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A Declaração de Paris, eficácia da ajuda ao desenvolvimento e o princípio da apropriação: experiência de aplicação

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Academic year: 2021

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7.º CONGRESSO IBÉRICO DE ESTUDOS AFRICANOS |7.º CONGRESO DE ESTUDIOS AFRICANOS |7TH CONGRESS OF AFRICAN STUDIES L 2010

CIEA7 #28:

STATE,INSTITUTIONS AND MARKET REFORMS IN AFRICA.

Raquel Freitas

 raquel.freitas@eui.eu

A Declaração de Paris, eficácia da ajuda ao desenvolvimento e o

princípio da apropriação:

experiência de aplicação

Nos últimos anos registaram-se esforços internacionais inéditos no sentido de garantir uma maior eficácia da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) e do seu contributo para o desenvolvimento económico e redução da pobreza, designadamente em África. A ideia de assegurar que os países em desenvolvimento se apropriam das suas políticas de desenvolvimento foi reconhecida na Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda, como um dos princípios basilares para melhorar a eficácia da APD. No entanto, a implementação e avaliação do princípio de apropriação têm gerado questões e debates, quer ao nível dos especialistas técnicos quer ao nível dos académicos que estudam estas matérias. O problema reside essencialmente na dificuldade em distinguir entre apropriação real e virtual, e nos impactos negativos desta última relativamente aos resultados desejados. Este artigo percorre os debates existentes, no sentido de identificar as clivagens essenciais em torno do conceito de apropriação, e as suas desvantagens e oportunidades. Finalmente, pretende-se contribuir para a discussão sobre a validade do conceito e possíveis áreas de melhoria para incrementar a sua pertinência na linha dos objectivos da Declaração de Paris.

Eficácia da ajuda, Apropriação, Redução da pobreza, Desenvolvimento.

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5,000 years of modern human history suggests that ownership is not usually given away, but taken. (ver Hannan, 2007)

I

NTRODUÇÃO

O presente artigo analisa a aplicação da Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda ao Desenvolvimento, aprovada por doadores, países em desenvolvimento e instituições internacionais em 2005, e debruça-se em particular sobre um dos seus princípios, o da apropriação (ownership) e a forma como o mesmo tem sido implementado.1 No momento em que se prepara a segunda fase da avaliação da implementação da Declaração de Paris e em que se perspectiva uma nova oportunidade de discussão sobre este quadro normativo, este artigo procura trazer um contributo analítico para a discussão que se irá desenvolver.2

A ideia de apropriação foi adoptada na Declaração de Paris como o principal princípio pelo qual se deve reger a ajuda ao desenvolvimento de forma a assegurar a sua eficácia.3 Note-se no entanto, que a pertinência de uma análise deste princípio não se esgota na relevância que lhe foi reconhecida por este instrumento internacional. Na verdade trata-se de um conceito que, não só pela sua natureza complexa como pela forma como tem sido utilizado pela comunidade internacional, tem inspirado uma série de críticas de vária ordem. Algumas dessas críticas são de uma natureza mais técnica, outras de natureza mais política, e espelham-se na literatura empírica e teórica sobre a ajuda ao desenvolvimento.

Embora a utilidade do princípio de apropriação não seja posta em causa pela maioria das análises, a forma como ele é interpretado e implementado no quadro geral da agenda de Paris gera questões sobre o seu verdadeiro impacto sobre a eficácia da ajuda. Alguns argumentos resultantes destes debates assentam na ideia de que a apropriação efectiva não existe, sendo apenas uma construção discursiva dos países doadores tendo em vista responder a constatações históricas e empíricas sobre a importância do envolvimento dos sistemas locais de governação na formulação mas

1 A tradução oficial em Português deste princípio é a palavra “apropriação” (vide tradução portuguesa da

Declaração de Paris), pelo que será este o termo utilizado neste texto. Ressalva-se a existência de uma palavra específica inglesa, appropriation, que também é utilizada no âmbito da ajuda ao desenvolvimento, mas que se refere ao processo de apropriação de algo já feito não necessariamente pelo país que recebe a ajuda, enquanto que ownerhsip se refere à ideia de que o país beneficiário da ajuda é efectivamente dono da política, conforme explica Castel-Branco 2008, 8.

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Em 2011 terá lugar a próxima reunião de seguimento da Declaração de Paris, durante o IV Fórum de Alto-Nível sobre a Eficácia da Ajuda em Seoul. Foi entretanto realizada a 1ª fase da avaliação prevista para a Declaração Wood et al. 2008., e está em curso a 2ª fase da avaliação ver Phase 2 Evaluation Reference Group 2009. Através das discussões presentes pode-se antecipar que a operacionalização do conceito de apropriação venha a estar na agenda desta reunião, uma vez que este tema tem levantado diversas questões.

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Os cinco princípios da DP são apropriação, alinhamento, harmonização, gestão centrada nos resultados, responsabilidade mútua pelos resultados.

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sobretudo na implementação das políticas de desenvolvimento e nas de redução da pobreza. Segundo esta argumentação, o actual paradigma da ajuda não representa na prática uma mudança fundamental relativamente ao paradigma anterior em que dominavam as relações de poder e dependência da ajuda. Presentemente a implementação do princípio de apropriação é formalmente aferida por apenas um indicador, a existência de uma Estratégia Nacional de Redução da Pobreza (ENRP).

A questão que aqui se coloca é a de saber se esta operacionalização do princípio de apropriação afere efectivamente o que se pretende com o princípio, ou seja, promover um processo de decisão política autónomo e livre de condicionamentos, por parte dos países em desenvolvimento, visto que se entende que é essa autonomia que está na base de uma melhor implementação das políticas adoptadas. Não se trata neste artigo de aferir o impacto da apropriação sobre a eficácia da ajuda ou mesmo das ENRP sobre a eficácia da ajuda, embora essa relação positiva seja presumida no contexto da Declaração de Paris.

