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Goiânia(s): uma discussão sobre representações sociais e identidades conferidas à capital goiana

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Academic year: 2021

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GOIÂNIA(S): Uma discussão sobre representações sociais e identidades

conferidas à capital goiana

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GOIÂNIA(S): a discussion about social representations and identities

attributed to the capital of Goiás.

GOIÂNIA(S): una discusión de representaciones sociales e identidades

conferidas a la capital de Goiás

Clarinda Aparecida da Silva

Doutoranda em Geografia-IESA/UFG

Profª do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás/IFG. Coordenação de Turismo e Hospitalidade/IFG

Rua 75, nº 46 - Centro - CEP: 74055-110 - Goiânia-Go clarindas@uol.com.br

Maria Geralda de Almeida

Orientadora e Professora Dra do Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia-IESA/UFG

mgdealmeida@gmail.com

Resumo

Este artigo discute alguns referenciais teóricos e conceituais da categoria “representações sociais”. Discute também as representações sociais produzidas e/ou veiculadas pela imprensa escrita e pela publicidade turística sobre a cidade de Goiânia. Essas representações, que usam como pano de fundo principalmente as características paisagísticas do espaço urbano, dão subsídios à construção de várias imagens sobre a cidade e lhe atribui identidades. Elas, contudo, provavelmente, configuram a situação apontada por Penna (1992) como alter-atribuição de identidade. São classificações originadas na exterioridade do grupo, no modo como Goiânia é reconhecida por determinados agentes sociais. Cabe, portanto, entender como a cidade é pensada e representada por seus moradores.

Palavras-Chave: Representações sociais, mídia, Goiânia, paisagem, identidade

Abstract

This paper discusses the theoretical and conceptual references from “social representations” categories. It also analyses the social representations produced and /or

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Este trabalho é parte das discussões da tese de doutorado, em andamento, do Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais da Universidade Federal de Goiás-IESA/UFG.

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transmitted by the press and touristic publicity in Goiânia, Goiás, Brazil. These representations, based on landscape characteristics of urban space as a background, normally support the construction of various images about this city and assign its identities. However, these images probably configure a condition cited in Penna (1992) as self-attribution of identity. They are classifications originated in the exteriority of the group, recognized by determined social agents. Therefore, the representations for this city is determined by its inhabitants.

Keywords: Social representation, press, Goiânia, landscape, identity.

Resumen

Este artículo discute algunas referencias teóricas y conceptuales de la categoría “representaciones sociales”. Discute también las representaciones sociales producidas y/o difundidas por la prensa escrita y por la publicidad turística sobre la ciudad de Goiânia. Esas representaciones, que sobre todo usan como telón de fondo las características paisajísticas del espacio urbano, dan subsidios a la construcción de varias imágenes sobre la ciudad y le atribuye identidades. Ellas, sin embargo, probablemente, configuran la situación apuntada por Penna (1992) como alter-atribución de identidad. Son clasificaciones originadas en la exterioridad del grupo, en el modo como Goiânia es reconocida por determinados agentes sociales. Por lo tanto, cabe entender como la ciudad es pensada y representada por sus habitantes.

Palabras-Clave: Representaciones sociales. Mass media. Goiânia. Paisaje. Identidad.

Introdução

Goiânia é a filha mais moça e bonita do Brasil. Por isso a sua filha predileta. Robusta, tropical. A cara do pai. Tem o seu mesmo sentimento sertanejo, o seu mesmo espírito bandeirante, a sua mesma alma cristã. Breve será moça e se casará. Se casará com o Espírito-Novo de nossa terra. Se casará e, forte, bonita, vai dar ao Brasil vovô de amanhã uma porção de Goianiazinhas (FIGUEIREDO, 1942, p.5. Grifo nosso).

As palavras de Figueiredo, publicadas na Revista Oeste, em 1942, poucos anos após a inauguração de Goiânia, sugerem a construção de múltiplas representações da cidade e remete à identidade nacional como uma forte referência para a construção da identidade local. Podemos dizer que, no decorrer dos anos, as reflexões de Figueiredo concretizam-se no campo das representações da cidade, as quais usam como pano de fundo principalmente as características paisagísticas de Goiânia. Elas dão subsídio à construção de várias imagens e atribuem identidades à cidade. Neste texto, optamos por discutir as representações sociais construídas e/ou veiculadas pela imprensa escrita –

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jornais locais2 – e pela publicidade turística3, selecionadas no período entre 2004 e 20084.

Consideramos prudente começar a discussão reportando a alguns conceitos, no sentido de eleger uma possibilidade de compreensão da categoria representações sociais. No contexto desse viés interpretativo, abordamos a relação entre as representações sociais e a construção de identidades para a cidade. A discussão recai nas representações que usam como pano de fundo a paisagem urbana de Goiânia.

