• Nenhum resultado encontrado

O COORDENADOR DE CURSO DE LICENCIATURA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: IDENTIDADE E TRABALHO

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O COORDENADOR DE CURSO DE LICENCIATURA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: IDENTIDADE E TRABALHO"

Copied!
12
0
0

Texto

(1)

O COORDENADOR DE CURSO DE LICENCIATURA NA MODALIDADE A DISTÂNCIA: IDENTIDADE E TRABALHO

Váldina Gonçalves da COSTA, UFTM Eixo Temático: Educação à distância na formação de professores Agência Financiadora: FAPEMIG E-mail: valdina.costa@gmail.com 1. Introdução

De acordo com o Censo da Educação Superior os cursos ofertados na modalidade a distância têm crescido no Brasil, principalmente em instituições privadas. Dentre os cursos que cresceram, a licenciatura é o grau que mais tem alunos. (BRASIL, 2013). A procura pelos cursos a distância é grande e as razões dessa procura segundo Moore e Kearsley (2007) são: crescente oportunidade de aprendizado, treinamento e capacitação; redução dos custos com recursos educacionais; nivelamento das desigualdades entre grupos etários; facilidade para conciliar a educação com o trabalho, e a vida familiar; maior comodidade para aqueles que não têm horários exatos para estudo ou possuem dificuldades de locomoção, entre outros.

Mas a implementação de um curso na modalidade a distância não é tão simples, envolve um número grande de sujeitos, além da diversidade e discussões em torno das relações de tempo e espaço que são diferentes. Assim, também é complexa a gestão de todos os elementos envolvidos nesse processo, principalmente em relação aos docentes que atuam nessa modalidade de ensino, pois é um trabalho que depende do outro, não é isolado, mas articulado que exige cooperação dos demais atores do processo, ou seja, “O trabalho a distância se organiza de forma coletiva e cooperativa. A esse conjunto articulado de trabalhadores, necessário para a realização das atividades de ensino-aprendizagem na EaD, denominamos de polidocência.” (MILL, RIBEIRO, OLIVEIRA, 2010, p. 23).

No contexto da polidocência destaca-se o trabalho dos coordenadores de cursos, mais especificamente nesta pesquisa, dos coordenadores dos cursos de Licenciatura, sujeitos responsáveis diretamente pela qualidade e eficiência do curso que coordena. Assim, essa pesquisa buscou investigar quem é esse coordenador do curso de Licenciatura, quais as suas funções, como desenvolve seu trabalho e em que condições.

(2)

buscando sempre o diálogo a fim de redirecionar e reavaliar posturas, materiais, ou desempenhar outras adequações que se fizerem necessárias.

2. Referencial teórico

Segundo Moore e Kearsley (2007) a EaD se constitui num aprendizado que é planejado e ocorre, normalmente, em local diferente do convencional, com técnicas especiais de criação de curso e de instrução, comunicação por meio de diversas tecnologias e disposições organizativas e administrativas especiais. Em relação às tecnologias, deve-se evitar, conforme proposto por Moraes (2000), reduzir a ideia do ensino na EaD ao uso de computador e redes virtuais, percebendo-a como algo mais amplo que envolve várias formas de estimular o estudo independente.

Para que esse estudo independente se sustente muitos são os requisitos necessários à EaD, destacamos: ter como foco os processos interativos e participativos, ser dialógica, construir coletivamente o conhecimento e a aprendizagem de forma colaborativa e em comunidades de trabalho em rede. Também se faz necessário superar os modelos consolidados do ensino presencial no sentido de buscar novas perspectivas para a EaD e que exigem criatividade, persistência, trabalho em equipe interdisciplinar e gerenciamento. Superar esses desafios significa ter uma visão do todo e que este se interconecta, o que significa adotar um modelo de gestão que seja democrática, compartilhada e co-ordenada (SOUZA, FIORENTINI, RODRIGUES, 2009), ou seja, um modelo de gestão da educação em que “a natureza do processo educativo não se confunde com a natureza do processo produtivo” (HORA, 1994, p. 47), além de ser imprescindível considerar a formação humana de todos envolvidos no contexto.

