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Sumário. Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 610/2007-5

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Tribunal da Relação de Lisboa Processo nº 610/2007-5

Relator: VIEIRA LAMIM Sessão: 27 Fevereiro 2007 Número: RL

Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NÃO PROVIDO

ESCUTA TELEFÓNICA TRANSCRIÇÃO

Sumário

I - Ao JIC, por razões de eficiência e racionalização de meios disponíveis, não é exigível a audição integral da gravação de todas as conversações telefónicas intercepcionadas.

II - A apresentação das gravações já com indicação das passagens

consideradas relevantes, é uma forma do juiz beneficiar de coadjuvação, expressamente admitida pelo art.188.º, n.º 4, do CPP, o que em nada belisca o dever de acompanhamento próximo das escutas, temporal e materialmente, pois recebendo, com a transcrição das partes consideradas relevantes, os suportes das gravações efectuadas, tem possibilidade real de ter acesso

directo à estas, o que lhe permite emitir um juízo autónomo sobre a relevância dos elementos recolhidos, mesmo que seja coincidente com as indicações que acompanhavam as gravações.

III - Apresentadas as gravações ao juiz, que ordenou a transcrição de certos registos considerados relevantes, deve este despacho ser cumprido no mais curto prazo possível, para que não constitua entrave ao bom andamento do processo, no entanto, não fixa a lei qualquer prazo concreto para o efeito, já que em relação a essa transcrição não se verificam as razões que, no art.188.º, n.º 1, justificam a imediata intervenção do juiz, não sendo tal transcrição, depois do despacho judicial, um acto destinado a minorar a compressão de direitos fundamentais afectados pelas escutas executadas, pois a transcrição não reduz a acessibilidade às comunicações, antes a facilita, destinando-se, apenas, a permitir a disponibilização prática dessa prova no processo.

IV - Em relação às passagens das gravações não consideradas relevantes, deve ser logo ordenada a sua destruição, em nome da protecção dos direitos

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fundamentais dos escutados, que o juiz deve assegurar, pois a conservação dessas gravações seria fonte de perigo acrescido de reprodução e devassa. V - A destruição desses elementos não pode ficar, em hipótese alguma,

dependente da vontade do arguido, o que se traduziria em colocar direitos de terceiros na mão deste, por vezes sujeitos aos seus caprichos e retiraria

sentido à nulidade cominada pelo n.º 8, do art. 32.º, da CRP.

Texto Integral

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa:

Iº 1. Nos autos de instrução nº337/05.2JELSB, a correr termos no 2º Juízo Criminal do Barreiro, foi proferida decisão instrutória, na qual foi apreciada a seguinte:

“QUESTÃO PRÉVIA:

O arguido (A) veio suscitar a nulidade da intersecção telefónica ao posto telefónico nº96...47, alvo 28739, invocando, para tanto, além do mais, os seguintes fundamentos:

1. Não foi cumprido o pressuposto da imediatividade a que alude o nº1, do artigo 188.°, do Código de Processo Penal, uma vez que após os dois primeiros contactos do Juiz com estes postos telefónicos em que ordena a validação das sessões com interesse (fls. 140 e 186), só volta a ter contacto com as referidas escutas após 5 meses, violando-se, assim, o disposto no artigo 188, nº1, do Código de Processo Penal.

2. O Juiz apenas ouviu as sessões que lhe foram sugeridas pela PJ e que, segundo estes, tinham relevância para a prova, parecendo resultar do despacho de aclaração que o Juiz apenas ouviu as sessões transcritas, evidenciando tal facto, além do mais, o despacho de fls.959.

O arguido (B), além de subscrever na íntegra o requerido pelo arguido(A) refere ainda o seguinte:

1. O alvo 28739 refere-se a intercepções telefónicas a partir de 11.11.05,

tendo a sua transcrição, após audição, sido ordenada em 20.11.05, sendo certo que a transcrição foi realizada apenas em 27.03.2006, quanto ao apenso I-A, e em 01 de Junho de 2006, quanto ao apenso I, o que viola o disposto no artigo 188, nº3 e 4, do Código de Processo Penal.

2. Resulta igualmente dos autos que as sessões 309, 426 e 540 são conversas em inglês, sendo certo que as conversas transcritas com aqueles números referem-se a conversas em português, pelo que se conclui que, ou por lapso foram aquelas sessões eliminadas ou, a não ser assim, as mesmas não terão sido ouvidas antes de se ordenar a sua transcrição, estando

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consequentemente feridas de nulidade (artigo 188°, nº1 e 2, do Código de Processo Penal).

3. As conversas a que aludem os nº de telefone91...54 e 91...55, foram eliminados sem que o arguido a eles pudesse ter tido acesso e fazer a sua própria selecção no sentido de preparar a sua defesa, o que viola o disposto no artigo 32.°, nº1, da Constituição da República Portuguesa.

*

Dada a palavra ao Ministério Público, pronunciou-se o mesmo pela validade das escutas.

