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O feminicídio como resposta simbólica à morte de mulheres por questão de gênero e sua ineficácia face ao regime patriarcal que ainda permeia a sociedade brasileira

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Academic year: 2021

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GRANDE DO SUL

VANDERLEIA STECHMANN DA SILVA

O FEMINICÍDIO COMO RESPOSTA SIMBÓLICA À MORTE DE MULHERES POR QUESTÃO DE GÊNERO E SUA INEFICÁCIA FACE AO REGIME PATRIARCAL

QUE AINDA PERMEIA A SOCIEDADE BRASILEIRA

Santa Rosa (RS) 2019

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VANDERLEIA STECHMANN DA SILVA

O FEMINICÍDIO COMO RESPOSTA SIMBÓLICA À MORTE DE MULHERES POR QUESTÃO DE GÊNERO E SUA INEFICÁCIA FACE AO REGIME PATRIARCAL

QUE AINDA PERMEIA A SOCIEDADE BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. -DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientador: MSc. Lurdes Aparecida Grossmann

Santa Rosa (RS) 2019

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Dedico este trabalho à todas as mulheres que lutam por igualdade de direitos, e que já sofreram algum tipo de violência.

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AGRADECIMENTOS

À Deus por permitir que eu pudesse chegar até aqui, e à minha família, que sempre esteve do meu lado me apoiando e incentivando.

À minha orientadora Lurdes Aparecida Grossmann, comquem eu tive a honra e o privilégio de conviver e poder contar com seus ensinamentos valiosos.

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“Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” Simone de Beauvoir.

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O presente trabalho de conclusão de curso verificará que a simples criação da qualificadora de feminicídio no crime de homicídio não terá o condão por si só de reduzir a violência num país que é o 5º colocado mundial da morte de mulheres por questões de gênero, sendo apenas uma resposta simbólica para a pressão social dos movimentos sociais, principalmente os feministas e de mulheres, aos números assustadores e progressivos da morte de mulheres no Brasil. Enquanto não forem enfrentadas as questões estruturais decorrentes do patriarcado no país não haverá a redução da violência e da morte de mulheres. A sociedade brasileira ainda está estruturada de forma hierarquizada, na qual as mulheres são colocadas como inferiores aos homens, recebendo menos pelo desempenho de tarefas iguais, com uma dupla jornada de trabalho, por arcarem com a realização das tarefas domésticas, junto com o trabalho externo, com um dos menores índices mundiais de representação política no Executivo e Legislativo e tantas outras questões, que faz com que alguns homens ainda objetifiquem e coisifiquem as mulheres e, ao colocarem estas pessoas como um objeto de sua propriedade, desumanizando-as, se sentem no direito de violá-las em todos os níveis, inclusive sentindo-se senhores de sua vida e sua morte, muitas vezes com a conivência da sociedade e a omissão do Estado.

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This course completion work will verify that the mere creation of the feminicide qualifier in the homicide crime will not in itself have the effect of reducing violence in a country that is the fifth-highest in the world in terms of the death of women due to gender issues. a symbolic response to the social pressure of social movements, especially feminists and women, to the frightening and progressive numbers of the death of women in Brazil. As long as the structural issues arising from patriarchy in the country are not addressed, there will be no reduction in violence against women. Brazilian society is still structured in a hierarchical way, in which women are placed inferior to men receiving less for the performance of equal tasks, with a double working day to bear the accomplishment of the domestic tasks, together with the external work. With one of the world's lowest indexes of political representation in the Executive and Legislative, and so many other issues, some men still objectify and harass women and, by placing these people as an object of their property, dehumanizing them feel in the right to violate them, at all levels. Even feeling themselves lords of their life and death, often with the connivance of the society and the omission of the State.

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INTRODUÇÃO ... 8

1 A CONSTRUÇÃO DO PATRIARCADO ... 10

1.1 Violência Simbolica ... 16

1.2 A estrutura patriarcal e a violência contra a mulher ... 22

2. FEMINICÍDIO: A CRIAÇÃO DA QUALIFICADORA COMO UMA RESPOSTA SIMBÓLICA E A NECESSIDADE DE POLITÍCAS PÚBLICAS ESPECÍFICAS ... 27

2.1 Feminicídio: Especíes e analíse de alguns casos ... 32

2.2 Politícas Públicas ... 39

CONCLUSÃO ... 46

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo sobre o patriarcado e as sociedades que desenvolveram-se estruturalmente, compreendendo o homem como superior à mulher, com base nos embasamentos religiosos, científicos, morais e outros e, de que forma, esta estrutura impacta na violência contra a mulher. Através de um recorte criminológico, de como deu-se essa construção da sociedade patriarcal, que ainda domina e permeia todos os setores no Brasil e no mundo, a mulher é colocada como causadora ou incentivadora da violência sofrida e, sob esta perspectiva vitiminológica, a qualificadora do crime de feminicídio não passa de uma resposta simbólica a pressão social para a cessação da violência contra a mulher, por questão de gênero ou em decorrência da violência doméstica. Trabalha-se no efeito, a violência, mas não na causa, o patriarcado. Um exemplo disso é que, apesar de estar vigente desde de 2006, ainda não foram implantadas as medidas transversais e transdisciplinares previstas na Lei Maria da Penha e que, visavam descontruir o androcêntrismo ainda reinante no país, tendo inclusive, ocorrido retrocessos neste período como, por exemplo, a retirada do debate de gênero do ambiente escolar em uma série de estados e municípios.

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Para construção deste trabalho, foram efetuadas várias pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, analisando a lei especifica do Feminicídio, a lei Maria da Penha e do Código Penal, casos coletados na mídia, a fim de desenvolver uma melhor compreensão sobre o assunto e buscar novas políticas públicas eficazes para real situação.

Inicialmente, será abordado no primeiro capítulo a compreensão da estrutura patriarcal, os conceitos de gênero, a dominação imposta às mulheres nos diferentes períodos históricos e verificar de que forma, o patriarcado é refletido na vitimologia dos crimes nos quais as mulheres são os principais sujeitos passivos, através da análise de doutrinas e jurisprudências destes crimes, analisar o simbolismo penal e de que forma, a criação da qualificadora do feminicídio, enquadra-se como uma resposta meramente formal à morte das mulheres.

No segundo capítulo, é analisada mais acentuadamente a Lei do Feminicídio e a Lei Maria da Penha, a fim de analisar a estrutura do patriarcado, que coloca a superioridade masculina como algo natural, e de que forma pode-se buscar uma igualdade de gênero. Também suscitar a verdadeira efetividade e relevância da Lei, mostrando as diferentes tipificações do crime de Feminicídio e por que esta qualificadora, não tem garantido às mulheres a devida proteção, salientando que apesar de estarmos no século 21, ainda há muito preconceito e a culpabilização da vítima, por estar em convívio ou em contato com o agressor.

Ao final, demonstra-se a importância de buscar-se políticas públicas, que sejam efetivas para garantir, a segurança dessas mulheres para que não sofram nenhum tipo de violência. A pesquisa realizada foi bibliográfica e o método indutivo

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1. A CONSTRUÇÃO DO PATRIARCADO

A história da humanidade sempre foi marcada por lutas, conquistas, questionamentos, divergências, busca por direitos, e busca por justiça. As mulheres aspiram por equidade/igualdade de gênero, travando uma luta constante contra o preconceito, a opressão e a violência, seja ela simbólica ou real, muitas vezes ocasionada por seus próprios companheiros.

Para compreender a pesquisa realizada e a luta das mulheres contra a violência, há a necessidade de esclarecer alguns conceitos básicos que, norteiam a Lei do Feminicídio, a Lei Maria da Pena e o Direito Penal.