Enfim, partindo-se do princípio que toda instituição tem uma ideologia que a caracteriza e que consequentemente irá definir sua cultura organizacional, todos os fatores ora relacionados à gestão precisam ser analisados criticamente para que se possa perceber os desdobramentos gerados pelo respectivo modelo de gestão sob diferentes aspectos, ou seja, não só da instituição como também dos estudantes, dos profissionais envolvidos e de suas condições de trabalho. (COIÇAUD, 2001).

Uma característica marcante na EaD é a maior fragmentação do trabalho, o que exige atenção especial do gestor no sentido de articular todo o processo (MILL, BRITO, 2009). Fragmentação porque existem muitos sujeitos envolvidos, ou seja, ter uma visão mais ampla para entender como funciona o sistema da EaD, quais as pessoas envolvidas no processo, é fundamental. Assim, conhecer as várias são as pessoas envolvidas no processo de planejamento em EaD se faz necessário. Segundo Giraffa e Faria (2008) essas pessoas são:

(3)

 Professor: responsável pela elaboração dos materiais e conteúdos das disciplinas, pelas avaliações e organização das atividades.

 Tutor: responsável por monitorar o ambiente virtual de ensino e aprendizagem (AVEA) e na mediação dos contatos com o professor-aluno, auxiliar os alunos em relação as suas dúvidas e dificuldades, organizar os materiais do professor no AVEA.

 Equipe de multidisciplinar: equipe responsável por elaborar e auxiliar os professores com seus materiais. Uma equipe com habilidades e facilidades no domínio de ferramentas tecnológicas tais como: editor de imagens, gravação de áudios e vídeos, linguagens de programação para Web.

 Equipe de Tecnologia da Informação: equipe que garante o funcionamento e a manutenção dos equipamentos e softwares utilizados no processo de EaD, bem como os links de rede, servidores, bancos de dados, entre outros.

 Equipe Jurídica: equipe que apoia o gestor em assuntos jurídicos, tais como: contratos e termos de aceitação para vinculação de vídeos, materiais e imagens no ambiente virtual, entre outros.

Enfim, um sistema de EaD é composto por todos os componentes que operam o ensino e a aprendizagem do estudante, ou seja, envolve aspectos pedagógicos, recursos humanos e infra-estrutura. Aspectos que para o funcionamento precisam estar interconectados e o gestor atento à funcionalidade e integração dos mesmos, pois não podemos esquecer que toda instituição busca resultados e isso resulta numa ação racional, estruturada e coordenada, o que não depende apenas da responsabilidade individual, mas de todo grupo. (LIBÂNEO, 2004). Assim, a gestão é o elo articulador dos vários segmentos envolvidos no processo e deve cuidar para todas as atividades aconteçam conforme o planejado. É no contexto da gestão que essa pesquisa foi desenvolvida, da gestão em cursos de licenciatura, no sentido de conhecer quem é o gestor e o seu trabalho.

O coordenador de curso, muitas vezes denominado gestor do curso, responsável pela gestão, deve, segundo Libâneo (2004), buscar condições e recursos para melhor qualidade do ensino, garantindo a realização da aprendizagem dos estudantes, bem como promover o envolvimento de todos que participam do processo, fazendo o acompanhamento e avaliação a fim de se atingir os objetivos, ou seja,

Os processos intencionais e sistemáticos de se chegar a uma decisão e de fazer a decisão funcionar caracterizam a ação que denominamos gestão. Em outras palavras a gestão, é a atividade pela qual são mobilizados meios e procedimentos para se atingir os objetivos da organização, envolvendo, basicamente, os aspectos gerenciais e técnicos administrativos. (LIBÂNEO, 2004, p.101)

Assim, várias são as maneiras de um gestor agir, o que depende da concepção que possui de gestão e dos objetivos que acredita de educação e nesse caso de EaD.

