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Dos kystos do Ovario

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Academic year: 2021

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DOS

KYSTOS DO OVÁRIO

THESE

A P R E S E N T A D A A

ESCOLA MEDICOCIRURGICA DO PORTO

PARA SER DEFENDIDA

PELO ALUIY1N0

rime' Swifótuo ew (2/OMja <tyMacãaao

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PORTO

TYP. DA LIVRARIA NACIONAL Rua de D. Pedro. 113-114

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HUNKSMli DO PORTO

D i r e c t o r

0 Excm.0 Snr. Conselheiro Dr. Francisco d'Assis Sousa Vaz

Lente jubilado.

S e c r e t a r i o

O Illm.0 Snr. Agostinho Antonio do Souto.

C O R P O CATHEDRATICO

jLentes p r o p r i e t á r i o s

Os Illm.os e Excm.™ Snrs.

i.* cadeira — Anatomia descriptiva.

2." cadeira — Physiologia

3.» cadeira— Historia natural dos medicamcn tos. Materia medica

4.» cadeira. — Pathologia geral. Pathologia ex terna e therapeutica externa . 5.a cadeira. — Operações cirúrgicas e apparc

lhos cora Fracturas, Hernias e Luxações 6.1 cadeira. — Partos, moléstias das mulheres

de parto e dos recem­nascidos. cadeira. — Pathologia interna, Therapeu

tica interna e Historia medica, cadeira. — Clinica medica . cadeira. — Clinica cirúrgica

10." cadeira. — Anatomia pathologica. Deformr dades e aneurismas . . . . I I .1 cadeira. — Medicina Legal, Hygiene privada

e publica e toxicologia geral . Lente de Medicina jubilado .

7.

8.» 9.

Luiz Pereira da Fonseca, Presidente. José d'Andrade Gramaxo.

João Xavier d'OIiveira Barros. Antonio Ferreira Braga. Caetano Pinto d'Azevedo. Manoel Maria da Costa Leite. Dr. Francisco Velloso da Cruz. Antonio Ferreira de Macedo Pinto. Antonio Bernardino d'Almeida. José Alves Moreira de Barros.

Dr. José Fructuoso Ayres de Gouvêa Osorió. José Pereira Reis.

L e n t e s s u b s t i t u t o s

Secção medica . Secção cirúrgica

I Dr. José Carlos Lopes Junior, j Pedro Augusto Dias. ( Agostinho Antonio do Souto. ■ ( João Pereira Dias Lebre.

Isentes d e m o n s t r a d o r e s

Socc­Sn m Prtir a Joaquim Guilherme Gomes Coelho.

S e S Sruîgka \ . . . . Dr.Viguel Augusto Cesar d'Andrade. A Escola não responde pelas doutrinas expendidas na dissertação e enunciadas nas proposiçõe..

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A SEU IRMÃO

EM TESTEMUNHO

DE

AMOR FRATERNAL S RECONHECiBA GRATffiÃÔ

» K U I C A

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I N T R O D U G Ç A O

Où la société est sans femme, il n'existe plus de bien entre les hommes, plus de douceur, et des charmes dans le commerce de la vie.

VlREY.

Não é moderno o assumpto de que me vou occupai-, nem tão pou-co elle tem sido indifférente a muitas e respeitáveis auctoridades, que magistralmente o têem tratado, para que eu pretenda apresentar um trabalho, que aos attributos de perfeito e completo reúna o da novidade. Similhante pretenção, além d'impossivel, seria incompatível com o meu acanhamento intellectual.

A necessidade d'ultimar meus trabalhos escolares, e o desejo d'obter uma auctorisação legal para poder alcançar o fim a que me destinei — satisfazer minha vocação e suavizar as dores á humanidade — me impelliram a lançar os olhos pelo vasto campo das sciencias medicas, para ver se, d'entre tantos, podia escolher um ponto, que mais se coadunasse com o meu pouco cabedal scientifico e diminutas forças intellectuaes.

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pro-— 8 pro-—

va final, tive sempre em vista que o meu trabalho tivesse alguma utilidade pratica. No assumpto, que me proponho a estudar, julgo ter alcançado o fim a que aspirava.

Hoje que já os kystos do ovário, esse flagello, que no dizer d'uma nossa illustre auctoridade tantas victimas faz na metade mais

sym-pathica da espécie humana não se julgam incuráveis, porque os

pro-gressos da medicina e cirurgia praticas toem salvado muitas infelizes accommettidas d'esta doença, e têem triumphado de sua marcha in-sidiosa e destruidora, que abandonada dos soccorros da arte é sem-pre fatal ; e que a nossa medicina pratica, que caminha a par da d'ou-tros paizes, que se crêem mais adiantados, se préoccupa seriamente com o tratamento d'esta terrível affecção, julgo mui opportuno que ella seja estudada.

Do tratamento d'esta moléstia me occuparei com superficialidade : cônscio do valor incontestável da anatomia pathologica e diagnostico d'esta doença para lhe instituir therapeutica racional, e porque nem a natureza deste trabalho, nem o pouco tempo de que posso dispor me permittem extensão demasiada, darei de mão a esta ultima, para me deter mais um pouco no estudo da anatomia pathologica e dia-gnostico differencial dos kystos do ovário.

Com este intuito compulsei muitos livros, memorias e jornaes, e do muito que estudei e meditei apresento o que colhi. Será deficien-tissimo meu trabalho, mas tenho a ingenuidadade de confessal-o; os meus recursos scientificos e parco engenho não me auclarizam a mais.

Dividirei o assumpto em quatro partes :

Na primeira estudarei d'uma maneira succinta e geral a anatomia dos ovários ;

Na segunda tratarei da anatomia pathologica dos kystos do ovário; Na terceira de seus symptomas e diagnostico differencional ; Na ultima darei idêa geral do seu tratamento mais racional e de que se tem colhido mais vantagens.

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PRIMEIRA PARTE

ANATOMIA DOS OVÁRIOS

La connaissance des organes malades suppose

0 , nécessairement des mêmes organes dans l'état d'in-tégrité.

CnnvEimiEK. «Anatomie path, gen.»

Os ovários, testes muliebres, são dos órgãos mais importantes da economia animal ; sua funeção é a secreção dos óvulos ; fornecem,

como os testículos, um dos elementos indispensáveis á reproducção da espécie.

Collocados na prega posterior dos ligamentos largos aos lados da parte mais elevada do utero, a cujos ângulos adherem por um cor-dão musculo-membranoso, o ligamento do ovário, por diante do re-cto, de que estão separados pelas circumvoluções mais inferiores dos intestinos delgados, e pela parte posterior das trompas uterinas e li-gamentos redondos, que os separam da bexiga, os ovários acham-se transversalmente lançados ao nivel do estreito superior da bacia conjuntamente com osiigamentos largos, que servindo-lhes de sus-tentáculo, lhes dão a direcção, e íixando-os á excavaçâo pélvica lhe deixam apenas mobilidade sufficiente para se accommodarem aos dif-férentes estados e posições do utero.

D'um volume, que varia com as edades, com os indivíduos e com as circumstancias em que estes se acham, os ovários medem, termo

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medio, quatro centímetros de comprimento, dois d'altura e um d'es-pessura.

De forma proximamente ovóide e ligeiramente achatada da parte anterior para a posterior, offerecem ao estudo : duas faces obliqua-mente lançadas de cima e de traz para baixo e para diante, de su-perficie esbranquiçada, que sendo lisa até á puberdade, principia des-de que se estabelece menstruação a apresentar cicatrizes e des- desigual-dades, que, resultantes da deliiscencia das vesículas ovaricas augmen-tam progressivamente até á velhice, em que os ovários consideravel-mente atrophiados offerecem uma superficie rugosa e desigual : dois bordos transversaes, um superior e posterior convexo e livre com o aspecto das duas faces> que divide ; outro inferior e anterior rectilí-neo, que dá inserção a dobra do peritorectilí-neo, que constitue a prega pos-terior do ligamento largo. Por este bordo entram as artérias nutri-tivas do órgão, e sahem as veias e lymphalicos, que d'elle emanam por um ponto que os anatómicos denominam Mio do ovário. Na sua extremidade interna se fixa o ligamento do ovário, na externa uma •

das franjas do pavilhão da trompa, que dirigindo-se da parte inferior d'esté órgão para a extremidade externa do ovário, constitue o cha-mado ligamento da trompa : em toda a sua extensão se inserem umas fibras musculares e aponevrolicas, que constituem o ligamento

redon-do posterior ou lombar descripto por M. Rouget.

ESTRUCTURA. DO OVÁRIO

Dois invólucros e um parenchyma especial constituem todo o teci-do teci-do ovário.

Dos invólucros, o primeiro, o mais exterior é de natureza sorosa, formado por uma dependência do peritoneo, que constitue o ligamen-to largo, involve o ovário por ligamen-toda a sua superfície, menos no seu bordo inferior a que adhere; é o invólucro peritoneal.