De acordo com Moscovici (2007), representações sociais constituem um conjunto de idéias, imagens e concepções que convencionalizam objetos, pessoas ou acontecimentos. Elas lhes dão significado e, gradualmente, os colocam como modelo partilhado por grupos de indivíduos. Jodelet (2001) acrescenta que, sendo socialmente elaboradas e sempre em ação na vida social, elas orientam e organizam condutas e comunicações sociais. Da mesma forma, elas intervêm em processos como a difusão e a assimilação do conhecimento, a definição de identidades pessoais e sociais, a expressão dos grupos e as transformações sociais.

Jodelet (2001, p. 22) afirma ainda que “representar ou se representar corresponde a um ato de pensamento pelo qual um sujeito se reporta a um objeto”. Este objeto tanto pode ser uma pessoa quanto uma coisa, um fenômeno natural, uma idéia, um acontecimento material ou social, dentre outros eventos. Não há representação sem objeto, seja ele real, imaginário ou mítico. Embora haja distinção entre sujeito e objeto, eles se articulam entre si numa relação de construção e simbolização.

As considerações de Jodelet (op. cit.) veem ao encontro das reflexões de Santos (2000) quando a mesma argumenta que as representações sociais revelam as formas de pensamento sobre os objetos sociais e, ao mesmo tempo, influenciam no que se refere ao modo como o sujeito se define em relação ao objeto. A autora afirma que

um objeto social qualquer só existe em relação a um sujeito ou um grupo, pois ao pensar sobre o objeto, ao exprimir opiniões a seu respeito, o sujeito (ou grupo) está recriando o objeto, reconstruindo-o de modo a tornar-se consistente com a opinião que o sujeito tem a seus respeito.

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Foram pesquisados os jornais O Popular e Diário da Manhã.

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Consideramos aqui como publicidade turística os folhetos, folders, guias e outros materiais impressos e divulgados pelo trade turístico Goianiense.

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Alguns desses materiais não constam data da publicação, mas algumas informações contidas no interior dos mesmos permitem-nos concluir que foram publicados entre 2004-2008.

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Representar implica sempre em um sujeito e um objeto, intrinsecamente ligados (SANTOS, 2000, p. 157).

Em vista disso, a representação não é um simples reflexo do objeto, mas um produto das relações complexas que o sujeito mantém com ele, ou seja, a representação funciona como um sistema de interpretação da realidade que rege as relações dos indivíduos com o seu meio físico e social e determina seus comportamentos e suas práticas (ABRIC, 2000).

Como forma específica de conhecimento, ressalta Moscovici (2007, p. 60), as representações sociais configuram-se por meio de dois mecanismos de um processo de pensamento baseado na memória e em conclusões passadas: a ancoragem e a objetivação. Segundo o autor, “não é fácil transformar palavras não-familiares, idéias ou seres, em palavras usuais, próximas e atuais. É necessário, para dar-lhes feição familiar, pôr em funcionamento os dois mecanismos [...].” O primeiro – a ancoragem – lança mão das idéias estranhas, do desconhecido reduzindo-o a imagens comuns, a um contexto familiar. Já a objetivação transforma algo abstrato em concreto. Objetivar é identificar a qualidade icônica do objeto, transformar um conceito em uma imagem. No processo de objetivação, “[...] um fenômeno é pensado de forma objetivada, ou seja, adquire materialidade e se torna expressão de uma realidade vista como natural” (ORDAZ; VALA, 2000, p. 88).

Voltando à questão da ancoragem, Moscovici (2007) acrescenta que ancorar é classificar e dar nome a algo. Uma vez que atribuímos nome ao anônimo, somos capazes de imaginá-lo, de representá-lo. De acordo com o autor, quando classificamos algo, nos confinamo-lo a um conjunto de comportamentos e regras que determinam o que é ou não permitido em relação aos indivíduos pertencentes a determinada classe. Ao mesmo tempo procuramos identificar que característica, motivação ou atitude o torna distinto daquele grupo. Na realidade, é dada uma identidade social ao que não estava identificado, ajustando-o a uma representação social predominante.

No caso de Goiânia, a cidade é nomeada e representada a seus habitantes e visitantes como “Capital dos Eventos”, “Capital Art Déco5

do Brasil”, “Goiânia Country”, “Cidade dos Parques”, “Capital das Praças e Jardins”, dentre outros slogans

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que transmitem a ideia de uma diversidade de paisagens na paisagem da cidade. Nessa perspectiva, considerando a identidade como processo multiplamente construído6, as identidades de Goiânia7 podem ser formadas no interior dessas representações, as quais agregam os atributos socioculturais, econômicos e paisagísticos do lugar. A cidade é representada como um conjunto de significados. A identidade, por sua vez, pressupõe que sejam estabelecidos critérios adequados para uma identificação que significa designar e nomear qualquer coisa ou qualquer um e depois caracterizar sua singularidade, como ressalta Bossé (2004).

Ainda para Moscovici (2007), as classificações, em sua grande maioria, são feitas comparando as pessoas ou objetos a um modelo, julgando sua especificidade, sua similaridade ou diferença com base em uma ou outra peculiaridade. Classificar e nomear uma pessoa ou coisa faz dela, por meio de suas características, suas tendências, seus valores, distinta de outras pessoas ou objetos. A representação é marcada por uma avaliação das características do objeto.