O patriarcado é o regime que, procura assegurar que o homem tenha soberania sobre as mulheres, tanto na vida profissional, social (sexual), garantindo a opressão/dominação em mulheres.

Vive-se, portanto, sob a lei do pai e, assim, do marido – figura que se constitui antes, através do contrato sexual. Não se pode negar que há diferenças de grau no domínio dos homens sobre as mulheres, até porque onde há dominação-subordinação, há resistência e luta. Neste sentido, ainda que as mulheres tenham conquistado direitos e espaços políticos, ocupando posições sociais e econômicas tradicionalmente reservadas aos homens, a base patriarcal continua a mesma, é imprescindível, para a libertação e emancipação das mulheres, uma mudança radical em todas as estruturas das quais elas participam, de forma a esgotar todas as condições materiais de existência das relações patriarcais. (CUNHA, 2018, sp)

O patriarcado sustenta-se no ambiente doméstico e familiar organizado e tem, por volta de 2 a 3 mil anos, e desenvolveu-se estruturalmente compreendendo o homem como superior a mulher, com base nos embasamentos religiosos, científicos, morais e também outros e, de que forma, esta estrutura impacta na violência contra a mulher.

Estima-se que o patriarcado tenha cerca de 2.603-4 anos, sendo, portanto, muito jovem se comparado a idade da humanidade, estimada entre 250 e 300 mil anos. O gênero, por sua vez - não enquanto compreensão teórica, mas como construção social de imagens projetadas sobre o masculino e o feminino - é, segundo a autora, inerente as sociedades. Ele é estruturador da divisão social (CUNHA, 2018, sp).

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Como preceitua Barbara Cunha (2018, p. 155), o Patriarcado é um pacto político civil. O Código Civil de 1916, trazia em sua redação que ao homem, cabia o exercício do pátrio poder e que a mulher, ao tornar-se esposa, ficava com diversos direitos civis restritos, que dependiam da autorização do marido para serem por ela exercidos. A ausência, no Código Penal Brasileiro, da tipificação de estupro no interior do casamento e, por outro lado, a permanência da criminalização da mulher que comete aborto, são exemplificadores da faceta sexual deste pacto, que também controla os direitos reprodutivos da mulher, mostrando que ela era submissa a ele.

Para Simone de Beauvoir (1980) em seu livro o “Segundo Sexo”, o conceito de patriarcado vai além, pois, ela instigou uma reflexão sobre o problema de participação política formal das mulheres. A autora em sua obra, descreve a busca por igualdade e independência, apesar dela ainda sofrer com as consequências desse regime, ao mesmo tempo em que ela aponta os “fatos e mitos”, ela interroga a existência de pontos a partir das áreas de conhecimento e, mostra a difícil dinâmica das ações femininas dentro das experiências vividas.

Ora, a mulher sempre foi, senão a escrava do homem ao menos sua vassala; os dois sexos nunca partilharam o mundo em igualdade de condições; e ainda hoje, embora sua condição esteja evoluindo, a mulher arca com um pesado handicap. Em quase nenhum país, seu estatuto legal é idêntico ao do homem e muitas vezes este último a prejudica consideravelmente. (BEAUVOIR,1980, p. 14)

Apesar de BEAUVOIR (1980), ter sido considerada além de seu tempo, e uma feminista que buscava a independência tanto financeira como pessoal, ela viveu em uma época em que as mulheres eram hierarquizadas, comparadas como funcionárias, cozinheiras de seus maridos, senhores, meras coadjuvantes, sem nenhum direito.

Mesmo quando os direitos lhe são abstratamente reconhecidos, um longo hábito impede que encontrem nos costumes sua expressão concreta. Economicamente, homens e mulheres constituem como que duas castas; em igualdade de condições, os primeiros têm situações mais vantajosas, salários mais altos, maiores possibilidades de êxito que suas concorrentes recém-chegadas. (BEAUVOIR,1970, p. 14)

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Já no segundo volume de seu livro, ela quer afirmar que a maneira que acontece essa independência, não a iguala com o homem, mas ela dedica-se para fazer melhor e poder ter as mesmas oportunidades. O fato da mulher manter-se “presa” a vida privada e subordinada, ela não consegue transcender, nem elevar-se por meio da cultura, mantendo-se submissa ao homem.

O ponto de vista masculino, segundo Freud na visão psicanalítica, citado no livro de Beauvoir (1980), para compreender a mulher, parte de um discurso dependente de um contexto histórico, ou seja, de um contexto de complexo de inferioridade feminino em relação aos homens, e que a mulher encontra-se num contexto, em que valoriza muito mais a virilidade do que feminilidade.

Beauvoir (1980), explica que não há como quebrar um regime tão sedimentado em uma construção cultural de séculos, mas o problema deverá ser multifacetado e poderá demorar anos para ser mudado.

A maternidade nunca foi considerada algo para justificar a submissão ou fragilidade da mulher, muito pelo contrário, alguns autores relatam que tal fato era considerado algo místico, mágico, dotados de forças extremas, pela capacidade de dar à luz, de conceber um filho ou filha. Como relata Cunha (2018, p. 153):

Os filhos não eram uma propriedade como os demais artigos de propriedade privada, nem eram estranhos uns aos outros, de acordo com sua riqueza, classe ou raça de suas famílias. Todos os adultos de um clã se consideravam pais sociais de todas as crianças, e se preocupavam com todos, igualitariamente [...] Na sociedade comunitária, em que ainda não existia a família como núcleo isolado, era inútil saber quem era o pai biológico, ou inclusive a mãe biológica.

O patriarcado ainda é fortemente influenciador em nossa sociedade, e que a vítima, tende a ser considerada culpada, por conviver com seu agressor, com isso e a não devida tutela protetiva, conduzem a uma violência fatal: o Feminicídio, tema que será desenvolvido após a teorização sobre a construção do patriarcado e suas consequências ou atribuição.

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Para compreender o feminicio o estudo da vítima é essencial, e desse modo, pode-se dizer que a vitímologia é o “estudo da vítima” que, geralmente sofreu dano ou foi sacrificado seus interesses. Como preceitua Guilherme de Souza Nucci (2008, p. 1017):

Vítima” é o sujeito passivo do crime, ou seja, a pessoa que teve o interesse ou o bem jurídico protegido diretamente violado pela prática da infração penal. Denomina-se, também ofendido. Deve ser ouvido, sempre que possível, durante a instrução, a fim de colaborar com a apuração da verdade real, valendo a oportunidade, inclusive, para indicar provas e mencionar quem presuma ser o autor do delito (art. 201, CPP).

Consoante os ensinamentos de Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini (2007, p. 301):

Estudos de Vitímologia demonstram que as vítimas podem ser ‘colaboradoras’ do ato criminoso, chegando-se a falar em ‘vítimas natas’ (personalidades insuportáveis, criadoras de casos, extremamente antipáticas, pessoas sarcásticas, irritantes, homossexuais e prostitutas etc.). Maridos vergudos e mulheres megeras são vítimas potenciais de cônjuges e filhos; homossexuais, prostitutas psicologia doentia de neuróticos com falso entendimento de justiça própria. Quem vive mostrando sua carteira, recheada de dinheiro, aumenta as probabilidades do furto e do roubo; o adúltero há de ser morto pelo cônjuge.e marginais sofrem maiores riscos de violência diante da

Consoante ao exposto, muitas vezes a vítima, sem intenção, colaborar de alguma forma para que o crime aconteça. O Feminicídio é considerado o assassinato de mulher, como sendo uma condição especial da vítima, quando ocorrer “violência doméstica e familiar” e/ou “menosprezo ou discriminação à condição de mulher” pelo gênero feminino.

