Resultados da artroplastia de Keller-Lelièvre no tratamento do hálux valgo *
FERNANDO FERREIRADA FONSECA FILHO1, ROBERT MEVES2, JORGE HERNANDES ELIECER3, RICARDO CARDENUTO FERREIRA4
* Trabalho realizado no Grupo de Cirurgia do Pé do Departamento de Orto- pedia e Traumatologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (DOT- SCMSP).
1. Professor Doutor, Chefe do Grupo de Cirurgia do Pé do DOT-SCMSP.
2. Médico Assistente do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do DOT-SCMSP.
3. Médico ex-residente do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do DOT-SCMSP.
4. Mestre Assistente do Grupo de Cirurgia do Pé do DOT-SCMSP.
Endereço para correspondência: Rua Dr. Cesário Motta Jr., 61 – 01277-900 – São Paulo, SP. E-mail: cepwcpf@santacasa.org.br
Recebido em 1/9/00. Aprovado para publicação em 11/1/01.
Copyright RBO2001
acima ou abaixo de 60 anos; não houve correlação sig- nificante entre a percentagem da ressecção da falange com os resultados.
Unitermos – Hálux valgo; tratamento; artroplastia de Keller-Le- lièvre
ABSTRACT
Keller-Lelièvre procedure: evaluation of results
The authors studied 21 patients (32 feet) with hallux valgus submitted to Keller-Lelièvre surgical technique from 1986 through 1996. To evaluate results, they used the rat- ing scale of the American Orthopaedics Foot and Ankle Society (
AOFAS) for the metatarsophalangeal joint of the hallux. Statistic analysis was performed and results were associated with use or non-use of intramedullary wire, the size of bone resected from phalanx, and the age of the pa- tients. With a mean follow-up period of 49 months, the au- thors came to the following conclusions: results were higher than or equal to 75 points in 62.5% of the cases; there was no significant difference in results as to use or non-use of intramedullary wire; there was no significant difference in subjective results as to use or non-use of intramedullary wire; the movement of metatarsophalangeal and interpha- langeal joint of the hallux was significantly better when intramedullary wire was not used; there was no significant difference between the results involving the two groups in ages above or below the limit of 60 years; there was no significant correlation between the percentage of resection and the results found.
Key words – Hallux valgus; treatment; Keller-Lelièvre procedure
RESUMO
Os autores estudaram 21 pacientes (32 pés) com há-
lux valgo, operados pela técnica de Keller-Lelièvre, de
1986 a 1996. Avaliaram os resultados usando o método
da American Orthopaedic Foot and Ankle Society (
AOFAS)
para a articulação metatarsofalângica do hálux. Fize-
ram análise estatística dos resultados obtidos, compa-
rando-os com a utilização ou não da fixação intrame-
dular, a quantidade de osso ressecado da falange e a
idade dos pacientes. Com seguimento médio de 49 me-
ses, os autores chegaram às seguintes conclusões: os re-
sultados foram iguais ou maiores do que 75 pontos em
62,5% dos casos; não houve diferença significante nos
resultados com o uso ou não do fio intramedular; não
houve diferença significante na satisfação subjetiva do
paciente com o uso ou não do fio intramedular; a mobi-
lidade das articulações metatarsofalângica e interfalân-
gica do hálux foi significativamente maior quando não
se utilizou o fio intramedular; não houve diferença sig-
nificativa dos resultados considerando-se a faixa etária
INTRODUÇÃO
Segundo Lelièvre
(1)(1963), foi Laforest, cirurgião do rei Luís XVI, quem primeiro descreveu o hálux valgo, afec- ção extremamente freqüente. A deformidade é definida por Mann
(2), em 1993, como um desvio lateral do hálux e me- dial do osso metatarsal I, muitas vezes associado à sublu- xação progressiva da articulação metatarsofalângica. Maior grau de desvio causa proeminência na região da cabeça metatarsal I, aumentando a subluxação da falange proxi- mal do hálux em direção lateral. Quando isso ocorre, os ossos sesamóides que estão firmemente ancorados no ten- dão do músculo adutor do hálux, flexor curto do hálux e no ligamento transverso profundo do metatarso posicio- nam-se lateralmente. Pronação de vários graus do primei- ro dedo e deformidades do segundo dedo secundárias à pressão exercida pelo hálux podem ser observadas. O tipo mais encontrado de hálux valgo é o adquirido e relaciona- do a mulheres de 40 a 60 anos de idade e de sociedades em que o uso de calçados de salto alto é freqüente
(3). A queixa da paciente geralmente é a deformidade e a dor na proemi- nência medial da cabeça metatarsal I; a primeira medida terapêutica indicada são modificações em relação ao tipo de calçado.