*

Compulsados os autos e com relevância para as questões suscitadas resulta que foram autorizadas por despacho judicial as seguintes escutas telefónicas: 1. Fls. 69: em 07/11/05 ao telefone móvel nº 96...47, pelo prazo de 60 dias; 2. Fls.101: em 10/11/05, ao telefone móvel nº 96...52, pelo prazo de 60 dias; 3. Fls. 107-108: em 14/11/05 aos telefones móveis 91...55 e 91...65, e ao telefone da rede fixa 212043141, todos pelo prazo de 60 dias;

4. Fls. 112: em 17/11/05, aos telefones móveis 96...16 e 91...01, todos pelo prazo de 60 dias;

5. Fls. 139: em 22/11/05 , aos telefones móveis 93...69, 93...70 e 91...34, todos pelo prazo de 60 dias.

6. fls. 184: em 24/11/05, aos telefones móveis 96...49 e 91...47, todos pelo prazo de 60 dias.

*

As escutas supra mencionadas foram sancionadas pelo Mmo Juiz de Instrução Criminal, tendo sido determinada a transcrição das que continham matéria relevante para os autos e a destruição das restantes pelos seguintes

despachos:

-a determinada ao alvo 28739 a que corresponde o telefone móvel referido a fls.69, pelo despacho de fls. 140, datado de 22/11/05, sendo certo que

relativamente às sessões com os n.°28 a 106, 141 e 146, que foram ouvidas e validadas se determinou a sua tradução e transcrição.

-a determinada ao alvo 28739 a que corresponde o telefone móvel referido a fls. 69, pelo despacho de fls.184, datado de 24/11/05, sendo certo que

relativamente às sessões com os n. ° referidos a fls. 148 e 151, que foram ouvidas e validadas se determinou a sua tradução e transcrição;

foi ordenada a transcrição das sessões com os n.° 296 e 319 por despacho de fls. 407, anteriormente validadas por despacho de fls.184 encontrando-se aquelas juntas aos autos a fls. 392 a 395;

*

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ordenou-se a destruição/desmagnetização das restantes, aludindo aos alvos 28738, 287381, 287391.

Por despacho de fls. 407 foi ordenada a destruição das escutas das sessões nº345 e 524.

*

Constam igualmente dos autos o conhecimento do início e cessação da gravação das sessões.

*

Posto isto, cumpre decidir.

A primeira questão colocada pelo arguido(A) relaciona-se com o advérbio "imediatamente”, contido no artigo 188º, nº1, do Código de Processo Penal. A imediação entre o juiz e a recolha da prova através da escuta telefónica aparece como o meio que melhor garante que uma medida com tão específicas características se contenha nas apertadas margens fixadas pelo texto

constitucional. Tal acompanhamento pressupõe o acompanhamento da

operação de intercepção telefónica pelo juiz. Não se impõe que a escuta seja realizada materialmente pelo juiz, mas deve assegurar-se um

acompanhamento efectivo, contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte, assegurando que, em função do decurso da escuta, seja mantida ou alterada a decisão que a determinou. Não é, pois, admissível a inexistência, documentada nos autos, desse acompanhamento e controlo ou a existência de largos períodos de tempo em que essa actividade do juiz não resulte do

processo.

Como se verifica dos autos, a intercepção e gravação das escutas telefónicas a que aludem as sessões 28, 106, 141, 146,296,309,319,345,426, 488, 524, 526, 528, 529, 540, 543, do alvo 28379, e tal como referido pelo requerente, foram autorizadas e ordenadas por despacho do Meritíssimo Juiz competente, tendo sido assinalado o preenchimento de todos os pressupostos necessários, ou seja, os requisitos legais da sua admissibilidade, em consonância com o disposto no artigo 187º, do Código de Processo Penal.

Realizada a apontada diligência foi lavrado auto que, juntamente com os cd's, foi levado ao conhecimento do Meritíssimo Juiz da 1nstrução Criminal, o qual validou as sessões com relevância para a investigação em curso e ordenou a correspondente tradução e transcrição, tendo ordenado a destruição /

desmagnetização das sessões consideradas sem relevância para a investigação (fls.140 e 184).

E certo que, no que concerne às conversas mantidas pelos telemóveis com os números cujos códigos são respectivamente 1G621, 1G623, 1G6231, 1G624, 1G6241, 1G625, 1G6251, 1G626, 1G6261 - que não o telefone móvel

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foram anteriormente objecto de pronúncia - a respectiva destruição apenas foi ordenada por despacho datado de 24/04/2006.

No entanto, e admitindo, por mera hipótese, que tal facto poderia constituir uma nulidade quanto- a esses alvos por violação do disposto no nº1, do artigo 188, tal facto não põe em crise as escutas devida e atempadamente

autorizadas, efectuadas e validadas cuja transcrição se encontra junta aos autos, já que as nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar (cfr. artigo 122, n°1, do Código de Processo Penal).

O que manifestamente não é o caso.

De facto, os números de telefone a que aludem os códigos IG621, IG623, IG623I, IG624, IG624I, IG625, IG625I, IG626, IG6261 nada têm a ver com o alvo nº28739 a que corresponde o telefone móvel nº96...47, cujo

acompanhamento foi sempre e devidamente realizado pelo Mmo Juiz de Instrução Criminal, como se retira dos despachos de fls.140, 186 e 407. Pelo exposto, e contrariamente ao alegado pelo requerente, os pressupostos dos artigos 187 e 188, do Código de Processo Penal, encontram-se verificados relativamente ao alvo nº28739 cuja nulidade da intercepção se invoca.