(4)

segundo o autor, diferença de tratamento ao se comparar com a docência presencial, ou seja, o tratamento da EaD é inferiorizado em relação à docência presencial. Mill também enfatiza que outra questão ainda não resolvida na EaD refere-se ao trabalho pedagógico virtual e as condições de trabalho dos docentes, além de se ter uma carência de professores que queiram atuar nessa modalidade de ensino, bem como falta de cursos de formação para atuar na EaD. Dessa forma, a muitos profissionais foram constituindo seus saberes relativos a EaD, no dia a dia, no aprender fazendo, ou seja, na experimentação, o que o autor denomina de metaformação. (Ibidem, p. 47). Então, que identidade possui esse professor? Em consonância com essa pesquisa, que identidade tem o gestor do curso? Quem é esse sujeito? Ele tem autonomia no seu trabalho? Muitas são as perguntas e olhando para esse estudo buscou-se estudar algumas questões relativas à identidade no sentido de nos ajudar a compreender quem é o gestor dos cursos de licenciatura.

Apoiada numa perspectiva sociológica, parte-se do princípio de que somos seres sociais e que por meio de nossas vivências pessoais e profissionais marcadas em diferentes momentos, durante a socialização primária e secundária, nos identificamos (DUBAR, 2005; BERGER, LUCKMANN, 2003).

A socialização primária segundo Dubar (2005), refere-se aos saberes de base, ou seja, aquelas primeiras aprendizagens construídas durante a infância, e, dependem das relações existentes na família, na escola, no convívio com os adultos. Acredita-se que esta socialização finda, quando o sujeito compreende o conceito estabelecido pelo outro, entretanto Berger e Luckmann (2003) acreditam que a socialização não se acaba totalmente.

A socialização secundária segundo os autores, corresponde ao processo de interiorização pelos sujeitos no mundo do trabalho e que precisa de aquisição de especificidades relativas às funções exercidas e que são interiorizadas pelos sujeitos, muitas vezes referem-se a condutas que são características de uma dada instituição.

Assim, tanto em relação à dimensão pessoal ou profissional os sujeitos se deparam com vários momentos de socialização que correspondem à sua entrada “[...] mundo objetivo de uma sociedade ou de um setor dela”, na qual a ação de socializar é dicotômica, pois está na confluência entre a identificação do sujeito pelos outros e a sua auto-identificação. (BERGER; LUCKMANN, 2003, p. 175).

Assim, o processo de socialização dos sujeitos acontece na dualidade entre a identidade para si e a identidade para o outro em que esse sujeito é identificado pelo outro (processo relacional) e também é identificado por si próprio (processo biográfico). (DUBAR, 2005). Para o autor o reconhecimento dos sujeitos pela instituição e seus agentes é fundamental para a construção da identidade. Direcionando o olhar para esse trabalho questionamos: como os gestores/coordenadores de curso são reconhecidos pelas instituições?

(5)

 com as competências aprendidas na formação inicial e continuada e com as articulações de suas diferentes origens;

 com as codificações estabelecidas nos sistemas de emprego a partir da construção e evolução deles;

 com o reconhecimento, nas relações profissionais, das competências do sujeito. Nesse sentido, cada gestor/coordenador de curso constitui sua própria trajetória de saber formalizado, tanto nas relações pessoais e familiares como também a partir de seu contato com os mais diversos estabelecimentos especializados, ou seja, a identidade é, portanto, “o resultado simultaneamente estável e provisório, individual e colectivo, subjectivo e objectivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que, em conjunto, constroem os indivíduos e definem as instituições.” (DUBAR, 2005, p.105).

Em relação à identidade profissional relacionada ao processo de socialização na profissão, acreditamos que ela não se reduz às ações desenvolvidas no âmbito do trabalho, mas tem como referência a trajetória de vida do sujeito, ou seja, o presente é marcado pelas experiências vivenciadas ao longo da existência de cada pessoa. Dessa forma, a identidade profissional não está relacionada apenas a

[...] uma situação de “escolha do ofício” ou de obtenção de diplomas, mas da construção pessoal de uma estratégia identitária que põe em jogo a imagem do eu, a apreciação de suas capacidades, a realização dos seus desejos. Mesmo quando é reconhecida por um empregador, esta primeira “identidade profissional para si” já não tem hipóteses de ser definitiva (DUBAR, 2005, p.114).

Diante do exposto, a identidade profissional é construída tendo como referência os significados sociais da profissão, bem como a revisão dos mesmos, das tradições, ou ainda, como nos propõe Pimenta (2009) a partir da reafirmação de práticas consolidadas culturalmente e que permanecem significativas para os sujeitos.