Nesse caso, as particularidades do espaço urbano tornam-se, então, um importante fator de classificação e de distinção entre uma e outra cidade. A identidade da cidade se define em comparação a outra identidade numa relação complexa de valorização positiva e negativa, tal como expõe Haesbaert (1999). Para Abric (2000, p. 29), “a função identitária das representações assegura, para estas, um lugar primordial nos processos de comparação social”.

Em decorrência dessas relações, o estudo dessas representações sociais traz à tona elementos importantes para compreender as construções sociais sobre a cidade. Elas - as representações - fornecem indícios sobre as formas de pensar o espaço e sobre a apropriação que os agentes sociais fazem das paisagens e de outros atributos socioculturais como elementos de identidades da cidade. Vejamos, pois, como a mídia8 elabora suas representações.

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Estilo arquitetônico adotado, pelos planejadores da capital goiana, como algo novo a ser experimentado em termos de urbanismo, nos anos de 1930-1940.

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A identidade não é algo dado, trata-se de uma identificação em curso. Assim, ela é sempre múltipla. (HAESBAERT, 1999).

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De acordo Haesbaert (op cit,), a identidade pode estar referida tanto a pessoas como a objetos, coisas. A identidade territorial é tratada, conforme o autor, como identidade social, uma vez que o referente simbólico para a construção dessa identidade parte ou perpassa o território.

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Cabe ressaltar que nossa intenção não é realizar uma análise do papel ou da linguagem da mídia no surgimento das representações, mas sim discutir aquelas representações sobre a cidade que ela produz e/ou põe em circulação.

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Mídia e Representações: Goiânia, múltiplas paisagens, várias identidades.

Os meios de comunicação social, conforme Camargo (2003, p. 131), “oferecem caminhos para que as representações sociais possam circular nos grupos e no interior de uma dada sociedade”. Eles lidam com a fabricação, reprodução e disseminação de representações sociais que influenciam na forma como sociedade vê a cidade. Por conseguinte, eles alimentam a “autoconsciência que os diferentes grupos sociais constroem a respeito do espaço e da sua relação com ele”. (MORAES, 2005, p.44),

A mídia, todavia, não só produz representações como também reproduz as representações que determinados agentes sociais constroem. São, geralmente, reproduzidos os significados e os valores impostos ideologicamente por grupos dominantes. Com isso, a mídia transforma e, conforme Jovchelovitch (2000), até certo ponto, define a circulação de bens simbólicos em sociedades contemporâneas. Desta forma, ela impõe definições sobre a cidade e a vida publica, cria e valoriza determinados espaços na cidade.

Goiânia, assim como todas as cidades, está impregnada de significados simbólicos provenientes do modo de vida dos seus habitantes, das suas paisagens e de outros elementos, os quais possibilitam múltiplas representações. Os meios de comunicação buscam nessas características físicas e socioculturais do espaço urbano e nos discursos políticos e do setor público os instrumentos que materializam as representações sociais. Eles, portanto, nos oferecem a possibilidade de conhecer a produção simbólica de determinados grupos sobre o cenário urbano. A publicidade turística, cuja finalidade é chamar a atenção para a cidade e seus atrativos, fornece narrativas e imagens que permitem as pessoas, principalmente os visitantes, conhecerem os aspectos, considerados mais relevantes, da paisagem da cidade. Juntos, os jornais e a publicidade turística configuram a trama simbólica sobre os espaços públicos de Goiânia e constroem, positivamente, imagens para a cidade.

As representações de Goiânia como “Capital dos Eventos”, “Capital Art

Déco9 do Brasil”, “Goiânia Country”, “Cidade dos Parques”, “Capital das Praças e

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Estilo arquitetônico adotado, pelos planejadores da capital goiana, como algo novo a ser experimentado em termos de urbanismo, nos anos de 1930-1940.

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Jardins”, dentre outras, foram identificadas nos jornais e na mídia turística investigada. Entretanto, neste estudo, interessa-nos, particularmente, refletir sobre aquelas que fundamentam-se na paisagem da arquitetura tradicional e dos inúmeros parques urbanos. Portanto, fazem parte dessa análise os slogans “capital art déco”, “cidade dos parques”, “cidade verde”, e outras atribuições à Goiânia, que estão ancorados nas representações que caracterizam a cidade como representativa do estilo déco e como a capital com melhor qualidade de vida do Brasil, conforme revela os tópicos a seguir .

A cidade das flores, do verde, dos parques: a capital com melhor qualidade de vida do Brasil.

O subtítulo acima leva-nos a afirmar que os elementos da paisagem urbana são constitutivos de múltiplas representações. Ela, a paisagem, é, ao mesmo tempo, um texto estruturado e estruturante das representações e de atribuição de identidades para a cidade. Isso implica em dizer que, segundo Cosgrove (1998), a paisagem é um texto cultural com muitas dimensões. Ela revela, a cada olhar, diversos aspectos, símbolos e significados, oferecendo, portanto, a possibilidade de diferentes e simultâneas leituras, igualmente, válidas. Portadora de um conjunto de significados, a paisagem pode engendrar tantas respostas quanto forem às atitudes para com ela.