Immediatamente por baixo d'esta camada e com ella intimamente unida encontra-se uma membrana de natureza fibrosa,, branca, densa e resistente ; é a tunica albuginea, a membrana propria do ovário. Esta membrana, que mede Va millimetre d'espessura, está tão

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exa-— 11 exa-—

ctamente applicada sobre o parenchyma do ovário, e adhere-lhe de maneira tal, que, sem enviar prolongamentos ao sea interior, não é possível marcar limites entre estas duas partes do órgão.

O parenchyma do ovário, geralmente conhecido pela denominação de stroma, constitue a parte central do órgão, e involvido exterior-mente pelo peritoneo e tunica albuginea, é composto d'uma subs-tancia avermelhada e densa, formada d'um tecido conjunctivo fibroi-de, onde caminham os vasos do órgão extremamente flexuosos, e on-de estão on-depositadas as vesículas ovaricas tanto mais numerosas e on- des-envolvidas, quanto mais se aproximam do bordo superior da glân-dula.

As vesículas ovaricas, ovisaccos, também conhecidas pelo nome do auctor, M. Graaf, que primeiro em 1672 deu d'ellas uma descrip-ção completa, encontram-se na parte mais peripheric! do stroma ; (lo-tadas de forma espherica, seu volume varia desde um millimelro de diâmetro, que medem as que estão mais profundamente collocadas, até dez, doze e mais, que medem as que se aproximam da superficie do órgão, seu numero, que também é excessivamente variável, quinze a vinte para cada glândula segundo uns, trinta a cincoenta segundo outros, podendo em casos excepcionaes encontrarem-se duzentas (Kól-liker), diminue á medida que os indivíduos se adiantam em edade, e que os órgãos se atrophiam e degeneram chegando muitas vezes a desapparecerem completamente na extrema velhice.

Cada uma das vesículas de Graaf chegadas ao seu perfeito desen-volvimento é composta d'um invólucro e um contido.

O invólucro, que M. Kõlliker compara a uma membrana mucosa, apresenta: 1.° uma tunica fibrosa e pouco vascular, unida ao stroma por tecido conjunctivo assaz laxo, e composta, segundo Baer, por duas camadas, uma externa mais clara e densa, outra interna mais espes-sa, laxa e avermelhada, é tapetada por uma membrana propria amor-pha e mui delicada : 2.° um epithelio, camada granulosa que tapeta toda a superficie interna da vesícula, e que medindo 0,m018 a 0,m027

d'espessura, forma na parte mais elevada da mesma vesícula corres-pondente á superficie livre do ovário por accumulaçâo das cellulas, que o constituem, o chamado disco proligero ou cumulus proliger, Na espessura do disco proligero existe o ovo, vesícula espherica de Vi a Vs de millimetre de diâmetro e formada por um invólucro,

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membrana hialina, transparente e muito elasticade0,mm009a0,mm01

d'espessura, e o vitellus, liquido viscoso e d'uma infinidade de gra-nulações d'entre as quaes sobresahe um núcleo vascular de 0,mm05

de diâmetro, que tem o nome vesícula germinativa, a qual dentro em si encerra uma substancia transparente e um nucleolo homogéneo peripherico, arredondado de 0,mm007 de diâmetro e que se chama

mancha germinativa. As cellulas, que constituem a membrana

gra-nulosa das vesículas de Graaf, estão dispostas por camadas, affectando a forma polygonar, e encerrando no seu interior um núcleo com al-gumas granulações amarelladas.

Dentro das vesículas de Graaf existe um liquido transparente, um tanto amarellado, de composição análoga ao soro do sangue, e no qual nadam différentes elementos, como granulações, nucleolos, núcleos e cellulas, que não são outra cousa mais que porções destacadas da membrana granulosa. (Kõlliker. Elem. d'histologie humaine).

Esta doutrina sobre a organisação e estructura dos ovários, geral-mente adoptada, não é hoje acceita por todos, e uma theoria nova, de que darei idèa geral, não porque ella tenha grande importância para o assumpto, que me proponho tratar, mas por me parecer que explica mais satisfatória e completamente'as funcções physiologicas dos ovários, nasceu ha poucos annos entre os histologistas allemães e tem sido seguida por muitos escriptores francezes.

Segundo estes auctores, o invólucro peritoneal do ovário não é mais que uma simples camada d'epithelio pavimentoso, e existe apenas em estado de vestígio ; da tunica albuginea nem vestígios s'encontram, e s

o stroma nunca foi a sede das vesículas de Graaf!

N'esta theoria cada ovário é composto de duas partes mui distin-ctas, que representam papeis diversos ambos tendentes ao mesmo fim — a secreção e excreção dos óvulos. D'estas duas partes uma é su-perficial, de côr branca, resistente e d'apparencia homogénea ; outra central de côr avermelhada, de consistência esponjosa e formada d'e-lementos diversos, constitue as 7 oitavas partes do órgão ; aquella é a sede exclusiva das vesículas de Graaf, e chama-se porção

grandu-lar ou oviginea, esta, que é essencialmente constituída por vasos,

cha-ma-se porção vascular ou bulbosa; a primeira mede Va a u t n

milli-metre d'espessura pouco mais ou menos, tem sido especialmente

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cripta sob o nome de tunica propria ou fibrosa, a segunda involvida pela primeira fornece-lhe os materiaes de sua nutrição.

A porção bulbosa, que dá a forma ao ovário e serve d'apoio á ca-mada glandular, é de consistência mais molle e aspecto desigualmente avermelhado. Em sua composição entram: fibras, musculares lisses de diversas procedências, filbras de tecido conjunctivo em muito me-nor quantidade, divisões arteriaes, filhas do tronco utero-avarico muito numerosas e flexuosas afectando a forma d'espira, veias relativamente muito volumosas que constituem uma grande parte da porção bulbo-sa, vasos lymphalicos e nervos. O bulbo, que Rouget levou á classe dos tecidos erecteis, e de que na verdade mui pouco diffère, tem um duplo fim, sustentar as vesículas de Graaf pondo-as em contacto com o pavilhão da trompa, e dar-ihe os elementos de sua nutrição.

A porção peripherica ou oviginea, considerada até hoje como um invólucro do ovário, constitue a sua parte fundamental e a mais im-portante como aquella que tem a seu cargo a producçâo dos óvulos. Em sua composição entram partes que lhe são communs com o bulbo e que d'elle procedem, como : fibras musculares lisses, vasos, ner-vos e tecido conjunctivo; e partes que lhe são proprias, as vesículas ovaricas ou ouvisaccos.

As vesículas ovaricas ou de Graaf consideradas como tendo a sua sede exclusiva na substancia medullar do ovário e em numero de trin-ta, termo medio, têem posição mui diversa e numero muito mais ele-vado do que o que até hoje lhe tem sido dado. A analyse chimica e o microscópio, que tanto têem estendido o campo da anatomia normal e pathologica em particular, e o das sciencias medicas em geral tam-bém sobre a anatomia dos ovários nos fez uma descoberta importan-te, mostrando-nos a verdadeira sede e numero das vesículas de Graaf. Assim por aturados estudos por meio dos reagentes e microscópio, já sobre o ovário inteiro, já sobre uma ou outra de suas partes, illustres e sábios histologistas modernos chegaram a conhecer que não só era a porção peripherica dos ovários a sede exclusiva das vesículas de Graaf, mas que o seu numero era immensamente superior áquelle que até então se lhe tinha dado.

O Snr. Sappey, que estudou os ovários desde os primeiros mezes da vida extra-uterina até á edade da puberdade, viu as vesículas no campo do microscópio mais numerosas que as estrellas no

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firmamen-— 14 firmamen-—

to! cujo numero de 300:000 a 400:000 para cada ovário chegou a

determinar, numero que se conserva sempre o mesmo e constante até á puberdade, em que periodicamente diminue pelo estabelecimen-to das funções catameniaes; observou que a mulher no estado em-bryonario possue já todas as vesículas ovaricas que lhe são necessárias para mais tarde preencherem a funcção a que são destinadas : foi mais adiante o illustre chefe dos trabalhos anatómicos na faculdade de medicina de Pariz, chegou a conhecer a verdadeira causa d'erro de todos os que seguiram a observação do sábio physiologista hollan-dez: depois da puberdade 15 a 20 das vesículas por seu maior de-senvolvimento cahem, íicando simplesmente em contacto com a face interna da membrana oviginea, na porção bulbosa onde facilmente se julgou que ellas se geravam.

Eis como facilmente s'explica e melhor se comprehende como a mulher pode perder durante todas as suas revoluções monstruaes 360 a 420 vesículas de Graaf.

Bem longe me levaria a innumeração das vantagens, que esta no-va theoria tem sobre a antiga, pela mais fácil explicação, que nos dá d'alguns phenomenos physiologicos dos ovários, mas a natureza do meu trabalho, que se destina a assumpto mui diverso, me obriga a termi-nar esta primeira parte.