Vale lembrar que houve uma alteração na redação do texto da Lei, mudando a palavra gênero, para sexo feminino, “biológico” e não o social, exclui-se, portanto, travestis e transgêneros. Como preceitua Cleide Alves Aparecida (2018, p. 11):

A princípio, a formulação da lei pela comissão definia feminicídio como a medida extrema de violência de gênero que resultava nas mortes das mulheres, a redação, no entanto, sofreu algumas modificações quando tramitou na Câmara dos Deputados e no Senado e na sua aprovação no Congresso Nacional, sofreu pressão de alguns parlamentares da bancada religiosa. Como resultado dessa pressão a palavra “gênero” foi extraída da redação da Lei. O

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que é importante é sempre entender quais são as desigualdades que afetam e contribuem para que as mortes extremamente violentas aconteçam e como é a essencialidade para que possa aplicar claramente a lei principalmente para que a mesma atue também como forma de prevenção.

Através de um recorte criminológico, de como se deu essa construção da sociedade patriarcal, que ainda domina e permeia todos os setores no Brasil e no mundo, a mulher é colocada como causadora ou incentivadora da violência sofrida, e sob esta perspectiva, vitiminológica, a qualificadora do crime de feminicídio, não passa de uma resposta simbólica a pressão social para a cessação da violência contra a mulher, por questão de gênero ou em decorrência da violência doméstica.

Trabalha-se no efeito, a violência, mas não na causa, o patriarcado. Um exemplo disso é que, apesar de estar vigente desde de 2006, ainda não foram implantadas as medidas transversais e transdisciplinares previstas na Lei Maria da Penha e que, visavam descontruir o androcentrismo ainda reinante no país, tendo, inclusive, ocorrido retrocessos neste período como, por exemplo, a retirada do debate de gênero do ambiente escolar em uma série de estados e municípios.

Enquanto não forem enfrentadas as questões estruturais decorrentes do patriarcado no país, não haverá a redução da violência e da morte de mulheres. A sociedade brasileira ainda está estruturada de forma hierarquizada, na qual as mulheres são colocadas como inferiores aos homens, recebendo menos pelo desempenho de tarefas iguais, com uma dupla ou até tripla jornada de trabalho, por arcarem com a realização das tarefas domésticas, junto com o trabalho externo, que faz com que alguns homens ainda objetifiquem as mulheres e, ao colocarem estas pessoas como um objeto de sua propriedade, desumanizando-as, sentem-se no direito de violá-las em todos os níveis, inclusive sentindo-se senhores de sua vida e sua morte, muitas vezes com a conivência da sociedade e a omissão do Estado:

O feminicídio é a ponta do iceberg. Não podemos achar que a criminalização do feminicídio vai dar conta da complexidade do tema. Temos que trabalhar para evitar que se chegue ao feminicídio, olhar para baixo do iceberg e entender que ali há uma série de violências. Precisamos ter um olhar muito mais cuidadoso e muito mais atento para o que falhou Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre Violência contra a Mulher (GALVÃO, 2018, sp)

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Por isso, Lei do Feminicídio em conjunto com Maria da Penha, deve ser respeitada e seguida de fato, e principalmente, tomar a consciência de que se não houver uma mudança estrutural da sociedade, em que a mulher passe a ser encarada como ser humano, sujeito de direito, com os mesmos direitos e oportunidades que os homens, para que não seja mais vista como um patrimônio de alguém.

O feminicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro; como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração de seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante, Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre Violência contra a Mulher (GALVÃO, 2018, sp).

Vários casos de feminicídio tem chocado a sociedade, em várias cidades brasileiras. Aqui vemos o caso de uma menina de apena 16 anos, que assassinada praticamente na porta de sua casa, e por motivo torpe e fútil, onde o assassino usa uma faca para golpear a vítima 12 vezes, tudo porque, a vítima não queria mais ter um relacionamento amoroso com o assassino. Vejamos o caso a seguir:

Giulia: aos 16 anos, assassinada a facadas na esquina de casa, em São Jerônimo.Quando uma jovem de 19 anos ouviu os gritos da irmã na esquina de casa, em São Jerônimo, na Região Carbonífera, não havia mais tempo para socorrê-la. Correu para a rua e deparou com Giulia Faleiro Nascimento, 16 anos, golpeada por 12 facadas. Poucos meses antes, a vida das irmãs era muito diferente. As três jovens, de 15, 16 e 19 anos, viviam com a mãe, Liziane Faleiro Oliveira, 34. A casa estava sempre agitada, perfumada e colorida. Um cenário que começaria a mudar quando a mãe adoeceu. Por dois meses, as filhas iam e vinham do hospital. Uma complicação causada por uma meningite levaria a mulher à morte em pouco tempo. Em 2 de junho, um sábado, Liziane não resistiu. Na segunda-feira, dois dias depois, as irmãs receberam uma visita: o primeiro namorado de Giulia, Gabriel Borba Rigotti, 18 anos, com quem ela terminara o relacionamento seis meses antes. A mãe havia proibido a relação, que tinha se estendido por dois anos. O rapaz havia se mudado para outra cidade, mas retornou após constatar a ausência de Liziane. Giulia não queria mais namorar com ele. Respondeu negativamente às sistemáticas insistências do rapaz, que a procurou em casa e na escola naqueles dias. Na quinta-feira à tardinha, cinco dias após a morte de Liziane, Giulia contou à irmã que estava incomodada com a presença do ex. As duas decidiram que, no dia seguinte, iriam à polícia. Naquela mesma noite, Giulia saiu para jantar com o garoto que estava começando a namorar. A residência dele ficava a quatro quarteirões de sua casa. Por volta das 23h,

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Giulia decidiu voltar caminhando, acompanhada do novo namorado. No trajeto, depararam com Gabriel. A Giulia não conseguiu correr. Ele a pegou pelo braço. Quando saí correndo, ela estava no chão, não falava mais. Gritei, fiz o que pude. Ela deu os últimos suspiros abraçada em mim — conta a primogênita, que prefere não ser identificada. O suspeito foi preso na manhã seguinte. Gabriel é réu por homicídio qualificado por motivo torpe, com recurso que dificultou defesa da vítima e feminicídio.(GAUCHA ZH, 2018,sp)

Essa reportagem, nada mais é do que um dos exemplos dos vários casos de crimes contra mulheres que acontecem diariamente em nosso país, que está em 5º lugar num ranking mundial de morte de mulheres, numa média de 12 mortes de mulheres por dia. Segundo as recentes pesquisas do site do G1(2018) muitas vezes esses crimes são cometidos por motivos fúteis e torpes, e estão em constante crescimento, e irão mudar a vida de várias pessoas para sempre. A violência, tanto real quanto simbólica, está em nosso dia-dia, e como acabar com essa violência e com esse sistema Patriarcal, é o questionamento que fica.

1.1 A violência simbólica

A dimensão simbólica, ou seja, a maneira de pensar está relacionada à sociedade no qual nascemos, baseando-se em eventos religiosos, científicos e morais. A violência simbólica, suave, e imperceptível, está elencada como “algo natural” e que na prática vai dar origem a uma violência real.

Para o sociólogo Pierre Bourdieu (2012, p. 45), a violência simbólica é algo que não pode ser contestada, por ser da natureza ao qual o ser humano está acostumado e por esse conceito, ele impõe o poder de forma legitima. Para o autor:

A dominação masculina encontra, assim, reunidas todas as condições de seu pleno exercício. A primazia universalmente concedida aos homens se afirma na objetividade de estruturas sociais e de atividades produtivas e reprodutivas, baseadas em uma divisão sexual do trabalho de produção e de reprodução biológica e social, que confere aos homens a melhor parte, bem como nos esquemas imanentes a todos os habitas: moldados por tais condições, portanto objetivamente concordes, eles funcionam como matrizes das percepções, dos pensamentos e das ações de todos os membros da sociedade, como transcendentais históricos que, sendo universalmente partilhados, impõem-se a cada agente como transcendentes.

