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Torção uterina em vacas na Ilha de São Miguel

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Academic year: 2021

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Ciências Veterinárias

Torção Uterina em Vacas na Ilha de São Miguel

- Versão Definitiva –

João António Salgueiro Pereira Agostinho

Orientadora: Professora Doutora Rita Payan Carreira

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO VILA REAL, 2014

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Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Ciências Veterinárias

Torção Uterina em Vacas na Ilha de São Miguel

- Versão Provisória –

João António Salgueiro Pereira Agostinho

Orientadora: Professora Doutora Rita Payan Carreira

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO VILA REAL, 2014

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“Sou definitivamente contra o definido,

porque o definido é o bastante e o bastante não basta”

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IV

A torção uterina é uma causa de distócia de origem materna que poderá apresentar um forte impacto nas explorações. É uma condição característica do final da gestação, ocorrendo sobretudo no início do trabalho de parto. Para além das características do aparelho reprodutor da vaca, que favorecem a ocorrência de torção uterina, também a permanência dos animais em pisos acidentados, maneio e nutrição podem contribuir para este problema.

Os objetivos deste trabalho passaram por tentar analisar os diversos parâmetros clínicos e zootécnicos que coincidindo num animal culminam na torção, perceber a forma como é encarado tanto pelo produtor como pelo Médico Veterinário, a forma de resolução consoante os casos apresentados e ainda a previsão futura para um animal que sofre esta ocorrência. Para isso analisaram-se os dados de 31 animais com torção uterina confirmada, num período de quatro meses (entre Fevereiro e Maio).

Os parâmetros avaliados no decorrer deste trabalho foram; a distribuição das torções uterinas ao longo dos meses de estágio, a gravidade da torção, sentido da torção, tempo de gestação, número do parto, paridade, produção leiteira da lactação anterior, sinais clínicos associados a alterações da área perineal, sexo fetal e método de correção.

Nos casos por nós acompanhados observou-se uma ocorrência de torção uterina maior no mês de Maio (35,48%; 11/31), apesar de não existirem diferenças estatísticas entre os meses em estudo. As torções simples foram encontradas com maior frequência (67,74%; 21/31), sendo a torção à esquerda a que se observou mais comummente (58,06%; 18/31). A maioria dos partos ocorreram dentro do tempo de gestação esperado (61,29%; 19/31), tendo o terceiro parto apresentado uma incidência superior de torções uterinas (29,03%; 9/31). A torção uterina foi mais frequente em animais multíparos do que primíparos (77,42%; 24/31); os animais multíparos incluídos neste estudo eram maioritariamente altos produtores (72,22%; 16/18). Em algumas das situações de torção uterina observou-se alteração de conformação vulvar incluindo desalinhamento entre os eixos da vulva e ânus, lábios vulvares repuxados e diferenças no grau de pregueamento périvulvar. A torção uterina ocorreu sobretudo em gestações com fetos do sexo masculino (74,19%; 23/31). O rolamento da vaca foi o método que apresentou maior sucesso (54,84%; 17/31), mas este acontecimento poderá estar associado ao facto de existirem diferenças na abordagem metodológica da correção entre os dois Médicos Veterinários cujas consultas acompanhei (operadores): o operador 1 adota como

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V

primeira abordagem a rotação transvaginal do útero antes de passar a outro método (em geral o de rolamento da vaca), enquanto que para o operador 2 o rolamento da vaca é o método de abordagem preferencial. A correção cirúrgica da torção foi o método menos utilizado por qualquer um dos operadores; embora sem diferenças estatísticas, ainda assim foi observada com mais frequência no operador 2 do que no 1. Neste trabalho, o sentido da torção e gravidade da torção estão significativamente associados. Por outro lado, a gravidade da torção influenciou o resultados da abordagem e correção do caso, uma vez que nenhuma das torções categorizadas como simples ou complicadas necessitou de intervenção cirúrgica para a sua correção. A resolução da torção e sentido da torção estiveram também significativamente relacionadas. Neste trabalho encontrou- -se um numero elevado de torções uterinas relativamente ao esperado, para o que poderão contribuir enormemente dois fatores: o maneio da vaca no pré-parto e as condições de transporte para as instalações onde irá ocorrer o parto.

Palavras Chave: Bovinos, Torção Uterina, Sentido da torção, Gravidade da torção, Método de resolução, Sexo Fetal.

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VI

Uterine torsion is one possible origin for a maternal dystocia that may have a strong impact on farms economy. Typically, it is condition of late pregnancy, occurring especially at the beginning of labor. In addition to the characteristics of the reproductive tract of the cow uterus, that facilitates the torsion, other factors may contribute to its development, such as the animals housing on irregular floors or the nutrition management.

This work aims to contribute to a better understanding of the different clinical and zootechnical parameters that coincide in an animal developing this condition, to know how the condition is noticed by the producer or the practitioner, which is the appropriate resolution that can be offered, as well as to preview the consequences for the animal with torsion. This study enrolled 31 animals with confirmed uterine torsion, surveyed for a four month period (between February and May).

The parameters evaluated during this study included the monthly distribution of during the months of my practice, the severity and the direction of the torsion, the pregnancy length, calving order, parity, milk yield in the previous lactation, morphological changes in the perineal area, fetal gender and the successfulness of the corrective approach.

This study showed a higher number of uterine torsion cases in May (35.48%; 11/31), although no statistical difference exists on the monthly distribution of the cases. Simple uterine torsions were the most frequently found (67.74%; 21/31); the left side was the commonest direction of the torsions (58.06%; 18/31). In most cases, calving occurred at the expected date (61.29%; 19/31); the third calving presented a higher number of occurrences (29.03%; 9/31). The uterine torsion occurred more frequently in multiparous than in primiparous animals (77.42%; 24/31); most multiparous animals in study were high producers (72.22%; 16/18). In some situations uterine torsion changed vulvar conformation, inducing the misalignment of the vulva and anus vertical axes, the retraction of the vulvar labia or differences on the wrinkling of the perivulvar skin. The uterine torsion occurred mainly in pregnancies with male fetuses (74.19%; 23/31). Rolling the cow was the most successful method showed (54.84%; 17/31), but this may result from differences in adopted first approach between the two Practitioners (operators): for the first operator the first approach was the transvaginal rotation of the

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VII

calf while the operator 2 always first approach the situation rolling the cow. Surgery was seldom used for the correction of the torsion, independently of the operator, though it happened more often in the operator 2. Statistical association was found between direction of torsion and its gravity. Also, the direction of torsion and the method that succeeded resolution were statistically associated. Moreover, the severity of the torsion affected the success of the correctional method: all cases categorized as simple or complicated were solved by non-surgical approaches. The method for resolution of the situation was also associated with the direction of torsion.

A higher number of uterine torsions were found in this work, compared to the expected for dairy cattle. Two main factors might have contributed for this prevalence: cow management in the prepartum period and the conditions of the animal transport into the facilities were calving will occur.

Keywords: Cattle, Uterine Torsion, Direction of Torsion, Torsion Severity, Resolution Method, Fetal Sex.

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VIII

Ao longo dos seis anos de curso, percurso que culmina com a elaboração desta dissertação, muitas pessoas passaram pela minha vida e em muito contribuíram para que pudesse chegar até aqui.

Aos meus pais, o meu muito obrigado pela educação que me proporcionaram e por todo o esforço que fizeram para que este sonho fosse possível. Sem vocês não era nada.

Aos meus irmãos, Emídio e Pedro muito obrigado pela paciência que sempre tiveram para comigo, pela amizade e por me ajudarem em tudo o que vos peço; se não fossem vocês quem é que eu chateava.

Aos meus avós, meus segundos pais, obrigado por estarem sempre presentes. São para mim uma referência. Avô António, partiste a meio desta etapa da minha vida, sei o quanto aqui gostarias de estar para me ver chegar ao fim do curso de que tanto te orgulhavas; obrigado por tudo!

À Professora Rita o meu muito obrigado por toda a dedicação, empenho e paciência ao longo da orientação deste trabalho.

Ao Professor Jorge Colaço, o meu obrigado pela ajuda com a análise estatística. Ao Doutor Hélder, muito obrigado por me ter aceite como seu estagiário, pela sua paciência, boa disposição e por me ter ensinado tanta mas tanta coisa neste mundo das vacas.