Este artigo explora o conceito de apropriação e os seus limites de verificação, argumenta que a forma como é operacionalizado o conceito assenta numa visão essencialmente quantitativa, numa metodologia problemática e em modelos de análise que excluem dimensões internas dos processos de decisão, os quais são essenciais para uma medida fiável do conceito de apropriação. Este artigo procura demonstrar a importância de se analisar as dinâmicas que presidem ao processo de formulação de políticas públicas. O artigo começa por uma análise do conceito e da forma como é operacionalizado o conceito de apropriação, bem como dos debates que tem gerado, e sugere um modelo de análise assente na formação de preferências e na interacção entre os interesses dos doadores e dos países em desenvolvimento.

O

CONCEITO DE APROPRIAÇÃO E OS SEUS LIMITES

O conceito de apropriação inscreve-se formalmente na agenda internacional através de uma definição reconhecida na Declaração de Paris (DP) aprovada em 2005, e aperfeiçoada na Agenda para a Acção de Accra (AAA), aprovada em 2008.4 Apesar de existir uma convergência internacional sobre a importância destes documentos e dos princípios neles contidos, o princípio de apropriação apresenta-se difícil de concretizar e operacionalizar. O espectro de especificações que o

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O Fórum de Alto-Nível de Accra em 2008 foi uma reunião de seguimento da Declaração de Paris, que teve em consideração os relatórios de progresso e avaliação da implementação da DP, no sentido de refinar os princípios e compromissos contidos nesta última, do qual resultou a Agenda para Acção de Accra (AAA). Para mais informação consultar http://www.accrahlf.net (acedido a 02/08/2010).

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caracterizam traduz-se numa observável diversidade de abordagens por parte dos diferentes agentes que o utilizam.

O conceito oficial

Segundo a tradução portuguesa da DP, o princípio de apropriação consiste na condição de os países parceiros exercerem liderança efectiva sobre as suas políticas e estratégias de desenvolvimento e assegurarem a coordenação das acções de desenvolvimento.5 No âmbito deste princípio são assumidos compromissos por parte dos países parceiros, no sentido do exercício de liderança no desenvolvimento e implementação das suas estratégias nacionais de desenvolvimento e de redução da pobreza. Daqui resulta o único indicador do princípio de apropriação reconhecido na DP: existência de uma estratégia operacional, i.e., uma Estratégia de Redução da Pobreza (ENRP).6 O compromisso de liderança deverá ser exercido através de processos consultivos amplos; e os países parceiros comprometem-se a dirigir a coordenação da ajuda a todos os níveis, bem como os outros recursos de desenvolvimento, em diálogo com os doadores e fomentando a participação da sociedade civil e do sector privado nacional. Os países doadores comprometem-se a respeitar essa liderança e a ajudar a reforçar as capacidades para os parceiros a exercerem. No entanto a forma como são concretizadas e sobretudo monitorizadas e avaliadas as várias dimensões destes compromissos não são especificadas na DP nem na subsequente AAA.

Entre as declarações de Paris e de Accra verificou-se um alargamento da especificação teórica sobre o conceito de apropriação, que não estava suficientemente explorado (FRIDE, 2008), designadamente no sentido do desenvolvimento de capacidades de liderança e gestão do desenvolvimento e do envolvimento da sociedade civil, governos locais e sector privado, traduzindo a ideia de “apropriação democrática” e do reforço alargado dos sistemas dos países em desenvolvimento, aliás na linha do proposto por Zimmermann and McDonnell (2008). A evolução foi no sentido de maior utilização da economia política e análise da governação nos países em desenvolvimento, havendo uma convergência crescente entre países em desenvolvimento e doadores no sentido de algumas prioridades temáticas,

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Os cuidados com a terminologia para designar os países em desenvolvimento levam por vezes a confusão entre quais são os doadores e quais os beneficiários da ajuda, devido à utilização indistinta de designações como países parceiros ou parceiros de desenvolvimento. Neste artigo, exceptuando as referências a terminologia traduzida de documentos oficiais, será utilizada a expressão países em desenvolvimento, seguindo a tradução oficial da Agenda para a Acção de Accra (http://siteresources.worldbank.org/ACCRAEXT/Resources/4700790-1217425866038/FINAL-AAA-in-Portuguese.pdf, acedido a 02/08/2010).

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A sigla ENRP (Estratégia Nacional de Redução da Pobreza) é aqui utilizada como tradução dos PRSP (Poverty Reduction Strategy Papers), conforme designados pelo Banco Mundial.

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designadamente: direitos humanos, igualdade de género, e boa governação (Accra High Level Forum, 2008b).

Apesar de em Accra se terem alterado os compromissos do princípio de apropriação, não houve alteração nos indicadores formais para a sua verificação, o que mostra as inconsistências na mobilização simultânea mas descoordenada de agendas técnicas e políticas. Como nota Easterly (2006), as burocracias internacionais têm uma extraordinária capacidade para incorporar as críticas que lhes são feitas. De facto, apesar de Accra conter um reforço da linguagem sobre apropriação, em termos de operacionalização o único indicador mantém-se a existência de uma estratégia de desenvolvimento operacional (EURODAD, 2008). Na reunião de Accra a possibilidade de se desenvolverem outras formas de operacionalização do conceito de apropriação foi remetida para a próxima reunião do Fórum de Alto-Nível sobre a Eficácia da Ajuda em Seoul 2011. No entanto, o relatório de progresso sobre a DP, produzido pela OCDE reconhece as dificuldades da medição do conceito apropriação, afirmando mesmo que por essa razão não se espera que em 2011 haja uma ideia definitiva sobre até que ponto o objectivo foi atingido (OECD, 2009: 37). O Banco Mundial (BM) tem estado a estudar outras formas de operacionalizar os princípios da DP (Knack, et al., 2010) mas não foram inseridos na agenda indicadores adicionais relativamente ao princípio de apropriação.