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SEGUNDA PARTE

ANATOMIA PATHOLOGICA DOS KYSTOS DO OVÁRIO I

Origem e divisão dos kystos do ovário

Os kystos do ovário, raros nas primeiras edades da vida, são mui frequentes na adolescência e velhice, cujos períodos gozam grande in-fluencia em sua marcha e terminação, que se é morosa no segundo, é rápida e quasi sempre fatal no primeiro. Affectam indistinctamente ambos os ovários, e na eteologia da doença bem pouco adiantada, não vejo predisposição mais frequente do ovário direito, que alguns au-ctores têem julgado mais sujeito a ser invadido : as estatísticas que el-les chamam em favor d'esta asserção não são sufllcientes para a fun-damentar, e as condições que mais ou menos podem favorecer o des-envolvimento da moléstia dâo-se, creio eu, em anjbos os órgãos com egualdade.

Varias discussões e controvérsias se têem suscitado sobre a ver-dadeira origem dos tumores kysticos dos ovários, e diga-se a verdade, a impossibilidade de resolver duma maneira certa tão difficil questão abriu campo a hypotheses innumeraveis. O snr. Gruveilhier affirma que são as vesículas de Graaf, pequenos kystos em miniatura, como lhes chama Cazeaux, a origem e séde d'esta doença, cuja evolução

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elle seguiu desde que estes tumores altingiam o volume d'uma cereja até ao seu desenvolvimento o mais completo. Esta opinião é hoje seguida por respeitáveis histologistas, que, como Hogkin, Kiwisch, Paget e outros concordam em ver n'estes productos anormaes simples dila-tações das vesículas de Graaf; além de ponderosas razões que ad-duzem em favor de similhante hypothèse sobresahe a da maior fre-quência da moléstia no período da vida em que funccionam as vesí-culas. Pensam outros que é o tecido próprio do ovário, o stroma, a origem exclusiva dos kistos, no seio do qual se desenvolvem. Outros, e d'esté numero é Huguier, admittindo que estes tumores nascem no tecido próprio do ovário, são d'opiniâo que uns tem por origem as vesículas de Graaf, outros o stroma. Diversas outras hypotheses têem sido apresentadas por vários auctores que d'esté assumpto se têem occupado, mas todas ellas não satisfazem mais nem explicam melhor o phenomeno. A questão é difficil de resolver, e é mais pelo raciocí-nio que pelo exame de factos bem averiguados que se podem formu-lar conclusões prováveis.

Com tudo é possível que os différentes kystos dos ovários tenham uma origem distincta, tendo uns por ponto de partida as vesículas de Graaf, outros o próprio stroma do ovário etc. ; porem até hoje ne-nhum facto positivo veio ainda confirmar d'uma maneira absoluta uma ou outra d'estas theorias. E' a de Cruveilhier a que tem sido mais geralmente adoptada, e a que melhor satisfaz : pelo desenvol-vimento hypertrophico d'uma só vesícula se forma um kysto simples pelo desenvolvimento simultâneo de duas ou mais vesículas, formam-se os kystos múltiplos ou multiloculares, e os kystos compostos re-sultam indubitavelmente de kystos secundários, que tiram origem de germens desenvolvidos nas paredes dos kystos primitivos, e que a seu turno dão origem a kystos terciários dando aos kystos compostos o caracter d'areolare|, que os distingue na generalidade.

Tem-se dividido de différentes modos os kystos do ovário, e para facilidade de estudo tem-se feito d'elles différentes variedades : uns, tendo só em consideração o logar onde se desenvolvem, dividiram-os em superficiaes e profundos, e chamaram superficiaes aos kystos que independentes do ovário nascem á sua superficie ou nas visinhanças de vesícula, que se separou da substancia do ovário. Estes kystos, que parecem mais tirar origem dos canaliculus que constituem o

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or-— 17 or-—

gão de Rosenmulter ou do próprio ligamento largo, nunca devem ser considerados nem confundidos com os kystos do ovário, ainda que re-sultantes de vesícula, que por seu desenvolvimento o deixou livre. Os profundos produzidos pelo hypertrophico desenvolvimento d'uma ou mais vesículas de Graaf, são os kystos próprios do ovário.

Outros attendendo mais á estructura de suas paredes, á disposi-ção de seus loculos e á natureza do liquido que encerram, têem es-tabelecido na descripção d'esta moléstia divisões de grande utilidade para o seu diagnostico e tratamento.

A divisão mais geral que se tem feito dos kystos, é a que os se-para em duas grandes classes: kystos simplices e compostos; seguirei esta divisão n'este meu trabilho, e estudarei primeiro os caracteres que são próprios, e depois os que são communs a estas duas classes de kystos.

II

CARACTERES PRÓPRIOS AOS KYSTOS DO OVÁRIO

1.

Kystos simplices

Os kystos simplices apresentam-se debaixo de formas différentes segundo a variada disposição interior, que suas paredes podem affec-tar, d'onde vem a sua divisão em différentes variedades. São simples-mente uniloculares quando seu sacco é tão simples e tão regularsimples-mente disposto que se assimilham perfeitamente ás membranas flbro-sorosas normaes invertidas as suas faces : constituem a primeira variedade de Cruveilhier. Outros, os kystos multílocidares, apresentam no séu in-terior septos mais ou menos completos, que dividem a sua cavidade em um numero considerável de loculos communicando entre si : for-mam a segunda variedade de Cruveilhier. Vem ainda a terceira

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- , 18 —

riedade de Cruveilhier, que é constituída por aquelles kystos, cujas paredes, no seu interior, apresentam certas vegetações ou producções mamilonadas mais ou menos numerosas, cujo volume varia desde o tamanho d'urna avela ao de uma laranja e mais. Estas vegetações são geralmente constituídas por cellulas epilbeliaes de núcleo duro, por tecido fibroso e mesmo muitas vezes encephaloide ou areolar : esta variedade de kystos pertence á classe dos compostos. Finalmente na classe dos kystos simplices colloca ainda Cruveilhier. uma quarta va-riedade que denomina kystos flaccidos, porque adquirindo volume con-siderável, em logar de offerecerem tensão e resistência elástica, como o geral dos kystos, mostram uma ílaccidez extrema, e distendendo as paredes abdominaes descem pela arcada crural sobre a face anterior das coxas, chegando alguns ao nivel dos joelhos.

Os kystos multiloculares não são outra coisa mais que um aggre-gado de kystos resultantes do simultâneo desenvolvimento hypertro-phico d'outras tantas vesículas de Graaf, cujas paredes por seu suc-cessivo crescimento chegaram a tocar-se, formando simples septos que separam suas cavidades, e que depois se romperam para as porem em communicação umas com outras por aberturas mais ou menos largas, regulares e quasi sempre circulares. Não é raro a um exame superficial o confundirem-se estes kystos com os compostos areolares, principalmente se uma cavidade adquiriu grande desenvolvimento em relação ás outras ; n'estas circumstancias convém attender, como nota Paget, que os kystos secundários que se desenvolvem em volta do kysto principal, são simplesmente contíguos e ficam em contacto re-ciproco por juxtaposição de suas paredes, em quanto que nos kystos compostos os kystos secundários acham-se contidos nos primitivos por inclusão ou desenvolvidos nas suas paredes.

ESTRUCTUHA. — As paredes dos kystos ovaricos simplices são formadas de duas camadas distinctas: uma sorosa dependente do pe-ritoneo, cujos caracteres perde com a marcha da doença, outra fibro-sa, é a propria do ovário no seu estado normal, e cuja espessura va-ria de dois a muitos millimetros segundo a antiguidade dos kystos e as phases porque ellestêem passado; ainda, alémd'estas, descrevem alguns histologistas uma terceira camada muscolosa proveniente, mui provavelmente, das fibras musculares lisses, que entram na composi-ção do ovário e uma camada epithelial característica, que forra toda

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"o

— 19 —

a superficie interior do kysto. Todas estas camadas eslão de tal manei-ra adhérentes e tão unidas entre si, que é muito difficil sepamanei-ral-as distinctamente sem grande esforço de dissecção.

A parede interior do kysto mostra-se com diversos aspectos e soffre modificações différentes segundo a natureza do liquido que contem : assim se o liquido é purulento, ella é fungosa, tomentosa, avermelha-da, mui similhante em aspecto ás membranas mucosas ou antes a uma membrana pyogenica : se o liquido é hematieo e o sangue está mais ou menos alterado, ella passa por todas as mudanças e transfor-mações, que passam as paredes de todos os hematoceles ; ora se en-contram coágulos fibrinosos adhérentes ás paredes do sacco ; ora fal-sas membranas mais ou menos espesfal-sas formando muitas camadas estratificadas, etc. : ainda dentro de kystos, que tenham sido injecta-dos muitas vezes se encontram falsas membranas e vestígios d'outras modificações, porque os fez passar o liquido irritante da injecção. Alem d'estas alterações, que estão ligadas á natureza do liquido dós kystos, outras se encontram proprias de suas paredes, como placas cartilagineas e calcareas, que não é raro existirem n'ellas encrustadas ; Cruveilhier viu um kysto ovarico do volume d'uma cabeça de creança, cujas paredes se tinham tornado osteo-calcareas.