Defendemos que a paisagem, por um lado, deve ser “vista por um olhar, apreendida por uma consciência, valorizada por uma experiência, julgada por uma estética e uma moral, gerada por uma política, etc.”. Por outro lado,ela [...] “determina, em contrapartida, esse olhar, essa consciência, essa experiência” (BERQUE, 1998, p. 98). Isso significa dizer que a leitura da paisagem urbana não deve ser redutível à sua morfologia, ao desenho da cidade ou às suas atividades econômicas, mas envolve, sobretudo, as suas propriedades simbólicas, as suas formas de apropriação cultural. Entretanto, nas representações de Goiânia, a paisagem é tratada essencialmente, pela aparência visual e não por suas dimensões históricas e culturais.

As representações de Goiânia nasceram ou mudam de acordo com o contexto político e socioeconômico da cidade ou do país. Assim, nos primeiros anos da década de 1990, o discurso ecológico no Brasil e as ações urbanas da cidade de Curitiba, contribuíram para tornar as praças e parques de Goiânia em objetos de maior interesse

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político (Oliveira, 2005). Esses espaços, agora, estão no centro das discussões sobre a cidade, principalmente nos discursos urbanos das gestões municipais e na mídia, conforme mostram, a seguir, as diversas reportagens e propagandas turísticas investigadas.

A reportagem “O verde recupera força”, de Braga (O Popular, 24/10/04, s/p.)10 evidencia que a “capital é a segunda do país com melhor arborização”. Tal reportagem ressalta o trabalho da prefeitura de Goiânia para incorporação de áreas verdes ao município. Nessa matéria, o, então, secretário do Meio Ambiente destaca que

Goiânia é a segunda em arborização. É praticamente unanimidade entre os que visitam Goiânia os elogios à arborização e ao ajardinamento da cidade. Os elogios se justificam: os jardins da capital florescem durante o ano todo [...].”

Nesse caso, a representação do poder público é apropriada pela imprensa e reconstruída de modo a legitimar para Goiânia uma imagem que revela um estilo de governar com êxito. O fato de a cidade estar na mídia e, portanto, no imaginário social, confere prestígio à administração pública. “Compreende-se melhor agora o porquê do desejo político de se representar a cidade através dessas imagens”. (SERPA, 2007, p. 85).

Com o tema “Capital das Flores”, Sabino, em o Diário da Manhã (20/07/2004, s/p) destaca que, independente das condições do tempo, “em Goiânia todo dia é dia de flores tanto na região central quanto na periferia”. Em setembro de 2006, no mesmo jornal, a reportagem “capital dos Jardins”, com o objetivo de divulgar alguns bairros e praças de Goiânia, relata que a cidade é “o reduto das flores, dos bosques e da natureza. Em seus 73 anos de vida, Goiânia carrega, com orgulho, o título de capital do verde. É a cidade com maior índice de áreas verdes do país” (DUTRA, 2006, p.1). Embora não se deve confundir a cidade com o discurso que a descreve, essas representações contribuem para promover as condições de atratividade do lugar e impor determinados valores, justificando, assim, que “[...] a Goiânia das flores e do verde, sem dúvida, é um dos principais motivos de orgulho do cidadão goianiense” (ibid., p.1).

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As reportagens dos Jornais O Popular e Diário da Manhã, aqui citadas, que não contam número de páginas foram pesquisadas no Departamento de Engenharia de Sistemas – Sistema de Pesquisas CEDOC da Organização Jaime Câmara e a impressão fornecida pelo referido departamento não identifica a página da publicação.

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Vale destacar que as praças mostradas pela referida reportagem estão situadas, principalmente, em bairros de classe média/alta como o Jardim Goiás, Setor Sul, Setor Nova Suíça. Ainda que na periferia da cidade vários bairros possuam parques, praças e jardins, não se podem negar que, à medida que vamos nos distanciando dos setores nobres, as flores diminuem ou até mesmo deixam de existir. Essa diferenciação espacial, que elege e segrega setores, remete-nos às considerações de Arrais (2001, p. 191), ao comentar que o discurso “cidade das flores”, construído durante a administração de Nion Albernaz11, encarava a parte como se fosse o todo. De fato, a “cidade das flores” não existe na periferia.

É notável, contudo, que essa representação cristalizou-se nos discursos sobre a cidade. Ela está ancorada em antigas representações que procuram evocar uma imagem positiva para Goiânia. Segundo Arrais (op. cit.), o marketing do Governo Nion Albernaz procurou exaltar a qualidade de vida da cidade das flores com a agitação da vida moderna imposta pela metrópole. Deixou-se de lado, assim, a cidade ecologicamente correta da administração anterior. Isso ilustra as contribuições de Moscovici (2007), para o qual as representações sociais, uma vez criadas, adquirem vida própria, circulam, encontram-se e atraem-se, repelem-se e dão oportunidade ao nascimento de novas representações. Elas vão, “esvaindo-se, apenas para emergir novamente sob novas aparências” (op. cit, p. 38). Isso não significa, porém, que elas não possuam algum aspecto duradouro e permanente, que sejam realidades absolutamente flutuantes, complementa Guareschi (2000).

