemos conceber um ensino de História que nos torne alheios e desatentos a nossa própria experiência com a História? Nesta direção, incide a questão posta por Nietszche na Segunda Consideração Intempestiva, da utilidade e desvantagem da História para a vida. O filósofo inicia o texto com uma citação de Goethe: “me é odioso tudo que simplesmente me instrui, sem aumentar ou imediatamente vivificar a minha atividade” (NIETZSCHE, 2003, p.5). Trata-se de uma afirmação da vida, de uma História que atenda às demandas da vida.

Urge atender às questões hodiernas e a cada passo consolidar nossa posição no mundo, nosso lugar na História. Parte integrante, somos constituídos e constituímos uma História maior que vem sendo contada. Por quem ela tem sido contada? Quem contou nossa história?

Larrosa afirma que “o sentido do que somos depende das histórias que contamos e das que contamos a nós mesmo [...] em particular das construções narrativas nas quais cada um de nós é, ao mesmo tempo, o autor, o narrador e o personagem principal”. Ora, nós podemos e devemos contar nossa história, nós mesmos. Cada um tem uma história e uma maneira singular de contar, a si mesmo e aos outros.

(10)

9 Podemos tentar aqui, para finalizar, um breve exemplo da metodologia aplicada no Ensino de História do Brasil. História de vida e História nacional. Inicialmente, como podemos no esforço compreensivo de nós próprios darmo-nos conta da identidade nacional. Naquilo que identificamos como sendo, próprio de si, ou melhor, como na multiplicidade singular pode-se definir uma comunidade de brasileiros. O que nos une?

O que define ser brasileiro para além do território?

As narrativas de si contribuem assim na pesquisa sobre o Brasil a partir da investigação de si enquanto brasileiro. Partindo do singular para o coletivo, vamos detectando aspectos culturais. Características que nos tornam membros de uma determinada comunidade. Podemos relacionar território e identidade, comunidade e singularidade, o eu o outro.

Se refletirmos acerca do processo de construção da nação brasileira, notamos a força do simbólico como aspecto determinante no imaginário. A produção discursiva e simbólica, a construção de uma narrativa comum que pudesse dar a noção de pertencimento e comunhão entre os habitantes desse território imenso que se convencionou chamar Brasil. O esforço pela unidade apesar dos inúmeros conflitos resultou o que podemos chamar de uma “comunidade imaginada” (ANDERSON, 1991).

Quem são e como são os brasileiros e brasileiras? Como se deu o processo de formação do povo brasileiro? Para essas questões a obra de Darcy Ribeiro pode muito contribuir. Darcy realizou uma grandiosa pesquisa sobre o tema. Quando exilado, dedicou-se a pensar nossa formação pluriétnica resultado do processo de colonização ibérica.

Cada brasileira e brasileiro ao refletir sobre sua própria história está, de certa forma, refletindo sobre a história de seus antepassados. A relação que se estabelece entre herança e identidade são indispensáveis para o entendimento de si e do espaço onde se vive. Conhecer a história de seus pais e de seus avós é ir abrindo caminho, ganhando espaço para a afirmação de si mesmo. Na medida em que saber também significa poder. Avançar no conhecimento de si é ampliar a força de existir elevando-se acima de si mesmo.

Reflexão, narrativa e experiência. O entrelaçamento dessas instâncias nos sujeitos eleva sua capacidade de existir, restaurando e afirmando sua presença no espaço-tempo.

(11)

10 Bibliografia:

BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. Vol. 1. Magia e técnica, arte e política.

Ensaios sobre literatura e história da cultura. Prefácio de Jeanne Marie Gagnebin. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 114-119.

DELORY-MOMBERGER, Christine. Abordagens metodológicas na pesquisa biográfica. Tradução de Anne-Marie Milton Oliveira Revisão técnica de Fernando Scheibe.

________________________. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.2, p.

359-371, maio/ago. 2006.

CUNHA, Maria Isabel Conta-me agora! As narrativas como alternativa pedagógica na pesquisa e no ensino. Rev. Fac. Educ. vol. 23 n. 1-2 São Paulo Jan./Dec. 1997.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. Paz e Terra, Rio de janeiro, 1996.

HEIDGGER, Martim. A Caminho da Linguagem. Tradução de Márcia Sá Cavalcante Shuback - Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, Editora Universitária São Francisco, 2003.

LARROSA, Jorge. Linguagem e Educação depois de Babel. Tradução de Cynthia Farina. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

_______________. “Tecnologias do eu e educação”. In: Silva, Tomaz Tadeu. O sujeito da educação. Petrópolis: Vozes, 1994, p.35-86.

NIETZSCHE, Friederich Wilhelm. Segunda Consideração Intempestiva: da utilidade e desvantagem da história para a vida/ tradução de Marco Antônio Casanova. Relume Dumará. Rio de Janeiro, 2003.

PINEAU, Gaston Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.2, p. 329-343, maio/ago. 2006.

RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo:

Companhia das Letras, 2006.

Referências

Documentos relacionados

Inspecção Visual Há inspeccionar não só os aspectos construtivos do colector como observar e controlar a comutação (em

A gestão do processo de projeto, por sua vez, exige: controlar e adequar os prazos planejados para desenvolvimento das diversas etapas e especialidades de projeto – gestão de

Controlador de alto nível (por ex.: PLC) Cabo da válvula Tubo de alimentação do ar de 4 mm Pr essão do fluido Regulador de pressão de precisão Regulador de pressão de

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

A cor “verde” reflecte a luz ultravioleta, porém como as minhocas castanhas são mais parecidas com as minhocas verdadeiras, não se confundem com a vegetação, sendo

Este estudo, assim, aproveitou uma estrutura útil (categorização) para organizar dados o que facilitou a sistematização das conclusões. Em se tratando do alinhamento dos

[r]

Principais Saídas do Curso: Arquitectura, Pintura, Escultura, Design, Artes Gráficas, Artes Visuais, História da Arte, Cinema, Artes e Comunicação, Engenharia Multimédia,