Aos Veterinários da Associação Agrícola de S. Miguel, Dr.ª Patrícia, Dr. João Vidal, Dr. Aston, Pedro, Sofia, obrigado pela forma como me receberam e pela ajuda. Também à Filomena e Daniela muito obrigado pela simpatia e boa disposição sempre presente.

Ao Professor Mário, muito obrigado pela sua disponibilidade sempre que precisei, pela sua amizade e companheirismo nestes últimos anos do curso.

Ao Dr. Miguel Quaresma, obrigado pelos contactos para o estágio nos Açores e por todo o apoio e amizade prestada durante o estágio no HVUTAD.

À Ana e à Xu obrigado por todos os ensinamentos durante o estágio, conselhos e amizade que sempre mostraram.

Ao Ricardo, obrigado por toda a amizade e companheirismo durante o curso e durante a escrita da tese, por todos os desentendimentos e opiniões diferentes.

À Natacha, pessoa de que só me aproximei no final deste curso, companheira de casa durante o estágio, obrigado por seres a pessoa que és e pela tua amizade incondicional.

À Rafa e à Cláudia, pelo companheirismo e amizade durante o curso e na elaboração da tese, muito obrigado.

Ao Xico, Bé, Té, Uxi, Inês, meus companheiros de casa durante o curso e grandes amigos que se tornaram, obrigado por tudo.

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IX

Ao pessoal do Soiré obrigado por todos os momentos bem passados ao longo deste curso e pela amizade.

À Olga, à Céu, ao Fábio Rodrigues e ao Fábio Pontes, apesar da distância a amizade perdurou e há-de assim continuar obrigado por terem entrado na minha vida e por fazerem parte dela.

Ao Pessoal “Lá de Baixo” como eu costumo dizer, quando falo deles aqui em Trás-os-Montes, Susana, Nuno, Pedro, Diana, Xuxu, Xamora, Mafalda, meus amigos de sempre obrigado por tudo!

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X

Parte I – Revisão Bibliográfica ... 1

1. Introdução ... 1

2. Parto ... 2

3. Distócia ... 5

4. Distócia por torção uterina ... 8

4.1. Etiologia e Fatores de Risco ... 10

4.2. Fase da gestação na incidência de torção uterina ... 13

4.3. Sintomatologia ... 14

4.4. Diagnóstico... 17

4.5. Tratamento ... 20

4.5.1.Rotação transvaginal do útero ... 20

4.5.2.Rolamento da vaca... 21

4.5.3.Rolamento com prancha – Método de Schafers ... 23

4.5.4.Laparotomia ... 24

4.5.5.Cesariana ... 25

4.6. Extração do feto ... 26

4.7. Prognóstico ... 27

Parte II - Trabalho de Campo ... 30

1. Objetivos ... 30

2. Materiais e Métodos ... 30

2.1. Caracterização da região ... 30

2.2. Animais e procedimentos ... 31

2.3. Caraterização das explorações ... 34

2.4. Análise estatística ... 35

3. Resultados ... 35

4. Discussão ... 44

5. Comentários finais ... 50

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XI

Índice de Figuras

Figura 1 – Estática normal do feto no momento do parto ... 4

Figura 2 – Frequência de distócias em bovinos ... 7

Figura 3 – Representação esquemática de uma torção uterina para o lado direito ... 9

Figura 4 – Deformação da comissura vulvar e períneo em situação de torção uterina ... 16

Figura 5 – Disposição do ligamento largo ... 18

Figura 6 – Correção de torção à direita por rotação transvaginal do útero ... 21

Figura 7 – Resolução de torção à esquerda por rolamento com manipulação vaginal ... 22

Figura 8 – Redução pelo método de Schafers ... 24

Figura 9 – Redução pelo método de Schafers ... 24

Figura 10 – Aspeto do períneo em situações de torção uterina ... 32

Figura 11 – Incidência de torções ao longo dos meses de estágio ... 36

Figura 12 – Frequência relativa da severidade da torção nos animais em estudo ... 36

Figura 13 – Prevalência do sentido da torção nos casos registados no período em estudo ... 37

Figura 14 – Prevalência de torção uterina em função dos tempos de gestação ... 38

Figura 15 – Prevalência de torção uterina por classes de paridade ... 38

Figura 16 – Comparação da ocorrência de torção em vacas primíparas e multíparas ... 39

Figura 17 – Distribuição relativa dos animais com torção uterina de acordo com os seus níveis de produção leiteira ... 39

Figura 18 – Gráfico do teste de Kruskal-Wallis, relacionando o número do parto com a produção leiteira ... 40

Figura 19 – Reflexos dos efeitos da torção uterina sobre a morfologia perineal ... 40

Figura 20 – Representação da prevalência do sexo fetal nas torções uterinas em estudo ... 41

Figura 21 – Métodos utilizados neste trabalho para resolução da torção uterina ... 41

Figura 22 – Representação dos diferentes métodos de resolução da torção uterina conforme o operador ... 43

Figura 23 – Distribuição da gravidade de torção conforme o método de resolução abordado por cada operador ... 43

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XII

Tabela 1 – Prevalência de torções consoante o grau ... 19 Tabela 2 – Distribuição do tipo de torção consoante o sentido ... 37 Tabela 3 – Respetiva média e desvio padrão consoante a paridade e o nível de produção ... 39 Tabela 4 – Distribuição dos diferentes tipos de torção consoante o método de resolução .... 42

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Parte I – Revisão Bibliográfica

1. Introdução

Quanto mais se apuram as raças para satisfazer as nossas necessidades, quer para a produção de leite quer para a produção de carne, mais frágeis estes animais se tornam. A rusticidade é posta de parte em resposta à pressão de seleção e muitos problemas surgem, uma vez que exigimos a estes animais mais do que aquilo que eles estão preparados para nos oferecer, o que frequentemente está aliado ao fato de não lhes serem proporcionadas as condições ideais, pelo que as complicações começam a surgir. Para além dos problemas metabólicos, a parte reprodutiva também se apresenta afetada, tanto do ponto de vista de fertilidade, como aquando do parto dando origem às distócias.

A torção uterina é uma causa de distócia de origem materna. É um problema reprodutivo encarado pelos produtores como algo estranho, apesar de em maior parte dos pontos geográficos apresentar uma baixa ocorrência representa um efeito significativo nas explorações afetadas, chegando a assumir-se em algumas zonas do globo devido às condições da região, métodos agrícolas e maneio dos animais como uma das maiores causas de distócia. Surge a maior parte das vezes no final da gestação, na altura do parto, contudo pode ocorrer durante a mesma embora em situações bastante raras, parece existir uma correlação entre gestações prolongadas e a ocorrência de torção uterina. Os animais afetados apresentam-se por norma inquietos e com um trabalho de parto demasiado demorado sem que ocorra progressão, não existindo por norma membranas fetais visíveis.

É uma patologia que tanto está descrita em animais que se encontram estabulados permanentemente, estando deitados a maior parte do tempo e que têm uma dieta muito à base de concentrado ocupando o rúmen pouco espaço no abdómen, como em animais que se encontram em pastoreio em terrenos inclinados predispondo a quedas ou que têm atividade física despropositada. Os fatores de stress e agitação junto à hora do parto são considerados predisponentes para esta condição.

É característica de animais com mais do que um parto uma vez que todo o seu sistema reprodutivo se apresenta mais laxo predispondo à condição. Existe uma forte predisposição para o envolvimento de fetos machos na ocorrência da torção uterina pelo peso e movimentos fetais que este género apresenta na altura do parto.

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2. Parto

Eutócia ou parto normal pode ser definido como um parto espontâneo de duração normal. É um dos processos biológicos mais encantadores que temos a oportunidade de assistir; apesar de serem conhecidos os mecanismos endócrinos e fisiológicos, a hora exata do parto permanece sempre uma incógnita. A duração da gestação cabe em grande parte ao feto, a mãe pode influenciar o momento do nascimento apenas dentro de limites estreitos (Noakes et al. 2001).

