DELEGADO REGIONAL DA F I ^ Í C U R I T I B A - PR.
Pomo é do conhecimento de U. S, E do público em geral, no dia 12 de maio último a Itaipu Binacional obteve a concordância do grupo indígena Avá-Guarani quanto à sua remoção da área que será / inundada pelo rcccructcrio ria hidrelétrica para outra, nas prDxim_^
dades da área inundada,
No dia seguinte à celebração do acordo entre Itaipu e a tribo Avá-Guarani, na condição de documentarista, estivemos visi - tando os índios - motivados especialmente pelas informações que t_l hamos de que os mesmos estavam passando por sérias dificuldades,Os índios estariam precisando de auxílio em alimentação, vestuário e saúde, além do que exigirá a adaptação à nOva área destinada por / Itsipu,
Em nossa viagem de observação e estudo, permanecemos ãMH to B aldeia dos índios por quase um dia, quando constatamos a exi_s tê^cia dos graves probelmas que passamos a expor:
1» Segundo syas próprias informações, os índios estão na aldeia em número aproximado de 60 pessoas ~ a maioria composta de crianças, mulJieres e idosos, sendo mínimo o ^úmero de pessoas aptas ao trabalho, ressaíva^do-se ainda que entre eles persiste o hábito de n^c) submeter as mulheres a trabalhos pesados.
2, Como foi amplamente atestado através de relatos histó- ricos e pesquisas feitas por antropólogos, a área de terra deste / remapescente indígena da grande n^ção Guarani foi progressivamente grilada pela invasão dos branCos, que os encurralaram de encontro/
ao rio Para{:^á, desmataram a área e violentaram profundamente o ec£
sistema que permitia a sobrevivência ÜGS índios, forçando-os a adoi
t p e m , Qu a se submeterem, à sanha da pOssa civilização. Sabe-se que^
de mais de mil hectares de terra, sobram aos índios não mais que hectares - a muito custo indenizadas por Itaipu, não esquecendo que tanto esta como a F^nai custaram a ddmitir a existêp,cia de uma tri- bo indígena na área de influência da hidrelétrica,
3. Cientes de que deveriam abandonar sua área a qualquer / momento - mas sem nunca saber quando os índios pararam de plaj^tar,
de modo que h^ rnais de um mês esgotaram-se bs poucos gêneros alimen- tícios por eles cultivados. Em tais situações, costumavam eles tra - balhar como bóias-frias em fazendas próximas à sua aldeia, recebendo pelo trabalho e^tre 300 e 600 cruzeiros por dia, com o que os índios compravam artigos que Ihffi faziam falta. Acusam, porém, que em muitos casos 08 patrões negaram-se a pagar até mesmo este soldo, sob prete2<
tos os mais escandalosos possíveis. Ocorre que hoje a área do reser- vatório que será formado em outubro próxima está completarnepte aban- dopada, não havendo lavouras que possam dar emprego para os índios , mesmo que fosse sob o regime de exploração a que se submetiEm, Ade - mais, eles não se atrevem a buscar recursos de subsistência fora nos estreitos limites de sua área em virtude de forte medo acumulado du- rante anos e apOS de ameaças partidas dos grileiros de terras.
U, Itaipu destinou ao grupo Avá-Guarani uma área de 253 / hectares sob a promessa de reassentá-los no prazo máximo de um mês,
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a contar do dia em que foi celebrado o acordo. A nova area dista CEr_
ca de 20 quilômetros do local onde estão. Não tendo meios de locomo- ção, nem recursos, não podem ir preparar a terra e plantar para, quari do reassentados, terem algum produto alimentar., f\íem mesmo haveria teiTi_
po sazonal para plantarem e colherem durante os próximos 3 ou ^ meses»
5, Os índios têm na tribo um rádio e uma bicicleta. Do rádio todos desfrutam ouvindo programas das emissoras paraguaias, que tran3_
mitem em idioma guarani. O índio que mais utiliza a bicicleta - como
se fosse D "motorista" da aldeia - está sem saber como proceder para ir'até o distrito de Sapta Terezinha para consertar a pneu da "máqui- na".