O slogan, “cidade ecologicamente correta”, foi lançado em forma de discurso na década de 1990, pelo poder público municipal de Goiânia como estratégia de marketing político, apropriando-se do título que colocou a capital Goiana como uma das cidades brasileiras que mais investiu na qualidade de vida. Compartilhada pelos Jornais locais, cartões postais dentre outros meios de divulgação, essa representação de capital ecológica passou a ser uma característica que diferenciava Goiânia das demais cidades Brasileiras (ARRAIS, 2001).

A cidade como um todo, continuou sendo construída positivamente pela mídia. Em 2007, o guia Curta mais Goiânia (ano 1 n. 10, dez. 2007/jan. 2008, p. 8). destaca Goiânia como a capital verde do país. Esse mesmo guia, como forma de publicidade da

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administração municipal traz, na sua contra capa final, o slogan “VerdeNovo “ e logo abaixo acrescenta: “esta brotando como a nova capital ambiental”. Observa-se que, conforme vão desencadeando as circunstâncias sociais, políticas e culturais em Goiânia, novos discursos vão sendo produzidos e, captados pela publicidade turística, dão origem a outras representações sociais, ainda que sustentadas nas antigas. Nesse processo, a imagem da cidade está sempre se construindo e reconstruindo.

Goiânia, que vinha sempre disputando com Curitiba, Porto Alegre e João Pessoa a condição de cidade brasileira com maior índice de arborização, recebeu, em 2007, do Instituto Brasil Américas, o título de capital Brasileira com melhor índice de qualidade de vida12. O referido título, segundo o Diário da Manhã (24/10/07), justifica-se, principalmente, pelo fato da cidade ser considerada, atualmente, a capital brasileira que possui maior número de metros quadrados de áreas verdes por habitantes no Brasil13. Esses dados exemplificam as afirmações de Guareschi (2000, p. 77), para o qual “a representação social é um espaço transcendente, mas está vinculado a uma realidade objetiva: sem essa realidade objetiva, a representação não existe”.

Ancoradas na representação de cidade com melhor qualidade de vida do Brasil, as reportagens “Cidade dos Parques” publicada no guia “Curta mais Goiânia” (n.1 ano 1, nov. 2006) e “Goiânia Cidade Verde” (GOIÁS TURISMO/GOIÂNIA CONVENTION, s/d); dão nomes a Goiânia. Uma vez nomeada, a capital goiana adquire características que a distinguem de outras cidades e dão suporte à atribuição de identidades urbanas. Isso revela o que Haesbaert (2007) considera como caráter relacional da construção identitária. A identidade da cidade é produzida na relação e na comparação com aquela e que é estabelecida como a outra, conforme exemplifica as seguintes citações.

Goiânia carrega, com orgulho, o título de capital verde. É a cidade com maior índice de áreas verdes do país. Ganha até mesmo de Curitiba – capital considerada modelo de cidade ecológica (DUTRA, 2006, p.1, grifo nosso).

12Segundo a reportagem “Qualidade de vida. Goiânia é campeã entre as capitais brasileiras”, publicada no

caderno cidades (O Popular, 29/11/2007), a pesquisa que deu esse título a Goiânia foi divulgada pela Organização Brasil América (em sua 12ª edição) e baseou-se em dados do IBGE, do Ministério das Cidades e em estudos realizados pelo Jornal do Brasil e Gazeta Mercantil.

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De acordo com estudos realizados pela diretoria de Unidade de Conservação da AMMA (Agência Municipal de Meio Ambiente de Goiânia), divulgados em junho de 2007, Goiânia possui 94m² de área verde por habitantes, superando Curitiba que possui 53m² por habitante. Até então, a capital paranaense ocupava o primeiro lugar no ranking desse tipo de comparativo. (GOYA, 2008)

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[...] Goiânia não só conquistou o título de capital com melhor índice de qualidade de vida (IQV) como foi a 3ª classificada no ranking geral das cidades brasileiras com os melhores desempenhos no quesito. Perdeu apenas para Sumaré (SP) e Lauro de Freitas (BA). Dos mil municípios pesquisados, 300 apresentaram índices acima da média, dos quais 60 se destacaram (O POPULAR, 29/11/2007. Cidades, s/p., grifo nosso).

Goiânia possui hoje cerca de 650 mil árvores plantadas em vias públicas, superando Curitiba (cerca de 300 mil árvores e João Pessoa (cerca de 40 mil), que eram, até então, referências nacionais em termos de arborização (DIÁRIO DA MANHÃ, 24/10/07. Goiânia 74 anos, p.23. grifo nosso).