Entram também na estructura das paredes dos kystos ovaricos veias e artérias : as veias são dispostas em dous planos : um superficial na espessura da camada fibrosa formado de ramos cruzados em diversos sentidos, medindo os mais grossos 7 a 8 millimetres de diâmetro (Dubreuil) e mui similhante aos seios da dura-mater; o plano pro-fundo é constituído por ramos venosos muito mais finos, ramificados na camada profunda da parede do kysto, e enviando os seus prolon-gamentos aos septos dos kystos mulliloculares; são mui tenues e ar-borescentes. As artérias são relativamente muito numerosas e menos desenvolvidas, apenas apreciáveis proximo ao pedículo.

CONTIDO. — E' de tanta importância o estudo das matérias con-tidas no interior dos kystos, quanto é certo que o exame attento d'essas matérias nos dá o melhor elemento de diagnostico differencial d'esta doença. Supposto que o liquido dos kystos simplices varia mui-to com a sua edade, phases différentes porque elles têem passado etc; pode-se com tudo dizer d'uma maneira geral que n'aquelles, que não têem soffrido inflammação nem foram ainda punccionados, o seu

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liqui-— 20 liqui-—

do é uma sorosidade citrina, clara, perfeitamente transparente, simi-lhante á sorosidade de todas as hydropesias; outras vezes é d'um amarello côr de palha similhante ao soro do sangue com vestígios d'albumina. Mas se o kyslo tem sido punecionado uma e mais vezes, se está mui distendido, se é mullilocular, e um ou mais loculos se romperam e communicaram entre si, o liquido apparece mais ou me-nos avermelhado; sangue misturado com certa quantidade de soro, sangue mais ou menos puro, liquido de côr mais ou menos carrega-da etc., são tudo variecarrega-dades de côr devicarrega-das á maior ou menor quan-tidade de sangue que se derramou no interior do kysto, misturando-se com o liquido que elle continha. Também é frequente sèr o liqui-do albuminoso como a branca d'ôvo, ou consistente e glutinoso co-mo agua de gomma.

Se o kysto tem sido invadido d'inflammaçao, acha-se o seu liqui-do misturaliqui-do com maior ou menor quantidade de pus, com flocos albuminosos ou pseudo-membranosos. Esta purulenàa do kysto, como lhe chama o snr. Dauchet, pode sêr devida ou a um trabalho phlegma-sia espontâneo, que se deu no kysto, ou a manobras operatórias di-versas.

Não é raro o liquido dos kystos mudar d'uma para outra puneção, e o que era soroso ou soro-sanguinolento na primeira, tornar-se san-guinolento ou mesmo purulento na segunda; assim como um liquido soroso na primeira puneção pode ser substituído por liquido gelati-noso nas puneções seguintes. E', ainda que raro, todavia possível, na opinião de Cruveilhier, que o liquido d'um kysto fdamentoso á pri-meira puneção se torne soroso nas punções seguintes.

Finalmente no liquido de certos kystos, e principalmante hemati-cos, encontra-se choleslrina em maior ou menor quantidade.

I 2.°

Kystos compostos

Kystos uni ou multiloculares associados a kystos areolares ou vesi-culares de maneira a formarem um só tumor, constituem os kystos

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— 21 - •

compostos em cuja classe devem também sêr contados os

simplesmen-te areolares ou vesiculares, que Kiwisch denomina proligeros ou

cys-toides. São formados por uma espécie secundaria e talvez tercearia

de kystos, que se desenvolvem nas paredes do kysto primitivo, onde, na camada fibrosa, existem germens innumeraveis que lhes dão ori-gem. Este desenvolvimento de kystos secundários na parede dos pri-mitivos é geralmente endógeno, e estes kystos inclusos elevam-se na face interior do sacco formador ; outras vezes este desenvolvimento é exógeno, e estes kystos de nova formação elevando-se na superficie externa do sacco, tornam-o desigual e lobulado. O medico inglez Wil-son Fox estudou minuciosamente debaixo do campo do microscópio estes kystos secundários e denominou-os excrescências, que dividiu em excrescências papillares, excrescências villosas e excrescências

glandulares.

Na estructura dos kystos compostos, posto que entram os mesmos elementos que nos kystos simplices, dependentes egualmente das di-versas camadas que compõem o ovário, com tudo ella offerece par-ticularidades, que muito convém mencionar. Muitas vezes as paredes dos kystos compostos são constituidas por um tecido areolar, que mos-tra o aspecto, quando cortado, das cellulas d'um favo de mel, cujas malhas communicam ordinariamente entre si e contêem um liquido filamentoso, viscoso, sendo necessário recorrer á expremedura do kys-to para o fazer sahir de suas cavidades. Outras vezes estas areolas contêem uma materia colloide, ou uma materia similhante ao mel branco por sua có*r e consistência. Este tecido areolar, ora existe dis-seminado por toda a parede do kysto, ora se accumula em certos pontos em maior ou menor expessura. Quando o kysto primitivo é assaz desenvolvido, pode o liquido, que enche o seu maior loculo ter qualidades diversas das do liquido que occupa a parte vesiculosa do tumor. Entram ainda na classe dos kystos compostos os kystos végé-tantes de Cruveilhier que acima descrevi, e aquelles em cujas paredes existem outros productos pathologicos, taes como massas fibrosas, en-cephaloides etc. Finalmente suas paredes são susceptíveis de todas as transformaçõese mudanças porque passam as paredes dos kystos sim-plices.

Em conclusão, para terminar o mais que ha a dizer sobre a histo-logia dos kystos compostos, transcreverei aqui uma parte do

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intelli-— 22 intelli-—

gente estudo que fez o digno preparador e conservador do museu da Escola Medico-Cirurgica de Lisboa, o snr. Amado, sobre a anatomia patbologica d:um kysto composto, extirpado pelo illustre professor da

mesma Escola o snr. A. M. Barbosa (1).

« Atravez do peritoneo vê-se a camada de tecido fibroso proveniente da hypertrophia do estroma do ovário, dando ao tumor uma côr d'um branco-sujo.

« Na camada sub-peritoneal observam-se numerosos vasos, sendo os mais volumosos na parte posterior e inferior.

« A espessura das paredes do tumor varia entre 0,m005, e 0,m0005,

sendo mais delgados na parte superior e posterior : em alguns pontos, onde offerecem menos espessura, dilaceram-se com muita facilidade.

« Interiormente é constituído por kystos em numero não inferior a 150, de grandezas muito variadas desde 1 centímetro cubico até um millimetre.

« Os kystos mais volumosos, em numero de três, quasi eguaes em desenvolvimento, têem a sua sede na parte superior e posterior do tu-mor. Na parte anterior e inferior, no ponto correspondente á insersão do pavilhão da trompa, observa-se um aggregado de pequenos locu-los parecendo serem as vesículas de Graaf d'uma porção do ovário, que apenas começava a soffrer a degeneração kyslica.

« Dos diversos kystos secundários uns são simplesmente contíguos, outros formam relevo no interior d'outros maiores, constituindo os chamados kystos proligeros ou cystoides (Kiwisch).'

« Observando attentamente a superfície interna das paredes dos grandes kystos, nota-se, em alguns pontos, peguenas vegetações epi-theliaes, sendo umas sesseis, outras pediculadas, e as que toem sido observadas por Hogdkin, Kiwisch, e Farre.

« O liquido extraindo dos diversos loculos offerecia propriedades différentes :

« Límpido em uns, branco sujo ou anegrado em outros, mais ou menos viscoso em todos, sendo tratado pelo calor e acido azotico de-nuncia a albumina, que tem disolvida.

« O liquido límpido é o menos viscoso, e turva-se apenas pelos

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reagentes que coagulam a albumina : a tintura d'iodo, posta em con-tado com o liquido extrahido de qualquer dos kystos não adquire a cor azul.

« Subrnettido o liquido ao microscópio observam-se numerosos corpúsculos granulosus, de grandezas variáveis entre 0,mm006 e

O,mm06, análogos uns aos glóbulos de muco, outros a verdadeiras

ceifarias epitheliaes : estes corpúsculos encerram numerosas granula-ções, e os maiores encerram um núcleo.

111

Caracteres communs aos Kystos do ovário Os kystos do ovário, assim como têem caracteres anatómicos pró-prios a cada classe que os distingue uns dos outros, assim também os têem communs que os distinguem d'outras affecções que mais po-dem confundir o seu verdadeiro diagnostico; n'este caso estão os ca-racteres tirados da sede, volume, relações, complicações etc., que passo a descrever.