A cirurgia descrita inicialmente por Davies e Colley
(4)(1887) e popularizada por Keller
(5), em 1904, continua sen- do um dos mais de 100 procedimentos utilizados para o tratamento do hálux valgo no adulto, especialmente nos pacientes idosos. O procedimento envolve a ressecção de mais da metade da falange proximal do hálux e da exosto- se medial da cabeça metatarsal I.
No início da utilização da técnica observam-se apenas dois casos de anquilose da articulação metatarsofalângica do hálux; entretanto, muitas outras complicações são des- critas. A função estabilizadora da musculatura intrínseca que se insere na base da falange proximal é perdida, expli- cando a causa primária das complicações após esse proce- dimento.
Lelièvre
(1), preocupado com a manutenção da biomecâ- nica do hálux, preconiza uma ressecção mais econômica da falange proximal para aproximar o pé a um tipo grego mais favorável (primeiro dedo menor do que o segundo) e cerclagem fibrosa para tensionamento da cápsula. Viladot
(6)(1962), com o mesmo objetivo, mais tarde adiciona à téc- nica de Lelièvre
(1)uma sutura do tendão do flexor longo do hálux ao rebordo glenossesamóideo para manter a força flexora do hálux. Outras modificações são propostas para
melhorar o posicionamento e a estabilidade do hálux, en- tre elas o pregueamento da cápsula articular no sentido transversal, por meio de um ponto, visando boa correção do valgo do hálux, como descrito por Regnauld
(7)(1974).
Bonney e Macnab
(8)(1952) encontram melhores resul- tados associados à cirurgia de Keller quando no pós-ope- ratório observam maior distância entre a cabeça metatarsal I e a falange proximal remanescente. Em 1950, Fitzgerald
(9)descreve o uso de um fio intramedular para manter essa distância e Thomas
(10)(1962) compara favoravelmente seus resultados com os estudos retrospectivos de Bonney e Mac- nab
(8)(1952) e Cleveland e Winant
(11)(1950) quando usa a fixação.
Atualmente, a artroplastia de Keller-Lelièvre está indi- cada para o hálux valgo moderado associado à doença arti- cular degenerativa da articulação metatarsofalângica em pacientes sedentários e pouco ativos
(12).
Devido à grande freqüência da indicação da artroplastia de Keller e Lelièvre, fomos motivados a estudá-la. O obje- tivo do trabalho é avaliar seus resultados comparando se houve diferença com a utilização do fio intramedular tem- porário, a quantidade de osso ressecado da falange e a ida- de dos pacientes.
CASUÍSTICA E MÉTODO
Foram estudados 21 pacientes (32 pés) operados pela técnica de Keller-Lelièvre no Grupo de Cirurgia do Pé do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, de 1986 a 1996, sendo 17 pacientes do gênero feminino e quatro do masculino. Onze pacientes apresentavam hálux valgo bilateral. A idade va- riou de 49 a 78 anos, na ocasião da cirurgia, com média de 63 anos. O seguimento pós-operatório variou de 13 a 131 meses, com média de 49 meses. Doze pacientes (57%) ti- nham algum parente acometido pela deformidade. Dez pés (31%) apresentavam metatarsalgia.
Todos os pacientes responderam a um questionário e foi preenchido um protocolo de acordo com critérios de ava- liação da American Orthopaedic Foot and Ankle Society (
AOFAS), 1994, para a articulação metatarsofalângica do hálux (quadro 1).
Foi feito o exame clínico de cada paciente, observando-
se o posicionamento dos pés com carga. As mobilidades
das articulações metatarsofalângica e interfalângica do há-
lux foram medidas com o paciente sentado e, o tornozelo,
na posição neutra. Todas as medidas clínicas foram feitas
com goniômetro. Em todos os pacientes foram realizadas
fotos e radiografias dorsoplantares e perfil, sempre dos dois pés com carga.
O ângulo do hálux valgo foi medido nas radiografias dorsoplantares com carga, traçando-se o eixo longitudinal do osso metatarsal I e o eixo longitudinal da falange proxi- mal do hálux. A ressecção da falange foi mensurada e com- parada nas radiografias pré e pós-operatórias imediatas.