O parto é um evento fisiológico que envolve os fenómenos que dão por terminada a gestação e o mecanismo de expulsão de uma cria do ambiente intrauterino para o mundo exterior, assim como as correspondentes membranas fetais (Martin e Alfonso 1985a; Hafez e Hafez 2000; Peters e Ball 2004). O processo de reprodução da vaca só é concluído com êxito quando um bezerro saudável está de pé ao lado da sua mãe (Peters e Ball 2004).

A musculatura do útero é a componente chave do início do parto. A mudança fisiológica essencial entre a gestação e o nascimento é a libertação de potencial contráctil do miométrio, os mecanismos envolvidos nesta transformação são neuronais, humorais e mecânicos (Noakes et al. 2001). Desta forma, a gestação pode durar mais ou menos do que os 278 dias para a qual está definida, continuando a ser fisiológica (Hafez e Hafez 2000).

Numa vaca gestante, o corpo lúteo, a placenta e a glândula adrenal contribuem para a produção de progesterona. Se o corpo lúteo é removido durante o último trimestre, a gestação continuará, embora o parto em seguida possa ser anormal, sugerindo que o corpo lúteo seja necessário ao desencadeamento do parto (Peters e Ball 2004).

O parto é um evento endócrino que depende da ativação fetal do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, como foi demonstrado por Liggins et al. (1973) em ovinos. De um modo geral, os mesmos mecanismos ocorrem nas diferentes espécies domésticas, incluindo nos bovinos (Noakes 1991). As concentrações plasmáticas de progesterona começam a diminuir geralmente durante os últimos 20 dias de gestação, tendo uma diminuição mais acentuada nos dois ou três dias antes do parto (Peters e Ball 2004). Isto deve-se ao aumento da produção de corticosteroides, que estão também

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relacionados com o aumento da produção de estrogénios pela placenta, o que leva a um amadurecimento da cérvix (Noakes 1991).

Num bovino gestante as concentrações plasmáticas de corticosteroides podem subir até 15 vezes nos últimos 20 dias de gestação. Isto tem bastante importância para dar início ao parto, uma vez que a infusão de hormona adrenocorticotrófica sintética (ACTH), produzida pelo feto leva ao nascimento do vitelo nos 7 dias seguintes. Desta forma consegue-se explicar o fato dos bezerros gémeos nascerem mais precocemente, uma vez que o nível de corticosteroides limite produzido pelos dois pares de glândulas suprarrenais é atingido mais cedo (Peters e Ball 2004).

Os estrogénios produzidos pela placenta estimulam a síntese e libertação de PGF2α, a qual por sua vez provoca a lise do corpo lúteo e estimula as contrações do

miométrio que iniciam a dilatação cervical (Noakes 1991).

Com a aproximação da data do parto, ocorre um aumento do edema mamário, do edema vulvar e os ligamentos sacro-isquiáticos apresentam-se relaxados (base da cauda sobressaída) (Stilwell 2013).

O parto encontra-se dividido em três momentos distintos. A primeira fase corresponde a um estado de preparação do animal, ocorrendo estiramento dos ligamentos pélvicos e dilatação do cérvix. Tem a duração média de 6 horas, mas pode variar entre 1 e 24 horas (Ceron 2007; Selk 2013), sendo por norma a fase mais demorada em novilhas (Neary e Hepworth 2005; Stilwell 2013). Esta fase inicia-se com ocorrência de contrações uterinas regulares, que aumentam em frequência e amplitude à medida que esta fase progride (Noakes 1991). Ao longo desta etapa podem ser evidenciados alguns sinais por parte da parturiente, entre eles, agitação, cauda levantada e isolamento dos outros animais do grupo, para além disto pode apresentar corrimento vulvar mucóide (perda do rolhão gelatinoso cervical), diminuição da temperatura corporal e início da secreção de leite; por vezes o animal pontapeia o abdómen devido ao desconforto que sente (Neary e Hepworth 2005; Stilwell 2013).

O aumento das contrações do miométrio e a presença do feto causam pressão no cérvix, provocando a ativação de neurónios sensitivos de pressão que se localizam a nível cervical e que induzem a produção de oxitocina, que é libertada em circulação pelo lobo posterior da hipófise, facilitando as contrações do miométrio (Youngquist e Threlfall 2007). Peters and Ball (2004) referem que este processo se prolonga durante a segunda fase do parto. Durante a primeira fase do parto o feto passa da posição que

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mantinha no final da gestação e assume a posição necessária para que o nascimento possa ocorrer (Neary e Hepworth 2005), como se pode observar na figura 1.

Figura 1 – Estática normal do feto no momento do parto (Ceron 2007)

A segunda fase corresponde à expulsão do feto através do canal pélvico. Esta fase caracteriza-se pelo aparecimento de contrações regulares dos músculos abdominais (Neary e Hepworth 2005; Ceron 2007). As contrações miometriais aumentam de frequência e chegam às 48 por hora, com 8-10 contrações abdominais por cada contração miometrial (Peters e Ball 2004). Nos bovinos, esta fase dura entre 30 minutos e 4 horas (Noakes 1991; Neary e Hepworth 2005). Vários estudos referem que as novilhas demoram mais tempo nesta fase do parto, devido a uma abertura pélvica menor e menor capacidade de dilatação (Selk 2013), apontando os autores dos mesmos para uma duração de 30 minutos em vacas multíparas e 1 hora em novilhas.

A membrana córion-alantoica pode-se romper totalmente no início da segunda fase do parto. À medida que as contrações vão progredindo o saco amniótico aparece na vulva, vendo-se de imediato os cascos anteriores do bezerro. A bolsa amniótica pode-se romper, possibilitando a lubrificação do canal do parto e que facilita a expulsão do feto (Noakes 1991; Ceron 2007; Stilwell 2013). Depois de expulsa a cabeça do vitelo, as contrações abdominais podem cessar por um curto período de tempo antes da saída do resto do corpo e dos membros posteriores (Noakes 1991).

A terceira fase do parto corresponde à expulsão das membranas fetais e involução inicial do útero (Neary e Hepworth 2005; Ceron 2007; Selk 2013; Stilwell 2013). Após a expulsão do feto, cessam as contrações abdominais. Contudo as contrações do miométrio mantêm-se, para que as membranas fetais possam ser expulsas. Este processo dura normalmente 6 horas e caso se prolongue por mais de 24 horas podemos estar perante um quadro patológico (Noakes 1991; Peters e Ball 2004).

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Depois de expulsas as membranas fetais, as contrações miometriais continuam, acompanhadas pela libertação de oxitocina e PGF2α, fatores que contribuem para uma

rápida involução uterina. Passados 30 dias depois do parto, uma vaca considerada normal já terá completado o processo de involução uterina até ao ponto necessário para poder voltar ao seu ritmo reprodutivo normal (Peters e Ball 2004).

3. Distócia

O termo distócia traduz-se como nascimento com dificuldade. Ocorre quando a primeira ou a segunda fase do trabalho do parto são prolongadas, exigindo frequentemente assistência para a extração do feto (Noakes 1991; Mee 2004; Neary e Hepworth 2005; Youngquist e Threlfall 2007), podendo mesmo levar à impossibilidade da vaca parir (Noakes 1991). É uma das situações obstétricas mais importantes e requer atenção imediata por parte do Médico Veterinário. De entre as espécies domésticas, os bovinos são os mais afetados por esta condição (Sloss e Dufty 1980).

Noakes (2001) refere que a distócia ocorre quando existe uma falha em um ou mais, dos três componentes principais do parto: forças de expulsão, adequação do canal do parto, e o tamanho ou posição fetal.

Não existe um limite claro entre a passagem de um parto eutócico (designado de parto normal, sem complicações), para um parto distócico. O estado do animal e a duração do processo de nascimento da cria ajudam tanto o Médico Veterinário como o produtor a decidir qual é a altura certa a ajudar no nascimento (Youngquist e Threlfall 2007).