Por conseguinte, improcede a nulidade invocada. *

A segunda questão suscitada pelo arguido(A) é a seguinte:

O juiz não deve apenas ouvir as sessões sugeridas pela Polícia Judiciária como sendo as relevantes para a investigação em curso, mas sim, aquelas que achar relevantes devendo, por isso ouvi-las.

Quanto a esta questão, cabe antes de mais esclarecer que o Mmo Juiz de Instrução Criminal não ouviu as sessões sugeridas pela Polícia Judiciária, mas sim - ainda que possa haver coincidência - as constantes das promoções do Ministério Público, que antecederam os despachos que validaram as escutas. Ora, o invocado artigo 188, nº1, in fine refere que os elementos atestando as escutas devem ser de imediato levados ao Juiz, com indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova. Como é consabido, o que aliás resulta de forma expressa do disposto no artigo 263.°, nº1, do Código de Processo Penal, a direcção do inquérito cabe ao

Ministério Público, ou seja, sendo este dominus do inquérito cabe-lhe, ainda que coadjuvado pelos órgãos de polícia criminal, determinar o conjunto das diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação.

Na verdade sendo o actual sistema processual penal o do acusatório e não do inquisitório, o papel do Juiz de Instrução Criminal é o de garante dos direitos,

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liberdades e garantias do arguido e não, como pretende o arguido(A) à semelhança do que acontece noutros países, o de inquisidor.

A intervenção do Juiz de Instrução Criminal é pontual e visa apenas verificar se os direitos, liberdades e garantias constitucionais e legais do arguido foram respeitados.

Assim, uma vez que o Mmo Juiz de Instrução Criminal ouviu as sessões que o Ministério Público - repita-se, dominus do inquérito - entendeu como

relevantes, tendo-as validado, não se vislumbra em que medida se encontram as referidas escutas feridas de nulidade. Esclareça-se, no entanto, que o Mmo Juiz de Instrução Criminal, no seu despacho, disse ter ouvido as sessões,

sendo certo que não disse quais em concreto, podendo apenas concluir-se que ouviu também as sessões sugeridas e não, como diz o requerente apenas estas. Aliás é precisamente isto que consta do despacho de aclaração.

Por fim, tem sido entendido que o Mmo Juiz de Instrução Criminal nem tem que fazer consignar no seu despacho que procedeu à audição das escutas. Na verdade, se valida umas e manda destruir outras é porque necessariamente as ouviu.

Donde, e em conclusão, se afirma não ter havido qualquer violação de

dispositivo legal atinente ao caso relativamente às sessões 28 a 106, 141, 146, 296, 309 a 319, 345, 426 a 488, 524, 526, 528, 529 e 540 a 543, do alvo

28379, mormente do estatuído nos artigos 187, 188, 100 e 101 do Código de Processo Penal, caindo por base a existência da invocada nulidade e seus efeitos.

Pelo exposto, improcede igualmente a nulidade invocada. *

O que acaba de se referir aplica-se mutatis mutandis ao requerimento apresentado pelo arguido (B) que subscreve o requerimento do arguido(A) No que à transcrição das escutas concerne cabe referir o seguinte:

O requerente alega que o juiz deve ordenar a transcrição em auto no mais curto de espaço de tempo, já que se aplica à transcrição o disposto no artigo 101, nº2 e 3, do Código de Processo Penal, acrescentando que tal não foi feito. Ora manifestamente não tem o requerente razão. Nos despachos de fls.140 e 184, aquando da validação das escutas foi ordenado de imediato a transcrição e tradução das mesmas, nada havendo, assim, a apontar ao Mmo Juiz de

lnstrução Criminal.

Questão diversa é ter sido tal despacho cumprido apenas posteriormente. O auto de transcrição, constata-se, foi levado a efeito por funcionário da Polícia Judiciária de acordo com o disposto no artigo 101.° do Código de Processo Penal; e não se vislumbra ter havido infracção ao estatuído no n°2 deste citado artigo, na medida em que não se constata excessivo lapso de tempo entre a

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realização total da diligência de escuta telefónica e a sua transcrição. Com efeito, a exigência da transcrição no prazo mais curto possível, mais não é do que o afloramento de necessidade de celeridade processual, aliada ao facto de assim ser restringida a operação ao essencial e necessário, para ser

preservada o mais possível a intimidade das pessoas, evitando-se, deste modo, uma devassa desnecessária das suas vidas.

Mas tudo deve ser encarado numa perspectiva de realidade atinente às dificuldades da tarefa, aos meios utilizados no caso, inclusive no tocante aos meios humanos disponíveis e respectiva interligação a estabelecer entre o investigador ou investigados e a entidade judicial instrutória.

