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CONCEITOS DA SOCIOLOGIA DE PIERRE BOURDIEU PARA PESQUISAS EM EDUCAÇÃO

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CONCEITOS DA SOCIOLOGIA DE PIERRE BOURDIEU PARA PESQUISAS EM

EDUCAÇÃO

Rita de Cássia Alves das Chagas Mestranda em Educação pela Universidade Nove de Julho

cassiaalves.historia@uol.com.br

Lídia Juliana Rodrigues Moraes Mestranda em Educação pela Universidade Nove de Julho

jujurodrigues@yahoo.com.br

O objetivo deste texto é promover uma discussão sobre os conceitos do sociólogo francês Pierre Bourdieu, direcionados à análise de pesquisas em educação.

As perspectivas de análise do papel social da escola na sociedade brasileira passaram a ter maior relevância após a instituição da República, onde questões como a organização do trabalho, as liberdades, a escravidão, entre outras, estavam em permanente debate.

Na década de 1920, com a crescente industrialização e a urbanização em todo o mundo, a necessidade de preparar o país para o desenvolvimento levou um grupo de intelectuais brasileiros a se interessar pela Educação, vista como elemento central para remodelar o país. Os teóricos deste movimento, denominado Escola Nova, viam num sistema público de ensino livre e aberto o único meio efetivo de combater as desigualdades sociais (SAVIANI, 2004).

Neste cenário, a educação estava baseada no ideal de confiança na razão humana1 para compreender e transformar a realidade, portanto a educação e a própria escola tinham este papel.

Predominava, até meados do Século XX, principalmente nas Ciências Sociais, uma perspectiva extremamente otimista, de inspiração funcionalista, que atribuía a escolarização um papel central no duplo processo de superação do atraso econômico, do autoritarismo e dos privilégios, associados às sociedades

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tradicionais, e de construção de uma nova sociedade, justa (meritocrática), moderna (centrada na razão e nos conhecimentos científicos) e democrática (fundamentada na autonomia individual). Supunha-se que por meio da escola “instituição neutra”, pública e gratuita, todos teriam igualdade de oportunidades, logo as pessoas iriam competir como iguais e os que se destacassem por seus dons pessoais seriam levados “por uma questão de justiça” a posições superiores da hierarquia social (NOGUEIRA, 2002).

Não se pode negar que esta visão da educação ainda permanece no senso comum de grande parte da população brasileira, mas, segundo Bourdieu, esta organização das hierarquias sociais, em hierarquias simbólicas, permitiria a legitimação ou justificação das diferenças e da própria hierarquia, motivo pelo qual, o indivíduo que ocupa posições elevadas entender-se-ia como merecedor desta posição que ocupa e não como o resultado de uma dominação, vista a validação de uma qualidade intrínseca cultural superior.

De outro lado, os sujeitos que constituem a posição dominada, reconheceriam a superioridade dos dominantes, baseados na percepção de que são incultos e/ou pouco inteligentes e por este motivo, individual, não alcançaram posições superiores.

A sociologia de Pierre Bourdieu, através da sua perspectiva de análise (teoria) compreende que na escola preserva-se muito da origem social sobre os destinos escolares, desta forma, a escola funcionava, e funciona, como uma produtora e/ou reprodutora dos padrões sociais, lingüísticos e comportamentais das classes dominantes.

A educação, na teoria de Bourdieu, perde o papel que lhe fora atribuído de instancia transformadora das sociedades e passa a ser vista como uma das principais instituições por meio da qual se mantêm e se legitimam os privilégios sociais. Trata-se portanto, de uma inversão total de perspectiva. Bourdieu oferece um novo quadro teórico para a análise da educação dentro do qual os dados estatísticos acumulados a partir dos anos 50 e a crise de confiança no sistema de ensino vivenciada nos anos 60, ganham uma nova interpretação (NOGUEIRA, 2006 p. 15).

Deve-se considerar que para Bourdieu é inviável estudar os fenômenos que ocorrem na sociedade isolando indivíduos ou a própria estrutura social, já que um pressupõe o outro.