Assim, a representação é assinalada por uma avaliação das características ou das produções da cidade, cuja função é garantir-lhe uma imagem positiva (ABRIC, 2000). Por essa via, Goiânia se faz presente nos jornais e na publicidade turística como lugar de qualidade de vida, sustentado pelos elementos da natureza, presentes na paisagem das praças e dos parques urbanos. Ela é vendida como um espaço de investimento, de oportunidades e de economia estável. Esses fatores, segundo a matéria “a vedete do setor imobiliário” (CURTA MAIS GOIÂNIA, ano 1 n. 6, jul/ago, 2007, p. 4), “estão transformando Goiânia em um dos lugares melhores para morar ou investir. A cidade está repleta de novos empreendimentos e o mercado imobiliário vive um dos melhores momentos da história, tornando Goiânia uma das vedetes nacionais do setor”.

Observa-se que, a exemplo de várias metrópoles brasileiras, a paisagem dos parques de Goiânia tornou-se objeto de consumo vendido pelo mercado imobiliário. Os parques têm contribuído para dar prestígio a determinadas áreas da cidade revalorizando sua imagem (SERPA, 2007). Por isso, os investimentos na implantação de áreas verdes e a criação de unidades de conservação são cada vez mais crescentes no espaço urbano goianiense. Essas intervenções pontuais, porém, constituem-se num processo de segregação dos bairros populares em favor daqueles das classes médias/altas.

Ainda referenciada por sua qualidade de vida, Goiânia é divulgada também nos meios de comunicação, aqui analisados, como a capital do sucesso e das oportunidades. Vejamos o texto da reportagem “Goiânia Capital de Sucesso”, de Pazini e Guimarães (2008), publicada no caderno economia do Diário da Manhã do dia 24 de outubro de 2008: “com a economia pujante, oportunidade de emprego e grande leque de opções na

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área de Educação, Goiânia se destaca pela qualidade de vida que atrai pessoas dos quatros cantos do Brasil em busca de realização profissional”.

Desta forma, a cidade torna-se, por vez, uma poderosa marca difundida na mídia. A imagem da cidade ganha destaque por apresentar-se atraente na perspectiva e na manipulação de valores criados pela linguagem e pelas técnicas do marketing. Os meios de comunicação, contudo, preconizam um quadro que, provavelmente, cria no imaginário social a ideia de uma cidade livre das mazelas socioambientais, ou seja, é um quadro da cidade visível, aquela recortada pela publicidade, pelo poder público, mas não da cidade de quem a vive (WEBER, 2006).

A expressão qualidade de vida tornou-se, nesse caso, um símbolo que representa os valores econômicos e a busca do sucesso profissional, tanto individual como social. Todavia, ela deve ser tomada em um sentido mais amplo, integrando diversos aspectos que vão desde a moradia, alimentação, lazer e transporte à satisfação/realização profissional, sexual e amorosa, somados à autonomia, segurança financeira, liberdade e relacionamento com o outro (ACCIOLY JUNIOR; SCHNEIDER; PINHEIRO, 2003).

Nosso propósito, no momento, não é discutir os referenciais conceituais em torno da expressão “qualidade de vida” e as oportunidades que Goiânia oferece na área de educação, moradia, trabalho etc. Pretendemos mostrar que essa representação, como prática comunicativa, caracteriza e constitui os espaços de acordo com os interesses de determinados agentes sociais. Além disso, tal representação confere prestígio ao grupo que está gerindo a esfera pública.

Diversas outras representações de Goiânia foram construídas e são alimentadas pela mídia. A arquitetura tradicional, por exemplo, deu à cidade a condição de “capital art déco”, sobre a qual passamos a discutir.

A “Capital Art Déco do Brasil”

Goiânia foi construída década de 1930, época em que se expandia pelo mundo um estilo arquitetônico e artístico, posteriormente, denominado art déco. Esse modelo de arquitetura foi escolhido pelos planejadores da capital goiana como algo novo a ser experimentado em termos de urbanismo. “Os primeiros edifícios públicos erigidos em Goiânia, não por acaso os primeiros da cidade, ao redor da Praça Cívica, seguiram

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orientação eminentemente déco.” Além dos prédios públicos, nove entre dez edifícios particulares no Centro da cidade seguiam essa tendência adotada pelos centros do poder. (UNES, 2008, p. 79).

Atualmente, revelam Silva e Mancini (2007; 2008), é possível encontrar, na paisagem do centro da cidade, prédios, linhas e formas exibindo nomes de cidades e de famílias de outrora, dentre outros aspectos art déco, que se constituem como marcas locais e regionais que caracterizam a origem da história de Goiânia. Essa arquitetura, presente na cidade de Goiânia desde o início da sua história, vem solidificando-se ao longo de sua trajetória evolutiva enquanto um patrimônio, considerado fundamental para o fortalecimento da identidade e dos valores locais. Em novembro de 2003, vinte e dois prédios e equipamentos públicos em art déco de Goiânia e o traçado original foram tombados pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional)14 e elevados à categoria de patrimônio cultural conforme legislação específica desse órgão.