Por outro lado constata-se que tal operação esteve sempre sob o controlo judicial, desde a sua autorização, à elaboração dos respectivos autos de ocorrência e de transcrição, sendo certo que os cd's foram presentes ao

Meritíssimo Juiz de Instrução bem como os autos que continham matéria com interesse, que foram validadas e/ou ordenada a destruição dos desnecessários. O que tudo revela, sem sombra para dúvidas, que existiu sempre um controlo efectivo de todo o processamento ligado às escutas telefónicas e actividades processuais a elas inerentes, por parte do poder judicial.

Na verdade, a última palavra em sede de controlo, fundamentação e decisão coube sempre ao Meritíssimo Juiz da Instrução Criminal.

Pelo exposto, improcede a nulidade invocada. *

Resulta efectivamente dos despachos de fls. 140, 184 e 407 que as sessões 309, 426 e 540 são em inglês, sendo, no entanto certo, que as mesmas foram tidas entre o arguido (B) e o (C) em língua portuguesa.

Porém, nos referidos despachos não se faz apenas alusão às mencionadas sessões, mas sim a mais 9, em língua inglesa, o que manifestamente indica ter havido um mero lapso de escrita e não, como se afirma, uma não audição das referidas sessões.

De facto, atendendo ao contexto em que tal declaração foi feita pelo Mmo Juiz de Instrução, contendo os despachos de fls.140 e 184 e 407 além da validação das escutas, autorização de novas escutas e buscas, ao que acresce o recurso a meios informáticos, é ostensivo estarmos perante um lapso de escrita. Por outro lado, encontra-se junto aos autos a transcrição das referidas escutas, previamente autorizadas e validadas.

Assim, nada há a apontar aos referidos despachos, pelo que igualmente improcede a nulidade invocada.

*

Por fim, invoca o arguido (B) violação dos seus direitos de defesa - artigo 32.°, da Constituição da República Portuguesa - em virtude de os alvos a que

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correspondem os números de telefone 91...54 e 91...55 terem sido eliminados sem que antes o arguido a eles pudesse ter tido acesso, uma vez que as

conversas eliminadas conjugadas com as transcritas, poderiam ser úteis à sua defesa.

Em primeiro lugar, diremos que o alegado pelo arguido é contraditório com o facto de o mesmo, ao subscrever o requerimento apresentado pelo arguido(A) invocar a nulidade decorrente do facto de apenas por despacho de fls.959 ter o Juiz de Instrução Criminal ordenado a desmagnetização/destruição das escutas sem relevância para a investigação.

Em todo o caso sempre se dirá, não perfilhar este Tribunal o entendimento secundado pelo arguido.

Na verdade, o referido entendimento aduzido é contrário aos princípios subjacentes à fase de inquérito, fase essa obrigatória, secreta e escrita, regida, predominantemente pelo princípio do inquisitório, sendo regra haver apenas lugar a contraditório nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 271.° e 194.°, ambos do Código de Processo Penal.

Dispõe, de facto, o artigo 32, nº1, da Constituição da República Portuguesa, que ao arguido devem ser asseguradas todas as garantias de defesa. O

segmento "todas as garantias de defesa" abarca seguramente todos os direitos e instrumentos adequados e necessários à contradição da acusação e

necessários à compensação da desigualdade material de partida entre a defesa e a acusação.

No entanto, a razão do secretismo da fase de inquérito - sede em que as mencionadas escutas foram realizadas - tem, por fundamento, não só o

interesse da investigação, mas também o princípio da presunção de inocência do arguido. Tanto assim é, que o próprio segredo de justiça está consagrado na nossa Lei Fundamental, como se retira do disposto no artigo 20, nº3, sob a epígrafe de acesso ao direito e tutela jurisdicional.

Acrescente-se ainda que o artigo 188, do Código de Processo Penal, que impõe as formalidades das operações a seguir nas escutas telefónicas, cuja não

observância implica a nulidade das escutas, em momento nenhum estabelece que, ordenando-se a destruição dos elementos recolhidos através das escutas, mas antes da sua efectiva destruição, deve ser dada a possibilidade ao arguido de se pronunciar sobre a mesma, mormente se os elementos cuja destruição foi ordenada tem relevância para a sua defesa.

Parece que do mencionado normativo legal, decorre precisamente o contrário: ou é ordenada a sua transcrição ou a sua destruição, sendo certo que neste último caso, todos os participantes nas operações - não sendo certamente este o caso do arguido! - fica ligado ao dever de segredo relativamente àquilo de que tenham tomado conhecimento.

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Ás questões legais e constitucionais citadas, acresce ainda o facto de o

inquérito ser dirigido pelo Ministério Público, regendo-se este, nos termos da Constituição, da lei processual penal e do seu estatuto, além do mais, pelos princípios da objectividade e da legalidade, cabendo-lhe, por isso, assegurar os direitos fundamentais do arguido.

Aos invocados fundamentos legais e constitucionais acrescem, igualmente, razões de ordem pragmática.

Na verdade, caso se dê conhecimento ao arguido, antes de proceder à destruição dos elementos recolhidos tal tornaria evidentemente inócua a

investigação em curso, uma vez que este, alertado que estaria sobre o facto de estar a ser investigado, mormente com o recurso a escutas telefónicas,

perturbaria o decurso do inquérito, nomeadamente quanto à conservação ou aquisição da prova.