Um elemento fundamental na constituição da identidade profissional é a autonomia profissional. Segundo Contreras (2002, p. 214) a autonomia profissional é um “[...] processo dinâmico de definição e constituição pessoal de quem somos como profissionais, e a consciência e realidade de que esta definição e constituição não pode ser realizada senão no seio da própria realidade profissional [...]”. Ou seja, é na relação com o outro que a autonomia profissional vai sendo constituída, seja no âmbito pessoal ou na necessidade de definir ou contrapor, com outras pessoas e outros setores. Daí questionamos: os gestores/coordenadores de curso dessa pesquisa possuem autonomia profissional?

3. Metodologia

(6)

Para a produção dos dados usou-se a entrevista semiestruturada por permitir intervenções do pesquisador e, para análise das entrevistas buscou-se manter as entrevistas dentro do contexto do entrevistado, considerando “[...] tanto do conteúdo manifesto quanto do conteúdo latente do material, [...] desvelando mensagens implícitas, dimensões contraditórias e temas sistematicamente “silenciados”. (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 48). Posteriormente realizou-se a recomposição dos dados, interpretando-os à luz do referencial teórico escolhido.

A pesquisa de campo foi realizada em uma instituição particular que possui atuação no mercado de mais de 60 anos, com vários cursos de graduação e pós-graduação. O programa de EaD conta com pouco mais de 15 anos e tem abrangência nacional. Atualmente existe uma pró-reitoria específica para a EaD - Pró-Reitoria de Educação a Distância (PROED) que está vinculada Pró-Reitoria de Ensino Superior (PROES) e a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação e Extensão (PROPEPE), pois a PROED se responsabiliza pelas atividades administrativas, desenvolvimento tecnológico, marketing e supervisão de unidades de apoio de EaD.

Em relação aos cursos de graduação ofertados são 21 cursos, sendo 16 de licenciatura, o que confirma os dados apresentados (BRASIL, 2013). Entrevistamos 3 gestores que coordenam 8 cursos, quais sejam: 1) Licenciatura em Letras (4) sendo Letras Português/Inglês e Português/Espanhol, nas versões para portadores de diploma (2) e para não portadores de diploma (2), na modalidade semipresencial; Licenciatura em História (2) sendo um para portadores de diploma, semipresencial e outro totalmente online; 3) Licenciatura em Química (2) para portadores de diploma e outro para não portadores de diploma, na modalidade semipresencial. Esses cursos são ofertados em três anos, divididos em seis etapas com dez quinzenas. Durante o curso há cinco encontros por etapa, sendo um seminário de oito horas e os demais, oficinas de quatro horas, que acontecem nos finais de semana, sendo que em uma duas dessas oficinas acontecem as avaliações. O aluno tem acompanhamento por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA).

Utilizando pseudônimos foram entrevistados os professores Walter, gestor do curso de Licenciatura em Química; Maira, gestora do curso de Licenciatura em História; e, Leila, gestora do curso de Licenciatura em Letras.

4. Resultados e discussões

(7)

projeto de vida bem como o modo de conquistar sua autonomia, seu reconhecimento pessoal, sua participação na sociedade. É um processo complexo, marcado por múltiplos fatores de ordem econômica, política, social e psicológica.

Nesse sentido, nem sempre a primeira escolha da profissão é a que os sujeitos exercem hoje, fato que aconteceu com os professores Walter e Maira que não tiveram como primeira opção a profissão docente: Walter queria fazer Direito e Maira, Comunicação Social.

Walter iniciou seus estudos mais tarde, advém de uma família humilde de muitos filhos e com os estudos tinha a pretensão de sair do trabalho na roça e dar melhor condição para sua família. Fazer um curso superior estava muito distante de seus sonhos, pois acreditava que era muito caro, até que um professor o levou a uma instituição e ele viu que era possível custear seus estudos. Tamanha sua dedicação que no segundo ano do curso fez um projeto de ludoteca e ganhou uma bolsa. Hoje percebe que realmente tinha que ser professor.