Técnica cirúrgica
A cirurgia sempre foi realizada após garroteamento do membro inferior com faixa de Esmarch. Foi feita incisão longitudinal e medial da pele e subcutâneo de aproxima- damente 4cm sobre a articulação metatarsofalângica do
primeiro raio, sendo a cápsula articular aberta no mesmo sentido da pele. A exostose medial da cabeça metatarsal I foi ressecada. Dissecando-se em direção plantar e dorsal, foi exposta a metade da falange proximal do hálux e, com um osteótomo, aproximadamente 30 a 40% da base da fa- lange foram ressecados no sentido perpendicular ao longo eixo do osso, para obtenção do pé tipo quadrado. Colocan- do o hálux em flexão, suturou-se o tendão flexor longo do hálux no rebordo glenossesamóideo. Os osteófitos da ca- beça metatarsal I foram removidos quando presentes. A cápsula foi suturada com o ponto em “8” de Valenti, que cruza a articulação metatarsofalângica e, ao ser ajustado, provoca a adução do hálux, com fio categute simples nº 1 antes do fechamento por planos da incisão.
Dezessete pés (53%) foram fixados temporariamente com fio de Kirschner intramedular e a carga foi permitida, em média, quatro semanas após a cirurgia.
Os testes estatísticos usados para avaliação dos dados foram o t de Student para amostras independentes, o exato de Fisher unilateral e o coeficiente de correlação de Pear- son, fixando-se 5% como nível de significância. Foram assinalados com um asterisco os resultados significantes.
RESULTADOS
A distribuição dos pés segundo o método de avaliação da
AOFASestá mostrada na tabela 1.
A comparação entre a pontuação dos pés submetidos à fixação intramedular e os não fixados, levando-se em con- sideração o método de avaliação da
AOFAS, está exibida na tabela 2.
A relação do uso do fio intramedular e a satisfação sub- jetiva do paciente está ilustrada na tabela 3.
A comparação da mobilidade pós-operatória das articu- lações metatarsofalângica e interfalângica do hálux ao exa- me físico, entre os grupos com e sem fixação intramedular, está mostrada na tabela 4.
QUADRO 1
Pontuação segundo critérios da AOFAS para a articulação metatarsofalângica do hálux AOFAS
DOR: 40 pontos
Nenhuma 40 pontos
Leve, ocasional 30 pontos
Moderada, diariamente 20 pontos
Grave, sempre presente 0 pontos
FUNÇÃO: 45 pontos A. Atividade
Sem limitação, sem suporte 15 pontos
Limitação recreacional, não usa bengala 7 pontos Limitação recreacional, usa bengala 4 pontos Limitação acentuada, usa andador, muletas 0 pontos B. Calçado
Convencional, sem palmilha 5 pontos
Confortável, com palmilha 3 pontos
Modificado ou órtese 0 pontos
C. Mobilidade da articulação MTF
Normal ou pouca restrição (≥ 75°) 10 pontos Moderada restrição (30° a 74°) 5 pontos
Grave restrição (< 30°) 0 pontos
D. Mobilidade da articulação IF (flexão plantar)
Sem restrição 5 pontos
Grave restrição 0 pontos
E. Estabilidade da articulação MTF-IF
Estável 5 pontos
Instável 0 pontos
F. Calosidade MTF-IF
Ausente ou presente e assintomática 5 pontos
Presente e sintomática 0 pontos
ALINHAMENTO: 15 pontos
Bom, hálux bem alinhado 15 pontos
Regular, algum grau de desalinhamento, assintomático 8 pontos Ruim, acentuado grau de desalinhamento, sintomático 0 pontos
TOTAL MÁXIMO 100 pontos
TABELA 1
Distribuição dos pés operados segundo o método de avaliação da AOFAS
AOFAS N %
> 75 pontos 20 62,5
< 75 pontos 12 37,5
Total 32 100,0
Fonte: DOT-SCMSP
TABELA 2
Comparação da pontuação segundo o método de avaliação da AOFAS e a fixação intramedular Com fixação intramedular Sem fixação intramedular
30 70
48 70
52 70
60 70
60 73
73 78
73 80
83 86
83 86
85 88
85 93
85 93
86 93
86 98
93 100
93 95
Média = 74,71 Média = 83,20
s =18,47 s = 10,91
p = 0,13, teste t de Student Fonte: DOT-SCMSP
TABELA 4
Comparação da mobilidade do hálux em graus e uso de fixação intramedular
Com fio Sem fio
Metatarsofalângica Interfalângica Metatarsofalângica Interfalângica
00 05 30 10
00 05 38 10
10 05 42 20
12 05 50 20
30 09 55 20
30 10 56 20
30 10 58 20
34 10 70 20
50 10 70 25
55 10 70 25
55 12 75 30
60 18 80 30
60 25 80 40
70 25 80 40
70 25 85 40
72 30
74 40
Média = 41,88 Média = 14,94 Média = 62,60 Média = 24,67
s = 25,60 s = 10,40 s = 17,12 s = 9,72
p = 0,01*, teste t de Student Fonte: DOT-SCMSP
A comparação dos resultados entre pacientes mais jo- vens (de 60 anos ou menos) e mais idosos (acima de 60 anos) está ilustrada na tabela 5.