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econômicas, não são suficientes para designar as propriedades comuns que fazem de um conjunto de indivíduos um grupo social relativamente homogêneo. É preciso considerar ainda a posição nas relações de produção cultural [...] (NOGUEIRA, 1997).

A classe social não se define somente por uma posição nas relações de produção, mas pelo habitus2 de classe que está normalmente associado a essa posição (BOURDIEU, 1979 apud NOGUEIRA, 1997).

A partir dos estudos deste sociólogo podem-se destacar os conceitos de capital cultural e violência simbólica, relacionando-os aos aspectos culturais, econômicos e sociais, por meio dos quais é possível compreender diversos aspectos da educação.

Da mesma forma que o poder econômico deriva da posse do capital econômico, o poder simbólico deriva da posse do capital cultural, e este ultimo ainda pode ser compreendido em três estados principais: incorporado, adquirido de forma consciente ou não, mas que torna-se corpo do individuo; objetivado, aqueles denominados objetos culturais: livros, obras de arte, discos, entre outros; e

institucionalizado, o qual foi atestado por uma instituição, isto é, que confere uma determinada habilidade e/ou conhecimento, por exemplo, certificados, diplomas, etc. (BOURDIEU In:NOGUEIRA; CATANI, 2008).

Em síntese, Bourdieu desenvolveu três definições básicas relativas ao papel dos sistemas simbólicos ou culturais na produção e reprodução das estruturas sociais que são formas de percepção e representação da realidade. Os indivíduos criariam, sustentariam e defenderiam seus sistemas simbólicos no âmbito da sociedade em geral ou no interior de um campo3 específico. Como resultado da disputa e da dominação estabelecer-se-iam hierarquias culturais e desta forma umas seriam consideradas superiores às outras e os indivíduos que fossem capazes de produzir e/ou usufruir estas produções, denominadas superiores, ganhariam mais poder em nossa sociedade.

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“Os “sujeitos” são, de fato, agentes que atuam e que sabem, dotados de um senso prático [...], de

um sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de divisão (o que comumente chamamos de gosto), de estruturas cognitivas duradouras (que são essencialmente produto da incorporação de estruturas objetivas) e de esquemas de ação que orientam a percepção da situação e a resposta adequada. O habitus é essa espécie de senso prático do que se deve fazer em dada situação. (BOURDIEU, 1997, p.42).

3 O conceito campo para Bourdieu é o conjunto de instituições sociais, indivíduos e discursos que se

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Neste mesmo sentido, os indivíduos que produzissem e/ou usufruíssem produções simbólicas tidas como inferiores, assumiriam uma posição subordinada na sociedade.

Este autor também utiliza o conceito de violência simbólica: como mecanismo que cria, legitima e reproduz a desigualdade social; pois, o uso da violência simbólica é dirigido por um individuo, ou grupo, que controla o poder simbólico sobre os outros, fabricando crenças no processo de socialização, induzindo os dominados a enxergarem e a avaliarem o mundo de acordo com os critérios e padrões definidos pelos dominantes.

Como por exemplo, a linguagem – e todas as suas definições: gramática, ortografia, sotaque, vocabulários, etc. – está relacionada à posição social de quem fala e à confirmação da ordem estabelecida. Para Bourdieu, todas essas ferramentas de poder são essencialmente arbitrárias, mas isso normalmente não é percebido. É necessário que os dominados as percebam como legítimas, justas e dignas de serem utilizadas (NOGUEIRA, ____)

“O individuo que domina, por exemplo, o padrão culto da língua – aquele reconhecido como legitimo (correto) pelas instâncias às quais foi socialmente atribuído o direito e o dever de avaliar e classificar as formas de linguagem (sobretudo, a escola e os especialista das áreas de linguagem) –

beneficia-se de uma série de vantagens sociais. O domínio da língua culta funciona como uma moeda (um capital) que propicia a quem o possui uma série de recompensas, seja no mercado escolar, seja no mercado de trabalho, seja até mesmo no mercado matrimonial”. (BOURDIEU, 1998 apud NOGUEIRA, 2006).

