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Gasometria arterial no diagnóstico diferencial de hipoxemia

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Academic year: 2021

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ISSN 1806-3713

© 2020 Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia

Gasometria arterial no diagnóstico diferencial de hipoxemia

José Alberto Neder1

a

,Danilo Cortozi Berton2

a

, Denis E. O’Donnell1

a

1. Pulmonary Function Laboratory and Respiratory Investigation Unit, Division of Respirology, Kingston Health Science Center & Queen’s University, Kingston, ON, Canada.

2. Unidade de Fisiologia Pulmonar, Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

CONTEXTO

A investigação da hipoxemia (PaO2 baixa) invariavelmente se beneficia de uma abordagem fisiológica estruturada com base em uma interpretação cuidadosa da gasometria arterial. Determinar o(s) mecanismo(s) subjacente(s) pode ser particularmente desafiador quando há múltiplas causas potenciais que mudam ao longo do tempo, espontaneamente ou devido ao tratamento.

PANORAMA

Uma mulher de 71 anos com DPOC grave (Figura 1A), classificação GOLD B e escore 2 na escala modificada do Medical Research Council deu entrada no PS com agravamento da dispneia, tosse produtiva e dor abdominal.

Ela estava confusa, letárgica e hipoxêmica (SpO2 = 88%

em ar ambiente) e apresentava leucocitose leve (12,6 x 103 células/µL). Os broncodilatadores inalatórios de curta duração foram otimizados, e O2 foi administrado por cânula nasal (2 L/min). Devido a uma radiografia de tórax normal em posição supina (de acordo com as precauções pandêmicas atuais), além de um amplo gradiente de pressão alveoloarterial de O2 [P(A-a)O2] — Figura 1B — foi

solicitada uma angiografia pulmonar por TC. Apesar da ausência de embolia pulmonar, observou-se extensa consolidação retrocardíaca (Figura 1C). Após 7 dias de antibioticoterapia, recebeu alta com O2 de 1 L/min com objetivo de se atingir uma SpO2 ≈ 90-91%. Vinte dias depois, ela retornou ao PS apresentando novamente confusão e sonolência; entretanto, sua SpO2 era de 99%, o fluxo de O2 era de 4 L/min, e a gasometria arterial revelou acidose respiratória com melhora de P(A-a)O2 (Figura 1D). Após 3 dias em ventilação não invasiva com O2 a 1 L/min, ela recebeu alta após melhora acentuada da acidose respiratória e do estado neurológico.

Se a PaO2 for substancialmente mais baixa do que a tensão alveolar de O2 (PAO2) -— isto é, P(A-a)O2 extenso

— há uma série de distúrbios da estrutura pulmonar que reduzem a eficiência da transferência de O2, por exemplo, difusão, limitação através da membrana alveolocapilar (raramente), desequilíbrio na ventilação-perfusão (V/Q) ou shunt. Nessas circunstâncias, a PaCO2 é geralmente baixa. Por outro lado, se a PaO2 estiver reduzida em conjunto com a PAO2 — ou seja, P(A-a)O2 normal— a PAO2 será baixa devido à redução de PO2 inspirada (por exemplo, altitude) e/ou ao aumento da tensão

CVF VEF1

VEF1/CVF

1,12 0,65 0,58

40 30

1,56 0,73 0,47

56 33 A

B D

Pré-BD %predito Pós-BD %predito

pH

PaCO2 (mmHg) HCO3 (mmol/L) PaO2 (mmHg) SaO2 (%) Fluxo O2 (L/min) P(A-a)O2 (mmHg)

7,48 44,4 32,9 73,5 95,7 2 67,4

2ª visita PS 1ª visita PS C

7,35 72,5 39,7 124,0

98,9 4 27,1

Azul = Pré-BD Vermelho = Pós-BD Fluxo

(L/s)

Volume (L)