Estratégias de Redução da Pobreza como indicadores de apropriação

O princípio de apropriação da DP apresenta uma meta muito concreta, ou seja, a existência até 2010 de pelo menos 75% de países em desenvolvimento com uma Estratégia de Redução da Pobreza (ENRP) operacional e ligada a quadros de despesas a médio prazo e a orçamentos anuais.7 Segundo o BM, esta ligação da ENRP à afectação de recursos no quadro de orçamentação nacional apresenta-se especialmente difícil (World Bank, 2007). Em 2007 apenas 20% dos países analisados haviam alcançado essa meta, perspectivando-se que a mesma dificilmente será atingida em 2010 e que para tal serão necessários esforços muito particulares (OECD, 2008).

As ENRP são o fruto da evolução do paradigma de desenvolvimento, e têm a sua origem no final dos anos 90 quando o BM constatou as desvantagens da imposição das políticas de ajustamento estrutural e das formas vigentes de condicionalismo, associadas às chamadas “boas políticas” (Bourguignon and Sundberg, 2007). Em 1999 surgem os primeiros documentos desta geração, baseados

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A base desta meta foram os 55 países analisados pelo BM no âmbito do Relatório de Progresso do Comprehensive Development Framework de 2005 World Bank 2005..

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em princípios da Comprehensive Development Framework, que assentam na necessidade de maior envolvimento dos países em desenvolvimento na definição das suas políticas, face à evidência de que as políticas impostas geravam ineficiência ao nível da implementação porque não tinham o empenho e adesão dos agentes nacionais e locais. Estes documentos trouxeram melhorias ao sistema, contribuindo para uma maior centralidade da questão da pobreza no seio dos governos; envolveram a sociedade civil nos debates sobre a redução da pobreza de uma forma inédita; centraram atenções no alinhamento e harmonização dos doadores a nível internacional e a nível local (Driscoll and Evans, 2005).

Apesar destas vantagens, a utilização da ENRP como indicador do princípio de apropriação assenta em dois pressupostos essenciais, os quais têm os seus limites.

Um pressuposto é o de que a ENRP é a estratégia de desenvolvimento tendencialmente dominante do país e que tem um impacto significativo e sustentável sobre as outras opções de desenvolvimento, estando implicitamente ligada ao crescimento. Aqui levanta-se uma série de questões sobre o estatuto da ENRP no contexto de outras estratégias de desenvolvimento e das opções orçamentais nacionais, bem como sobre a forma como todas elas se articulam. Tal relação é de alguma forma imposta pela DP e pelo BM, ao exigir a ligação da ENRP a um quadro orçamental de médio prazo, de forma a assegurar que a mesma é enquadrada nos outros processos orçamentais e não apenas um documento desgarrado do contexto para ser apresentado para financiamento pelos doadores. Particularmente difícil é a ligação da estratégia à afectação de recursos no quadro de orçamentação nacional (World Bank, 2007). Esta dificuldade pode resultar de incapacidade institucional para articular as duas estruturas ou de simples falta de empenho e vontade política em absorver no quadro nacional as opções políticas definidas no âmbito da ENRP, o que na prática configura falta de apropriação. É inevitável a constatação de que a apropriação das políticas de desenvolvimento é uma questão política e não uma questão meramente técnica, que se possa subsumir à existência de um documento estratégico. Esta noção é sublinhada por Lopes (2002), que adianta ainda que apropriação não promove ou obsta necessariamente ao crescimento económico. Esta equação entre o lugar da ajuda ao desenvolvimento no contexto mais amplo do crescimento e desenvolvimento geral do país começa a ser formalmente assumida no âmbito da preparação da segunda fase da avaliação da DP, com um documento que desenvolve uma reflexão mais profunda sobre as dimensões políticas da DP e sobre a ligação entre ajuda, crescimento e desenvolvimento (Stern, 2008).

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Um outro pressuposto é o de que a ENRP é de facto o resultado de uma vontade nacional, isenta de pressões externas e de contradições internas. Esta ideia tem sido desmistificada por diversos autores (Rakner and Vibeke, 2007) . Acresce que esse documento só é válido depois de aprovado pelo BM, apesar de na segunda geração de ENRP ter deixado de haver uma ligação directa das mesmas com o processo de aprovação dos empréstimos aos países altamente endividados (Booth, 2005). Driscoll e Evans (2005), por exemplo, evidenciam o condicionamento político nas opções disponíveis, ao referirem a pressão que as ENRP de segunda geração colocam para mais ênfase nos MDG e também a influência do contributo da ajuda para a segurança global.

A constatação ampla de que a apropriação não se esgota na existência ou ausência de uma ENRP aprovada pelo BM abre espaço a múltiplas re-interpretações do conceito e introdução de outros critérios e indicadores. Note-se, por exemplo, que os restantes princípios da eficácia da ajuda, designadamente a utilização dos sistemas dos países parceiros por parte dos doadores e o alinhamento das estratégias dos doadores pelas ENRP, são adicionados na avaliação da DP como critérios de verificação de apropriação (Wood, et al., 2008), embora o modelo de análise da DP os separe de forma estanque em indicadores quantitativos. Por exemplo, nas reuniões preparatórias de Accra, os países parceiros africanos indicaram claramente que o alinhamento das estratégias dos doadores com as suas é que “confere sentido à apropriação” e que enquanto existe dependência da ajuda não existe apropriação efectiva mas sim parcerias com diferentes graus de apropriação (ver Accra High Level Forum, 2008a). No entanto, a identificação desta gradação não foi feita até agora, e nem temos a certeza de que a direcção de influência se tenha de facto alterado, do doador para o país em desenvolvimento. Esta permanece uma hipótese de trabalho em aberto, que foi explorada pela Eurodad que estabeleceu um quadro analítico para explorar a questão da apropriação que leva em conta a dimensão da interacção com os doadores e o espaço político existente (ver IPAM, 2008).