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Neste sentido, Bourdieu (2012), tenta investigar a forma simbólica da dominação masculina, que pode ser compreendida a partir de uma origem sedimentada no patriarcado. Ele explica que quando ocorre à dominação masculina gera uma violência simbólica, ou seja, uma violência mais suave, por que ela é imperceptível, está localizada no subconsciente, não sente, não vê, por que ela está dentro das categorias de entendimento. Assim na forma com que se concebe o mundo, ela está na comunicação, por exemplo, em formas quase imperceptíveis, que futuramente poderão ensejar numa violência real que vai legitimar as práticas.

Assim, faz seu estudo na Cabília região da Argélia. O autor poderia ter escolhido qualquer lugar, mas fez seu estudo de campo nessa região, por conhecer muito bem e por ser uma sociedade extremamente androcêntrica, tradicionalista e patriarcal, assim como a Grécia e várias do mediterrâneo na época.

O “andocentrismo”, fortemente evidenciado nas sociedades da Cabília, significava que a perspectiva de tudo é masculino, que o homem era o centro de todas as coisas, a medida de todas as coisas, o ser supremo.

Por conseguinte, a representação androcêntrica da reprodução biológica e da reprodução social se vê investida da objetividade do senso comum, visto como senso prático, dóxico, sobre o sentido das práticas. E as próprias mulheres aplicam a toda a realidade e, particularmente, às relações de poder em que se vêem envolvidas esquemas de pensamento que são produto da incorporação dessas relações de poder e que se expressam nas oposições fondantes da ordem simbólica. Por conseguinte, seus atos de conhecimento são, exatamente por isso, atos de reconhecimento prático, de adesão dóxica, crença que não tem que se pensar e se afirmar como tal e que "faz", de certo modo, a violência simbólica que ela sofre. (BOURDIEU, 2012, p. 45)

Nessa fase histórica, Bourdieu (2012), está vivenciando e investigando as formas de conhecimento e de desenvolvimento da sociedade da Cabília, que fundamenta-se por meio de uma organização Binária, Dicotômica, ou seja, é praticada por meio das oposições. Os Berberes, povo da Cabília, tem toda sua agricultura, culinária, dia, cores, cosmos, casamentos e suas formas de pensar, organizado por dicotômias, oposições, por exemplo, quente e frio.

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A oposição dicotômica vai gerar à categoria masculino e feminino, positivo o masculino e negativo o feminino. O feminino será a “falta” do masculino, o “não homem”, a mulher nessa sociedade é definida como falta, então segundo uma escritora feminista, o órgão feminino seria descrito como órgão masculino ao contrário, de acordo com registros de médicos e estudiosos da época, que se espalhou por toda Europa. (BOURDIEU, 2012, p. 47)

A sociedade da Cabília, assim como a sociedade atual, faz com que as meninas/mulheres estejam sempre em “ordem”, estar com seu corpo em ordem, usar uma saia, um salto, faz com que ela cuide o tempo todo do seu corpo, sente com cuidado, ande devagar, se inferiorize, não podendo se locomover ou conquistar o mesmo espaço, que os homens estão vestidos confortavelmente para conquistar:

[...] como se a feminilidade se medisse pela arte de "se fazer pequena" (o feminino, em berbere, vem sempre em diminutivo), mantendo as mulheres encerradas em uma espécie de cerco

invisível (do qual o véu não é mais que a manifestação visível),

limitando o território deixado aos movimentos e aos deslocamentos de seu corpo — enquanto os homens tomam maior lugar com seu corpo, sobretudo em lugares públicos. (BOURDIEU, 2012, p. 39) Os costumes e as roupas, limitam a movimentação da mulher para ela não conquistar espaço ou tomar o espaço que seria ocupado pelos homens, inclusive na Cabília, tudo que refere a mulher/feminino vem no diminuitivo, é uma forma de diminuir o espaço da mulher simbolicamente.

[...] a orientação das moças para certas carreiras, sobretudo as técnicas ou científicas: "Os professores dizem sempre que somos mais frágeis e então... acabamos acreditando nisso", "Passam o tempo todo repetindo que as carreiras científicas são mais fáceis para os meninos. Então, forçosamente..."). E compreendemos que, por essa lógica, a própria proteção "cavalheiresca", além de poder conduzir a seu confinamento ou servir para justificá-lo, pode igualmente contribuir para manter as mulheres afastadas de todo contato com todos os aspectos do mundo real "para os quais elas não foram feitas" porque não foram feitos para elas. (BOURDIEU, 2012, p. 77)

A limitação simbólica da mulher, atualmente, também acontece quando ela sofre um assédio, por exemplo, o que faz pensar que ali não é o seu lugar, não é seu espaço, enquanto os homens são educados para ocupar os espaços.

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Muitos casos de assédio e até mesmo o estupro, estão vinculados preconceituosamente pelo homem, pela maneira da mulher se vestir, pois, com uma roupa curta ou justa, ela estaria convidando ou provocando o agressor para assediar ou estuprar, desta forma, a vítima está sendo colocada como a responsável pelo crime.

Os homens sempre estão atrelados a cores escuras, que demostram virilidade, assuntos sérios, também em lugares públicos, exercem funções importantes sentados em móveis de couro, já a mulher sempre romantizada, pequena, diminuída, infantilizada, ao seu redor, rendas e as cores claras, suaves e seu âmbito é privado, doméstico cheio de bibelôs, que nos traz a um ambiente mais dócil, fútil. Bourdieu (2012) retratava da França de 1995, observação de que até hoje, esses símbolos estão presentes na nossa sociedade, na publicidade, propaganda, jornais, novelas, filmes, etc. Neste sentido,

Elas estão inscritas na fisionomia do ambiente familiar, sob a forma de oposição entre o universo público, masculino, e os mundos privados, femininos, entre a praça pública (ou a rua, lugar de todos os perigos) e a casa (já foi inúmeras vezes observado que, na publicidade ou nos desenhos humorísticos, as mulheres estão, na maior parte do tempo, inseridas no espaço doméstico, à diferença dos homens, que raramente se vêem associados à casa e são quase sempre representados em lugares exóticos), entre os lugares destinados sobretudo aos homens, como os bares e os clubes do universo anglo-saxão, que, com seus couros, seus móveis pesados, angulosos e de cor escura, remetem a uma imagem de dureza e de rudeza viril, e os espaços ditos "femininos", cujas cores suaves, bibelôs e rendas ou fitas falam de fragilidade e de frivolidade.(BOURDIEU, 2012, p. 72)

Os comentários privando a mulher de frequentar alguns ambientes “masculinizados”, ou seja, públicos querem remeter a proteção, mas a mensagem por traz desta “cavalheiresca” ação é de privação, ou seja, é como se a mulher fosse dependente e precisasse de autorização.

Reforça assim a dicotomia público/privada, central nas teorias liberais afirmando Kant (2006; 2000) que à margem de seu interesse particular, o homem interessa-se pela coisa pública, enquanto a mulher restringe-se ao interesse doméstico, diminuindo assim seu vínculo com a política e justificando sua marginalização da vida pública. O autor chega a afirmar que se as mulheres velassem pela guerra e pela paz e interviessem de algum modo nos assuntos de

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Estado, isso seria um pequeno desastre, uma vez que sua única preocupação seria a tranquilidade, não se deixando inquietar senão pelos seus interesses particulares. Toda sua teoria conduz as mulheres a se manterem em uma situação de dependência para com os homens, e em um espaço doméstico, necessitando da mediação do homem para qualquer atividade pública, e as desvinculando, desse modo, do uso público da razão. Não as convida a pensar, mas a manterem-se em uma submissão, sob os preceitos de um tutor, que é um homem. (NIELSSON,2018, p. 91)

Por exemplo, hoje em dia, o simbolismo pode ser representado nas cores azul e rosa. O azul relacionado a cores frias, significando a razão, já o rosa uma cor quente, a emoção. Desde o nascimento de um bebê, a mãe prepara o quartinho da sua filha menina com a cor rosa, delicada, para que simbolicamente, ela seja delicada, feminilidade, ao contrário de um filho menino, quando se prepara um quartinho azul, já esperando certa racionalidade e frieza.