Nas palavras de Araújo e Almeida (2007, p. 207),

no contexto da cidade contemporânea, o tombamento do conjunto arquitetônico do Núcleo Pioneiro significa a preservação de valores da paisagem que assinalam a dimensão de vários tempos e ações que marcaram os lugares da cidade, bem como sinaliza a intenção subjacente de se construir uma imagem da cidade via patrimonialização.

O discurso da patrimonialização, sem dúvidas, deu à Goiânia a imagem de “Capital Art Déco”. Isso fica evidente no folder sobre a exposição identidade art déco de Goiânia, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN/Memória Futura Memória em 2001. De acordo com esse material, “Goiânia acabou ganhando uma unidade estética poucas vezes vista em outras cidades: é a capital do art déco do Brasil”. Com isso o imaginário patrimonialista produz a cidade desejada para potencializar o poder atrativo local.

Todavia, o crescimento urbano de Goiânia, acompanhado da chamada “modernidade”, tem levado a cidade a um processo de transformação espacial. Atualmente, área central da cidade mistura o estilo art déco com construções modernas. Essa mescla revela aos transeuntes uma integração explícita entre o velho e o novo, que

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Tombamento realizado conforme a portaria federal n. 507, de 18 de novembro de 2003, publicada no Diário Oficial da União em 24 de novembro do mesmo ano.

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torna a cidade um centro de referências múltiplas, afirmam Silva e Mancini (2007; 2008). Além disso, as alterações nos prédios e as gigantescas propagandas comerciais escondem as fachadas das formas arquitetônicas e os símbolos nelas grafados. Essa, “[...] poluição visual promovida pelo comércio levou a um processo gradual de descaracterização da identidade arquitetônica art déco da região central” (MACEDO, 2009, p. 299).

Em decorrência desse processo, conforme declara Mello (2006, p. 83), “[...] a população perdeu a familiaridade com o déco levando ao arrefecimento de sua legibilidade” Contudo, no final dos anos de 1990, segundo a autora, com o processo de patrimonialização, houve a possibilidade de ressurreição simbólica dessa arquitetura tradicional. Entretanto, a legibilidade do estilo ainda não foi efetivada pela população como um todo.

Todavia, a imagem de capital art déco é representativa na mídia local, principalmente, em reportagens, folders e propagandas turísticas. Os agentes públicos e privados adotam essa imagem para atrair investimentos e/ou expandir a atividade turística na cidade. Segundo a reportagem “Capital Art Déco” (CURTA MAIS GOIÂNIA, n. 4. Ano 1, abril/maio, 2007), existe “um pedacinho da Europa dos anos 20 em pleno Cerrado. [...] passear pelas ruas do Centro ou do tradicional bairro Campinas é fazer uma viagem no tempo e conhecer um pouco da nossa história arquitetônica.”.

Ainda, na perspectiva de dar à cidade uma imagem fundamentada em sua arquitetura tradicional, o Guia “Turismo e Negócios” divulga que “Goiânia é considerada por alguns estudiosos como a capital do Art Déco. O acervo arquitetônico e urbanístico é o mais representativo conjunto deste estilo no país, construído entre as décadas de 1940 e 1950.” Assim, a cidade, sua arquitetura, sua história, seus significados, enfim, sua paisagem [...] “é o topos no qual as representações sociais desenvolvem e adquirem existência concreta”. (JOVCHELOVITCH, 2000, p. 82).

Pode-se dizer, com base nas discussões anteriores, que essa representação foi elaborada a partir de uma realidade partilhada, pois existe um conjunto arquitetônico reconhecido legalmente e tomado por diversos indivíduos como patrimônio cultural da cidade. De acordo com Guareschi (2000), existe um nível de realidade compartilhada dentro de uma sociedade que permite uma fala possível de ser falada. Isso significa que

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as representações sociais são inscritas dentro de um referencial de pensamento preexistente, complementa Moscovici (2007). Os meios de comunicação interpretam essa realidade e, ao fazer isso, utilizam de mecanismos e de intenções que sustentam a representação. Com isso, atribuem identidades a Goiânia.

Referenciados nas contribuições de Haesbaert (1999), Cruz (2007) e Castells (1999), concebemos a identidade como um processo de construção histórica dos significados sociais e culturais, baseados nas práticas, nos discursos, nos sistemas de classificações simbólicas e nas representações dos grupos sociais. Nessa perspectiva, as representações sociais de Goiânia podem constituir-se em uma base subjetiva na formação de identidades da cidade. Para Hall (2007), as identidades são formadas e transformadas no interior da representação. Percebe-se, então, que as representações discutidas constroem um processo de formação de identidades sociais e também turísticas para Goiânia.

Resta, ainda, entender se a representação social aqui construída é convincente para que os moradores reconheçam a cidade pelo seu patrimônio art déco ou para que muitos queiram visitá-la. A imagem de capital art déco transmite aos olhares dos goianienses a essência da identidade local? É uma identidade, também, construída a partir da relação concreta/simbólica e material/imaginária dos moradores com e no espaço da cidade? (HAESBAERT, 1999).