Pelo exposto, não foi violado o disposto no artigo 32, nº1, da Constituição da República Portuguesa.

...”.

2. Inconformado com o despacho, o arguido (B) interpôs recurso, motivando-o com as seguintes conclusões:

2.1 Não se constata nos despachos do M. Jic que as intercepções telefónicas tenham sido escutadas na sua globalidade e só após a sua escuta tenham sido seleccionadas e ordenada a transcrição da matéria seleccionada;

2.2 O que se constata é que foi escutada somente a matéria seleccionada pelo OPC e promovida pelo M.P.;

2.3 Se as intercepções tivessem sido escutadas por certo que não incorreriam as 3 entidades no mesmo erro, quer na sugestão de selecção, quer na

promoção, quer no despacho (fls. 150, fls. , fls. 407) referindo que as sessões 28,309, 426 e 540 se tratavam de registos em língua inglesa, quando de facto o eram em português;

Entre tantas em língua inglesa teriam de sobressair 2 ou 3 em língua diferente. Não poderiam passar despercebidas a 3 ouvintes atentos.

2.4 O M. Jic, limitou-se a ordenar a transcrição e junção aos autos nos precisos termos em que foram sugeridos pelo OPC, obedecendo unicamente aos

critérios destes pelo que foi violado art.188, nº3 do C.P.P.

2.5 Quanto às intercepções escutadas em 16-11-05 e cuja ordem de

transcrição foi proferida em 20 de Novembro, a sua concretização processual só ocorreu passados que foram 4 meses aproximadamente, sendo que em relação às intercepções 28, 309, 426, 540 de 14 a 23 de Novembro, só em 01 de Julho de 2006 foram transcritas!

2.6 Apesar de não se entender o prazo de imediato de forma tão apertada em termos de controlo como quanto ao nº1 do art.188, do C.P.P., a flexibilidade,

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não poderá querer dizer 4 e 6 meses;

2.7 Trata-se de um direito fundamental do arguido não ver a sua intimidade devassada na “praça pública”, nas mãos da polícia, seja de funcionários, ou de quem quer que seja, sendo por isso que a lei ordinária em consonância com as garantias constitucionais da inviolabilidade de comunicação prevista no art. 34, nº1 e nº4 da C.R.P, impõe a simultaneidade das operações referidas no nº3 do art.188, do C.P.P., o dever do segredo em relação a todos os participantes nelas;

2.8 Foi violado o nº3 e 4 do art.188º do C.P.P., conjugado com o disposto no art.101 nº2 e 3 do mesmo diploma;

2.9 Foram postos em escutas os nºs, de telefone91...54 91...55, referentes ao arguido tendo o material sido destruído por não interessar à investigação; 2.10 Se tivessem sido escutados pelo JIC, órgão imparcial, por certo que teriam eventualmente sido seccionados também.

2.11 Os registos escutados unicamente pela parte acusatória, incidem

somente pelo que interessa à investigação, denotando a perspectiva policial da investigação;

2.12 A ilustração da actividade profissional do arguido, não era tarefa

relevante para os autos, pelo que foram eliminadas conversações que seriam importantes para explicarem certos factos;

2.13 Pelo que, o momento adequado para se acautelar a eliminação de todo o material escutado, será após ter sido dada oportunidade às partes

intervenientes, de delas tomarem conhecimento e exercerem o contraditório, caso o queiram;

2.14 A norma constante do nº3 do art.188, do C.P.P. ao ordenar a destruição do material não seleccionado, numa fase anterior às partes interessadas, terem total acesso às escutas está ferido de inconstitucionalidade material por

violação expressa das garantias de defesa por parte do arguido nos termos do art.32, nº1 da C.R.P.;

2.15 Assim sendo, as escutas telefónicas são nulas e consequentemente nulo o valor das provas obtidas mediante o recurso às mesmas nos termos do art.188, nº1, 3, 189 e 126 do C.P.P.;

2.16 A se considerarem válidas as escutas, conclui o recorrente que o Tribunal interpretou e aplicou as normas constantes no nº1 do art.188, na parte

referente à falta de controlo judicial e nº3 na parte referente à transcrição do material seleccionado de forma violadora dos princípios contidos nos arts.32º nº8, 34, nº1-4, art.18, nº2 da C.R.P., ferindo-as de inconstitucionalidade

material.

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devolutivo, o Ministério Público respondeu, concluindo:

3.1 O direito à intimidade da vida privada e familiar e à inviolabilidade das comunicações privadas consagrados, respectivamente, nos artigos 26º e 34º da Constituição da República Portuguesa, com a consequente nulidade das provas obtidas em sua violação (cfr. artigos 189º e 126º, n.º 3 do Código de Processo Penal), haverá de conciliar-se com a admissibilidade do recurso a intercepções telefónicas nos casos previstos pelo artigo 187º do Código de Processo Penal;

3.2 Na tipicidade insita ao artigo 187, atenta a natureza e gravidade dos

comportamentos aí incluídos, bem como a “danosidade social” que acarretam, é de admitir o recurso a escutas telefónicas enquanto meio de obtenção de prova, desde que necessário e proporcional, por despacho devidamente fundamentado;