6, A impressão que tivemos e de que se trata de uma tribo / sem iniciativas e incapaz de qualquer resistêpcia, üs índios pão têm, por exemplo, um artesanato que se apresente como original e próprio»
7, Disseram os índios que 6 famílias da tribo estão vivendo na reserva indígena do Rio das Cobras, mais ao sul do Estado, e ou- tras três estão no Paraguai. Manifestaram o desejo de trazer de volta à comunidade aquelas famílias, atendEj^do assim a um desejo das mes - mas, Mas quÈixam-se de não disporem mais de barco para atravessar o rio Paraná, porque o que tinham foi solto s levado pelas águas num / desaforro patrocinado por brancos. Por isso, precisam de meio de / transporte ou de dinheiro para irem ao Paraguai pela Ponte da Amiza- de, o que aumenta a distâ^j^ia e epcarece a operação, Igualniepte, para irem ao Rio das Cobras não têm meios. De qualquer forma, concordam em que as famílias que estão longe da tribo se-jam reintegradas após D reasseptame^^ta na nova área«
6, Os indígepas revelam grande preocupação quanto às condi - ÇDBS em que serão removidos para a terra oferecida por Itaipu. Estão com o receio de serem tra^^sferidos sem poderem antes construir suas casas e preparar adequadamente o locâil onde vão viver. Nesse sentido, revelaram que gastariam de receber da Funai ou de Itaipu casas de m_a deira, ainda que modcLti-c« Lcjfí [„ela contato com os ^rapcos, seja por_
que as condições ecolágicas foram profundamente alteradas, os ín-
dios queixam-se de desconforto e perigos para a saúde por viverem em
palhoças - mesmo porque na área não mais encontram o capim adequado
à construção de suas habitações. D que epcontram é de má qualidade -
não veda o teto e as paredes ao vepto e à chuva, e resiste por pouco
tempo.
9, Esta situação geral compõe um quadro deprimente» A pri- meira e mais grave conseqüência de tudo isso é que os índios foram por nüs encontrados passapdo fomía. Ma diia em que convivemos com eles, à hor^B—ri-O almoço disseram que nãp tinham horário para as refeições, pois se limitavam a comer quando tinham o quê. Naquele dia nada ti- nham. Du seja, as mulheres descascaram com o pilão pouco mais de meio quilo de arroz, que cozinharam com um punhado de raízes de mandioca B serviram minúsculas porções às crianças. Havíamos levado conosco meia dúzia de pãezinhos e uma&fatias de queijo para o almoço, mas nos septimos na dever de dar tudo aos índias, Eles repartiram miga- lhas daquela porção eptre si. Alguns adultos foram "almoçar" ao pé de laranjeiras. Chupavam algumas laranjas em nome do café, almoço e
japte, Um adulto estava tomando chimarrão por volta das Ik f:^orBs e disse que aquele era o seu almoço,
Quando as mães não podem mais amamentar, as crianças pas - sem a se alimentar sem leite.
ID. Produtos naturais praticamente inexistem n^ áreaj caça também não; tentam pescar no rio Paraná e numa lagoa, mas dificil - mente pescam algo, porque não têm meios eficientes de pesca e a ép_o ca não ê propícia. Faltam-lhes inclusive anzóis e linhas.
11, Percebeu-se que encaram a aproximação do inverno com / bastante preocupação, porque lhes faltam roupas e cobertores. Para se aquecerem à n°i<te precisam acender fogos dentro das palhoças, e queixam-se de que isso é desconfortável e causa muitas gripes, espec^
almente entre crianças. Dormem no chão, sobre a terra fria, às ve- zes protegidos por algum saco ou trapo.