SEDE. — Os kystos ovaricos, que ficam contidos na excavação da bacia em quanto seu desenvolvimento não excede certos limites, vão subindo, á medida que seu volume augmenta, ao estreito superior, e collocam-se na fossa iliaca do lado correspondente ao ovário affe-ctado. Esta regra todavia não è geral ; factos ha de kystos nascidos d'um ovário apparecerem collocados na fossa iliaca do lado opposto.

FORMA. — De forma muito variada, os kystos ora se apresentam de superficie lisa arredondada ou ovalar, ora são bosselados e des-ignaes. Segundo a forma e disposição interior de suas paredes, assim os kystos do ovário são uni ou pluriloeulares, areolares ou vesicu-lares, simplices ou compostas.

RELAÇÕES. — As relações dos kystos ovaricos variam com a se-de, forma, e volume d'esta doença. Ern quanto não excedem certo volume, e não sahem da pequena bacia sustentam com o recto e ór-gãos genito-urinarios relações que perdem logo que sobem ao

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estrei-— 24 estrei-—

to superior, e vão coliocar-se na cavidade abdominal. Do mesmo mo-do um kysto affectará certas relações com o intestino cego se occu-pa o ovário direito, c affectará outras com o S iliaco se occuoccu-pa o ovário esquerdo.

Para proceder com methodo, e a exemplo dos melhores auctores, estudarei as relações dos kystos do ovário com os órgãos com que se podem achar em contacto por seu progressivo desenvolvimento ; assim estudarei as suas relações com as paredes abdominaes, com os intestinos, com o grande epiploon, a bexiga, as ureteres, as trompas, os ligamentos redondos etc.

1.° PAREDES ABDOMINAES. — Os kystos ovaricos affectam re-lações com as paredes abdominaes, que variam com o seu volume e sede. Desde que o kysto passa o estreito superior, sobe por dian-te da massa indian-testinal, e em contacto immediato com a face posdian-te- poste-rior da parede abdominal, mais para a direita ou para a esquerda se-gundo o ovário affectado; chegando, quando o seu volume é exces-sivo, a encher toda a cavidade abdominal e ambos os hypochondrios, não se podendo conhecer bem qual dos ovários é o doente.

2.° INTESTINOS. —As relações dos kystos ovaricos são différen-tes para com os indifféren-testinos grossos e delgados.

Os intestinos delgados são impellidos pelo successivo desenvolvi-mento do kysto para cima e para a parle posterior, indo collocar-se por baixo e por diante do estômago no hypochondrio esquerdo, quan-do o kysto chega ao epigastrio.

As diversas partes do intestino grosso ficam geralmente occupan-do suas respectivas posições mais ou menos comprimidas, segunoccupan-do o maior ou menor crescimento do kysto: as porções verticaes ficam aos lados do tumor a transversal nos hypochondrios e epigastrio. Esta regra todavia não é geral ; existem factos e o snr. Cruveilhier cita uma observação na sua obra de anatomia pathologica geral, em que o cego e o colon foram arrastados pelo desenvolvimento d'um kysto ovarico, e comprimidos por baixo do fígado com a parte di-reita do colon transverso. Além d'estas relações geraes dos kystos com os intestinos, elles sustentam outras com o cego, S iliaco e com o recto, que dependem de sua sede e volume. Quando o seu ainda pequeno crescimento não os deixa sahir da excavação da bacia, os kystos do ovário direito têm relação de contacto com o cego e colon

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ascendente, quando occupam o ovário esquerdo com o S iliaco e co-lon descendente, relações, que muitas vezes produzem accidentes de compressão e de retenção das matérias fecaes de tal ordem, que em pouco tempo podem ter uma.terminação fatal.

3." EPIPLOON.— Por adherencias, que antes do desenvolvimento do kysto se estabeleçam entre o grande epiploon e a parede abdo-minal, pode esta ficar separada do kysto por aquelle que então co-bre sua face anterior em parte ou no todo.

4.° BEXIGA E URETERES. — Assim como os kystos do ovário, pop sua compressão sobre a uretra, collo e baixo fundo da bexiga, podem determinar retenção d'urinas, e dilatação enorme da bexiga, que por sua demasiada dilatação pode subir ao hypogastrio, e sepa-rar os kystos da parede abdominal; assim também estes, adquirindo relações mais ou menos intimas com os ureteres, podem comprimil-os ao nivel do estreito superior, e determinar n'elles a retenção da urina, e até communicarem entre si por effeito de mutua compres-são.

5.° A trompa uterina, o ligamento redondo e mesmo o ovário do lado opposto áquelle em que se desenvolveu o tumor conservam suas relações normaes, a não ser que o kysto tenha adquirido crescimen-to enorme, ou que o ovário d'esté lado esteja também affectado. Mas tanto a trompa como o ligamento redondo do lado correspondente ao tumor, se acham quasi sempre sobre a face anterior, e raras vezes ficam pela parte posterior. O ligamento redondo fica hypertrophiado e mais ou menos alongado, a trompa também mais longa participa da mesma hypertrophia.

6.° O UTERO, que em geral fica por diante e por baixo dos kys-tos, por adherencias, que entre uns e outros se estabeleçam, e que d'alguma maneira se oppõem ao seu successivo crescimento, pode to-mar posição anormal e ser por elles impellido para a parte posterior e para baixo; (o snr. Cruveilhier encontrou três vezes esta disposi-ção). Por muitas vezes o utero por suas relações com os kystos não só perde suas relações normaes de posição, collocando-se já em ante ou recto-versão sobre o recto ou sobre a bexiga, já em lato-versâo, mas seu volume e forma são consideravelmente transformados.

Se o utero está occupado com o producto da concepção impelle os kystos ovaricos para cima e para fora, colla-se por diante d'elles

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«

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em contacto immediate com a parede abdominal e na fossa iliaca correspondente ao ovário são.

Se as relações dos kystes com a vagina são de pouca importância, não deixam ainda algumas vezes, quando pequenos, de impellir qual-quer de suas paredes para a vulva e hernial-a

7.° Os kyslos dos ovários affectam quasi sempre relações mais ou menos próximas com vasos e nervos, que dão logar a symptomas d'imporlancia para o diagnostico d'esta doença. Comprimem em quan-to não saliem da excavação pélvica o plexo sagrado, e depois que sobem o estreito superior o plexo lombar, d'onde vêem-as dores e outros signaes de compressão nervosa que elles causam.

Por seu successivo desenvolvimento comprimem também os va-sos e principalmente as veias, com que se acham mais em contacto, o que motiva1 o œdema dos membros inferiores e da vulva tão

fre-quente n'estas doenças. E' também pelo embaraço que esta doença traz á circulação abdominal., que em parte se pode explicar a fre-quência, com que as ascites complicam as liydropesias do ovário.

' COMPLICAÇÕES. — Estudados assim os caracteres anatómicos que são constantes aos kystos do ovário, passarei, para terminar esta parte do meu trabalho, a estudar certas outras alterações particula-res, que apesar de não serem constantes podem todavia modificar o estado por assim dizer normal da moléstia, e darem logar a sympto-mas, que mais tarde terei de apreciar. Estas alterações descrevem-as os auctores debaixo do titulo de complicações, e são: as

adheren-cias, as aberturas espontâneas, a inflammação do sacco, a formação de placas gangrenosas, as ruptura* e a péritonite com ascite conse-cutiva.

l.° ADHERENCIAS.—Os kyslos do ovário são susceptíveis de adherirem mais ou menos intimamente aos órgãos, com que se acham mais em contacto, principalmente se esses órgãos gozam de pouca mobilidade e occupam uma posição fixa na cavidade abdominal. Es-tas adherencias são raras com a bexiga e intestinos delgados, e mes-mo com a parede abdominal, a não ser que o kysto tenha soffrido différentes puncções ou tenham havido accidentes graves dïnflamma-ção peritoneal. Os órgãos mais sujeitos a adherir aos kystos são os intestinos grossos, os ureteres, o utero, as trompas e os ligamentos redondos. Estas adherencias são umas constituídas por filamentos

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cel-■

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lulosos ; outras são de natureza fibrosa, largas e assaz resistentes para prender d'uma maneira intima os kystos ovaricos a certas partes d'or­ gãos abdominaes.

2.° ABERTURAS ESPONTÂNEAS. — Estabelecidas as adheren­ cias dos kystos com outros órgãos da cavidade abdominal, podem es­ tes kystos ou pelo simples trabalho phlegmasico, que occasionou as adherencias ou pelo successivo adelgaçamento das paredes em conta­ cto, romperem­se e communicarem mais ou menos amplamente com os órgãos visinhos. D'esté modo não é raro o encontrarem­se os kys­ tos do ovário communicando com os intestinos, com os ureteres, com a vagina e mesmo com o exterior pela parede abdominal. Casos d'es­ tes possue a sciencia um grande numero archivados.