3.3 No caso dos autos forneceram-se ao Mmo. JIC dados suficientes para ele poder concluir que o recurso às escutas telefónicas era, não só o mais idóneo, mas também o mais eficaz para a investigação da apontada actividade de

tráfico que estaria a ser desenvolvida pelo grupo de indivíduos que integrava o ora recorrente, na medida em que estes, nomeadamente, combinariam as operações de tráfico através do telefone;

3.4 Da regulamentação jurídica emergente do artigo 188º do Código de Processo Penal, resulta decisivo que, em matéria de recolha probatória, fundada em intercepção telefónica, se verifique um constante e efectivo

acompanhamento (controlo) por parte do juiz, devidamente documentado nos autos, devidamente conjugado com a praticabilidade das tarefas

investigatórias;

3.5 In casu o Mmo. JIC assegurou o acompanhamento contínuo das

intercepções por si ordenadas, compreendidas no prazo de sessenta dias, determinando (atempadamente) a validação das sessões tidas por relevantes, e ordenando a destruição/desmagnetização das desprovidas de interesse para a actividade investigatória (por despachos de fls. 140, 184 e 407);

3.6 Não é causa de nulidade das escutas a delonga, desde que objectivamente justificável, da sua efectiva transcrição;

3.7 Ainda que se admitisse a nulidade parcial das escutas, sempre se refira que a invocada teoria da “fruit of the poisonous tree” não permite concluir pela inutilização expansiva de todas as provas regularmente colhidas. 3.8 Do disposto no artigo 188º, n.º 3 do Código de Processo Penal não se

infere o dever do juiz proceder à audição da totalidade das escutas que lhe são apresentadas, sendo de aceitar, sem que daí resulte nulidade ou

inconstitucionalidade, que se limite a ouvir as passagens indicadas como relevantes para a prova;

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3.9 Não é inconstitucional a interpretação do artigo 188º, nº3, por violação do disposto no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, no sentido de permitir que se ordene a destruição/ desmagnetização das sessões constantes de intercepções telefónicas, desprovidas de interesse para a actividade

investigatória, sem que previamente se dê conhecimento ao arguido e aos restantes intervenientes nas conversações captadas.

Nestes termos, e pelas razões supra expostas, deverá improceder o recurso interposto pelo arguido (B) e, consequentemente, ser mantida a decisão recorrida.

4. Neste Tribunal, a Exma. Srª. Procuradora Geral Adjunta, em douto parecer, aderiu à resposta do Ministério Público em 1ª instância.

5. Colhidos os vistos legais, procedeu-se a conferência.

6. O objecto do recurso, tal como se mostra delimitado pelas respectivas conclusões, reconduz-se à apreciação das seguintes questões:

-papel do JIC no controlo e selecção das escutas telefónicas efectuadas em processo crime, nomeadamente se pode escutar, apenas, as partes

seleccionadas pelo Ministério Público e pelos OPC, ou se está obrigado a escutar a sua totalidade;

-prazo para transcrição, após ordem do JIC para o efeito;

-se as partes consideradas sem interesse podem ser eliminadas sem

conhecimento dos intervenientes, ou se tem de ser assegurado em relação às mesmas o contraditório;

* * *

IIº 1. O recurso ao meio de prova- escutas telefónicas, está sujeito a

pressupostos de admissibilidade e a formalidades, previstos, respectivamente, nos arts.187 e 188, ambos do CPP.

No caso, não é questionada a verificação dos pressupostos de admissibilidade das escutas, que foram autorizadas por juiz, para investigação de crime de tráfico de estupefacientes, limitando-se o recorrente a pôr em causa o

cumprimento das formalidades exigidas para a obtenção deste meio de prova. De acordo com o art.188, nº1, do CPP, na redacção introduzida pelo Dec. Lei nº320-C/00, de 15Dez.:

“Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as

operações, com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova”.

Aquele Dec. Lei nº320-C/00, aditou à redacção inicial deste preceito legal (“Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o qual,

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junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações”) a

expressão: “com a indicação das passagens das gravações ou elementos análogos considerados relevantes para a prova”.

Esta expressão final corresponde à utilização da autorização legislativa

concedida pela Lei nº27-A/2000, de 17Nov., que autorizou o Governo a rever o Código de Processo Penal, com o sentido e extensão definidos nesse diploma, entre os quais, segundo o artigo 4.º: “Permite-se que o juiz possa limitar a audição das gravações às passagens indicadas como relevantes para a prova, sem prejuízo de as gravações efectuadas lhe serem integralmente remetidas”. De facto, razões de eficiência e de racionalização dos meios disponíveis,

permitem compreender que não seja exigível ao JIC a audição integral das gravações, o que em relação a muitos processos pressuporia a sua exclusiva disponibilidade para essa questão concreta.