Simone de Beauvoir (1980), sugere alguns questionamentos sobre o que seria feminilidade, se ela estaria secretada pelos ovários (biologia)? ou estaria “presa” em um “céu platônico”, em uma essência que caracteriza o ser feminino (filosofia)? ou se usar uma saia fru-fru, ou um salto, ou até o fato de pintar as unhas a configurava mulher? Afinal o que é ser feminino? o que é ser mulher? Afinal, os conceitos sobre o que é ser mulher não são seguros, pois foram criados a partir de uma perspectiva masculina, “para agradar” o homem e, de novo, voltamos a falar de andocentrismo.

Esses signos que denotam a dominação masculina vão reverberar no trabalho, onde o homem ocupa o cargo superior, (o chefe), enquanto a mulher, sempre atrelada a funções inferiores (secretária), como se as funções subalternas pertencessem às mulheres. Neste sentido:

[...] essas possibilidades objetivas se fazem lembrar também, de maneira bem concreta e bem sensível, não apenas em todos os signos hierárquicos da divisão do trabalho (médico/enfermeira, chefe/secretária etc), bem como em todas as manifestações visíveis das diferenças entre os sexos (atitude, roupas, penteado) e, mais amplamente, nos detalhes, aparentemente insignificantes, dos comportamentos quotidianos, que encerram inúmeros e imperceptíveis apelos à ordem. (BOURDIEU, 2012, p. 74)

No trabalho, muitas vezes a mulher é vista com menos seriedade, por que a mulher é simbolizada com menos seriedade, assim num debate, numa reunião de

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trabalho, elas vão lutar para poder falar, para poder conquistar seu espaço, já tudo que é caracterizado como masculino, é visto de forma mais sóbria, então enquanto ela estiver falando, o homem ouve ela e muda de assunto falando, por exemplo, da sua beleza, ou alguma parte de seu corpo, dando a entender total desprezo ao que ela acabou de falar, outra situação de desprezo a sua inteligência, que relata Bourdieu (2012), e que é muito inconsciente do homem, é que nessa mesma reunião quando eles forem se dirigir a ela, vão chamar de lindinha, querida, tudo com muita intimidade tratando como um ser mais fútil.

O grande problema é que esses símbolos estão tão enraizados dentro da nossa forma de pensar e conceber o mundo, presentes na nossa atual sociedade, que as próprias mulheres vão compreender esses símbolos dessa forma, elas vão aceitar a dominação.

Por que diante de questões intoleráveis de violência contra as mulheres, não temos grandes revoluções históricas? Para Bourdieu (2012), a raiz do problema está um pouco nesse conceito de que ao conhecer, elas reconhecem esses símbolos e colocam-se como submissas, um exemplo seria um casal, em que as mulheres preferem os homens mais velhos, mais altos, e bem-sucedidos dentro da relação, eles são superiores à elas.

A organização de dicotomias vem à baila, e claro que nem todas têm essa preferência, mas na França de 1995, essa era a realidade e a maioria, e ainda que ela domine a relação em público, elas gostavam de mostrar que quem domina é o homem. Elas terminam trazendo essa dominação dentro de si, no esquema de pensamento, nas práticas dela e, então a impressão que fica é que isso é tudo natural, e difícil de perceber a evolução histórica, por que ela está tão enraizada no patriarcado e no andocêntrismo. Prossegue o autor,

Por não poder evocar com sutileza suficiente (seria necessária uma Virginia Woolf para tal) exemplos suficientemente numerosos, bastante diversos e bem gritantes de situações concretas em que esta violência doce e quase sempre invisível se exerce, limitarme- ei a observações que, em seu objetivismo, impõem-se de maneira mais indiscutível que a descrição das interações em seus mais mínimos detalhes. Constatou-se, por exemplo, que as mulheres francesas, em sua grande maioria, declaram que elas desejariam ter um cônjuge

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mais velho e, também, de modo inteiramente coerente, mais alto que elas, dois terços delas chegando a recusar explicitamente um homem menor. (BOURDIEU, 2012, p. 47)

É interessante o exposto por Bourdieu (2012) pois evidência que há muitas situações mundo afora que mostram que a violência é sutil e atinge a todas.

1.2 A estrutura patriarcal e a violência contra a mulher

A qualificadora de feminicídio reflete esta estrutura patriarcal que não protege as mulheres e culpabiliza a vítima, mesmo diante do mais grave crime que um ser humano pode sofrer. O feminicídio, como se verifica em uma série de julgados e decisões, que por exemplo, não concedem medidas protetivas às vítimas de violência doméstica por compreender que a mulher, de alguma forma, seria responsável pela violência sofrida e com isso, retornam ao convívio com o agressor até que ocorra a o evento morte.

A construção desses perfis tem impactos sobre o andamento processual e seu desfecho. A descrição do agressor como pai de família, trabalhador, religioso e honesto contribui para afastar sua responsabilidade, como se os comportamentos sociais citados isentassem o acusado da prática, frequente ou passageira, da violência contra a mulher. Ao mesmo tempo, a mulher é estampada como alguém que provocou o agressor e, dessa maneira, frustrou a expectativa social de docilidade; ou alguém com comportamento social questionável, o que justificaria a agressão. (SRJ,2015, p. 51) O possível agressor, em muitos casos é réu primário, e não está em envolvido com drogas, por isso responde em liberdade, sua pena é mais branda (SRJ, 2015, p. 52), pois é visto na sociedade, como se estivesse defendendo sua “honra”.

As autoras Isadora Vier Machado e Maria Lígia G. G. Rodrigues Elias (2019, p.7), denotam uma observação importante sobre a dimensão de gênero, vejamos:

Assim, o território corporal das mulheres é violado para consumar a morte, ou efetivar sua tentativa. O importante é ressaltar que, com base na dimensão de gênero, a conduta toma proporções políticas inegáveis, que permitem um enfrentamento mais incisivo e eficaz, porque compreende a verdadeira natureza de um crime que importa na despersonificação das mulheres. Mortas não pelo que são biologicamente para usar a mesma definição da Câmara dos Deputados, e sim pelo que, socialmente, são impelidas a não serem.

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Ou seja, nota-se que o fenômeno do feminicídio é um reflexo do regime patriarcal, pode-se falar que a vítima expressa em seu corpo traços desse regime, e que tais traços, exercem uma violência simbólica e real sobre a mulher. Como preceitua Isadora Vier Machado; Maria Lígia G. G. Rodrigues Elias (2019, p.7)

[...] reflexos de uma cultura patriarcal que se funda em dois eixos: um eixo assimétrico vertical (que coloca as mulheres em posição de submissão aos homens) e um eixo simétrico horizontal (que relaciona os homens com seus pares e constitui uma lógica social de submissão das mulheres). Essa arquitetura das relações de gênero resvala no espaço mais íntimo da existência humana, que é o corpo. Por fim, nesse sentido, o corpo das mulheres acaba sendo invadido e exterminado pelos pares de um eixo masculino voraz que nele inscrevem a assinatura de uma fratria inteira. Enfim, esse horizonte inteiro é negado pela supressão da expressão gênero e sua substituição pela expressão sexo, no texto legal.