As causas de distócia para além da normal distinção em maternas e fetais como será abordado de seguida neste trabalho também podem ser classificadas em proximais, intermédias e finais. Causas proximais podem advir de causas intermédias, que por sua vez podem resultar de causas finais. Assim sendo as causas proximais incluem a desproporção feto materna, posição fetal anormal, inércia uterina, estenose vulvar cervical e torção uterina. As causas intermédias apresentam-se como distócias devido a aumento do tempo de gestação, hipocalcemia, hipomagnesiemia e stress da parturiente, por fim as causas classificadas como finais incluem o sexo do feto, fetos múltiplos, história de distócia, idade do animal, nutrição, tamanho do efetivo, localização geográfica (Meyer 2001).

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Nos bovinos, para que um parto eutócico seja designado de eutócico o feto deverá ter apresentação longitudinal anterior e posição dorso-sagrada, com a cabeça, pescoço e patas dianteiras em extensão (Noakes 1991; Ceron 2007; Youngquist e Threlfall 2007).

As distócias podem também ser classificadas quanto à sua origem, em fetal e materna (Noakes 1991; Peters e Ball 2004). As distócias de origem materna são menos comuns do que distócias de origem fetal (Martin e Alfonso 1985b). Contudo muitas vezes a distinção não é clara e um problema pode dar origem ao outro (Noakes 1991).

As distócias de origem fetal em bovinos podem, por sua vez, ser divididas entre as que são originadas por anomalias na abordagem do feto ao canal obstétrico (defeitos de disposição fetal e várias formas de mau desenvolvimento, como é o caso dos monstros fetais) e as que são causadas por excesso de tamanho fetal em relação à pélvis materna (desproporção fetopélvica) (Youngquist e Threlfall 2007). A disposição do feto aquando da hora do parto também representa um tipo de distócia de origem fetal, podendo dever-se a alterações da postura como membros fletidos, rotação da cabeça para um dos lados, ou alterações de posição corporal, como a posição ventral ou lateral e alterações de apresentação como a apresentação posterior. A ocorrência de partos gemelares também leva muitas vezes a situações de distócia (Peters e Ball 2004; Youngquist e Threlfall 2007).

As distócias de origem materna estão frequentemente associadas a defeitos anatómicos e patológicos do canal do parto, como uma bacia de tamanho reduzido, uma reduzida dilatação da cérvix, inércia uterina, torção uterina, ou rutura. A causa materna mais comum é a inércia uterina, que pode ser primária ou secundária. A inércia uterina secundária é resultante do esgotamento após uma segunda fase do parto demasiado longa. A inércia uterina primária pode surgir por defeitos intrínsecos do miométrio, ou distúrbios hormonais. Uma causa comum de inércia uterina primária e distócia é a hipocalcemia, que ocorre na altura do parto (Peters e Ball 2004; Ceron 2007; Youngquist e Threlfall 2007).

Os diferentes tipos de distócias podem ocorrer tanto em primíparas como em multíparas, sendo os tipos predominantes e os fatores de risco diferentes entre os dois grupos de paridade. Em novilhas, os principais tipos de distócia são, por ordem decrescente de importância, a desproporção feto materna, posicionamento fetal anormal e estenose vulvar. Em vacas multíparas as distócias são devidas, por ordem decrescente de prevalência, a mau posicionamento fetal, desproporção feto-materna, gestações

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gemelares, inércia uterina e estenose cervical. A percentagem de distócias pode ser até três vezes superior em novilhas comparando com as vacas, (Meyer 2001) na figura 2 podem-se observar os diferentes tipos de distócia assim como a sua taxa de ocorrência.

A ocorrência de distócia por mau posicionamento do feto em vacas parece dever-se à raça do touro, sexo do feto e mortalidade fetal (Mee 2012). No caso da desproporção feto-materna, situação que ocorre devido a um tamanho excessivo do feto ou em animais com a bacia muito pequena ou com má conformação, esta é prevalente em novilhas pois são animais que nunca passaram pelo processo de dilatação do canal do parto, e têm uma conformação corporal mais reduzida o que limita também a dilatação do canal obstétrico, pois a pélvis tem menores dimensões do que em vacas adultas. Em raças de carne com hipertrofia muscular esta condição também está patente (Noakes 1991; Noakes et al. 2001; Neary e Hepworth 2005; Ceron 2007; Youngquist e Threlfall 2007). O confinamento é apontado como um fator associado ao aumento do número de distócias, principalmente em novilhas (Mee 2012).

Figura 2 – Frequência de distócias em bovinos, adaptado de Noakes et al (2001).

As consequências da uma distócia são numerosas e dependem da gravidade da situação; nelas se devem incluir os efeitos não quantificáveis financeiramente sobre o bem-estar da mãe e do bezerro (Noakes et al. 2001), assim como os efeitos a curto,

45% 25% 9% 5% 5% 3% 3% 2% 2% 1%

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médio e longo prazo que têm na economia da exploração. Estas consequências podem compreender: aumento da morbilidade e mortalidade neonatal, aumento das mortes do efetivo reprodutor, suscetibilidade aumentada para os animais desenvolverem problemas uterinos e retenção placentária, esterilidade, fertilidade reduzida, mastite e hipocalcemia (Noakes 1991; Noakes et al. 2001; Lombard 2007). Animais que já tiveram partos distócicos estão mais suscetíveis de que a condição volte a surgir nos partos seguintes (Mee et al. 2007).

A quantidade de apresentações clínicas passíveis de serem encontradas pelos veterinários é enorme. O diagnóstico de distócia é geralmente feito pelo proprietário, que pode decidir procurar ou não ajuda profissional no início do parto, levando a que o parto seja indevidamente prolongado (Youngquist e Threlfall 2007).

A prevalência de distócias em bovinos tem sido alvo de muito estudo devido aos seus efeitos prejudiciais na produtividade. Para além disto tem existido um esforço substancial para evitar distócias por desproporção feto-materna. Muitas variáveis podem contribuir para as distócias, tais como a raça, idade da progenitora, conformação e condição corporal da mesma, sexo do bezerro, partos gemelares. Reconhece-se ainda que é mais comum em bovinos de carne do que em bovinos de aptidão leiteira (Noakes et al. 2001).

Desta forma é de extrema importância prevenir as distócias, para isto devem ser tomadas em conta uma série de regras a seguir. O touro usado em inseminações de novilhas deve originar partos fáceis com vitelos pequenos e de peso reduzido ao nascimento. Tanto as vacas como as novilhas devem receber uma alimentação equilibrada do ponto de vista nutricional e adequada à gestação. Uma supervisão dos partos, associada a uma intervenção oportuna caso seja necessário ajuda a controlar casos de partos difíceis e a diminuir os índices de mortalidade da cria e da progenitora (Ceron 2007; Mee 2012).

4. Distócia por torção uterina

A torção uterina corresponde a uma rotação do útero grávido em torno do seu eixo longitudinal, (Tejerina 1991; Ceron 2007; Amer e Hashem 2008; Kumar 2009) como representado na figura 3; encontra-se em geral classificada (Amer e Hashem 2008):

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1 - Entre torção para o lado direito ou para o lado esquerdo, de acordo com o sentido que toma a torção;

2 – Como leve, moderada ou grave de acordo com o grau;

3– Em pré-cervical, cervical ou pós-cervical, de acordo com a posição.

As torções uterinas estão descritas nas diferentes espécies animais, contudo a espécie onde ocorre com maior frequência é a bovina (Frazer et al. 1996; Carlton e McGavin 1998; Nascimento e Santos 2003; Kumar 2009).

Embora seja no geral uma patologia característica de animais gestantes, também pode ocorrer em casos de piometra, mucometra e hidrometra (Carlton e McGavin 1998; Nascimento e Santos 2003).

Figura 3 – Representação esquemática de uma torção uterina para o lado direito (Sloss e Dufty 1980)

De acordo com a bibliografia, esta patologia parece ter uma incidência mais marcada em multíparas jovens (cerca de 70%) do que em novilhas (± 30%), mas esta distribuição relativa pode ser reflexo, em grande parte, da distribuição etária das explorações (Roberts 1986; Frazer et al. 1996). Representa 3 a 7% das distócias encontradas em bovinos (Noakes et al. 2001; Jackson 2004).

Numa situação de torção uterina, a expulsão do feto torna-se impossível, a menos que esta condição seja corrigida, e os distúrbios circulatórios que a acompanham podem levar tanto à morte do feto como da vaca se o diagnóstico não for feito atempadamente (Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996).