Multiplicidade de abordagens ao conceito de apropriação

Esses diversos critérios acabam por ser valorizados quando apresentam evoluções positivas no sentido pretendido, mas não implicam qualquer responsabilização formal no âmbito da DP quando apresentam evoluções negativas ou pelo menos quando não evoluem. Por exemplo, curiosamente a apreciação global da 1ª fase da avaliação da DP (Wood, et al., 2008) introduz os critérios adicionais identificados pelo BM no seu Comprehensive Development Framework (World Bank, 2005), concluindo que houve um fortalecimento das políticas e estratégias nacionais

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de desenvolvimento desde 2005 e que a apropriação nacional é forte, embora muito centralizada no governo. Não se percebe de onde vem esta medida de força. Por outro lado, o mesmo relatório de avaliação da DP faz uma avaliação positiva sorbre as medidas postas em prática pelos doadores para respeitar o princípio de apropriação, muito embora tais medidas não tenham sido assumidas como compromissos especificados em termos de indicadores, nem sejam objecto de mecanismos de parametrização de progresso: entre essas medidas estão declarações políticas, novas formações e linhas de orientação, novas abordagens de programação e incentivos para o apoio ao aumento de apropriação e liderança por parte dos beneficiários. Estes exemplos carecem de substanciação em termos do seu efectivo impacto na apropriação.

Para além da indefinição relativamente ao conceito de apropriação, no próprio seio das estruturas mais ligadas ao acompanhamento da DP, outras instituições têm as suas próprias abordagens ao conceito de apropriação. As Nações Unidas (NU) possuem instruções que possuem orientações estratégias que incluem a identificação de meios para influenciar processos de definição das políticas de desenvolvimento (United Nations Development Group, 2003). No âmbito NU o conceito de apropriação nacional é interpretado como a participação de representantes dos países em desenvolvimento nas reuniões de preparação do UNDAF, que é o documento estratégico do sector de desenvolvimento das NU (United Nations Development Group, 2010). O UNDAF é um processo puramente onusiano, em que as diversas agencias apresentam as suas prioridades, e que tem prazos apertados para ser negociado, sendo pois pouco provável que sejam muito permeáveis às posições dos representantes nacionais em questões fundamentais. Embora esta seja apenas uma observação de natureza dedutiva e não uma constatação, pode-se dizer que a forma como se utiliza a expressão apropriação de forma relativamente fácil mostra como o princípio é permeável a alguma retórica.

Noutros contextos a retórica é substituída pelo pragmatismo e por uma clareza de objectivos mesmo que não sejam os politicamente mais correctos no contexto da DP. A United States Agency for International Development (USAID) por exemplo, assume claramente nos seus nove princípios uma abordagem mais estratégica, e isso reflecte-se na menor ambição para o conceito que utilizam de apropriação: “capitalizar sobre a liderança, participação e empenho de um país e da sua população “ (USAID, 2006) e também na menor ênfase no conceito, o qual por exemplo é mencionado apenas uma vez na introdução do seu plano estratégico 2007-2012 (USAID and U.S. Department of State, 2007). O programa Millennium Challenge Account por seu turno,

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operacionaliza apropriação por referência aos seus programas, envolvendo o controlo por parte do governo do país em desenvolvimento sobre o processo de priorização durante a formulação do programa, sendo também o país em desenvolvimento responsável pela implementação, respondendo perante os seus interlocutores domésticos quer pelas decisões quer pelos resultados (Philips-Mandaville, 2009).

Outras abordagens privilegiam a transparência, como é o caso da CE, que definiu como as duas principais prioridades na implementação de Accra, a utilização dos sistemas dos países e a publicitação de todas as condições ligadas aos contributos (OECD (DCD; DAC), 2009). A verificar-se esta publicitação de todas as condições esta seria uma forma mais transparente de implementar a DP, desde que essa transparência se aplique também ao próprio processo de definição de políticas e identificação de objectivos das ENRP.

Esta secção procurou ilustrar alguma da diversidade a que se presta o conceito de apropriação e que é agravada pela deficiente operacionalização e falta de clareza sobre o que se pretende efectivamente no contexto de Paris. Esta ambiguidade acaba por tornar o objecto referente do conceito indefinido e aberto a múltiplas abordagens que raramente vão ao âmago das relações de poder e influência, que nem sempre são consistentes entre si e que nem sempre contribuem para a real eficácia do conceito no contexto da ajuda ao desenvolvimento.

D

EBATES ASSOCIADOS AO CONCEITO DE APROPRIAÇÃO

Apesar da valorização do princípio da apropriação por parte de doadores e países em desenvolvimento em termos de discurso político e da agenda internacional, existem indícios de que tal valorização não se reflecte inteiramente na prática. Verifica-se que muitos dos problemas técnicos apontados como obstáculos à apropriação resultam de problemas políticos e muitas das respostas técnicas destinam-se a responder – por vezes a camuflar - problemas políticos. Esta relação é habilmente traçada por Hannan (2007), ao diferenciar entre apropriação administrativa e apropriação política, que se traduz no facto de para gerir um país viável ser necessário muito mais do que capacidades de gestão da ajuda e que ao sobrecarregar a ajuda com procedimentos e indicadores de performance, se transforma as entidades locais em administradores de fundos e os doadores em políticos de facto. No fundo há uma tensão entre as respostas que podem ser dadas por indicadores de ordem burocrática e as que devem ser aferidas por indicadores de ordem política, que envolvem análise de relações de poder e dinâmicas de influência.