3.° INFLAMAÇÃO DO SAGCO. — Frequentes vezes os kystos ovaricos são invadidos por um trabalho inílammatorio, quer espontâ­ neo, quer filho de manobras cirúrgicas porque se fazem passar estes tumores, que não só produz as suas adherencias e communicações com os órgãos e partes mais próximas, mas é origem do pus, que de natureza e quantidade variável se encontra no seu interior, o qual modifica consideravelmente, como atraz fica notado, o aspecto e propriedades da membrana interna do kysto. O trabalho inflamma­ torio do kysto pode limitar­se a produzir as adherencias, e não ori­ ginar a purulencia do tumor; mas pode também, alem das adheren­ cias, aberturas e purulencia, dar logar a uma péritonite chronica, e em seguida a uma ascite: tal é o facto citado pelo snr. Cruveilhier no seu tratado de anatomia pathologica geral.

_ 4.° PLAGAS GANGRENOSAS.—Casos ha em que a inflamma­ ção do sacco caminha com intensidade e violência taes, que em pouco tempo determina a formação de placas gangrenosas mais ou menos extensas e disseminadas por toda a parede do kysto.

5.° RUPTURAS. — A ruptura das paredes dos kystos é frequen­ te e fica imminente desde que são invadidas pela formação d'ulcera­ ções e placas gangrenosas : é este um phenomeno, que frequentes ve­ zes complica a marcha da moléstia.

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TERCEIRA PARTE

DIAGNOSTICO DIFFERENCIAL DOS KYSTOS DO OVÁRIO.

0 diagnostico dos kystos do ovário é sem duvida a parte mais dif-ficil d'esté meu trabalho : e posto que os auctores, que da materia se lêem occupado lhe assignalem caracteres tão distinctos que pareça impossível confundil-os com outra moléstia, existem todavia na prati-ca numerosos erros de diagnostico, não só das différentes espécies de kystos, mas ainda de moléstias e até estados na mulher, que os po-dem simular, os quaes urge evitar. E' por isso que julgo muito diffi-cil conhecer no vivo a verdadeira natureza d'esta doença e que seu diagnostico é obscuro e se acha cercado de grandes difliculdades, que me esforçarei por fazer desapparecer no que tiverem de superavel, para evitar enganos, que na pratica algumas vezes têem sido fataes. N'este intento me servirá de grande auxilio a anatomia pathologica dos kystos ovaricos, que atraz deixo esboçada; ella me servirá de gran-de apoio para os seguir em suas diversas manifestações, e tornará bem mais fácil esta parte do meu trabalho.

Se os kystos do ovário têem symptomas communs bem distinctos para que qualquer observador pratico debaixo de rigoroso exame possa

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differençal-os d'outros tumores abdominaes, não acontece com tudo o mesmo quando se trata de distinguir um kysto de suas différentes va-riedades; quando se procura saber se um kysto é simples ou com-posto, se unilocular ou multilocular, qual é a natureza do liquido, que contém, se está complicado com outros tumores, se tem adherencias etc.; é então que os práticos se vêem embaraçados e se tem a lutar com as maiores difficuldades. Felizmente que ainda estas variedades e complicações dos kystos têem caracteres próprios pelos quaes po-demos chegar a differençal-os, o que no seu tratamento tem grande importância. Esta distincção dos kystos nos mostra não só o géne-ro de tratamento, que contra a moléstia temos a empregar, mas ainda o resultado provável, que d'elle temos a esperar. Tratarei pois n'esta parte dos symptomas communs aos kystos do ovário, dos pró-prios ás suas différentes variedades, e dos caracteres, que os differen-çam d outros tumores abdominaes, de seu diagnostico differencial.

1

Syinptomas.

A doença de que me occupo é tão insidiosa em sua invasão, que a maior parte das vezes os symptomas porque se manifesta n'este pe-ríodo, ou passam desapercebidos, ou são pela doente attribuidos a ou-tra qualquer causa ; e só depois que a doença attingiu certo desen-volvimento, e que a doente não pode mais illudir-se sobre o seu ver-dadeiro estado é que reclama os soccorros d'arte, e pede para ser cu-rada ; como porem a moléstia foi desconhecida em sua origem, é dif-ficil marcar-se quaes os symptomas, que n'este período a caracterisam. Alguns kystos ovaricos chegam a adquirir o volume d'um punho e mais sem que as doentes (sendo principalmente muito nutridas) os tenham percebido e accusera algum soffrimento dos órgãos genitaes. Todavia, geralmente quando o kysto attinge o vulume d'um ovo de gallinha, manifesta-se por signaes mais ou menos característicos, que passo a estudar.

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Os kystos do ovário desenvolvidos no interior da excavação pélvi-ca, manifestam-se por symptomas, que variam com o seu crescimen-to e se referem, uns ao estado local da doença, outros á influencia que ella exerce sebre o estado geral da doente : estudal-os-hei debai-xo d'estes dois pontos de vista.

1.°

Syniptomas l o c a c s dos k y s t o s «Io ovário

Os primeiros symptomas, porque geralmente se manifesta um kysto do ovário, são : a existência d'uma dôr surda, um embaraço, um leve incommodo, mesmo uma sensação de peso n'uma das regiões ilíacas, signaes estes, que se manifestam de preferencia e com mais intensidade na approximação e durante as épochas monstruaes. Appa-recem muitas vezes certos symptomas mui similhantes aos da gravi-dez insipiente, e se as regras, que no começo da moléstia são quasi sempre apenas irregulares, são completamente supprimidas em mu-lheres casadas ou que têem cohabitado, ellas não se preocupam com o seu estado crendo com facilidade que estão gravidas. A apalpação descobre por de traz da symphese púbica um tumor limitado, molle ou com vestígios de fluctuação : os mesmos symptomas revela a ex-ploração pelo recto e vagina ; e combinando a apalpação no hypogas-tric com o exame recto-vaginal, imprimindo ao tumor movimentos em différentes sentidos melhor se pode avaliar a sua verdadeira na-tureza.

Desde que o tumor adquiriu certo gráo de crescimento, dá logar, pelas relações que sustenta com os órgãos mais próximos, a sympto-mas importantes, que convém ter em vista por sua utilidade.

O utero é geralmente collocado em anteflexão, posição, que lhe é a mais geral no desenvolvimento dos kystos do ovário; algumas ve-zes se acha mais ou menos abaixado, outras está de maneira elevado e repuxado pelo hysto que é difficil tocar o collo uterino. Mais tarde quando a doença se acha sufficientemente adiantada e sobe ao estreito

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superior da bacia^ percebe-se n'a ma das regiões ilíacas correspon-dente ao ovário affectado um tumor mais ou menos indolente, lobu-lado ou arredondado, e o ventre augmenta de volume á medida do seu crescimento.

Signaes preciosos nos fornece também a percussão n'esta época de desenvolvimento dos kystos do ovário. Som maciço desde a arcada crural até maior ou menor altura do abdomen segundo o maior ou menor desenvolvimento do kysto : na parte superior, e mesmo na interna se o kysto occupa uma só fossa iliaca e não invadiu ainda toda a parte inferior do abdomen, acha-se sonoridade devida á massa intestinal.

A apalpação mostra um tumor mais ou menos desenvolvido regu-larmente circumscripto, arredondado ou bosselado, parecendo cons-tituído por muitos lóbulos em contacto uns com outros, indolente á pressão e movei por baixo da parede abdominal, e tanto mais se está completamente livre d'adherencias com órgãos visinhos, que no caso contrario participam de sua pouca mobilidade, a qual lambem revela a existência do pedículo do tumor mais ou menos laxo. Occupa uma das fossas ilíacas, mas quando tem adquirido volume extraordinário enche toda a cavidade abdominal.

Se o tumor tem pequeno volume, é difficil distinguir-lhe a flu-ctuação, que è um symptoma importante; mas se é volumoso, ella é clara, franca e fácil de perceber ; quando se percute ligeiramente o kysto n'um ponto vè-se claramente, olhando de perfil, a parede an-terior do ventre desenhar as ondulações, e collocando a outra mão no lado opposto ao percutido experimenta-se aquella sensação cara-cterística, que os francezes designam pelo nome de flot du liquide. A fluctuação do tumor muitas vezes não se percebe procurando a on-dulação do liquido em ponto diametralmente opposto ao percutido^ mas obter-se-ha procurando-a em pontos mais ou menos próximos na sua superficie, o que tem importância para estabelecer o diagnestico das diversas variedades dos kystos do ovário.

Ainda os kystos do ovário, por suas relações com os órgãos abdo-minaes, com que mais ou menos se acham em contacto, dão logar a symptomas, que dependem principalmente do seu estado de desenvol-vimento, do maior ou menor grau de ílaccidez das paredes abdomi-naes, etc.