Para Bourdieu a educação é uma violência simbólica, ou seja, cultural; os agentes4 do sistema inculcam um arbitrário cultural nas gerações. Isso não se revela como tal, porque tanto a instituição como os agentes tornam isso “naturalizado”, por ter poder e autoridade pedagógica.

Essa inculcação introduz um habitus cultural duradouro e legítimo, que incorporado, torna um capital cultural que terá um valor social, beneficia-se aqueles bem nascidos e exclui (com legitimidade) os despossuídos. (BOURDIEU, 1997).

A recepção dos estudos de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro teve diferentes apropriações. Nos anos de 1970 até meados de 1990 apontam-se críticas à obra do sociólogo, sobretudo baseadas no livro em parceria com J.

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Passeron - A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino - no sentido de se fazer, segundo alguns críticos, uma descrição da função reprodutiva na escola, e desta forma como bem destaca Catani evidenciando algumas discussões da época da maneira como era apreendida a obra do francês.

“[Bourdieu] um autor crítico, mas politicamente desmobilizador: sua teoria, se possibilita instrumentos para a crítica da função desempenhada pela escola na sociedade capitalista, não fornece armas para a ação, limita-se à constatação da dimensão reprodutivista da escola, não dá conta das contradições da realidade, enfim, desmobiliza. A imposição dessa problemática tem como uma das conseqüências concentrar a atenção nessa dimensão da leitura, afastando-se da compreensão dos propósitos e da lógica da obra de Bourdieu e condicionando fortemente, como já afirmado, a forma da apropriação do autor no campo educacional brasileiro.”

(CATANI, 2001, p.66).

O ponto de vista das leituras, ou ainda, o modo de apropriação em torno dos estudos de Bourdieu e sua equipe não atendiam às expectativas ligadas as propostas pedagógicas na atual condição política e social do Brasil, atribuindo-lhe como uma teoria da educação sem propostas, ou sem ação. Ainda conforme Catani, “para um campo que se encontrava num estado no qual se dava bastante ênfase à ação, sobretudo transformadora, isso era interpretado como defeito grave da teoria” (p. 69). Tratava-se de um período em que o campo educacional estava voltado essencialmente à militância e à politização, em uma dicotomia reprodução versus transformação.

Se por um lado, a produção científica de Bourdieu é tida como reprodutivista, por outro, a partir dos anos de 1990 novas leituras e apropriações conceituais, e ao modo de trabalho, do autor vão sendo incorporadas em uma análise educacional instaurada nas pesquisas sociológicas como “estudos que investem na análise de temáticas como as relações entre origem social e expectativas profissionais de futuros professores” (Catani, p.71).

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Jane Soares de; SOUZA, Rosa Fátima de; SAVIANI, Dermeval. O Legado Educacional do Século XIX no Brasil. São Paulo: Editores Associados, 2004.

AZEVEDO, Mário Luiz Neves de. Espaço Social, Campo Social, Habitus e Conceito de Classe Social em Pierre Bourdieu. Revista Espaço Acadêmico, Ano III, Nº 24,

Maio de 2003. Disponível em

<http://www.espacoacademico.com.br/024/24cneves.htm> acesso em 28/05/08.

BOURDIEU, Pierre. Esboço de uma teoria da prática. In: ORTIZ, Renato (org.). Pierre Bourdieu: sociologia. São Paulo, Ática, 1983a.

_______. Gostos de classe e estilos de vida. In: ORTIZ, Renato (org.). Pierre Bourdieu: sociologia. São Paulo, Ática, 1983b.

_______. A gênese dos conceitos de habitus e de campo. O poder simbólico. Lisboa: Difel, 1989.

_______. O novo capital. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1997.

_______. Classificação, desclassificação, reclassificação. NOGUEIRA M.A. & CATANI, A. (org.) Escritos de Educação. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

BOURDIEU, Pierre. Pierre Bourdieu entrevistado por Maria Andréa Loyola. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2002.

NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio (orgs). Escritos de Educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

NOGUEIRA, Maria Alice; NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins. A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: Limites e Contribuições. Campinas, SP: Revista Quadrimestral de Ciência da Educação – Educação & Sociedade, 2002.

NOGUEIRA, Maria Alice; NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins. Bourdieu & a Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

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