Então, ser professor vou ser sincero, não era meu sonho. Foi mesmo por condições financeiras, porque eu sempre quis fazer direito. Era meu sonho. Eu venho de uma família muito humilde [...]. Voltei a estudar muito tarde. [...] eu trabalhava na roça, [...]. Eu queria sair dessa vida, dar uma vida melhor para meus filhos. [...] meu professor de química me disse: por que você não presta um vestibular? Muito caro, não dou conta. [...] Aí ele [professor de Química] me colocou no carro um dia e a gente veio aqui. E era um valor que eu conseguia pagar [...]. No segundo ano de curso ganhei uma bolsa da faculdade por conta de um projeto que eu desenvolvi, ludoteca de química na cidadania, e o restante do curso eu praticamente não paguei por conta dessa bolsa. Aí hoje eu te falo uma coisa, realmente eu tinha que ser professor. (Prof. Walter).

Maíra também teve problemas financeiros e não conseguiu continuar o curso de Comunicação Social, precisava trabalhar e como o curso era multiperiódico sua família não tinha como sustentá-la. Sua opção pela docência aconteceu após a aposentadoria.

[...] iniciei um curso de comunicação, [...], mas por condição econômica, familiar e eu precisava manter meu emprego [...] tive que deixar a faculdade porque era multiperiódico e não tinha a noite [...] eu estava com quarenta e poucos anos, próxima de aposentadoria e eu quis fazer outra coisa e fui ver o que eu podia fazer que permitisse que eu realizasse esse trabalho com a idade que eu estava. [...] o caminho mais certo foi o de ser professora porque eu já tinha esse trabalho que não era de professor, mas era de treinador, então optei por fazer o curso de História [...] (Profª Maira).

Por outro lado, a professora Leila escolheu como primeira opção o curso de Licenciatura em Letras, pois gostava muito de ler e escrever, de lidar com pessoas, da relação com o outro, de contribuir para a formação de outros sujeitos.

(8)

professores muitas vezes marcam a trajetória de vida dos estudantes seja pela forma como lidam com os conteúdos seja pelas atitudes, são modelos que estes estudantes sempre irão lembrar em sua trajetória de vida, como apontam André e Passos (2008), Costa (2009, 2011).

Cabe destacar também que nesse processo de voltar ao passado e verificar que a profissão de hoje não é a escolhida no passado, e afirmar que essa é a escolha certa, o sujeito se reconhece, se autoidentifica (processo biográfico), conforme propõe Dubar (2005). Dessa forma, a escolha da profissão docente faz parte da trajetória de constituição de sua identidade profissional e ajuda a reafirmar a identidade dos professores, pois é permeada por acasos, coincidências, indecisões, certezas, dificuldades que vão se construindo nas trajetórias dos sujeitos.

Os relatos também nos dão indícios de que o meio no qual os professores estavam inseridos foi determinante para a escolha do curso e consequentemente contribuíram para a constituição da identidade deles, conforme nos mostram Berger e Luckmann (2003) e Dubar (2005). Assim, dentro de cada contexto ora vivenciados pelos sujeitos da pesquisa, ou seja, os processos de socialização vividos, foram demarcando as suas trajetórias num contexto permeado pela interação no qual a história foi sendo escrita.

Conhecida a inserção na docência procuramos identificar como esses gestores se inseriram na EaD e se tornaram coordenadores de curso.

O professor Walter foi aluno da instituição na qual trabalha e também está terminando o mestrado em Educação nessa instituição. Teve sua inserção na EaD como professor convidado para ministrar seminários e oficinas, logo em seguida foi convidado para ser preceptor (também conhecido como tutor), depois recebeu convite para ser professor do curso tanto no presencial quanto na EaD e agora está na gestão.

[...] eu fui aluno do curso de licenciatura aqui [...] Antes de terminar [especialização] o Solimar [gestor] me convidou pra viajar, pra dar aula na EaD, [...] o Solimar me convidou, falou que eu tinha o perfil pra ser o preceptor da turma. [...] fiquei um tempo, três meses, então ele me convidou pra professor do curso e do presencial também e fiquei um tempo com ele, depois ele saiu, aí veio o Lucas [...] O Lucas na defesa do doutorado dele, estava complicado e ele me convidou pra coordenador e estou aqui hoje. (Prof. Walter).

Para o trabalho como professor nos seminários Walter não teve preparação, mas para atuação como preceptor afirma que todos que entram na instituição precisam fazer o curso de preceptoria.