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Observações de natureza técnica

No âmbito dos obstáculos de natureza técnica à apropriação, encontram-se os problemas ligados à capacidade dos recursos humanos quer do sector público quer da sociedade civil; as questões ligadas à gestão da ajuda e liderança; e as questões de acompanhamento da implementação das políticas.

Capacitação

Algumas das questões identificadas na avaliação da DP como mais difíceis de contornar foram as relacionadas com a fraca capacidade dos beneficiários e com o fraco envolvimento da sociedade civil alargada (Wood, et al., 2008). É um facto conhecido e amplamente estudado que os países em desenvolvimento sofrem de uma marcada assimetria de formação de recursos humanos e sobretudo de recursos humanos adaptados às regras e conteúdos de funcionamento da ajuda internacional, que lhes permitam formular e implementar as políticas em consonância com os parâmetros ditados pelo sistema internacional. A ideia de eficácia, neste caso, tem implícito o grau de adequação da formação dos recursos humanos ao contexto internacional. Isto constitui, segundo Gould (2005), já uma forma de formatação de procedimentos e estruturas de pensamento que condiciona os países em desenvolvimento a “apropriarem-se” de opções previamente delimitadas, mais do que a desenvolverem as suas políticas autónomas.

Gestão da ajuda: Liderança, controlo e participação

A 1ª fase da avaliação da DP identificou uma contradição entre o exercício de liderança nacional e a exigência de processos consultivos amplos na formulação das ENRP, uma vez que abrem as portas a influência externa, embora não tenha sido considerada como um problema particularmente proeminente na maioria dos países avaliados (Wood, et al., 2008). Esta conclusão pode ser questionada, uma vez que não é conhecida a forma como foi aferida esta questão e está ausente qualquer distinção analítica entre liderança e controlo efectivo. Note-se, aliás, a mudança de linguagem na tradução portuguesa da AAA, que demonstra de alguma forma a necessidade de caracterizar o princípio da apropriação com a palavra controlo, indicando um maior grau de poder dos países em desenvolvimento sobre a definição das políticas do que a simples liderança de processos consultivos ou de gestão da ajuda.8 Esta distinção espelha o debate já referido sobre a apropriação real e virtual, no sentido de que podemos estar em presença de diversos mecanismos de acompanhamento e consulta na formulação das ENRP, os quais apenas esgotam as

8 Na tradução portuguesa da AAA a palavra apropriação é substituída pela expressão “fortalecer o

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capacidades dos agentes do governo e administração pública na gestão desses mecanismos mas não lhes conferem um efectivo poder de decisão final e de negociação política. Por outro lado, a chamada apropriação democrática, resultante de consultas com diversos sectores da sociedade civil pode ter esse mesmo efeito de sobrecarga do sistema e efeito nulo sobre a melhoria das políticas. Importa pois, para além de incentivar a participação, aferir de que forma as diversas reuniões e consultas exigidas têm impacto sobre as dinâmicas de influência e pressão em jogo e sobre as decisões efectivamente tomadas, permitindo identificar o peso de doadores e dos outros actores consultados nas decisões finais.

Acompanhamento – resultados, matrizes e avaliação

Existe uma tendência reconhecidamente excessiva para os doadores centrarem atenções nas análises de desempenho, matrizes de resultados e outros mecanismos de acompanhamento. Hannan (2007), observa alguma tendência dos doadores para a micro-gestão e envolvimento em múltiplas questões, com particular ênfase recentemente nas questões de governação. Aponta uma ânsia de demonstrar resultados e a eficácia de determinadas modalidades de ajuda, nomeadamente assente em motivações de natureza administrativa ou burocrática. O mesmo autor conclui que apesar de estes constrangimentos não minarem inevitavelmente o princípio da apropriação, ele ser também atingida por eles. Ultrapassada a era da condicionalidade, estabelecem-se novos modelos de selectividade, que consistem no condicionamento da ajuda à assunção de resultados em sectores económicos e sociais chave (Adam, 2004).

Outros autores, como Easterly (2006, 2008) criticam a governação por matrizes com o argumento de que apenas normaliza interacções sem alterar as causas da ineficácia. O mesmo autor inspira a questão sobre se podem abordagens técnicas ultrapassar os problemas políticos e que são inerentes às questões ideológicas e de modelo de desenvolvimento. Indo ao fundo da questão podemos interrogar-nos sobre quem é que define os objectivos a que os resultados exigidos devem corresponder? Traduzindo isto para o argumento aqui exposto sobre a operacionalização do princípio de apropriação, questiona-se quem é que define as opções essenciais das ENRP, que passam quase por documentos técnicos fabricados por uma série de burocracias de vária natureza? Tal como foi argumentado no início desta secção, acaba por se tratar já de uma questão política camuflada de questão técnica.

Existem ainda críticas à natureza demasiado técnica dos critérios da DP especificar (Rosser, 2009). Em resposta a estas críticas, a evolução de Paris a Accra

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procurou incorporar a consciência da dimensão política dos processos de decisão. O documento preparatório da 2ª fase da avaliação da DP conceptualiza claramente a relação entre a eficácia da ajuda e a eficácia do desenvolvimento, problematizando as dimensões políticas do modelo de Paris (Phase 2 Evaluation Reference Group, 2009). As estruturas de acompanhamento da DP parecem padecer de um problema geral da cooperação para o desenvolvimento, que é o de uma falta de correspondência entre a fase de definição de políticas (no caso mais concreto do ciclo de projecto, a fase de programação), da fase de avaliação.