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4.1. Etiologia e Fatores de Risco

Os clínicos de bovinos definem a torção uterina como resultado de distócia, contudo as causas exatas da torção raramente são descobertas em cada caso individual (Divers e Peek 2008). Um confinamento prolongado, quedas bruscas em terrenos inclinados, um abdómen profundo, movimentos fetais fortes, tonús uterino deficiente e a forma particular dos bovinos se levantarem, elevando primeiro o terço posterior têm sido apontados como alguns dos fatores predisponentes (Tejerina 1991; Frazer et al. 1996; Divers e Peek 2008).

Durante a gestação, ocorre um pequeno aumento dos ligamentos largos, quando comparado com o alongamento da massa do útero grávido (Manning et al. 1982; Roberts 1986); em casos de gestações unicornuais o órgão torna-se mais pesado e volumoso de um dos lados, provocando instabilidade e predispondo à torção uterina (Jackson 2004; Divers e Peek 2008; Kumar 2009). Para além disto, com o avanço da gestação o corno uterino gravítico é apenas suportado pela ancoragem do ligamento largo à curvatura menor, ligando a porção caudal do útero às estruturas laterais da bacia, que desta forma se estende para longe da sua área de ancoragem, ficando a curvatura maior livre (Jackson 2004; Drost 2007; Kumar 2009). Assim o útero avança em direção crânio-ventral podendo encontrar-se entre o rúmen, intestinos e parede abdominal, o que confere ao útero muito maior mobilidade e instabilidade (Frazer et al. 1996; Nascimento e Santos 2003), tornando a vaca predisposta a torção uterina no terceiro trimestre de gestação (Frazer et al. 1996; Drost 2007; Kumar 2009; Amin et al. 2010). A instabilidade do útero gravídico em vacas de raças derivadas do tronco BosTauros ocorre devido à ampla inclinação dos ligamentos largos na sua porção ventro-medial, de ancoragem subilial, e que se inserem na margem lateral ventro-medial do corpo uterino e na superfície ventral dos cornos uterinos, pelo que à medida que a gestação progride os cornos uterinos assentam no chão da cavidade abdominal sem a presença de ligamentos de estabilização (Frazer et al. 1996; Jackson 2004). A inserção dos ligamentos largos em raças derivadas do tronco Bos Indicus é mais dorsal, estendendo-se em direção à ponta do corno uterino, o que oferece uma maior estabilidade à estrutura, sendo esta a provável razão para que exista uma baixa prevalência de torção uterina nestas raças (Sloss e Dufty 1980; Divers e Peek 2008), aliado ao fato de os bezerros serem relativamente pequenos aquando do parto (Frazer et al. 1996). Gestações gemelares por norma diminuem o risco de torção uterina uma vez que são quase sempre

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de natureza bicornual, assim o útero apresenta-se mais estável (Roberts 1986; Hanzen 2014).

Na maior parte dos casos, a ocorrência de torção está associada ao parto. Uma movimentação vigorosa do vitelo antes do parto enquanto assume a posição correta para o nascimento, associada à existência de pequenas quantidades de líquidos fetais, contribuem para a ocorrência desta patologia (Drost 2007; Lyons et al. 2013). A bolsa amniótica adere ao alantoide que a circunda, o qual por sua vez se encontra unido através do córion à parede uterina, levando a que em alguns casos quando o feto gira sobre o seu próprio eixo no final da gestação o útero possa rodar com ele (Jackson 2004; Kumar 2009).

Outro fator que se crê também contribuir para a ocorrência da torção uterina é o peso do feto. Drost (2007) verificou que em 89% dos casos o peso do feto se encontra acima da média observada nas coabitantes; assim, poderemos dizer que uma torção uterina envolve maioritariamente um feto com peso acima da média e do sexo masculino. Esta diferença relativamente ao género poderá estar relacionada com as alterações hormonais que ocorrem durante a última fase do parto (Amin et al. 2010). No entanto, a influência do género na ocorrência de torção uterina é controverso, pois outros estudos não encontraram qualquer correlação entre estas duas variáveis (Kruse 2004).

Também as mudanças de instalações nos dias antecedentes ao parto, por aumentarem a atividade do animal, podem ser consideradas um fator de risco na torção uterina (Lyons et al. 2013; Stilwell 2013).

Ainda assim, mesmo no final da gestação quando a assimetria do corno uterino é máxima, a torção uterina é a exceção e não a regra (Roberts 1986). Para alguns autores (Frazer et al. 1996; Mee 2008), a torção uterina é um achado incomum, representando entre 3 a 7% das distócias (Frazer et al. 1996; Noakes et al. 2001; Jackson 2004; Mee 2008). Robin (2005) refere ter-se observado um acréscimo na incidência de distócias por torção uterina no Reino Unido. Segundo este autor, a proporção aumentou de 5.5%, em 1997, para 10.7%, em 2004, com uma prevalência de 9% desde 2000. A causa deste aumento não está definida, mas poderá estar relacionado com o aumento do tamanho da vaca ou com uma redução do volume do rúmen antes do parto, promovendo o aumento do espaço abdominal livre que por sua vez favorece a rotação do útero; o aumento do tamanho do vitelo ao nascimento também poderá contribuir para este aumento na ocorrência de torção uterina (Laven e Howe 2005).

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A incidência de torção uterina é também variável em função da localização geográfica, a variabilidade geográfica dos métodos agrícolas e de produção pode determinar uma maior prevalência de torções uterinas. A meio da década de ´90, a América do Norte, tinha uma incidência mais elevada de torções em bovinos, com 5 a 7% das distócias por torção, enquanto o Reino Unido apresentava 5 a 6% de torções uterinas e a Europa continental apresentava 3 a 4%; a Austrália surgia então com a menor percentagem de distócias por torção uterina, cerca de 1 a 3%, o que na altura foi associado favoravelmente à prática de um pastoreio rotacional. Estes dados referentes às diferentes regiões do globo, refletem as práticas agrícolas utilizadas nas diferentes regiões, assim como as variações a nível de maneio e nutrição praticadas (Frazer et al. 1996), as quais poderão contribuir para a incidência de torção uterina nos efetivos bovinos.

Animais com uma dieta à base de concentrado ou que passem por um período de escassez alimentar (controlado) têm um volume ruminal menor, o que liberta espaço na cavidade abdominal que será ocupado pelo útero gravídico, tornando-o mais propenso à torção uterina, comparativamente ao que acontece nos animais em pastoreio (Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996; Nascimento e Santos 2003). Além disso, animais estabulados com exercício físico reduzido e que se encontram muito tempo em decúbito ficam predispostos a esta condição (Martin e Alfonso 1985b; Jackson 2004), assim como acontece com animais que pastam em terrenos muito acidentados e que praticam movimentos bruscos (Martin e Alfonso 1985b).

Parece existir uma influência genética na ocorrência de torção uterina. A raça de bovinos Parda Suíça foi apontada como tendo maior predisposição para torção uterina quando comparada com Holstein-Frísia, devido à sua grande profundidade abdominal e ao fato de originar vitelos com bastante peso ao nascimento (Frazer et al. 1996; Mee 2008). Em contraste, outras raças, como a Jersey, a Hereford e a Angus, apresentam uma prevalência de torção uterina bastante inferior à Holstein-Frísia. A raça de aptidão de carne que apresenta maior incidência para torção uterina é a raça Charolesa, cujas crias apresentam hipertrofia muscular ao nascimento e peso elevado (Frazer et al. 1996). Não parece existir um efeito associado ao mês do parto na ocorrência de torções uterinas, uma vez que cerca de 35% das ocorrências incidiram nos meses de primavera, entre Março e Abril, o que coincide também com a altura de maior número de partos dos animais nos locais onde se desenvolveram os estudos (Roberts 1986; Frazer et al. 1996).

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No que diz respeito à prevalência da idade dos animais na torção uterina, animais com idade entre os dois e os quatro anos estão mais suscetíveis à torção uterina, em oposição a animais entre os sete e dez anos que são menos propensos (Frazer et al. 1996). Por outro lado, estes dados podem estar condicionados pelo fato de os proprietários não recorrerem a serviços veterinários no caso de animais mais idosos, uma vez que 70% das torções estão descritas em multíparas jovens e 30% em novilhas (Roberts 1986). Há ainda que considerar que o ligamento largo é maior e mais flexível em vacas com alguma idade, assim como o abdómen é mais espaçoso e a parede bastante distendida, pelo que o útero teria tanto maior mobilidade para a torção quanto a paridade do animal (Martin e Alfonso 1985b; Aubry et al. 2008).