(9)

há 2 anos.

A inserção de Maira foi por transferência do presencial para a EaD, ou seja, “[...] trabalhei na educação presencial, no curso de História presencial e de 2007 em diante eu comecei com a educação à distância [...] e o curso presencial fechou.” Maira sempre procura fazer cursos na área, fez especialização em EaD, atualmente está fazendo curso de direitos autorais e design instrucional, mas os custeios são todos pessoais: “Não eu que pago, eu estou fazendo em outra universidade”. Maira atualmente está terminando o doutorado em História em outra instituição.

A professora Leila ingressou na EaD como preceptora, sem preparação e para um curso que não corresponde ao de sua formação – Pedagogia, razão pela qual resolveu fazer esse curso. Posteriormente foi convidada pela equipe dirigente para ser coordenadora do curso de Licenciatura em Letras, no qual atua a dois anos.

[...] logo ingressei aqui na Instituição como preceptora [...] do curso a distância. Sendo preceptora vi a necessidade de fazer o curso de Pedagogia, [...] sou licenciada em pedagogia também [...]. Cursando o curso de Pedagogia, logo quando estava finalizando fui convidada a me tornar docente do curso, atuei como docente apenas por 3 meses no curso de Pedagogia. Logo a reitoria me chamou pra assumir a gestão do curso de Letras. Assumindo a gestão do curso de Letras vi a necessidade de estudar um pouco mais e ingressei no mestrado. Então, atualmente estou cursando o mestrado aqui na Instituição também. (Profª Leila). Os gestores entraram para as coordenações dos cursos a distância sem terem preparação para atuarem na gestão de um curso a distância. Em relação à professora Maíra chama-nos a atenção que as demandas da Educação Presencial são diferentes das demandas da Educação a Distância, então ser gestor num curso presencial não significa que o sujeito está preparado para ser gestor de um curso a distância tamanha a demanda que esse tipo de curso requerer, conforme já exposto, tamanha a fragmentação do trabalho (MILL, BRITO, 2009). Os excertos nos indicam que os professores foram se constituindo gestores na EaD sem preparação, a partir das relações que foram sendo criadas no espaço institucional, num processo de socialização (DUBAR, 2005), num “aprender fazendo”, ou seja, como nos afirma Mill (2012) num contexto de metaformação. O fato retrata a precarização do trabalho docente, pois os professores foram contratos para um serviço do qual não tinham conhecimento e tiveram que executá-lo. Por outro lado, esses docentes não são obrigados a aceitar, talvez a atratividade pela gestão de um curso na universidade tenha contribuído para a aceitação.

Ainda sobre os coordenadores de cursos buscou-se investigar sobre as especificidades do seu trabalho, ou seja, quais são suas funções, como desenvolve seu trabalho e em que condições isso acontece. Parte-se do princípio de que a identidade também é constituída nas relações de trabalho, a identidade profissional, num processo de socialização secundária (DUBAR, 2005).

(10)

com carga horária administrativa, mesmo sendo contrata como docente. Além disso, nenhum dos gestores tem secretária e participam de reuniões com a pró-reitoria de graduação (semanais), coordenadora pedagógica (quinzenais) e com os professores do curso (mensais). Outra característica comum ao trabalho de todos os gestores diz a respeito a alimentar o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e elaborar questões para esse banco quinzenalmente.

Walter, além da gestão também é responsável pelos seguintes componentes curriculares do curso: Trabalho de Construção de Aprendizagem (TCA), Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), componentes pedagógicos de química das etapas 4, 5 e 6 e também orienta estágio em três etapas. Também escreve material para as respectivas etapas e elabora quatro questões fechadas e uma aberta por quinzena, pois há um banco de questões no AVA para as provas que é alimentado com questões semanalmente. O gestor orienta os professores para que produzam “[...] 3 questões pelo menos 2 a 3 por semana, não é muito [...]” e acredita que isso não é muito. Há ainda as reuniões com a pró-reitoria, coordenadora pedagógica e os professores do curso.