12, DiverBcH cr.i.unças estavam fortemente gripadas, com si-
nais evidentes de detjiutriçno. Também havia crianças doentes dos
olhos, e adultas queixandu-se de problemas dentários, Com a cesca
de uma árvore conhecucJa popularmen"te por "açoita cavalo", os índios
fazem chás que utilizam como analgésica, antigripal... - mas preci-
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sam percorrer grande distância para encontrarem uma árvore da espécie.
Queixaram-se também de que sofrem constantes dores de cabeça - com cer^
teza por falta de alimentação. Ha ainda e^tre eles evidentes sinais de vermi4"iüse.
13. Um índio de IS anos de idade acusou que recentemente es- teve trabalhando para um fazendeiro na tarefa de pulverizar uma plan- tação e que ficou dias em contato direto com o defensivo químico sem qualquer proteção. A partir de então passou constantes dores de cabe- ça, complicações gástricas e debilitação de suas forças. Além disso, o índio é aleijado - tem uma perna mais curta que a outra. O fazende_i ro empregador pagava-lhe mil cruzeiros por dia.
Ik, Contrastando com esse quadro, nas'proEimidades da aldeia existe uma invernada com cerca dc 500 cabeças de gado pastando em tEr_
ras que os índios dizem ter-lhe pertencido antes da invasão dos / brancos.
Em resumo, a situação dos Avá-Guarani atingidos por Itaipu e, sem exagero, dramática. Pediram-nos com muita insistência que lhe arrumássemos comida, roupa, assistência médica e odontológica, arti- gos para pesca, utensilhos de costura, ferramentas, sementes, mate - rial de limpeza e higiene, ajuda na instalação na nova área...
Analisamosí e discutimos a situação em Foz do Iguaçu e toma- mos as seguintes providencias:
1. Constituímos um Comitê Pró-índios do Dcoí, que se encar- rega de prestar-lhe uma ajuda de emergência e de encaminhar a ques - tão a quem de direito ou a entidades destinadas a esse tipo de atua- ção,
2. Conseguimos colaboração de pessoas e empresas da comuni-
dade e pudemos, já no dia 15 de maio, levar aos índios boa quantidade
de 'alimentos, obedecendo a uma relação de artigos por eles mesmos solicitados, evitando assim de levar-lhe algo com o que não estives- sem acostumados ou que pudesse prejudicar-lhe a saúde,
3. Expusemos a situação aos padres da Paroquia São João Sa- /
tista, que se propuseram a obter ajuda através de apelos feitos ao povo durante as missas. Graças a isso, obtivemos recursos para poder- mos levar mais um pequeno estoque de alimentos e roupas, o que foi feito no dia 19 de maio.
IMem é preciso descrever a alegria com que receberam as doa- ções. O cacique Cambai fez a distribuição dos gêneros segundo as ne- cessidades de cada família, Havíamos levado boa qua^jtidade de bana- nas maduras e os índios comeram tantas que nos causaram preocupação, tal a fome por que passavam.
f\ia segunda viagem, o cacique Cambai nos pediu o fnvoi- bus- car alguns familiares seus numa fazenda próxima à antiga vila de /' Alvorada do Iguaçu. Üs índios estavam numa fazenda onde haviam ter- minado uma empreitada quebrando milho para um fazendeiro. Estavam / hospedados num galibão e não tinham meios para se locomoverem até a tribo, distante mais de 2D quilômetros de onde trabalhavam. Fomos. / buscá-las,
Naquele mesmo dia disseram que uma viatura da Funai esteve na tribo ministrando alguns medicamentos a crianças gripadas e com doenças nos olhos.
h, Fomos à Itaipu Binacional e expusemos o problema ao as- sessor de relações públicas, Rubens r\lDgueira. Este disse que pode - ria dar uma contribuição pessoal, mas que a empresa não poderia /
atender a esse tipo de problema por três motivos: a) D problema nao é de responsabilidade de Itaipu; b) Se Itaipu ajudasse os índios, l£
go apareceriam outros grupos pedindo o mesmo; c) Tanto o serviço so-
cial como outros setores da empresa nao tem recursos e disponibili-
dade de pessoal para prestar qualquer assistência emergencial aos
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