Observações de natureza política

O princípio da apropriação prende-se também com questões de natureza política ligadas ao paradigma de desenvolvimento, e incluem considerações que envolvem a análise dos interesses dos doadores face aos interesses dos beneficiários. Paradigma da ajuda ao desenvolvimento

Como vimos, pretende-se com a agenda de Paris consolidar a mudança no paradigma de desenvolvimento ultrapassando as dificuldades colocadas pelo condicionalismo que presidia à imposição de modelos de ajustamento estrutural. O novo paradigma caracteriza-se por uma nova concepção mais aberta e participativa do desenvolvimento, mas depende da boa governação e do envolvimento dos governos e da ênfase na questão da pobreza. A grande questão que se coloca sobretudo na literatura académica, tendencialmente mais criticado que a institucional, é saber até que ponto o paradigma realmente mudou e até que ponto deixou de haver imposição de opções políticas.

Vários autores argumentam que a estrutura ideológica e a distribuição de poder global estabelecem um contexto que efectivamente limita a liberdade de escolha e as opções políticas disponíveis aos países em desenvolvimento. Mosse e Lewis (2005) concedem que a ajuda ao desenvolvimento em geral não funciona através do poder negativo da compulsão ou domínio, mas através de um poder positivo que ganha legitimidade pelo estabelecimento de “regimes de verdade” que delimitam o campo de acção possível, havendo apenas uma aparente liberdade de escolha dos indivíduos. Segundo Tandon (2009), os paradigmas do desenvolvimento constituem um impedimento à real apropriação, e argumenta que para haver apropriação efectiva é necessário uma transferência da conceptualização do paradigma de desenvolvimento no norte para o sul, sendo o ponto de partida não a ajuda mas o desenvolvimento.

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Alguns estudos apontam para que o novo paradigma de desenvolvimento apenas se traduz por uma mudança de velocidade, e não de direcção, e que continua a existir um consenso de Washington, embora fragmentado (Sumner, 2006). Uma análise das ENRP conclui que para além de serem muito parecidas entre si, elas não se demarcam muito das políticas de ajustamento estrutural dos anos 80, corroborando a tese de que as ENRP e o conceito de apropriação servem objectivos sobretudo retóricos (World Development Movement, 2005).

Craig e Porter (2006) argumentam que a mudança de abordagem se traduz sobretudo na ênfase “supostamente benigna” na questão da boa governação, e que em última análise promove a manutenção do projecto liberal. Esta ênfase na boa governação foi vista inicialmente como potenciadora do funcionamento dos mercados e mais tarde como potenciadora também das dimensões segurança e oportunidade, através do que estes autores designam como institucionalismo neo-liberal, que segundo eles só se consegue com o envolvimento dos governos.

A questão da boa governação tem sido amplamente promovida por instituições como o BM e a OCDE (ver por exemplo OECD, 2009), as quais sofrem de um défice de legitimidade para conduzir processos que já levaram a impactos reconhecidos como negativos (EURODAD, 2008). Esta ênfase na governação e na verificação das boas políticas de governação acaba por cair na mesma tendência dirigista que as anteriores políticas de ajustamento estrutural, segundo Carmody (2008). Tudo isto representa uma de facto imposição de condicionalidade, cujos impactos negativos podem ser múltiplos (ver Adam, 2004, Molina, 2007).

A própria ênfase do presente paradigma na pobreza é criticada por Green (2008), que pugna por uma maior ênfase nas desigualdades e na redistribuição, as quais o paradigma não resolve. Esta ênfase é também vista como uma forma de legitimar o paradigma liberal. São apontadas na literatura inconsistências entre as ENRP e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), consideradas duas abordagens diametralmente opostas sobre utilização da condicionalidade que ameaçam o sucesso do novo paradigma (Renard, 2007). Este autor levanta questões quanto à possibilidade de de facto ser aplicado o novo paradigma e afirma que não existe na verdade consenso sobre a forma como ele deve ser aplicado e que existem agendas diferentes entre doadores e beneficiários.

Outras análises como a da Oxfam (2004), consideram que ainda não se faz o suficiente no sentido da verdadeira apropriação. Glennie (2008) questiona mesmo a

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necessidade de mais ajuda para África e argumenta que a dependência da ajuda impede o desenvolvimento das instituições básicas necessárias para assegurar a ligação vital de responsabilidade entre o Estado e o cidadão.

Interesses dos doadores

Seguindo a linha das críticas ao paradigma, podemos dizer que este continua a favorecer os interesses ideológicos dos doadores. No entanto, para além do enquadramento macro do paradigma de desenvolvimento, no qual se inclui o enfoque dos doadores na redução da pobreza, entendido como um projecto que equilibra as necessidades sociais com as liberais, existem interesses concretos dos doadores que os podem levar a exercer formas de pressão explícita ou de influência por parte dos doadores e mesmo de manipulação sobre os países em desenvolvimento. A problemática do exercício de influência por motivações de política externa ou comerciais tem sido explorada em literatura de natureza diversa e são conhecidas as formas tradicionais pelas quais ela se manifesta, como por exemplo através da imposição de prioridades em áreas de intervenção e visibilidade dos doadores. Tais dinâmicas estão intrinsecamente associadas à problemática da dependência da ajuda e impacto nas relações de poder, e prendem-se com as questões de condicionalismo e de ajuda ligada. Toda a lógica da DP vai no sentido de ultrapassar essas dinâmicas que permitiam o exercício de pressões de forma directa aberta e de alguma forma legitimada. A DP acaba por ter um efeito de mediação entre os interesses dos doadores e dos países em desenvolvimento. A questão que se coloca é a de saber se houve convergência ou se ficou tudo na mesma, com um condicionamento normativo.