Na gestão Walter trabalha de forma mais colaborativa com os demais professores, sempre buscando uma opinião deles: “[...] eu costumo dizer: a direção, a gestão não é minha, ela é nossa. O curso não é meu, é nosso. Eu busco muita orientação de outro professor, o que acha que deve ser feito, como devemos fazer, a gente faz um trabalho conjunto mesmo, estou só assinando papel [...] ganhando bronca. Além disso, Walter quando questionado se leva trabalho para casa afirma: “Mentira professor que disser não, a gente acaba levando” e depois afirma que está tentando evitar, pois está terminando o mestrado: “[...] mas eu nem acho que seja um trabalho, sinceramente não acho, hoje eu estou evitando porque estou terminando meu mestrado [...]. Então evito levar, mas quando precisa um caso ou outro a gente leva.” Mesmo assim, ele não se diz sobrecarregado, afirma que é justa a carga horária institucional e que a ansiedade de um trabalho de qualidade o sobrecarrega, ou seja, atribui o excesso de atividade a ele: “Eu não diria sobrecarregado, eu diria que a minha ansiedade é que me sobrecarregada, porque quero fazer tudo bem feito, [...] mas acho que é justo as determinações que a faculdade faz pra mim, quantidade de serviço que ela me dá, eu que às vezes me sobrecarrego mesmo.”

Sob orientação da gestora Leila estão 14 professores em oito polos diferentes, sendo 7 no polo de Uberaba. A referida gestora também afirma que não se sente sobrecarregada e que é possível se organizar para desenvolver as diversas atividades que realiza diariamente. Sobre as condições de trabalho diz que são boas e estão sendo ampliadas. Além das atividades já citadas, também enumera “[...] acompanhar a programação no sistema [...], estabelecer prioridades, correções de provas, acompanhar o trabalho dos professores, divulgação de resultados, elaboração de pautas dos eventos, indicação de docentes, dar o parecer nos processos, protocolos, dentre outras.”

(11)

Então, isso é muito claro pra mim, muito tranquilo, lido com muita tranquilidade [...].” Por outro lado, em relação à produção do material impresso diz que há autonomia e é produzido pelos próprios professores do curso.

A professora Maira é responsável pela elaboração de material, professora tutora de 5 componentes curriculares no curso a distância, grava vídeo-aulas, faz todo serviço administrativo e é professora validadora (que lê e valida tudo que todos os professores do curso fizeram), coordena 27 polos, 12 turmas on-line e 4 turmas na modalidade semipresencial. Em relação à elaboração de material Maira afirma que faz em casa, pois a gestão lhe toma muito tempo: “A parte da elaboração do material eu faço em casa, eu não faço aqui, porque a gestão do curso me toma muito tempo”.

Em relação ao excesso de atividades que os gestores experimentam, Walter e Leila não assumem que há sobrecarga. Será que estão naturalizando a situação? No caso de Walter reconhece que leva trabalho para casa e atribui essa sobrecarga à sua ansiedade. Essa ansiedade não seria provocada justamente por esse excesso de trabalho? No entanto, seu relato nos dá indícios de que ele não consegue perceber isso!

Os depoimentos nos dão indícios de que esses gestores têm uma sobrecarga de trabalho, principalmente pelo formato dos cursos, trabalho no presencial e as várias funções exercidas. Concordamos com Mill (2012) quando afirma esse excesso de trabalho propicia a exploração da mais valia no tempo do trabalho e fica subtendida a intensificação do trabalho dos professores, além da precarização. É nesse contexto que o processo de socialização desses gestores acontece e são essas as atitudes que vão guiando a constituição da identidade deles, conforme afirma Dubar (2005).

5. Conclusões

A gestão nos cursos de licenciatura pesquisados nos permite afirmar que dois coordenadores não tiveram com escolha inicial da profissão docente e que a segunda opção foi marcada por condições econômicas, mas foram se identificando ao longo da profissão. Além disso, a opção pela gestão em todos os casos foi indicação institucional e não tiveram preparação para atuar nesse cargo.

Em relações as funções exercidas por esses gestores e suas condições de trabalho verificou-se que experimentam um excesso de atividades, marcados a custas de trabalho realizado em casa, mas os mesmos afirmam que não há sobrecarga de trabalho. Diante da situação questiona-se: estariam os gestores naturalizando a situação da precarização do seu trabalho?