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Quando os kystos attingem certo grau de crescimento e as pare-des abdominaes são tensas, como em mulheres, que não têem tido fi-lhos, comprimem vasos de maior importância como as artérias e veias hypogastaicas, as artérias e veias ilíacas, a veia das portas etc, assim como lambem podem comprimir os plexos lombar e sagrado ; d'abi vêem a maior dilatação das veias, que se distribuem na parede abdo-minal, os œdemas dos extremos inferiores e vulva, e outros sympto-mas de compressão vascular e nervosa, mui frequentes n'estas doen-tes.

Os intestinos delgados impellidos pelo desenvolvimento suecessivo dos kystos para a concavidade do diaphragma, raras vezes são com-primidos, a menos que adherencias anormaes os não prendam ao tu-mor ; mas encontram-se quasi sempre nimiamente dilatados por gazes, que em abundância se accumulam no seu interior; d'onde resulta cons-tipação pertinaz e habitual, alternativas de conscons-tipação e diarrhea etc. O intestino grosso, menos movei, é o mais sujeito a ser comprimido, compressão, que pode ser assaz forte para determinar uma occlusão intestinal, e alem da retenção das matérias fecaes produzir também adherencias, rupturas, e communicações dos kystos com diversas por-ções do intestino.

A compressão da bexiga pode trazer a retenção das urinas com to-das as suas consequências, diíficuldades na micção, desejos frequen-tes d'urinar, etc.

Os ureteres podem também ser comprimidos, e estabelecerem-se communicações entre elles e o tumor, como em outro logar já fiz notar.

§ 2.°

Syniptomas g e r a e s «los l. j SIOH <1O ovário

Os kystos do ovário nascem, crescem, adquirem mesmo volume considerável, sem grande influencia sobre o organismo inteiro e a saúde em geral. Comtudo, quando estes tumores por seu cresci-mento demasiado enchem toda a cavidade abdominal e comprimem

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». os órgãos n'ella contidos embaraçando o livre exercido de suas func-ções, não podem deixar de modificar d'um modo mui considerável a saúde e a vida da doente affectada.

São as funcções de geração as mais directamente influenciadas pelo desenvolvimento dos kystos ovaricos.

A menstruação, que poucas vezes fica regular, é ora mais

abun-dante, ora em menor quantidade que no estado normal ; mais vezes é precedida e seguida de escoamentos leucorrhoicos e metro-rrhagias, que enfraquecem consideravelmente a doente : regularisa-se em mu-lheres, cujo tumor fica estacionário, e perturba-se desde que de novo elle prosegue em sua marcha.

A fecundação pode effectuar-se sendo um só ovário affectado, mas

raras vezes a prenhez segue seus períodos regulares sem que seja perturbada em sua marcha ; e só pode conhecer-se desde que appa-recem os movimentos da creança, os sons cardíacos e o sopro utero-placental

Os kystos do ovário embaraçam também por seu grande volume, pelo grande obstáculo que oppoem aos movimentos do diaphragma e pelos derrames sorosos que accasionam, os phenomenos da circulação. Não é raro vêr soffrer de palpitações, tendências para syncope, pulso frequente e pequeno, etc. as doentes, que padecem de kystos do ová-rio.

As digestões perturbam-se, tornam-se morosas e difficeis, o

appe-tite foge, a sede augmenta, existem dores epigastricas e outros desar-ranjos do tubo digestivo.

A respiração perturba-se consideravelmente pelo obstáculo, que

o desenvolvimento dos kystos traz aos movimentos do diaphragma. Existe quasi sempre uma dyspnea, que augmenta com a ingestão de alimentos ou bebidas. Nos últimos tempos da vida apparecem conges-tões do pulmão e derrames nas pleuras capazes de só por si produ-zirem a morte.

Sobre as funcções do systema nervoso pouca influencia exerce esta moléstia ; as doentes conservam-as geralmente até aos últimos mo-mentos em estado d'integridade

D'estas perturbações nas grandes funcções da economia resulta uma emaciação geral, que augmenta á medida e proporção que o kysto se desenvolve. As extremidades inferiores, os braços e o rosto, quando

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não são œdemaciadas, emmagrecera, seus elementos de nutrição são absorvidos pelo tumor enkystado do ovário ; as faces enrugam-se ; fi-nalmente as mulheres são accommettidas de velhice prematura. Se o kysto é invadido de trabalho phlegmasia), um outro cortejo de sym-ptomas mais pronunciados se apresenta, como febre lenta continua, prostração maior ou menor, frios de tarde mais ou menos intensos apparecendo comintervallos irregulares, emmagrecimento rápido etc: mais tarde o ventre e o tumor apparecem com tensão e dolorosos, as doentes perdem o appetite e são accommettidas de vómitos, diar-rhea, etc. Se o trabalho phlegmasico continua, ou o kysto ulcera as partes com que se acha em contacto e communica com ellas, ou os symptomas se aggravam e as doentes succumbem em algumas sema-nas ou em poucos mezes em marasmo, em esgotamento ou febre hectica.

II

Caracteres difTerenciaes d a s -variedades tios k y s t o s ovarieos

Em quanto o kysto está encerrado na cavidade pélvica com difficulda-de se chega a julgar difficulda-de sua verdadifficulda-deira natureza ; a exploração pelo recto e vagina moslrar-nos-ha um tumor arredondado, movei e fluctuante, mas com grande difficuldade se poderá suppôr se o kysto é soroso, gelatinoso, ou mesmo purulento; e só pelo estado geral da doente e pelos commemorativos poderemos saber se o kysto é complicado da presença d'um tumor nas suas paredes ou encerra despojos de feto etc.

Quando o kysto por seu desenvolvimento occupa já a cavidade ab-dominal, será: unilocular e soroso, se, sendo arredondado e movei, mostrar fluetuação franca e clara, e ondulação rapidamente propaga-da a ponto diametralmente opposto ao percutido. Topropaga-davia estes signaes são falliveis, principalmente quando se trata de conhecer a verdadei-ra natureza do liquido : o snr. Boinet cita um caso de kysto gelatino-so, que, tendo todos os symptomas d'um kysto unilocular sorogelatino-so,

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punccionou repetidas vezes para só á terceira obter uma pequena quantidade de liquido e julgar de sua verdadeira natureza.

Será o kysto multilocula^ se a sua fluctuação é limitada e se pode só obter e apreciar em pontos de sua superficie mais ou menos apro-ximados, não se sentindo, percutindo-o em pontos diametralmente oppostos ; a superfície d'estes tumores é ás vezes bosselada e irre-gular.

Tumor molle, elástico, com vestígios de fluctuação, que só geral-mente se pode obter imprimindo-lhe fortes abalos, de superfície mui-tas vezes irregular com desenvolvimento moroso, são os principaes caracteres d'um kysto gelatinoso. Todavia casos ha em que estes tu-mores simulam perfeitamente kystos uniloculars de liquido soroso.

Os kystos de paredes espessas, fibrosas e forradas no seu interior de falsas membranas, têem geralmente um desenvolvimento moroso. O exame exterior d'estes tumores, mostra uma immensidade de placas mais ou menos espessas disseminadas em suas paredes duras e resistentes.

Os kystos compostos ou complicados de tumores nas suas paredes ou proximidades, manifestam-se á pressão por desigualdades, umas duras, outras molles, outras com fluctuação, e todas mais ou menos ligadas entre si. O estado geral das doentes também tem muita im-portância no diagnostico das différentes variedades de kystos ovaricos, e sobre o grau d'adiantamenlo, em que se acham.

Finalmente, muitas vezes é tão difficil o diagnostico das différen-tes variedades de kystos do ovário, que só a puncção exploradora nos pode certificar sobre a sua verdadeira natureza. Com tudo é este um meio tão arriscado e seguido ás vezes de consequências tão graves, que julgo só deverá usar-se quando por meios lherapeuticos a doen-ça fôr incurável, quando o estado cia doente fôr desesperado e inspi-rar a maior gravidade, quando emfim nos virmos obrigados a lançar mão de meios cirúrgicos com intenção seja de alliviar, seja de curar as doentes d'uma moléstia, cuja marcha é decididamente fatal.

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III

Caracteres dilTerenciaes dos Kystos «Io ovário com outros t u m o r e s d a cavidade a b d o m i n a l .

Os kystos do ovário emquanto por seu volume não excedem 0,m03

a 0,m05 de diâmetro passam quasi sempre desapercebidos para a

doente e para o medico, e só depois que augmentam de maneira a manifestarem sua presença por symptomas, que lhes- são próprios n'este estado de desenvolvimento, é que principiam a inquietar as doen-tes, e nós somos procurados para lhes prestarmos os soccorros d'arte. Nestas circumstancias é de maior importância e primeira necessidade conhecer bem a moléstia de que temos a tratar e fazer o seu

diagnos-tico differencial.

Como são numerosos e muito variados os tumores, que podem si-mular kystos do ovário nos diversos graus de desinvolvimento em que estes se acham, dividil-os-hemos em três classes : tumores de

pe-queno volume, de volume medio e tumores de volume considerável.