Apesar de não haver uma correlação marcada entre o alongamento da gestação e ocorrência de torção uterina, vários estudos sugerem essa predisposição (Frazer et al. 1996). Kruse (2004) observou essa correlação positiva entre a gestação e o risco de torção uterina confirmada pela correlação genética aditiva entre a gestação e a torção uterina nas raças Holstein-Frísia e Parda Suíça.

4.2. Fase da gestação na incidência de torção uterina

Uma torção uterina pode surgir entre os cinco e os oito meses de gestação, contudo a sua ocorrência afastada do momento do parto é uma situação bastante rara (Frazer et al. 1996; Aubry et al. 2008). A maior parte das torções uterinas ocorre próximo da hora do parto (Noakes 1991; Frazer et al. 1996), ocorrendo mais frequentemente entre a primeira e a segunda fase do parto (Divers e Peek 2008; Kumar 2009). Esta ideia baseia-se no fato de ser observado um determinado grau de dilatação cervical imediatamente antes ou depois da resolução da torção (Frazer et al. 1996).

Torções com menos de 180º surgem muitas vezes durante uma gravidez avançada sem que apresente, algum efeito sobre a gestação. Torções menores, entre os 45 e o 90º podem ser detetadas durante a rotina de diagnóstico de gestação e muitas vezes têm uma correção espontânea (Roberts 1986). Divers e Peek (2008) referem que torções de 45º ou superiores podem permanecer durante semanas ou meses sem que no final da gestação se agravem ou sequer comprometam o fluxo normal de sangue ao útero e ao feto.

Um estudo britânico revelou que, num grupo de 168 vacas, 98% dos casos de torção ocorreram ao início do parto, com grau de dilatação cervical variável, o que

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sugere a existência de um fator inicial, que exercerá a sua ação na primeira fase de trabalho de parto (Frazer et al. 1996). Segundo estes autores, em 55% dos casos por eles registados, o serviço veterinário foi requerido para animais em trabalho de parto há 6 a 24h, de acordo com os dados fornecidos pelos proprietários. Em alguns casos a única forma de determinar a duração da torção passou pela determinação do grau de decomposição fetal. Sendo que existiam sinais de autólise avançada e/ou enfisema em cerca de 40% dos fetos.

4.3. Sintomatologia

A torção uterina ocorre normalmente na altura em que o animal já apresenta edema do úbere: desta forma o desenvolvimento mamário é pouco suscetível de levantar suspeitas, a menos que o animal inicie este processo algumas semanas antes da data prevista para o parto (Frazer et al. 1996). Kumar (2007) afirma que a torção uterina é uma complicação do final da primeira fase do parto ou início da segunda. Contudo, embora seja raro as torções uterinas ocorrerem nos primeiros meses de gestação, quando isso acontece podem apresentar sinais clínicos se superiores a 180º, que podem ser confundidos com cólicas e desconforto abdominal (Divers e Peek 2008). Assim, apesar de raramente ser uma causa de cólica, a torção uterina deve ser incluída no diagnóstico diferencial de uma vaca com cólica depois dos quatro meses de gestação (Divers e Peek 2008).

Nos casos de torção uterina que ocorrem ao parto, muitas vezes o primeiro e principal sinal a ser notado é uma primeira fase do parto demasiado longa associada a alguma inquietude e desconforto por parte do animal, não havendo progressão para a segunda fase (Martin e Alfonso 1985b; Roberts 1986; Noakes et al. 2001; Jackson 2004; Kumar 2009). Sinais de esforço abdominal e tenesmo são sintomas característicos da segunda fase do trabalho de parto, mas que estão diminuídos ou ausentes na torção uterina (Kumar 2009); existem evidências de dor abdominal e desconforto devido ao alongamento do ligamento largo (Drost 2007).

A maioria dos autores afirma que o bruxismo (ranger de dentes), as cólicas e a anorexia são sinais raros em vacas com torção uterina, a menos que a torção não seja diagnosticada e se prolongue por vários dias (Frazer et al. 1996). Em casos de suspeita de torção uterina é mais provável que o animal permaneça inquieto durante um longo período, ansioso, com diminuição do apetite, com relutância a deitar-se ou levantar-se,

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podendo ainda apresentar estase ruminal, constipação e aumento do pulso (Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996; Drost 2007; Divers e Peek 2008).

Frazer et al. (1996) descreveu a existência, em cerca de 23% dos casos por eles registados, de esforço abdominal como sinal clínico na torção uterina. Esta percentagem de esforço abdominal pode ser explicada pelo fato de 31% dos casos relatados serem torções de mais de 270º; este grau de elevada tensão pode estimular recetores de estiramento na vagina, provocando um esforço abdominal reflexo. A ausência de esforço por vezes pode surgir devido à presença de membranas fetais intactas ou presença de um membro na vagina anterior. Uma elevada prevalência de membranas fetais intactas explica o facto de só terem observado corrimento vaginal em 13% dos casos.

A presença de taquicardia é um dado clínico consistente. Deste modo, um animal com uma frequência cardíaca elevada deve alertar para uma possível torção uterina (Frazer et al. 1996; Divers e Peek 2008). Também a temperatura retal pode estar ligeiramente elevada (Frazer et al. 1996); a par disto também a frequência respiratória vai estar aumentada (Frazer et al. 1996; Drost 2007).

Como o parto não progride devido à torção, pode surgir anorexia completa, taquicardia progressiva e verdadeira cólica com o animal a pontapear o abdómen (Divers e Peek 2008).

Estão também descritos em casos de torção uterina algumas deformações a nível da comissura vulvar, que se pode apresentar repuxada para o interior, para a esquerda ou para a direita, (Frazer et al. 1996; Divers e Peek 2008) (Figura 4). No entanto, estas alterações não são descritas de forma constante (Frazer et al. 1996), se bem que haja descrições que incluem o edema vulvar como sinal clínico; este pode ocorrer por compressão das veias vaginais e das artérias linfáticas podendo levar ao desenvolvimento desta condição. Encontra-se ainda referida a existência de mucosas conjuntivas congestionadas e mucosa vulvar pálida e seca (Sutaria et al. 2012; Alfaris et al. 2014).

Em torções mais severas podem ainda ser observadas alterações no perfil sanguíneo, como cálcio e albumina diminuídos, aumento dos níveis de ureia, hematócrito reduzido e linfocitose (Ensell e Cutler 2010).

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Figura 4 – Deformação da comissura vulvar e períneo em situação de torção uterina. À esquerda, torção uterina> 180º para o lado esquerdo. Para além da vulva se encontrar repuxada para dentro, notava-se também que o grau de pregueamento era um pouco mais intenso no lado da torção (seta cião) comparado com a do lado oposto (seta amarela). À direita, torção uterina de 720º (duas voltas completas) para o lado direito. De notar que, para além de uma ligeira rotação do eixo longitudinal do óstio vulvar, a profundidade e aproximação das rugas da pele peri-vulvar é mais pronunciada do lado direito (marca cião) do que do lado esquerdo (marca amarela).

Quando o grau de torção é muito pronunciado, ou esta se mantém por demasiado tempo, a vida do animal pode estar em risco, pois há comprometimento da função de veias e vasos linfáticos com congestão e edema da parede uterina, compressão arterial de que podem resultar alterações da oxigenação, com hipoxia e morte fetal. A trombose, gangrena e rutura uterina podem ser observados quando a situação persiste por algum tempo (Martin e Alfonso 1985b; Penny 1999; Nascimento e Santos 2003; Ceron 2007; Sutaria et al. 2012). A acumulação de fluido sero-sanguinolento na cavidade abdominal varia, em quantidade, de acordo com a severidade e a duração da torção (Otter 1999; Penny 1999).