A relação entre a quantidade ressecada da falange pro- ximal do hálux e o resultado pós-operatório está mostrada na tabela 6.
O ângulo médio do hálux valgo pré-operatório foi de 30º (variando de 20º a 50º) e pós-operatório de 15,5º (va- riando de –11º a 36º).
As complicações pós-operatórias são mostradas na ta- bela 7.
TABELA 3
Distribuição dos pés segundo a satisfação subjetiva e o uso ou não de fio intramedular
Com fio Sem fio Total
N % N % N %
Satisfeito 12 70,6 13 86,7 25 78,1
Insatisfeito 5 29,4 2 13,3 7 21,9
Total 17 100,0 15 100,0 32 100,0
p = 0,25, teste exato de Fisher Fonte: DOT-SCMSP
TABELA 6
Distribuição dos pés segundo a percentagem ressecada da falange e a pontuação do método de avaliação da AOFAS Caso Falange AOFAS Caso Falange AOFAS
1 30% 93 17 52% 70
2 30% 93 18 48% 70
3 20% 85 19 26% 30
4 20% 85 20 27% 86
5 20% 88 21 37% 86
6 23% 73 22 30% 48
7 29% 83 23 44% 83
8 42% 85 24 20% 52
9 34% 60 25 30% 93
10 12% 86 26 34% 73
11 19% 93 27 26% 93
12 38% 70 28 31% 78
13 40% 70 29 31% 86
14 36% 98 30 37% 60
15 19% 95 31 34% 100
16 34% 73 32 41% 80
r = 0,14, coeficiente de correlação de Pearson Fonte: DOT-SCMSP
TABELA 7 Complicações
Complicação Nº de pés
Infecção superficial 03
Neuroma incisional 01
Hallux extensus 03
Correção insuficiente 04
Metatarsalgia 10
Hálux varo 01
Encurtamento excessivo 06
Fonte: DOT-SCMSP
TABELA 5
Comparação da pontuação segundo o método de avaliação da AOFAS e a faixa etária
< 60 anos > 60 anos
30 52
48 70
60 70
60 73
70 73
70 80
73 83
78 85
83 86
85 86
85 93
86 93
86 93
88 95
93 98
93 100
Média = 74,25 Média = 83,13
s = 17,48 s = 12,88
p = 0,11, teste t de Student Fonte: DOT-SCMSP
DISCUSSÃO
A prática clínica tem demonstrado que o hálux valgo é uma patologia ortopédica freqüente. Viladot
(6)e Coughlin e Thompson
(3)observaram a alta prevalência do hálux val- go nas mulheres da quarta, quinta ou sexta décadas de vida, implicando os sapatos justos femininos oferecidos pela cultura vigente como um importante fator extrínseco da deformidade. Hardy e Clapham
(13)notaram que a heredita- riedade pode desempenhar um papel desencadeante em muitos indivíduos, visto que 63% dos 91 pacientes de seu estudo tinham um parente com hálux valgo. Em nossa ca- suística, essas observações se confirmaram, pois a média de idade dos pacientes na época da cirurgia foi de 63 anos, havendo predominância feminina de 80% e a presença de história familiar com antecedentes de hálux valgo em 57%
dos casos.
Cleveland e Winant
(11)publicaram um valor de satisfa- ção subjetiva de 96% (157 de 163 pés) após a cirurgia de Keller, mas estudos que avaliam outros aspectos além do alívio da dor e da bursite na exostose medial mostram al- gumas limitações da técnica. Bonney e Macnab
(8), Majko- wisk et al
(14)e Vallier et al
(15)empregaram critérios mais
objetivos na suas avaliações, observando complicações como a metatarsalgia e o hallux extensus e pior resultado funcional objetivo. A observação desses autores foi confir- mada em nosso trabalho, pois observamos as complica- ções descritas e obtivemos um resultado acima ou igual a 75 pontos, pelos critérios da
AOFAS, em 62,5% dos casos.