(12)

Referências Bibliográficas

ANDRÉ; M. E. D. A.; PASSOS, L. F.. Professor formador, mestre modelo? Anais 31ª Encontro Nacional da ANPED. Caxambu, 2008.

BERGER, Peter Ludwig; LUCKMANN, Thomas. A Construção Social da Realidade. Trad. Floriano de Souza Fernandes. 23 ed. Petrópolis: Vozes, 2003.

BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. Sinopse da Educação Superior. Brasília-DF: MEC/INEP, 2013.

COIÇAUD, S. A colaboração Institucional na Educação a Distância. In: LITWIN, E. Educação a distância. Porto Seguro: Artmed, 2001.

CONTRERAS, José. Autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002.

COSTA, Váldina Gonçalves da. Condição docente e constituição do formador: um olhar para a Licenciatura em Matemática. São Paulo: Edgard Blucher, 2011.

COSTA, Váldina Gonçalves da. Professores Formadores dos Cursos de Licenciatura em Matemática do Estado de Minas Gerais. São Paulo: PUC-SP. Tese de Doutorado, 2009. DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Trad. Annette Pierrette R. Botelho e Estela Pinto Ribeiro Lamas. Portugal: Porto Editora, 2005.

GIRAFFA, L.; FARIA, E. Gestão de EAD na Universidade: o Desafio Contemporâneo. PUC/RS, 2008.

HORA, D.L. Gestão democrática na escola: artes e ofícios de participação coletiva. Campinas: Papirus, 1994.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da Escola. Teoria e Prática. Goiânia: Alternativa, 2004.

LUDKE, M.; ANDRÉ, M.. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. MILL, Daniel. Docência virtual: uma visão crítica. Campinas-SP: Papirus, 2012.

MILL, D.; BRITO, N. D. Gestão da Educação a Distância: Origens e Desafios. In: 15. CIAED - Congresso Internacional Abed de Educação a Distância, 2009, Fortaleza. Anais... Fortaleza: CIAED, 2009.

MILL, D.; OLIVEIRA, M. R. G.; RIBEIRO, L. R. C.. Múltiplos enfoques sobre a polidocência na Educação a Distância virtual. In: Polidocência na educação a distância: múltiplos enfoques. São Paulo: EdUFSCar, 2010, p. 13-22.

MINAYO, M. C. S.. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo (SP): Hucitec, 2014.

MOORE, M. G.; KEARSLEY, G. Educação a distância: uma visão integrada – Edição Especial ABED – Associação Brasileira de Educação a Distância. São Paulo: Thompson Learning, 2007. MORAES, M. C. (Org). Educação a distância: fundamentos e práticas. Campinas, SP: Unicamp / Nied, 2002.

PIMENTA, S. G. A profissão professor universitário: processos de construção da identidade, in CUNHA, M. I; SOARES, S. R.; RIBEIRO, M.L. (org.). Docencia Universitária: Profissionalização e Práticas Educativas. Feira de Santana: UEFS Editora, 2009, p.33-55.

SOUZA, A. M.; FIORENTINI, L. M. R.; RODRIGUES, M. A. M.. (Org.). Educação superior à Distância: Comunidade de Trabalho e Aprendizagem em Rede (CTAR). Brasília: Universidade de Brasília, Faculdade de Educação, 2009. Cap. 3, p. 65-85.

Referências

Documentos relacionados

De seguida, vamos adaptar a nossa demonstrac¸ ˜ao da f ´ormula de M ¨untz, partindo de outras transformadas aritm ´eticas diferentes da transformada de M ¨obius, para dedu-

Equipamentos de emergência imediatamente acessíveis, com instruções de utilização. Assegurar-se que os lava- olhos e os chuveiros de segurança estejam próximos ao local de

•   O  material  a  seguir  consiste  de  adaptações  e  extensões  dos  originais  gentilmente  cedidos  pelo 

Com o objetivo de compreender como se efetivou a participação das educadoras - Maria Zuíla e Silva Moraes; Minerva Diaz de Sá Barreto - na criação dos diversos

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

A Psicologia, por sua vez, seguiu sua trajetória também modificando sua visão de homem e fugindo do paradigma da ciência clássica. Ampliou sua atuação para além da