Outras situações em que a palavra do agressor é mais valorizada que a da vítima, situações em que o poder Judiciário, Ministério Público e Polícia, manifestam-se de forma preconceituosa, fazendo com que a mulher não manifestam-se sinta acolhida para representar, para denunciar o agressor, sendo que se este acolhimento tivesse acontecido antes, não teria chegado até a situação de morte.

Esse poder hierarquizado, afirma, está assentado em três vigas-mestras: o poder do pater familiae (patriarcado), ou seja, a subordinação da metade inferiorizada da humanidade e o controle da transmissão cultural (controle repressivo/punitivo da mulher); o poder

punitivo, ou seja, o uso legítimo da violência no disciplinamento dos

inferiores (controle punitivo/repressivo dos perigos reivindicatórios); e o poder do saber do dominus, ou a ciência desse senhor, que, ao longo de tempo, foi acumulando capacidade instrumental de domínio (controle dos discursos). (NIELSSON,2018, p. 67)

Esses três poderes, estão alicerçados na função punitiva, como afirma a autora e, a sua função seria de máximo controle, ao qual mulheres estão sujeitas, mesmo passando décadas isso não tem mudado e muito menos diminuído, somente vemos um crescimento acelerado de violência e morte. Neste sentido:

A violência contra a mulher é um evento de caráter crônico, portanto a resolução demanda tempo e as vítimas precisam ser atendidas, acompanhadas e fortalecidas em linhas de cuidado que podem demandar longos períodos de tempo. Por outro lado, o feminicídio é uma ação que pode ocorrer abruptamente após uma ameaça ou

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conflito e, neste caso, as providências de proteção da mulher precisam ser oportunas e rápidas. (MENEGHEL; et al, 2019, sp)

A autora Helleieth Saffioti (2004), ainda nos remete a uma comparação de “sociedade” e violência que não pode ser ignorada:

A sociedade assemelha-se a um galinheiro, sendo, contudo, o galinheiro humano muito mais cruel que o galináceo. Quando se abre uma fresta na tela do galinheiro e uma galinha escapa, o galo continua dominando as galinhas que restaram em seu território geográfico. Como o território humano não é meramente físico, mas também simbólico, o homem, considerado todo-poderoso, não se conforma em ter sido preterido por outro por sua mulher, nem se conforma quando sua mulher o abandona por não mais suportar seus maus-tratos. Qualquer que seja a razão do rompimento da relação, quando a iniciativa é da mulher, isto constitui uma afronta para ele. Na condição de macho dominador, não pode admitir tal ocorrência, podendo chegar a extremos de crueldade. A sociedade, similarmente ao galinheiro, também apresenta uma ordem das bicadas. (SAFFIOTI, 2004, p. 62)

Essa semelhança de comparativos nos remete mais uma vez ao andocêntrismo e ao patriarcado, onde o homem é o lado completo e forte, dominante, e sendo a mulher a submissa.

Quando a mulher resolve afrontar ou denunciar seu agressor, antes que se consume o fato morte, Feminicídio, ela está correndo risco de vida e sua proteção é necessária. Há falta de políticas públicas específicas para as mulheres que se apoderam e denunciam esse agressor e não são amparadas pelo Estado, e essa falta de amparo, faz com que sejam mortas.

Primeiramente, o agressor trata sua parceira como “princesa”, dando-lhe flores, cuidando e protegendo, o “falso cavalheirismo”, mas, logo após por um “ciúme bobo” ou qualquer coisa fútil que não agrade o “príncipe”, masculino, ser completo, senhor de sua vida, perde o controle e agride com palavras, fere seu psicológico. Logo após, ele é perdoado, pois para redimir-se de seus atos cruéis tenta agradar com mais flores e bombons, implorando por desculpas, e a mulher em uma situação, podemos dizer perdida em seus sentimentos (amor e ódio), ela pensa ele vai mudar.

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Porém, a violência tem muitas facetas e volta aparecer, agora o “príncipe” deseja controlar suas roupas e sua maneira de andar e falar, entretanto, suas vontades não são atendidas e ele volta agredir, agora não com uma violência psicológica, e sim com uma violência física, um tapa, empurrão, puxão de cabelo, mas ele fala palavras bonitas e como já destruiu com a auto estima de sua parceira, então ele a reduz e a faz de submissa, pede desculpa e fala “ Eu te amo”, ela desculpa, pois ele disse que jamais ela vai achar alguém, pois ela é feia, está velha, acabada, gorda entre outras, pois o príncipe já não é tão príncipe.

Ele agora passa a ser o macho dominante que a mulher teme, e não sabe como sair dessa situação abusiva e perigosa, pois a qualquer momento, ela poderá se tornar vítima de uma violência mais grave, inclusive de feminicídio.

Este círculo vicioso em que as agressões começam com palavras e segue-se com o perdão, e com isso o agressor sente-se confiante que não haverá o rompimento da relação, consequentemente, torna as agressões mais graves. Esta é uma regra dentro das situações de violências domésticas, que a maioria dos casos faz com que as vítimas demorem alguns anos para denunciar o fato ou só o fazem, quando há uma agressão gravíssima.

Sobretudo quando a iniciativa do rompimento da relação é da mulher, esta perseguição, esta importunação, este molestamento pode chegar ao femicídio. Várias mulheres nestas condições solicitaram proteção policial. Como a segurança das mulheres é considerada questão secundária, o pedido não foi atendido, daí resultando a morte das ameaçadas. Embora a violência tenha seu ciclo, especialmente a doméstica, isto é meramente descritivo, não induzindo sequer a atitudes preventivas. É mais adequada a percepção de que a violência contra mulheres se desenvolve em escalada. Isto sim pode mostrar a premência da formulação e da implementação de políticas públicas que visem a sua extinção. (SAFFIOTI, 2004, p. 62)

Sair dessa situação perigosa e a parte mais difícil que uma mulher poderia enfrentar, pois ela se torna muitas vezes dependente desse domínio, porque em seu cérebro, foram introduzidos esses símbolos que denotam a dominação masculina, em outros casos, para algumas mulheres, há vários fatores que as levam relevar

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esse convívio inclusive, família e religião, para ela seria uma questão de princípios, inclusive a frase” até que a morte nos separe”, é bem significativa nesse caso.

Salienta-se que, quando a iniciativa de término parte da mulher, o homem sente-se afrontado e desafiado, gerando uma situação de alto risco e de crueldade extrema. A intervenção do Estado criando políticas públicas eficazes é de suma importância e de real urgência, não apenas como um “grito” de socorro, mas sim, como uma forma de prevenir esse tipo de violação da vida humana.

Por isso, para ter uma efetiva e real proteção, a resposta deve ser multifacetada como prevê a Lei do Feminicídio e a Lei Maria da Penha, e principalmente, se tomarmos consciência de que se não houver uma mudança estrutural/cultural da sociedade em que a mulher, passe a ser encarada como ser humano, sujeito de direito, com os mesmos direitos dos homens e que não seja mais vista como uma cidadã de segunda classe, ela ainda será morta.

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2. Feminicídio: a criação da qualificadora como uma resposta simbólica e à necessidade de politícas públicas específicas

Um dos maiores desafios do século XXI, é tentar erradicar ou diminuir a violência causada pela diferença de gênero. A forma mais cruel que podemos citar de violência contra a mulher é denominada de feminicídio, assassinato de mulheres em várias formas e contextos, podemos assim dizer que este fenômeno, sempre esteve enraizado em nosso sistema patriarcal, mas nos últimos anos tem ganhado visibilidade.