Considerando o estatuto do Ministério Público, caracterizado pela sujeição dos seus magistrados a estritos critérios de legalidade e objectividade, a quem o legislador atribuiu a titularidade do inquérito, responsabilizando-o pela direcção da investigação, levada a cabo por si ou por delegação de

competência, genérica ou específica, nos órgãos de polícia criminal, colocados nesta fase na sua dependência funcional e estando esses OPC sujeitos a

especiais obrigações de objectividade, as referências, por transcrição ou por resumo, das passagens das conversações que o Ministério Público, ou o órgão de polícia criminal sob controlo daquele, considera relevantes, são suficientes para que o juiz possa de imediato determinar a interrupção da intercepção revelada desnecessária, ou formule um juízo próprio sobre a admissibilidade e a relevância dos elementos a transcrever.

Na verdade, indo essas referências acompanhadas pelas fitas gravadas ou elementos análogos, tem o juiz todas as possibilidades de reduzir ou ampliar as passagens consideradas relevantes, nada impedindo que aceite as

indicações recebidas, se com elas concordar.

No fundo, a apresentação das gravações já com indicação de passagens

consideradas como relevantes, é uma forma do juiz beneficiar de coadjuvação, expressamente admitida pelo nº4, do art.188, que em nada belisca o dever de acompanhamento próximo, temporal e materialmente, das escutas, pois tem a possibilidade real de ter acesso directo às gravações, emitindo, assim, um juízo autónomo sobre a relevância dos elementos recolhidos, mesmo que seja coincidente com as indicações que acompanhavam as gravações (1).

2. Tendo o JIC considerado certos registos como relevantes para a prova e tendo ordenado a sua transcrição em 20Nov.05, insurge-se o recorrente contra

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o facto dessa transcrição só se ter concretizado meses depois o que, na sua perspectiva, viola o nº1, do art.188.

Este preceito legal visa assegurar o controlo e imediação entre o juiz e a recolha da prova através da escuta telefónica, como forma de garantir que uma medida com tão específicas características tenha o menor impacto

possível na compressão de direitos fundamentais das pessoas por ela afectada. Esse controlo e acompanhamento tem uma dupla finalidade:

-fazer cessar, tão depressa quanto possível, escutas que se venham a revelar injustificadas ou desnecessárias;

-submeter a um “crivo” judicial prévio a aquisição processual das provas obtidas por esse meio (2);

O recorrente não põe em causa essa intervenção judicial, que alega ter ocorrido poucos dias depois da execução das escutas (conclusão 5ª), mas o facto da transcrição só ter sido concretizada muito depois de ordenada. Contudo, a transcrição não é acto destinado a minorar a compressão dos direitos

fundamentais afectados pelas escutas executadas, mas antes forma de

permitir a disponibilização prática dessa prova no processo, já que a consulta da transcrição é manifestamente mais fácil que a audição da gravação.

Ao contrário do que refere o recorrente na sua conclusão 7ª, a demora na transcrição das passagens da gravação consideradas com interesse pelo juiz, em nada agrava a devassa da intimidade das pessoas escutadas, pois é

evidente que a transcrição não reduz a acessibilidade às comunicações, antes a facilita.

Não é, deste modo, aplicável à transcrição ordenada pelo juiz após a selecção das partes das intercepções telefónicas com interesse, o nº1, do art.188, uma vez que em relação a esse acto não ocorrem as razões que justificam neste preceito a intervenção “imediata” do juiz.

Também não será aplicável o nº2, do art.101, do CPP, preceito que se refere à documentação de actos e que prevê a transcrição do que se tiver passado ou das declarações prestadas em dado acto processual, quando no seu registo tenham sido usados meios estenográficos ou outros diferentes da escrita comum, o que não corresponde ao caso em apreço, em que não está em causa a documentação de determinado acto processual mas a forma de apresentação no processo de um meio de prova.

Não estabelece a lei, pois, qualquer prazo especial para cumprimento do despacho do juiz que ordena a transcrição, devendo, apesar disso, ser

cumprido no prazo mais curto possível para que não constitua entrave ao bom andamento do processo, não determinando a demora no caso concreto, porém, qualquer nulidade, já que não é alegado que daí tenha resultado prejuízo para

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os direitos de defesa do arguido.

3. Insurge-se o recorrente contra o facto de, antes das partes terem total acesso às escutas, ter sido ordenada a destruição do material não

seleccionado, o que, na sua perspectiva, viola os seus direitos de defesa. O procedimento adoptado, porém, é o que de forma clara resulta da lei, prevendo o nº3, do art.188, que o juiz ordene a destruição dos elementos recolhidos que não sejam considerados relevantes.

O recorrente não questiona o facto dos elementos seleccionados serem

relevantes, mas tão só o facto de terem sido seleccionados numa perspectiva de investigação, afirmando que foram eliminadas conversações que seriam importantes para explicarem certos factos, embora não os concretize com rigor.

Segundo o recorrente, tudo o que vai sendo adquirido pelo processo, no seu decurso, tem de permanecer nele até as partes poderem exercer em relação a esses elementos o contraditório, porque o arguido poderá, eventualmente, detectar nesses meios de prova, elementos factuais relativos aos próprios meios de prova ou à realidade cuja existência os mesmos tendem a

demonstrar de que poderá beneficiar na sua defesa.