Figura 1. Espirometria basal (em A) de uma mulher de 71 anos com diagnóstico prévio de DPOC que deu entrada no PS com quadro de dispneia e hipoxemia (gasometria arterial basal em B). A angiografia pulmonar por TC revelou pneumonia em lobo inferior esquerdo (Figura 1C), o que explicava o aumento do gradiente de pressão alveoloarterial de O2 (valor esperado, 2,5 + [0,21 × idade] = 17,4 mmHg). Poucos dias após a resolução da pneumonia, uma segunda gasometria arterial mostrou menor gradiente de pressão alveoloarterial de O2 e hipercapnia, bem como acidose respiratória induzida pela excessivamente alta oferta de O2 a 4 L/min (em D). BD: broncodilatador; HCO3: bicarbonato; e P(A-a)O2: gradiente de pressão alveoloarterial de O2.

https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20200505

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J Bras Pneumol. 2020;46(5):e20200505 EDUCAÇÃO CONTINUADA:

FISIOLOGIA RESPIRATÓRIA

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Gasometria arterial no diagnóstico diferencial de hipoxemia

alveolar de CO2, sugerindo depressão respiratória (hipoventilação alveolar).(1,2) O P(A-a)O2 elevado na primeira gasometria arterial (Figura 1B) foi secundário a uma causa comum de desequilíbrio na V/Q: uma consolidação pneumônica infecciosa(3) (Figura 1C); na verdade, a hipoxemia da paciente respondeu bem a uma FiO2 relativamente baixa, o que não é consistente com shunt. A gasometria arterial também revelou níveis aumentados de bicarbonato: quando um paciente com hipercapnia crônica e apresentando acúmulo de bicarbonato compensatório é exposto a uma fonte de alta pressão ventilatória (por exemplo, hipoxemia), a PaCO2 pode cair para a faixa normal; assim, pode surgir alcalose metabólica (Figura 1B).(1) A segunda gasometria arterial mostrou um cenário diferente (Figura 1D): naquele momento, a fonte extra de desequilíbrio na V/Q não estava mais presente, ou seja,

a pneumonia havia sido resolvida. Consequentemente, fluxos inspirados de O2 excessivamente altos para a melhora de P(A-a)O2 aumentaram a tensão de O2 nos alvéolos, causando baixo nível de ventilação e inibindo a vasoconstrição pulmonar hipóxica, uma causa bem conhecida de hipercapnia (Figura 1D).(4,5)

MENSAGEM CLÍNICA

A interpretação da gasometria arterial em um paciente hipoxêmico deve levar em consideração a história clínica, o tratamento em andamento e os fluxos inspirados de O2 recentes/atuais. As informações fornecidas por P(A-a)O2 devem ser consideradas em associação com PaCO2 (e pH). Um P(A-a)O2 normal na presença de hipoxemia sinaliza oxigênio ambiente reduzido ou hipoventilação alveolar, evidenciados por uma PaCO2 elevada.

REFERÊNCIAS

1. Williams AJ. ABC of oxygen: assessing and interpreting arterial blood gases and acid-base balance. BMJ. 1998;317(7167):1213-1216.

https://doi.org/10.1136/bmj.317.7167.1213

2. Wagner PD. The physiological basis of pulmonary gas exchange:

implications for clinical interpretation of arterial blood gases. Eur Respir J. 2015;45(1):227-243. https://doi.org/10.1183/09031936.00039214 3. Theodore AC. Measures of oxygenation and mechanisms of

hypoxemia. In: UpToDate. Parsons PE, Finlay G, editors. Waltam MA; 2017 [cited 2020 Sep 15]. Available from: https://www.

uptodate.com/contents/measures-of-oxygenation-and-mechanisms- of-hypoxemia

4. Abdo WF, Heunks LM. Oxygen-induced hypercapnia in COPD: myths and facts. Crit Care. 2012;16(5):323. https://doi.org/10.1186/cc11475 5. Hanson CW 3rd, Marshall BE, Frasch HF, Marshall C. Causes of

hypercarbia with oxygen therapy in patients with chronic obstructive pulmonary disease. Crit Care Med. 1996;24(1):23-28. https://doi.

org/10.1097/00003246-199601000-00007

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