A avaliação da DP identifica alguns dos principais desafios que se colocam aos doadores e que condicionam o grau de abertura para uma real apropriação por parte dos países que recebem a sua ajuda (Wood, et al., 2008), entre eles o fraco apoio pela apropriação na opinião pública nacional, receios nas ONGDs desses países de que o relacionamento governo-governo esgote o espaço da sociedade civil; preocupação com a visibilidade dos seus contributos, as suas próprias regras fiduciárias e contabilísticas, e os interesses de politica externa, comerciais e institucionais que continuam a permear a ajuda ao desenvolvimento.

Interesses dos países em desenvolvimento

Ao nível da definição dos interesses dos países em desenvolvimento, coloca-se a questão de saber quais são os seus reais interesses. Não sendo o Estado uma entidade unitária, com diversas perspectivas por parte dos parlamentos, actores da sociedade civil e sector empresarial, e mesmo o governo contém dentro dele múltiplas

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perspectivas dissonantes, é difícil estabelecer um interesse predominante. No entanto existem algumas questões que ajudam a estabelecer um parâmetro dentro do que se pretende na análise da apropriação das políticas de desenvolvimento. Eles são consonantes com o paradigma de desenvolvimento, incluindo as suas interpretações mais críticas? Existem nos países em desenvolvimento interesses distintos das opções de desenvolvimento identificadas pelos doadores como ideais? O paradigma de desenvolvimento e em particular a DP permitem a efectiva construção de preferências autónomas por parte dos países em desenvolvimento?

As ENRP, enquanto indicador de apropriação são vistas como tal. Booth (2005) afirma que o que realmente é necessário para as ENRP trazerem um contributo significativo para o processo político é a produção local de pensamento político de alta qualidade sobre os objectivos de redução da pobreza e sua implementação. Isto demonstra a incapacidade local de formular políticas de forma consistentemente orientada para a redução da pobreza. No entanto não significa que não haja formulação de preferências, eventualmente com base em interesses pessoais.

Algumas abordagens questionam a centralidade do poder do Estado neste processo, incluindo a sociedade civil, embora outras defendam a sua pertinência (Green, 2008). Alguns argumentos vão no sentido da transferência das responsabilidades pelos resultados dos países doadores para os países em desenvolvimento, quando eles são muitas vezes responsáveis pelas opções políticas (Hickey and Mohan, 2008). Alvarez (2010) critica o efeito do apoio ao orçamento: desresponsabilização dos doadores, mais corrupção, mais dependência da ajuda, maior influencia efectiva dos doadores nas políticas do governo, menor responsabilidade dos governos perante os seus cidadãos, menor incentivo para desenvolvimento de políticas fiscais e do sector privado.

Conclui-se que é essencial analisar o contexto e não apenas de um ponto de vista técnico sobre números de reuniões, mas do ponto de vista da formulação de preferências e das dinâmicas de poder e influência. Não podemos falar de apropriação em termos absolutos mas importa qualificá-la de acordo com modelos de interacção.

E

LEMENTOS PARA A DISTINÇÃO ENTRE APROPRIAÇÃO EFECTIVA E APROPRIAÇÃO VIRTUAL

Num contexto em que se levanta a questão da consonância entre discurso e prática relativamente ao conceito de apropriação, são úteis reflexões que contribuam para alargar o modelo de análise existente e quais as áreas em que o mesmo beneficiaria

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de aperfeiçoamentos no sentido de permitir uma distinção mais fiável entre apropriação efectiva e apropriação virtual.

Interpretação do modelo de análise existente

O quadro analítico formal subjacente à agenda de Paris assenta num único indicador binominal dicotómico, traduzindo-se na existência ou não de uma ENRP. O pressuposto sobre o qual assenta este indicador é o de que a mera existência desta estratégia reflectiria automaticamente a apropriação das políticas de desenvolvimento por parte dos países em desenvolvimento. As abordagens analíticas institucionais que operacionalizam o conceito de apropriação assentam em checklists de variáveis pré-determinadas que acabam por consistir mais num guião de como devem ser os processos de decisão a nível nacional do que numa verdadeira análise de quais os factores que de facto influenciam as decisões (ver por exemplo Entwistle and Cavassini, 2005).

No entanto, se deixarmos em aberto a possibilidade de a própria definição da ENRP não ser totalmente controlada pelos países em desenvolvimento mas fruto de constrangimentos ou imposições, teremos uma apropriação condicionada, mesmo com a existência formal de uma ENRP, aprovada pelo BM. Ou seja, haveria uma apropriação virtual e não real ou efectiva. Como vimos adiante, a agenda de Paris não vai ao ponto de questionar as opções políticas acordadas nas ENRP e a aferição de apropriação é remetida para a questão técnica sobre até que ponto são implementadas as políticas e efectivamente alocados os financiamentos destinados aos diferentes sectores.

Booth (2005) apresenta uma lista interessante de indicadores que mostram que a teoria de mudança que inspira as ENRP e a sua operacionalização está errada, designadamente ao presumir que maior participação implica maior responsabilização do governo e consequentemente maior empenho na sua implementação. Embora esta visão seja comprovadamente limitativa, após Accra, continua a insistir-se sobretudo na dimensão interna da governação e participação em processos de consulta nacionais, desvalorizando-se por um lado a análise do real impacto desses processos de consulta nas políticas adoptadas e por outro o papel dos doadores no processo de decisão das políticas.