Ora, o nosso processo penal não está estruturado sobre esse princípio, que pressuporia a obrigação de quem tem a direcção do processo de acautelar uma hipotética, eventual e indeterminada estratégia de defesa do arguido. As escutas telefónicas representam sempre uma intromissão na reserva da intimidade da vida privada, que só pode ocorrer nos casos e termos previstos na lei (art.26, nº4, da C.R.P.) e como forma de salvaguarda de outros

interesses, em particular, o interesse público de administração da justiça penal (art.34, nº4, da C.R.P.).

Não tendo interesse para a investigação, devem essas passagens ser

destruídas, em nome dos direitos fundamentais dos escutados, muitas vezes terceiros sem qualquer relação com o processo, o que se traduz em correcção pelo tribunal da intromissão injustificada na reserva da intimidade da vida privada.

Manter essas gravações, com perigo de ofensa para direitos fundamentais dos escutados, só porque pode vir o arguido a ter interesse nas mesmas,

apresentar-se-ia como uma compressão injustificada de direitos fundamentais, procedimento inadmissível face ao art.26, da Constituição.

Aliás, estando o juiz obrigado a um critério de objectividade, devendo

seleccionar os elementos “..relevantes para a prova...”, deve seleccionar as conversações necessárias à compreensão do contexto em que ocorreram, o que não está demonstrado que não tenha ocorrido no caso concreto, já que o

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recorrente não refere qualquer conversação concreta que permitisse dar às seleccionadas sentido diferente do que lhe é atribuído pela acusação,

mencionando, apenas, que não foram seleccionadas conversações que

ilustrassem a sua actividade profissional, questão que, manifestamente, pode ser provada por ele com recurso a outros meios de prova, menos ofensivos para direitos fundamentais.

Por outro lado, o invocado princípio do contraditório, não justifica o

procedimento defendido pelo recorrente, pois a Constituição apenas garante esse princípio em relação à audiência de discussão e julgamento e aos actos instrutórios que a lei determinar (art.32, nº5, da C.R.P.), o que não abrange a obtenção deste meio de prova em fase de inquérito.

Não pode ser ignorado, também, que a ofensa aos direitos fundamentais não ocorre, apenas, com a captação da conversação e sua audição pelos órgãos de polícia criminal e autoridades judiciárias, sendo manifesto que a conservação dessas conversações gerará sempre um perigo acrescido de reprodução e de devassa, como tem revelado a experiência recente em certos processos

envolvendo figuras públicas, através da violação do segredo de justiça, o que aconselha a destruição, o mais rápido possível, de todo o material que na análise do juiz de instrução não seja relevante, o que se traduz, precisamente, na concretização da sua principal função- assegurar os direitos, liberdades e garantias do arguido, de outros sujeitos processuais e de quaisquer terceiros, como decorre do nº4 do artigo 32º da Constituição.

Fazer depender, da vontade do arguido, a destruição dos elementos recolhidos por escutas telefónicas, significava colocar direitos de terceiros, merecedores de protecção constitucional, na mão deste, por vezes ficando sujeitos aos seus caprichos, o que abriria caminho para violações de direitos fundamentais, o que não pode ser admitido e retiraria sentido à nulidade cominada pelo nº8, do art.32, da C.R.P., pois apesar de estar assente que determinada escuta representou uma intromissão injustificada na vida privada de uma pessoa, nomeadamente de um terceiro, poderia ser aproveitada se o arguido alegasse que interessava à sua defesa, o que seria suficiente para legitimar tal ofensa a direitos constitucionalmente protegidos.

Em conclusão, existiu controlo judicial em relação às escutas telefónicas efectuadas, a execução da transcrição das passagens seleccionadas pelo JIC não está sujeita ao imediatismo previsto para aquele controlo, no nº1, do art.188, do CPP e foi efectuada a destruição dos elementos sem interesse, de acordo com o regime legal e constitucional aplicável a este meio de obtenção de prova, razão por que o despacho recorrido não merece censura.

* * *

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Pelo exposto, os juizes do Tribunal da Relação de Lisboa, em conferência, acordam em negar provimento ao recurso, mantendo o despacho recorrido. Condena-se o recorrente nas custas, com oito UCs de taxa de justiça.

Lisboa, 27/02/2007 (Relator: Vieira Lamim)

(1º Adjunto: Ricardo Cardoso) (2º Adjunto: Filipa Macedo)

__________________________________________________________________________ 1.-Este entendimento, mantém-se na Proposta de Lei que altera o Código de Processo Penal, entrada na Assembleia da República em 20Dez.06 (Nº109/X, acessível em www.mj.gov.pt), sendo a redacção do art.188, na parte que aqui interessa, do seguinte teor:

“1- O órgão de polícia criminal que efectuar a intercepção e a gravação ... lavra o correspondente auto e elabora relatório no qual indica as passagens relevantes para a prova, descreve de modo sucinto o respectivo conteúdo e explica o seu alcance para a descoberta da verdade.

...

5- Para se inteirar do conteúdo das conversações ou comunicações, o juiz é coadjuvado, quando entender conveniente, por órgão de polícia criminal e nomeia, se necessário, intérprete.

...”.

2.-cfr. José Manuel Damião da Cunha, “A jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria de escutas telefónicas”, Jurisprudência Constitucional, n.º 1, Janeiro-Março 2004, pp. 50-56).

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