O termo femicídio/ feminicídio foi usado pela primeira vez por Diana Russell e Jill Radford, em seu livro Femicide: The Politics of Woman Killing, publicado em 1992 em Nova York.1 A expressão já tinha sido usada pelo Tribunal Internacional de crimes contra as mulheres em 1976 e foi retomada nos anos de 1990, para ressaltar a não acidentalidade da morte violenta de mulheres. (MELLO, 2016, p. 1)

Nota-se que a violência contra a mulher não é algo novo, nem diferente, ela sempre esteve ali presente, ou seja, sempre existiu. Mas podemos afirmar que ela se difere da violência sofrida pelo homem, em ambiente público, a mulher é agredida no conforto de seu lar, ou seja, em ambiente privado, e geralmente o agressor é seu marido ou ex-companheiro.

O fato de um terço das mortes ter ocorrido no domicílio da vítima reforça a ideia de que se trata de feminicídio ou mortes provocadas por parceiros íntimos, familiar ou conhecido das vítimas. Sabe-se também que um grande número dessas agressões ocorre justamente quando elas decidem pôr fim à relação ou quando manifestam seus pontos de vista contrários aos de seus maridos ou companheiros. (MELLO, 2016, p.1)

Quando a mulher tenta contrariar seu companheiro ela inicia uma disputa, e ele irá encarar como um desafio e fará de tudo para provar “quem manda” na relação. Mas essa disputa é perigosa, pois o agressor não pensará muitas vezes em medir forças com quem o está desafiando.

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A situação piora quando a mulher resolve pôr fim ao relacionamento abusivo, pois o companheiro não aceitando o fato, toma medidas extremas, por não se conformar com o fim do relacionamento, o desfecho dessa história será a mais terrível e violenta: o feminicídio.

Vale salientar que as mulheres estão em extrema ascensão, em crescimento, em uma fase de empoderamento e independência econômica, isso para a o sistema patriarcal é contraditório e ofensivo, pois elas estão tomando um espaço separado e conquistado somente por homens, nota-se que que ao mesmo tempo, tem crescido o número de violência e morte a mulheres.

Este espaço público, reservado para a classe masculina tem sido muito bem representado pela classe feminina, que mesmo com salários menores e com uma jornada dupla, tem desempenhado suas funções tão bem tanto quanto os homens. Porem isso, é extremamente afrontoso, pois o lugar reservado para a mulher era sempre o ambiente privado, já que o sistema patriarcal rege isso há 2 a 3 mil anos atrás até os dias atuais. (CUNHA,2018, sp)

Deve-se ressaltar a importância dos movimentos feministas na conquista da mulher, pois através deste, a visibilidade ao combate a violência a mulher teve início e com isso, gerou a coragem necessária para denunciar o agressor. Também foi através dos movimentos feministas que foram criados os primeiros centros de atendimento à mulher:

[...] feminismo, como movimento social e político, defende a igualdade de direitos entre homens e mulheres e trouxe a questão da violência contra a mulher para o debate público, exigindo por parte do Estado políticas públicas de enfrentamento à violência. Dentre as várias políticas públicas já obtidas por esse movimento no Brasil, encontram-se as Delegacias de Atendimento à Mulher, principal porta de entrada das mulheres na rede de serviço de combate à violência, e a Lei nº 11.340/06, denominada Lei Maria da Penha, que coíbe a violência doméstica e familiar contra a mulher. (MELLO,2016 p. 3)

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A lei do Feminicídio, Lei nº 13.104, de 09 de março de 2015, veio para qualificar o crime de Homicídio, buscando uma proteção efetiva à mulher, transcrito no artigo 121, 1º, § 2º- A, e o aumento de pena § 7º do Código Penal, sancionada pela Presidente da República. Vale lembrar que houve uma alteração na redação do texto da lei, mudando a palavra gênero, para sexo feminino, “biológico” e não o social, exclui-se, portanto, travestis e transgêneros.

Feminicídio

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: § 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar;

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Aumento de pena

§ 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:

I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR) (BRASIL, 2018, grifo do autor)

O aumento de pena de 1/3 até a metade, se o crime for praticado a gestante ou nos primeiros meses depois do parto, justifica-se porque a mulher está em seu estado mais frágil, ou seja, a autodefesa da vítima está comprometida. O inciso segundo, dispõem sobre a vulnerabilidade da vítima. Já o inciso terceiro, versa sobre o trauma que ocasionará na vida dos descendentes ou ascendente da vítima.

É importante salientar que o crime de Feminicídio foi introduzido no rol de crimes hediondos amparado pela Lei 8072/1990, e a pena máxima para o crime é de 12 a 30 anos, pois trata-se de uma qualificadora do crime de homicídio descrita no Artigo 121 do Código Penal.

O Feminicídio é o crime praticado a condição de a vítima ser do sexo feminino e está atrelado com sentimentos de ódio, ciúme, egoísmo, intolerância e até mesmo vingança. Isso ocorre quando há uma perca de controle do agressor, pois a mulher

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considerada sua propriedade está se tornando independente, ou saindo de um relacionamento abusivo:

Trata-se de um crime de ódio. O conceito surgiu na década de 1970 com o fim de reconhecer e dar visibilidade à discriminação, opressão, desigualdade e violência sistemática contra as mulheres, que, em sua forma mais aguda, culmina na morte. Essa forma de assassinato não constitui um evento isolado e nem repentino ou inesperado; ao contrário, faz parte de um processo contínuo de violências, cujas raízes misóginas caracterizam o uso de violência extrema. Inclui uma vasta gama de abusos, desde verbais, físicos e sexuais, como o estupro, e diversas formas de mutilação e de barbárie (GALVÃO,2019, p sp)

Como preceitua Gabriela Petrucci (2019), até a sanção da Lei nº 13.104, assassinatos de mulheres eram julgados apenas como homicídios, não havendo especificidade, podendo apresentar os agravantes de crime torpe ou fútil, características que eram avaliadas e objetivadas durante o processo, a depender do envolvimento da vítima com o réu ou do motivo que o levou a cometer o ato.

Devido à recorrente utilização da qualificadora para acentuar penas em casos de mortes de mulheres, inicia-se um conflito dentro do campo do Direito Penal: mas há criminalistas que argumentam, contrariamente à Lei do Feminicídio por entenderem como suficientes, as qualificadoras de torpeza e futilidade e que, a promulgação nada mais é do que mero reflexo da cultura patriarcal, uma resposta meramente simbólica.

As formas de realizar um ato tão cruel e fatal como este, são muitas como por exemplo asfixia, espamcamento, desconfiguração, estrangulamento, mutilação, envenenamento, cárcere privado, uso de arma branca (faca) e arma de fogo, nota-se que esta arma foi comprada para agredir a vítima, e ardilosamente, o crime foi premeditado:

A arma branca (faca, peixeira e canivete) foi identificada em 14 dos 34 casos analisados. A quantidade de facadas verificada em

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algumas situações é expressiva há processos em que as vítimas foram atingidas por dezenas de facadas, o que tende a indicar tanto a intenção de provocar aflição suplementar anterior à morte quanto o desejo de aniquilar fisicamente a mulher. As facadas são profundas e não raro atravessam o corpo. As regiões em que as agressões foram perpetradas geralmente são as vitais, como tronco e pescoço, e algumas vezes o ataque se dá pelas costas. (SRJ, 2015, p. 41)

O sentimento de posse, ódio, egoísmo, ciúme, são notórios e muitos casos pesquisados, têm demonstrado que o agressor quer desconfigurar a vítima para que não haja mais interesse por ela, e estas agressões, muitas vezes, estão atreladas ao consumo álcool, e ao uso de drogas. Como se verifica:

O dispositivo da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) que impede a retirada de queixa contra o agressor pode estar prejudicando o registro de novos abusos contra as mulheres. Entre as vítimas de violência doméstica no Brasil, 73% foram agredidas por pessoa do sexo oposto com quem conviviam intimamente. Destas, 26% ainda convivem com o agressor e 14% delas continuam sendo vítimas de agressões. O ciúme e o álcool continuam sendo apontados como os principais agentes causadores de violência por 21% e 18% das mulheres agredidas. Os dados são da Pesquisa sobre Violência Familiar e Doméstica Contra a Mulher do Data Senado, que ouviu por telefone 1.102 brasileiras de todos os estados, entre 24 de junho a 7 de julho. (DATASENADO, 2019, sp)

Porém é importante salientar que o consumo de álcool e o uso de drogas, são apenas para acionar o gatilho, para que as agressões aconteçam, pois, não se fundamenta que apenas por estar bêbado e drogado, irá cometer o crime hediondo. Os maiores fatores que estão inerentes nesse sujeito, são o pensamento de posse, sexista e patriarcal. (SRJ, 2015, p. 47)

Denota-se que para ser configurada a violência, é necessário que a ação ou omissão aconteça na relação doméstica ou familiar, ou em razão da relação de afinidade, uma vez que o agressor tenha que ter convivido ou conviver atualmente com a vítima, sem haver necessariamente a coabitação. Desta forma, como preceitua a autora (APARECIDA, 2019, p. 23), o agressor não precisa morar com a vítima para configurar violência doméstica, basta apenas o agressor ter mantido vínculo com a vítima. Também há casos de violência contra a mulher que foram

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ocasionados pelo simples fato dela ser mulher, pelo gênero feminino, sendo agredidas e mortas por serem consideradas inferiores.

2.1 Feminicídio: especíes e analíse de alguns casos

Para compreender o Feminicídio e seus vários modelos, é importante observar alguns artigos da Lei Maria da Penha 11.340/2006, pois foi através desta, que ensejou uma tipificação e a criação da qualificadora para crimes relacionados a morte de mulheres

Primeiramente observa-se o Artigo 7º da Lei Maria da Penha que traz em sua redação a violência doméstica, ou seja, íntima, em cinco modelos:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada ,mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV- a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades

;V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.(BRASIL,2019)

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Segundo a autora Cleide Alves Aparecida (2019, p. 19), em seu artigo faz uma distinção entre as espécies de feminicídio. O feminicídio íntimo, nasce de uma relação entre a vítima e o agressor, regrada de sentimentos amor, carinho, afeto e nasce, geralmente no domicilio da vítima, um exemplo, seria um ex-companheiro que não aceita o fim do relacionamento. Veja um caso a seguir:

Grávida de três meses do quinto filho, Luana Bezerra da Silva, 28, levou ao menos quatro facadas nas costas e uma, fatal, no pescoço. O crime ocorreu na AR 5, em Sobradinho 2. O suspeito, Luiz Filipe Alves de Sousa, 20, fugiu após o crime. O casal tinha um relacionamento de três anos e, na noite anterior ao crime, brigaram em frente a uma das filhas do casal. A mulher foi atacada pelo marido por trás, quando terminava de servir almoço para às duas filhas de Luana, uma delas era fruto do relacionamento com o suspeito. A 35ª DP (Sobradinho 2) ainda apura o caso. O autor está foragido.seria um ex-companheiro que não aceita o fim do relacionamento.(ATITUDE, 2019, sp,grifo do autor)

Há outros modelos de feminicídio, como por exemplo, o não íntimo, que a vítima não possui grau de parentesco, “um estranho”, com a vítima e nenhum tipo de sentimento, mas ela foi agredida e abusada sexualmente. (APARECIDA, 2019, p. 19). Veja este caso recente em Catuípe, Rio Grande do Sul:

Adolescente de 15 anos é encontrada morta em Catuípe; motorista de van escolar é suspeito.Considerada desaparecida desde a tarde de sexta-feira, a adolescente Maria Eduarda Zambom, de 15 anos, teve o corpo encontrado na manhã deste sábado em um matagal na localidade de Santa Terezinha, no interior de Catuípe, no Noroeste gaúcho. O corpo tinha sinais de violência sexual e marcas de asfixia no pescoço. O principal suspeito é um motorista, de 52 anos, que fazia o transporte escolar, explica o delegado responsável pelo caso, Gustavo Arais. “Todos os dias, às 6h, a adolescente pegava o transporte escolar, dirigido pelo suspeito para ir ao colégio estudar. Às vezes era um ônibus, às vezes uma Kombi, mas no dia dos fatos investigados, ele utilizou um veículo particular para ir buscar a Maria Eduarda, que para nós, detona a premeditação dos crimes a serem confirmados nos exames periciais”, ressalta. A investigação também estima que o cobertor localizado próximo ao corpo da jovem tenha sido utilizado para asfixiá-la. Em outro ponto da mata, foram encontrados o par de tênis e a blusa da garota. Ainda na madrugada, o carro do suspeito foi localizado, abandonado, distante do local do crime. Perto do veículo, policiais encontraram a mochila de Maria Eduarda. Em meio às buscas, testemunhas informaram que o suspeito foi localizado pedindo socorro. Ele tinha um corte profundo na garganta e no peito.

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O motorista recebe atendimento no Hospital de Caridade de Ijuí, onde passou por cirurgia. O estado de saúde dele é grave. A Polícia Civil ainda não esclareceu os motivos do ferimento, mas estima que ele tenha tentado suicídio após violentado a menina. O delegado vai pedir a prisão temporária do suspeito. (GUAIBA, 2019, sp, grifo do autor)

Existe uma terceira hipótese de feminicídio, em que a vítima está conexa ao crime, ela tenta interferir uma morte ou abuso e acaba morta, esse seria o feminicídio por conexão. (APARECIDA, 2019, p. 19). Veja um caso a seguir:

Eliane Maria Sousa de Lima, 49, morreu na casa da irmã, na Quadra 11 do Setor Leste do Gama. Ela foi esfaqueada no tórax pelo cunhado, o açougueiro Josué Pereira da Silva Filho, 47. Ele ameaçava a mulher, Paula Otacilio de Lima, 43, durante uma briga entre os dois. Eliane ficou entre o casal para defender a irmã, mas acabou ferida e morreu na hora. Agentes da 20ª Delegacia de Polícia (Gama) prenderam Josué em flagrante. Ele foi hospitalizado depois de vizinhos tentarem linchá-lo no momento em que tentava fugir. O agressor recebeu alta e foi encaminhado à carceragem da Polícia Civil. Durante a audiência de custódia, o juiz converteu a prisão em preventiva, sem prazo para ser encerrada. (ATITUDE,2019, sp, grifo do autor)

Como preceitua APARECIDA (2019, p. 19), existem outras formas de classificar o feminicídio. Um novo modelo seria o preconceito a quem aderiu outro gênero que o não o seu de nascimento, a Transfóbia, e também aqueles que tem ódio ou repudio a quem tem outra opção sexual, neste caso, como estamos falando de mulheres, a lesbofóbia, que tem resultado a morte de mulheres pela mudança de gênero ou orientação sexual:

Ainda segundo o dossiê, "as questões de gênero se reforçam e demonstram que 97,5% (aumento de 3% em relação a 2017) dos assassinatos foram contra pessoas trans do gênero feminino (158 casos). No ano de 2018 foram noticiados pela imprensa brasileira 71 tentativas de homicídio, um aumento de 9,8%, sendo que todas as vítimas são do gênero feminino. (UOL,2019, sp, grifo do autor)

Neste sentido, em seu artigo a autora Paula Clavé de Oliveira, (2018, p. 21) conceitua alguns outros modelos, que se referem a crianças e adolescentes e, ao

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