Contributos para a formulação de um modelo de análise

Nos últimos anos, académicos e think tanks têm desenvolvido propostas de análise alternativas à institucional para a questão da eficácia da ajuda, e entre elas incluem-se algumas abordagens ao conceito de apropriação. A tendência geral

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converge no reconhecimento da questão política, colocando a tónica nas relações de poder e em dinâmicas não lineares de decisão e influência, cortando com a visão tecnicista e linear da ajuda ao desenvolvimento assente em estruturas de gestão definidas rigidamente a priori.

Booth (2008) propõe uma nova construção analítica de todo o processo da eficácia da ajuda e nota a importância de colocar as questões de forma apropriada e estabelecer as “variáveis” correctamente. Vários estudos colocam a ênfase na interacção de estruturas de poder, algumas propondo uma maior ênfase na questão da governação (Booth and Fritz, 2008), outras colocando a ênfase na democratização e participação (Meyer and Schulz, 2007). Groves e Hinton (2004), estruturam a sua análise da ajuda ao desenvolvimento claramente com base em variáveis que remetem para as relações de poder e de influência cultural e política entre actores e suas relações de liderança, cortando com a linearidade presumida nos modelos mais comuns e que informam a estrutura internacional da ajuda ao desenvolvimento. Rosser (2009) inclui a análise da forma como a eficácia da ajuda é moldada por configurações de poder e interesses de coligações, concluindo que são as relações políticas e sociais e não as estruturas de gestão da ajuda e modalidades da ajuda que importam na definição do grau de apropriação do país em desenvolvimento. Ainda no âmbito da análise da apropriação das teorias da mudança que estão por detrás da definição de opções de desenvolvimento, Sullivan e Stewart (2009) questionam quem detém essa teoria da mudança e identificam quatro modelos alternativos de apropriação: “elite”; “avaliador”; “político”; ”comunidade”.

Estas abordagens corroboram a ideia sustentada neste artigo de que o princípio de apropriação não se traduz numa variável dicotómica, em que existe ou não um indicador, mas sim numa variável nominal, constituída por modalidades distintas de apropriação que podem eventualmente configurar um maior ou menor grau de apropriação. Propõe-se assim uma abordagem seguindo alguns passos:

Transformar a ENRP num indicador de escala nominal em que em dois extremos verificamos apropriação total ou condicionamento total das decisões políticas. No intervalo entre estes dois extremos, que consideramos as opções reais, estarão diferentes tipos de apropriação que poderão ser colocados numa escala de contínuo conforme representem um maior poder de decisão por parte dos países em desenvolvimento face aos doadores ou conforme haja um predomínio das posições dos doadores e um fraco envolvimento das dinâmicas internas. Por outro lado, existirá um ponto neutro na escala que representará uma indefinição de preferências

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convergentes ou divergentes, caso que também se verifica frequentemente pela incapacidade de definir prioridades concretas, particularmente no caso de Estados frágeis. Propõe-se assim um olhar para as dinâmicas de poder e influência e consideração de processos e contextos na análise.

A identificação de definição de preferências por parte dos actores envolvidos e o contraste de preferências será o mecanismo de verificação para a aferição das dinâmicas de poder e influência.

Identificação de dinâmicas de influência entre os actores envolvidos, que podem ser determinadas por uma série de factores que vão desde o poder estrutural às dinâmicas de influência através de mecanismos de capacitação e assistência técnica, passando pela ausência de uma tomada clara de posição devido a falta de capacidade institucional ou a ambiguidade estratégica por falta de vontade política, incluindo uma multiplicidade de influências contraditórias.

C

ONCLUSÃO

A questão que este artigo abordou foi a do poder dos países em desenvolvimento para realmente determinar as suas políticas de desenvolvimento e redução da pobreza e até que ponto o conceito de apropriação traduz mais a retórica dos doadores do que propriamente uma mudança real de dinâmicas de poder e influência. Demonstrou-se através da análise dos debates em torno do conceito de apropriação que a presente operacionalização, tal como aprovada e aplicada pelo contexto da Declaração de Paris não permite aferir verdadeiramente a real apropriação, e sobretudo o efeito que se pretendia ao alterar o paradigma da ajuda ao desenvolvimento anteriormente assente na imposição das políticas de ajustamento estrutural.

Respondendo à questão inicial sobre se o princípio de apropriação tal como operacionalizado presentemente responde às necessidades de maior eficácia da ajuda, podemos dizer que em grande parte sim, uma vez que não só contribui para um maior envolvimento e mobilização de agentes para a discussão de políticas direccionadas para a redução da pobreza como assegura maior envolvimento dos mesmos na implementação. Há uma criação de espaços de consenso e negociação que não estava presente anteriormente na fase do condicionalismo e do ajustamento estrutural. No entanto, ela apresenta limites em termos da possibilidade de aferição do grau de apropriação efectivo. Por outro lado, o princípio faz sentido no contexto de agenda internacional da ajuda ao desenvolvimento que não contempla o questionar

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absoluto do sistema global e nesse sentido reforça a eficácia da ajuda, permanecendo em aberto a questão sobre se reforça a eficácia do desenvolvimento.

Começa a haver um conjunto de abordagens analíticas que reconhecem a importância das dinâmicas políticas no contexto da agenda de Paris sobre a eficácia da ajuda, que não se limitam ao discurso institucional sobre a governação e participação democrática circunscritos por critérios técnicos de metas atingidas, definidas a priori pelas estruturas de gestão da ajuda. Esta reflexão constitui um enquadramento teórico para uma aplicação das propostas aqui apresentadas a uma investigação empírica.

B

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Referências

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