O estudo realizado por Silva e Mancini (2008, p.28) a respeito da percepção dos usuários do Centro de Goiânia sobre o patrimônio art déco mostra que a maioria dos sujeitos pesquisados “não conhece ou pouco reconhece a arquitetura art déco como um patrimônio constituído, conforme o passado e a história da cidade. O próprio nome art

déco não faz parte das referências desses sujeitos [...]”. Segundo as autoras, “isto

demonstra a falta de conhecimento que eles têm do meio em que vivem. E que a história da cidade vem sendo construída apartada do seu cotidiano”. Os resultados dessa pesquisa não indicam valorização e apropriação do patrimônio como espaço identitário e simbólico para a população de Goiânia. Nesse sentido, o patrimônio não é um mecanismo pelo qual o grupo de moradores define seu universo identitário. Essas considerações nos conduzem às reflexões de Mello (2006), quando a mesma expressa que o art déco, por enquanto, só é decodificado para uma elite. A garantia da

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preservação desse patrimônio é a efetivação do seu significado pela população, complementa a autora.

Subentende-se, então, que a identidade art déco de Goiânia não é um constructo baseado na representação e na apropriação do patrimônio cultural pelos habitantes da cidade. É uma identidade baseada em significados culturais, socialmente atribuídos por grupos com poder de representar. A representação só será eficaz na construção da identidade, se fornecer imagens da cidade através das quais os habitantes possam se identificar. Isso porque, segundo Woodward (2007, p. 18), a “produção de significados e a produção das identidades que são posicionados nos (e pelos) sistemas de representação estão estreitamente vinculados.”

As sínteses anteriores possibilitam-nos o entendimento de que as representações da cidade de Goiânia são distintas para pelo menos dois grupos: o “nós” e o “eles”. Instigam-nos, portanto, a suscitar questões sobre o poder da representação, como forma de definir o que é a cidade e propiciar para que ela seja, conforme afirma Linch (1988), um lócus altamente imaginável.

Ainda a concluir

Considerando a identidade social, de acordo com Penna (1992), como uma representação, entendemos que as representações de Goiânia são representações de identidades que determinados agentes sociais atribuem à cidade. Cruz (2007, p. 100) subsidia essa compreensão ao afirmar que [...] “devido ao seu caráter estratégico, as identidades estão sujeitas à manipulação dos indivíduos ou grupos sociais; elas não existem em sim mesmas independentes das estratégias de afirmação dos atores sociais”. Consequentemente, elas não são, tal como afirma Silva (2007), simplesmente definidas, mas impostas, sujeitas às relações de poder.

Em relação a Goiânia, as representações de determinados agentes sociais podem não coincidir com as representações que a comunidade goianiense faz da cidade, de si e de suas práticas culturais. Elas, provavelmente, configuram a situação apontada por Penna (1992), como alter-atribuição de identidade. Elas constituem classificações, no

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caso, originadas na exterioridade do grupo, no modo como a cidade é reconhecida por alguns sujeitos sociais. Nas palavras de Carvalho (2003, p. 99), “todas as práticas de alter-atribuição produzem significados que envolvem relações de poder que definem o que Eu ou Nós queremos que Ele ou Eles sejam”. Segundo a autora, “para se questionar uma identidade, é preciso ter em mente o que está lhe dando suporte: a representação é claro. É por meio dela que a identidade e a diferença se ligam aos mecanismos de poder”. Com isso, afirma Moscovici (2007, p. 68), [...] “os de quem se falam são forçados a entrar em uma matriz de identidade que eles não escolheram e sobre a qual eles não possuem controle.”

Não obstante, para entender a força dessas representações como construtivas das identidades da cidade, é necessário entender se essas representações e consequentemente as identidades atribuídas a Goiânia são validadas pelos habitantes da cidade. Elas podem, por um lado, produzir um sistema de conhecimento e reconhecimento da população em relação aos atributos da cidade e, por conseguinte, de construção de identidades ligadas à experiência dos moradores com o espaço vivido e suas paisagens. Por outro lado, elas podem apenas expressar um conjunto de significados e valores construídos fora do contexto das representações da maioria da população e segundo os interesses de determinados sujeitos sociais em relação ao espaço público.

A reflexão pertinente, neste contexto, é se as representações da cidade de Goiânia constituem fontes de significados importantes para a sociedade e de identidade da cidade ou são simples papéis definidos por determinados grupos sociais. O desdobramento dessa reflexão, ainda em investigação, implica, conforme destaca Cruz (2007), levar em conta um conjunto de representações e ideologias presentes nas imagens e nos discursos elaborados e sedimentados historicamente pela classe política e pela mídia. Além disso, implica entender os possíveis efeitos das representações nos hábitos da população e na construção das identidades. Em visto disso, é preciso conhecer as experiências culturais e os saberes dos habitantes sobre a cidade. Isso constitui um desafio, aqui posto, que uma vez concretizado, certamente, poderá contribuir para a emergência da pluralidade de leituras da cidade.

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Recebido para publicação em janeiro de 2010 Aprovado para publicação em março de 2010

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