Thomas
(10)preconizou a modificação da cirurgia de Kel-
ler, com o uso de fixação intramedular ou “agrafe” para
manter o afastamento entre a cabeça metatarsal I e a falan-
ge proximal remanescente e melhorar a dor, a aparência
estética, a cicatrização pós-operatória, encontrando melho-
res resultados do que o estudo retrospectivo de Cleveland e Winant
(11), que não usaram a fixação. Vallier et al
(15), numa revisão de 54 pés, associaram a utilização do fio de Kirsch- ner à melhor satisfação subjetiva de seus pacientes. Sher- man et al
(16), através de um estudo prospectivo de 51 pés, não encontraram vantagem associada ao uso do fio de Kirschner temporário, inclusive relacionaram seu uso à piora subjetiva e pior mobilidade da articulação interfalân- gica. Em nossa série, não houve relação significante asso- ciada ao uso do fio intramedular e a satisfação subjetiva dos pacientes (p = 0,25) e, também, aos critérios mais ob- jetivos da
AOFAS(p = 0,13). O estudo, entretanto, da mobi- lidade da articulação metatarsofalângica (p = 0,01) e inter-
falângica (p = 0,01) do hálux demonstrou resultados signi- ficativamente melhores nos casos não fixados.
Mann
(2)alerta que o procedimento de Keller deve ser reservado para pacientes idosos e pouco ativos por levar a distúrbio funcional do mecanismo do windlass, que con- siste na ação da aponevrose plantar que força as cabeças metatarsais em flexão plantar, elevando o arco plantar lon- gitudinal durante a fase final do apoio da marcha. Como resultado desse mecanismo, a pressão abaixo das cabeças metatarsais é transferida para os dedos, especialmente o hálux. A desinserção da aponevrose plantar e musculatura intrínseca do hálux lesa esse mecanismo estabilizador e a pressão não é mais transferida para os dedos, ocorrendo, secundariamente, a perda da função de suporte do hálux.
Em nosso estudo, não houve diferença significativa dos resultados entre os dois grupos na faixa etária acima ou
Fig. 1 – LS, gênero feminino, 66 anos, com queixa de dor e deformidade na exostose da cabeça metatarsal I. Pré- operatório: a – as- pecto clínico, b – aspecto radiográfi- co.
Fig. 2 – LS. Assin- tomática e satisfei- ta com o resultado.
Um ano de pós- operatório: a – as- pecto clínico, b – aspecto radiográfi- co.
a
b
a
b
abaixo de 60 anos (p = 0,11), mas cumpre ressaltar que a idade cronológica muitas vezes não corresponde ao grau de atividade do paciente.
Cleveland e Winant
(11)recomendaram uma ressecção de pelo menos 50% da falange para evitar o desenvolvimento do hálux rígido. Lelièvre
(1)ressecava a base da falange pro- ximal do hálux numa proporção ótima para a obtenção do pé tipo grego. Vallier et al
(15)associaram ressecções limita- das da falange à melhor satisfação do paciente. Bretenseher et al
(17)demonstraram que no tratamento do hálux rígido através da técnica de Keller a ressecção de 33 a 50% da falange proximal esteve associada ao mais alto grau de sa- tisfação do paciente. Nos casos em que excedeu 50%, os pacientes não ficaram satisfeitos, havendo perda da mobi-
lidade do hálux e, quando a ressecção foi menor que 33%, ocorreu recorrência do hálux rígido. Axt et al
(18), através da mesma técnica, encontraram resultados tardios desfa- voráveis quando a ressecção ultrapassou 50% como o hallux extensus.
A média da nossa ressecção foi de 31% para obter o pé quadrado ou grego e apenas um caso ultrapassou 50%, não ocorrendo relação significante entre a ressecção e o resul- tado pós-operatório nos casos estudados (r = 0,14).
CONCLUSÕES
1) Os resultados com a cirurgia de Keller-Lelièvre, se- gundo o critério de avaliação da
AOFAS, foram iguais ou maiores do que 75 pontos em 62,5% dos casos.
Fig. 3 – JS, gênero feminino, 52 anos, com recidiva de hálux valgo e dor na exotose da cabe- ça metatarsal I após recidiva de McBride. Pré-ope- ratório: a – aspec- to clínico, b – as- pecto radiográfico.
Fig. 4 – JS. Encur- tamento + extensão do hálux, metatar- salgia, insatisfeita com o resultado.
Nove anos de pós- operatório: a – as- pecto clínico, b – aspecto radiográfi- co.
a
b
a
b
2) Não houve diferença significante nos resultados com o uso ou não do fio intramedular.
3) Não houve diferença significante na satisfação sub- jetiva do paciente com o uso ou não do fio intramedular.
4) A mobilidade das articulações metatarsofalângica e interfalângica do hálux foi significativamente maior quan- do não se utilizou o fio intramedular.
5) Não houve diferença significativa dos resultados con- siderando-se a faixa etária acima ou abaixo de 60 anos.
6) Não houve correlação significante entre a percenta- gem da ressecção da falange com os resultados.
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