Otter (1999) referiu no seu estudo a ocorrência de uma torção de 360º numa novilha charolesa, acompanhada de igual torção do mesentério intestinal. Existe também referência à coexistência de mumificação fetal e torção uterina (Moore e Richardson 1995). Este é um achado incomum pois relata existência de mumificação fetal e torção uterina concomitantemente, o mais provável de ter ocorrido terá sido em primeiro lugar a mumificação fetal e posteriormente torção uterina, uma vez que a torção uterina nunca foi apontada como causa de mumificação fetal (Roberts 1986).

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Surpreendentemente, ocorrem muitos casos de morte fetal e autólise, mas a vaca só desenvolve sinais leves ou moderados de toxemia; nos casos em que as membranas fetais permanecem íntegras esta condição é retardada, fazendo com que em muitos casos os animais não apresentem alterações na temperatura corporal. A falta de sinais clínicos no decorrer de uma torção uterina levam a que por vezes o proprietário só recorra a auxílio veterinário passadas 6 a 24 ou mesmo 48 horas após a torção (Frazer et al. 1996).

4.4. Diagnóstico

O diagnóstico de torção uterina obtém-se numa gestação avançada. É indispensável a realização de uma palpação transretal, pois só ela permitirá confirmar a torção devido à disposição anormal dos ligamentos largos, além de permitir ainda confirmar o sentido da torção, caso ela exista (Penny 1999; Jackson 2004; Divers e Peek 2008). À palpação transretal a orientação dos ligamentos largos encontra-se nitidamente alterada. Dependendo do sentido da torção, se é para a esquerda ou para a direita, o respetivo ligamento é puxado em todo o útero. Através da palpação vaginal podem ser palpadas pregas espiraladas (Martin e Alfonso 1985b; Tejerina 1991; Lyons et al. 2013). Por se tratar de uma patologia característica do final da gestação, muitas vezes as torções uterinas que ocorrem a meio da gestação passam despercebidas, devido aos sinais clínicos que apresentam são frequentemente diagnosticadas e tratadas como se de patologias intestinais se tratassem (Divers e Peek 2008).

É de extrema importância que o sentido da torção seja diagnosticada com clareza antes de se proceder à correção da situação, pois caso se tente fazer a correção no sentido errado ir-se-á agravar a situação. Numa situação de torção uterina, o ligamento largo do lado da torção é puxado verticalmente para baixo, enquanto o outro ligamento oposto é tracionado com bastante tensão através da parte superior do corpo uterino, como se pode observar na figura 5 apresentada de seguida. A força de tensão nos ligamentos largos ajuda a determinar a gravidade da torção (Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996). Esta situação exuberante ocorre por norma na maioria das torções que surgem a meados da gestação, que são torções de mais de 180º (Divers e Peek 2008).

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Figura 5 – Disposição do ligamento largo: A- em situação normal; B- no caso de torção para a direita; C- no caso de uma torção para a esquerda (Roberts 1986)

A torção uterina na vaca ocorre normalmente em torno do cérvix (Carlton e McGavin 1998). Na grande parte dos casos estende-se posteriormente ao cérvix, pelo que são designadas de torções pós-cervicais; neste caso a parede vaginal poderá estar envolvida na rotação. Por norma apenas a vagina anterior é afetada, não envolvendo a vulva. O envolvimento vaginal pode não ser evidente se a torção for inferior a 180º (Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996). Segundo o estudo de Frazer et al. (1996), os casos analisados foram mais propensos a ter um envolvimento vaginal na torção. Contudo em 34% dos casos de torção o envolvimento vaginal na torção não foi evidente, sendo a torção pré-cervical. Desta forma o diagnóstico de torção uterina não teria sido possível se não se tivesse realizado palpação rectal (Long 2006); este tipo de torções são mais prováveis de ocorrer no último trimestre de gestação embora ocorram com pouca frequência de maneira geral (Frazer et al. 1996; Jackson 2004).

Nos casos em que a torção é inferior a 180º, a mão do Veterinário consegue passar através da constrição e palpar o feto; nestes casos o cérvix encontra-se por norma dilatado. Desta forma é preciso determinar a vitalidade do feto pois disso pode depender a abordagem a tomar. Em situações em que a torção é superior a 180º, o canal do parto pode encontrar-se fechado, não sendo possível nestes casos palpar-se o cérvix, e a vagina afunila em forma de cone (Jackson 2004).

Numa torção uterina, o corno uterino gestante gira normalmente sobre o não gestante, e portanto é de esperar uma maior prevalência de torções no sentido

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anti-19

horário (lado esquerdo), já que cerca de 60% das gestações ocorrem no corno uterino direito (Tejerina 1991; Frazer et al. 1996; Drost 2007; Aubry et al. 2008; Divers e Peek 2008; Hanzen 2014). Por outro lado, seria de esperar que o rúmen impedisse a rotação do corno uterino direito para a esquerda; contudo as torções para o lado esquerdo são as mais comuns (Noakes et al. 2001). Inúmeros autores referem que a incidência de torções uterinas no sentido anti-horário é de 59 a 75% (Roberts 1986; Noakes et al. 2001; Jackson 2004; Aubry et al. 2008).

O grau de torção uterina mais comum é um parâmetro mais difícil de estabelecer. Frazer et al. (1996) encontraram as prevalências apresentadas na tabela seguinte. Contudo não existe consenso sobre a frequência relativa das torções uterinas pelos diferentes graus, chegando mesmo a ser posta em consideração se a frequência reportada nos diferentes trabalhos é representativa da observada no campo (Roberts 1986; Frazer et al. 1996).

Tabela 1 – Prevalência de torções consoante o grau.

Grau de torção Prevalência

45 – 90º Raras

90-180º 20%

180 - 270º 57

270 – 360º 22

Embora sejam situações consideradas raras, podem existir torções de útero com graus de rotação superiores a 360, correspondendo a duas ou mesmo três rotações completas do útero sobre o seu eixo (Frazer et al. 1996); Penny (1999) observou um caso de torção uterina de 540º aos 150 dias de gestação.

Torções uterinas com menos de 180º são normalmente resolvidas no campo, representando apenas 6 a 15% dos casos de referência (Frazer et al. 1996). Em casos mais ligeiros de torções ≤ 45º, pode ser possível o parto (Lyons et al. 2013).

O aumento do grau de torção tem impacto na sobrevivência do feto (Amer e Hashem 2008), pelo que a viabilidade do vitelo deve ser sempre determinada por palpação ou ecografia, pois isto pode condicionar a abordagem a tomar (Divers e Peek 2008).

Animais que já sofreram de torção uterina têm maior probabilidade de nova ocorrência em partos seguintes (Long 2006).

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4.5. Tratamento

No que diz respeito à resolução de uma torção uterina em bovinos, não existe uma forma padrão para o fazer (Frazer et al. 1996; Aubry et al. 2008). O método selecionado para a resolução de torções uterinas em bovinos depende da experiência do veterinário, da fase da gestação, da gravidade da torção, assim como da condição da progenitora, do útero e do feto (Ghuman 2010). Em torções em que a rotação apresentada é ≤90º, é frequentemente possível extrair o feto em posição dorso-sacral normal (Drost 2007). Na maior parte das vezes, tentam-se várias técnicas antes de conseguir a resolução da situação, em particular no caso de torções superiores a 180º (Frazer et al. 1996).

Para a resolução de uma torção uterina, as manobras devem sempre ser feitas sob anestesia epidural baixa (5-10 ml de lidocaína 2%) (Stilwell 2013).

4.5.1. Rotação transvaginal do útero

O grau de torção e de dilatação cervical são fatores críticos para o sucesso deste método (Sloss e Dufty 1980; Kruse 2004). A correção manual só é possível se o local principal da torção for caudal ao cérvix. Nesta abordagem, a determinação da gravidade da torção e o grau de relaxamento cervical são dados importantes. Cerca de 90% das torções ocorrem durante o parto e são inferiores a 180º, pelo que com frequência se opta pela resolução manual através da vagina (Friedhofer 2005; Aubry et al. 2008). A técnica apresenta uma eficácia de 96%, mas caso se considerem apenas os casos referenciados para um especialista, esta eficiência pode variar entre 23 a 62% (Manning et al. 1982; Frazer et al. 1996).