I

1.°

Tumores de p e q u e n o v o l u m e

Quando os kystos do ovário não têem ainda adquirido volume suffi-ciente para sahirem da excavaçâo da bacia, e em quanto se não pode por consequência avaliar bem os symptomas, que os caracterisam, o seu diagnostico apresenta-se cercado de grandes difficuldades, por-que uma quantidade immensa de tumores, por-que podem ter sua sede no próprio ovário, nos seus annexos ou pontos mais proximos,"os po-dem simular apresentando exactamente os mesmos symptomas. N'es-tas circumstancias só a marcha da doença pode esclarecer-nos para o futuro sobre a sua verdadeira natureza.

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— 37 — §2.°

Tumoi'os de volume mediano

Desde que os kystos do ovário adquiriram volume sufficiente para subirem acima do nivel do estreito superior da bacia e fazerem sa-liência atravez das paredes abdominaes, podem offerecer ou não si-gnaes claros de fluctuação ; e então para proceder-mos com methodo vejamos primeiro quaes os tumores não fluctuantes e depois quaes os fluctuantes, que mais podem simular os kystos do ovário n'este grau de desenvolvimento.

1.° Se os kystos não apresentam fluctuação clara e distincla, elles podem ser confundidos :

1.° Com diversos tumores do ovário como os fibrosos, scirrosos, encephaloides, etc ; o diagnostico n'este caso é difficil e torna muitas vezes necessária a puncção exploradora, que pode ainda falhar prin-cipalmente se se trata d'um kysto multilocular, cujo conteúdo solido não pode sahir atravez da cânula do instrumento.

2.° Com os diversos tumores das paredes do utero, que se distinguem dos kystos pela maior resistência que offerecem á pressão, e porque intimamente unidos ao órgão participam dós movimentos, que a este se imprimem.

3.° Com uma prenhez uterina. Graves erros têem sido commetti-dos por cirurgiões de grande nome e longa pratica, que tomando uma prenhez, que corre seus períodos regulares por kystos do ovário, sub-metteram as mulheres a toda a ordem de meios pharmacologics, que contra esta doença estão indicados, e, o que é ainda mais funesto, a operações cirúrgicas cujo resultado é quasi sempre fatal para a mãe e para o filho.

Eis, segundo Valleix, os verdadeiros signaes porque se distingue uma prenhez uterina d'um kysto ovarico.

Na prenhez o tumor é globuloso, eleva-se uniformente na direcção da linha mediana do abdomen, dando á percussão som maciço no hypogastrio e claro nas fossas ilíacas, que em caso de kysto são

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oc-— 38 oc-—

cupadas por um tumor mais ou menos considerável com som maciço do lado correspondente ao ovário affectado. Kysto ovarico, que não tem fluctuação, é ordinariamente bosselado, não apresenta aquella su-perficie lisa nem tem aquelle desenvolvimento regular, que nos ofe-rece o utero carregado com o producto da concepção. Em fim pela exploração vaginal verificaremos ou a integridade do collo e corpo do utero, ou as modificações porque a prenhez o fez passar. Alem d'es-tes symptomas outros ha, que distinguem perfeitamente a prenhez de qualquer outro tumor principalmente se os primeiros quatro me-zes se tem passado ; refiro-me aos movimentos da ereança., e aos si-gnaes sthetoscopicos, os quaes sós bastam para caracterisar este es-tado. Se ainda assim houver duvida, a marcha do tumor nos escla-recerá sobre a sua verdadeira natureza, e o pratico deve abster-se d'empregar qualquer meio violento, que pode ser immensamente pre-judicial.

4.° Prenhez extra-uterina. — As dificuldades de bem distinguir um kysto ovarico d'uma prenhez são muito maiores quando esta se desenvolveu fora da cavidade uterina, e muito principalmente se ella tem por sede o ovário ou suas dependências. A confusão é fácil e o diagnostico difficil, porque ainda que a prenhez extra-uterina é acom-panhada de signaes racionaes, que caracterisam a prenhez propria-mente dita, elles com tudo podem faltar, como faltam muitas vezes n'esta : assim como não é raro serem os kystos do ovário acompa-nhados em seu desenvolvimento de perturbações sympathicas de tal ordem que simulam perfeitamente a prenhez, de que então não é fácil differençal-os.

Todavia, se o feto chegou vivo ao sexto mez, os seus movimentos e signaes sthetoscopicos servir-nos-hão ainda de melhor auxilio: an-tes porém d'esta épocha se o feto está morto, como é constante, e ainda, se se trata d'um tumor enkystado embryonario incluído, as dificuldades sobre o verdadeiro diagnostico sobem a ponto de se não poder dizer nada de positivo, porque não ha nenhum signal caracte-risco além dos fornecidos pela anatomia pathologica ; e só os comme-morativos, o estado estacionário do tumor, sua dureza e desigualda-des, que por ventura possam conhecer-se atravez das paredes do ab-domen, e finalmente a puncção exploradora, nos poderão esclarecer sobre a sua verdadeira natureza.

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5.° Outros muitos tumores podem simular kystos do ovário e cer-car seu diagnostico de difficuldades, que muitas vezes nem a obser-vação attenta nem longa pratica poderão vencer ; neste caso estão o cancro dos intestinos e différentes outros tumores fibrosos de varia natureza, desenvolvidos dentro da cavidade abdominal proximo aos ovários.

2." — Se os kystos ovaricos têem attingido um dado volume, e dão mostras de fluctuaçâo, poderão confundir-se :

1.° Com a hydropesja uterina e molla hydatica, que se distinguem dos kystos por seu desenvolvimento uniforme na direcção da linha mediana, signaes de fluctuaçâo no utero e perturbação simultânea em suas funcções.

'2.° Com a retenção d'urinas proveniente ou de paralysia das pa-redes da bexiga, ou de compressão permanente de seu collo, apertos d'uretra etc, a qual pode, distendendo-a consideravelmente, dar to-gar a um erro de diagnostico, que se evitará praticando o catheteris-mo da bexiga.

3.° Com os kystos das trompas, que só se podem distinguir dos do ovário ou porque este forma relevo sobre a parede do kysto, o que é raro conhecer-se, ou pela sondagem da trompa pela cavidade uterina, e pela evacuação do liquido do kysto atravez da camula da sonda.

4.° Finalmente as différentes hydropesias enkystadas do peritoneo, os tumores enkystados bydaticos e sorosos do mesenterio e da cavida-de abdominal, os kystos do ligamento largo, do órgão cavida-de Rosenmul-ler e do epiploon, os différentes abcessos da cavidade abdominavel, os kystos sanguíneos retro-uterinosetc, são tudo moléstias, que mais ou menos simulam kystos do ovário, e cujo diagnostico differencial muitas vezes apresenta difficuldades insuperáveis. A sede e marcha da doença, o exame attento de seus symptomas pela exploração recto-vaginal e abdominal, e sobre tudo a puncção exploradora são os meios, que temos a empregar e de que não devemos prescindir para bem chegar a conhecer a verdadeira natureza d'estes tumores.

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3.°

Tumores de volume considerável

Também nos ovários se desenvolvem tumores volumosos de natu-reza différente, que, ainda que não tenham flnctuação, podem com tudo obscurecer o diagnostico dos kystos. Existem observações de tumores sólidos enormes formados á custa da substancia dos ovários, que simulam perfeitamente os kystos d'estes órgãos. D'estes tumores to-marei para exemplo o encephaloide, que tantas vezes se desenvolve nos ovários como bem provam as observações de Schneider, Meckel, An-dral e outros. O encephaloide do ovário attinge um tal volume e apre-senta caracteres physicos, que inteiramente o confundem com os kys-tos, e só pela existência de tumor da mesma natureza n'outra região, e signaes de cachexia cancerosa poderemos tirar alguns elementos de diagnostico. Estas difficuldades augmentai» quando a materia cance-rosa se desenvolve nas proprias paredes do kysto.

Tumores da mesma natureza dos rins e mesenterio podem,, não se lhe tendo seguido o desenvolvimento desde o seu começo, e tendo cahido nas fossas ilíacas, confundir-se com os kystos, cujo contido é gelatinoso ou muito viscoso e sem fluetuaçãodislincta. Caseauxcita um caso de encephaloide do rim tomado por um kysto do ovário. Gardier julga mui fácil a confusão dos kystos do ovário com os tu-mores steatomatosos de mesenterio. Bauchet diz ter encontrado na clinica de Velpeau uma mulher com uma hypertrophia do baço, que tinha tomado tal desenvolvimento, que descendo á fossa iliaca, simu-lava perfeitamente um kysto do ovário. Todos estes erros de diagnos-tico poderão até certo ponto evitar-se adquirindo-se idêas lixas quan-to possível sobre a origem, modo de desenvolvimenquan-to primitivo e marcha ulterior da moléstia, não deixando de nos esclarecer também bastante o estado geral da doente.

Os tumores fluctuantes, que mais podem contundir-se com os tu-mores do ovário, e obscurecer o seu diagnostico ou oceupam as

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