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Cad. Saúde Pública vol.23 número9

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Academic year: 2018

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1992

Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 23(9):1992-1993, set, 2007

1992

Pela primeira vez um Ministro da Saúde posicionou-se favorável à mudança da legislação brasileira sobre aborto. A tese do Ministro José Gomes Temporão é simples: aborto é uma questão de saúde pública. O deslocamento do debate do campo moral para o da saúde pública provoca uma redefinição nos termos argumentativos que dominam o debate bra-sileiro nos últimos trinta anos. Um levantamento recente da Universidade de Brasília e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro recuperou 1.600 fontes impressas sobre aborto no Brasil de 1987 a 2007. Esse dado demonstra que há uma permanência do tema na ci-ência brasileira, muito embora algumas características do debate demonstrem a força da afirmação do Ministro.

Há poucos estudos empíricos sobre o fenômeno do aborto no Brasil. Uma explicação possível para essa ausência é o contexto de ilegalidade e imoralidade em que o tema do aborto encontra-se imerso. Identificar mulheres, ouvir suas histórias e cuidar de seus cor-pos pode trazer riscos para elas e para os pesquisadores. A promessa de sigilo ou confiden-cialidade dos dados é um acordo entre pesquisadores e participantes da pesquisa, mas não significa proteção legal frente a investigações policiais ou judiciais. O contexto de guerrilha moral em que o tema do aborto se encontra no Brasil fragiliza pesquisadores e participan-tes. Internacionalmente, pesquisadores já foram obrigados a apresentar seus dados à Justi-ça. Em caso de recusa, já houve a prisão de pesquisadores.

No entanto, há outra maneira de entender a abundância de fontes, mas de poucos es-tudos empíricos. O debate sobre aborto é um espaço de confronto de duas teses pré-es-tabelecidas: a tese do aborto como uma grave infração moral e a tese do aborto como um exercício de autonomia reprodutiva das mulheres. É nesse cenário de confronto de teses incomensuráveis com esparsas evidências empíricas que a reafirmação de que “aborto é uma questão de saúde pública” ganha força e vitalidade política. Na verdade, as poucas e seguras evidências disponíveis no cenário das pesquisas em saúde no Brasil comprovam a tese de que a ilegalidade traz conseqüências para a saúde das mulheres, que não coíbe a prática e perpetua a desigualdade social. Ou seja, o que há de científico no debate brasilei-ro sobre aborto antecipa a tese do Ministbrasilei-ro.

Enfrentar com seriedade o fenômeno do aborto como uma questão de saúde pública significa entendê-lo como uma questão de cuidados em saúde e não como um ato de in-fração moral de mulheres levianas. E para essa redefinição política há algumas tendências que se mantêm nos estudos à beira do leito com mulheres que abortaram: a maioria é ca-tólica, jovem, pobre e já com filhos. O interessante é que essa descrição não representa apenas as mulheres que abortam, mas as mulheres brasileiras. Por isso, a compreensão do aborto como uma questão de saúde pública em um Estado laico e plural representa um novo caminho argumentativo, no qual o campo da saúde pública no Brasil traz sérias e im-portantes evidências para o debate.

Aborto e saúde pública no Brasil

EDITORIAL

Debora Diniz

Programa de Pós-graduação em Política Social, Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.

Referências

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