Para que esta abordagem tenha sucesso é necessário que a vaca esteja de pé, permitindo ao Veterinário a introdução do braço pelo canal do parto até ao útero; o feto é então agarrado por uma proeminência conveniente (como a cabeça, pescoço, cotovelo, esterno ou coxa) e agitado de um lado para o outro antes de ser empurrado no sentido oposto à da torção (Jackson 2004; Purohit et al. 2011; Lyons et al. 2013), como se pode observar na figura 6. Este procedimento é facilitado se um assistente aplicar uma força externa no abdómen da vaca, usando os seus punhos num movimento descendente, para coincidir com os movimentos que estão a ser aplicados interiormente (Lyons et al. 2013). Caso os dois membros do feto consigam ser palpados e amarrados, pode-se usar uma barra de destorção, que permite a rotação do vitelo por parte do assistente. Para que

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esta técnica resulte é indispensável uma boa lubrificação do canal do parto (Purohit et al. 2011).

Figura 6 – Correção de torção à direita por rotação transvaginal do útero (Jackson 2004)

Por norma, é mais difícil resolver os primeiros 180º, depois do que o útero continua o seu próprio movimento (Sloss e Dufty 1980). Caso os fluidos fetais ainda se encontrem dentro do útero e o feto se encontre vivo, a resolução da torção é facilitada uma vez que este responde à manipulação, e acaba por fazer a rotação desejada (Sloss e Dufty 1980; Martin e Alfonso 1985b; Frazer et al. 1996; Jackson 2004). Contudo o aumento do peso do feto pode tornar este tipo de correção difícil (Noakes et al. 2001).

A resolução da torção é bastante facilitada se se proceder ao levantamento dos quartos traseiros da vaca, por exemplo com recurso a uma pinça de trator. Desta forma o eixo maior da torção fica paralelo ao eixo vagino-uterino, o que permite reduzir as forças e facilita a rotação (Kumar 2009). Esta suspensão facilita ainda quando se pretende utilizar o método de balotamento abdominal. Esta técnica recorre à ação, na parte exterior do abdómen, de dois assistentes, um do lado que ocorreu a torção e outro do lado oposto, que tentam balançar o vitelo na direção contrária à torção (Noakes et al. 2001; Kumar 2009). Para que esta técnica tenha sucesso o assistente do lado da torção deverá fixar uma proeminência do vitelo num plano inferior, enquanto o assistente do lado contrário deve fixar uma proeminência num plano superior, depois disto podem proceder à rotação. Esta técnica é usada por norma antes do Veterinário proceder à destorção manual (Noakes et al. 2001).

4.5.2. Rolamento da vaca

Esta abordagem deve ser considerada em casos em que a correção manual não foi satisfatória. Contudo em torções superiores a 360º, deverá ser considerada outra metodologia (Lyons et al. 2013). Está indicada para animais com o abdómen muito

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profundo, em que é complicado aceder ao feto, em torções de maior gravidade e em casos em que a gestação ainda não chegou a termo (Roberts 1986; Noakes et al. 2001).

Este método passa por rolar a vaca em torno do seu útero, enquanto o órgão permanece imóvel. Neste método, a vaca é deitada para o lado da torção, sendo contida pelas duas patas dianteiras e as duas traseiras, assim como pela cabeça; de seguida é rodada em sentido contrário (Jackson 2004; Lyons et al. 2013). Poderá ser necessário proceder à rotação da vaca várias vezes antes da torção ser resolvida (Jackson 2004).

A técnica de rolamento pode ser acompanhada de manipulação vaginal, o que aumenta a probabilidade de correção. Neste caso o Veterinário segura o vitelo na posição em que este se encontra enquanto a vaca é rodada (Figura 7). Contudo este método torna-se perigoso para o operador, pelo que deve ser evitado (Lyons et al. 2013).

Figura 7 – Resolução de torção à esquerda por rolamento com manipulação vaginal.

Não é comum ocorrer rutura das membranas fetais em casos de rotações até 180º, pelo que nestes casos é frequente encontrar o feto ainda vivo; se a cérvix não se encontrar completamente dilatada, é preferível nestes casos tentar resolver a torção sem ruturar as membranas, procedendo ao rolamento da vaca. Caso as membranas fetais tenham sofrido rutura a viabilidade do feto encontra-se muito reduzida. Contudo mesmo em situações em que as membranas se encontram íntegras, pode já ter ocorrido deslocação da placenta e hipoxia fetal (Frazer et al. 1996).

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Caso se parta para a resolução de uma torção com a certeza de que o feto está morto, ruturar as membranas fetais irá ajudar na resolução pois a eliminação dos fluidos fetais diminui o peso do útero, favorecendo a destorção manual (Frazer et al. 1996).

Roberts (1986) refere que em determinadas circunstâncias, o simples ato de deixar cair a vaca para o lado da torção pode corrigir o sucedido. Contudo, não foi esta a experiência de Frazer et al. (1996), que defendem que torções de maior gravidade exigem um cuidado extremo aquando da manipulação, e que a queda brusca do animal pode sujeitar o útero friável à rutura.

O rolamento da vaca aparenta ter uma taxa de sucesso entre 18-100%, no entanto se a torção não for aliviada após três a cinco tentativas, a cirurgia é indicada (Sloss e Dufty 1980; Kruse 2004).

4.5.3. Rolamento com prancha – Método de Schafers

A modificação do método de rolamento implica a utilização de uma prancha na tentativa de tentar aumentar a imobilidade uterina (Frazer et al. 1996; Jackson 2004).

A vaca é deitada com recurso a cordas, para o lado da torção; uma tábua longa é colocada na fossa paralombar, formando um ângulo reto com o eixo longitudinal da vaca. Um assistente coloca-se em cima para fazer pressão no útero (Roberts 1986; Noakes et al. 2001; Swelum et al. 2012; Lyons et al. 2013), enquanto a vaca é rolada. Para a elaboração desta técnica o ideal são pranchas de 4-5 metros (Lyons et al. 2013). De seguida, as patas dianteiras da vaca são amarradas uma à outra e faz-se o mesmo às patas traseiras; os membros são então erguidos enquanto a vaca permanece deitada e o animal é rodado (Roberts 1986; Tejerina 1991; Drost 2007), ao mesmo tento que um assistente se mantém sobre a prancha e vai caminhando no sentido oposto ao da rotação da vaca (Figuras 8 e 9). Depois disto deve-se realizar palpação vaginal ou rectal de forma a perceber se a torção foi ou não corrigida; caso tenha resolvido a torção as pregas vaginais em espiral características terão desaparecido (Swelum et al. 2012). Este método consegue resolver rotações de maior grau, quando comparado com o rolamento simples, uma vez que o útero se consegue de certa forma fixar na posição desejada (Drost 2007).

O uso da tábua aumenta a taxa de sucesso, permitindo a correção de mais de 90% dos casos (Frazer et al. 1996).

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Figura 8 – Redução pelo método de Schafers (Martin e Alfonso 1985b)

Figura 9 – Redução pelo método de Schafers (Roberts 1986). As setas perpendiculares à tábua representam o assistente em cima da tábua, as setas ocas paralelas à corda representam o sentido da rotação.

4.5.4. Laparotomia

A correção cirúrgica de uma torção uterina só deverá ser adotada quando os outros métodos se revelam infrutíferos (Lyons et al. 2013). A laparotomia pode estar indicada em casos em que ocorrem torções antes do final da gestação, e em casos em que as tentativas de rolamento da vaca foram infrutíferas. Caso não ocorra rutura uterina e estando o feto vivo, a gestação poderá prolongar-se até à altura do parto (Frazer et al. 1996).

O veterinário deve passar a mão entre o útero e a parede abdominal, ou entre o rúmen e o útero, segurar uma extremidade abdominal, e balançando o útero para o lado

Imagem

Figura 1 – Estática normal do feto no momento do parto (Ceron 2007)
Figura 2 – Frequência de distócias em bovinos, adaptado de Noakes et al (2001).
Figura 3 – Representação esquemática de uma torção uterina para o lado direito (Sloss e Dufty 1980)
Figura 4 – Deformação da comissura vulvar e períneo em situação de torção uterina. À esquerda, torção  uterina>  180º  para  o  lado  esquerdo
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