• Nenhum resultado encontrado

BuscaLegis.ccj.ufsc.Br

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "BuscaLegis.ccj.ufsc.Br"

Copied!
10
0
0

Texto

(1)

®

BuscaLegis

.

ccj.ufsc.Br

Das diferenças entre a prescrição aquisitiva e a ação de usucapião

Tiago da Rocha Moreira*

HISTÓRICO

Com o surgimento do Estado, surge a propriedade, e os direitos inerentes ao seu exercício. Logicamente, a propriedade precisava de caráter oponível frente à terceiros, caráter este concedido junto ao pacto social que instaurou o Estado, garantindo ao homem certa segurança.

Assim defende Kyoshi Harada:

“O direito de propriedade é sem dúvida alguma o mais importante de todos os direitos subjetivos materiais. Há unanimidade dos civilistas no sentido de que o direito de propriedade, como direito real, por excelência, constitui o cerne do direito das coisas, representando a propriedade a espinha dorsal do direito privado. Realmente, dentro do sistema permanente de apropriação de riquezas em que vivemos, inevitáveis os conflitos de interesses entre pessoas, envolvendo disputas sobre bens, reclamando sua disciplinação pelo ordenamento jurídico.”

(2)

De certo que o direito de propriedade é a base sustentáculo de todo a sociedade, e por conseqüência de todo o Direito Civil, regulador das relações humanas, tendo em vista que é à partir dele que definem-se os limites à liberdade, comparam-se às igualdades, e compreende-se a necessidade de solidariedade.

É a partir do Direito Civil da Propriedade que o homem aceita a subordinação de seus interesses aos interesses do próximo, desde que o próximo subordine seus interesses aos seus, por regular os limites à interferência das vontades dos homens sobre os homens. Não é à toa que o direito de propriedade é absoluto e oponível erga omnes.

Neste sentido, compõe salutar importância para o direito de propriedade o ordenamento jurídico Romano, pois é nele que se figura a efetiva regulamentação de bens imóveis - em específico a propriedade do solo -, quando, pela primeira vez na história, é cedido a um cidadão adquiri-la:

“Dotada de caráter místico nos primeiros tempos. Mesclada de determinações políticas. Somente o cidadão romano podia adquirir a propriedade; somente o solo romano podia ser seu objeto, uma vez que a dominação nacionalizava a terra conquistada. E a técnica da aquisição – mancipatio -, um cerimonial tipicamente romano, restringia o fenômeno e limitava o domínio ex iure quiritium. Mais tarde estendeu-se o ius commercii aos estrangeiros, ampliou-se a suscetibilidade da aquisição ao solo itálico, e depois além deste; [...]”

(3)

“Naquele direito, deparamos com a chamada propriedade, que era protegida por uma ação civil in rem, a reivindicatio: era a propriedade “quiritária” – dominium ex jure Quiritum. A expressão ex jure Quiritum, designando a propriedade romana por excelência, deve estar relacoinada com os sabinos de Quirital. [...] A propriedade quiritária era dotada de garantia eficaz, exigindo capacidade pessoal, idoneidade e o modo de adquirir, conforme o jus civile. Em outras palavras, a sua aquisição era privilégio só do cidadão romano.”

A ação de usucapião é meio pelo qual se obtém direito à propriedade de um bem através da posse por tempo prolongado e ininterrupto, isto é, é a transformação da posse em domínio, pelo transcurso de tempo, depois de satisfeitos os requisitos previstos na lei.

A usucapião é um dos mais antigos institutos jurídicos, pois trata da posse e da propriedade do solo, existindo desde a Lei das XII Tábuas, conforme expõe Natal Nader:

“O usucapião, como modo de aquisição de propriedade imóvel, previsto no art. 530, III, do Código Civil Brasileiro, é instituto antiqüíssimo, do qual já cuidava a Lei das XII Tábuas, na Tábua 6ª, inciso III, que se intitula “Da propriedade e da posse”: “III – A propriedade do solo se adquire pela posse de dois anos; e das outras coisas, pela de um ano”.

Sua importância é salutar, tendo em vista a organização histórico-política de todo o ocidente, bem como de toda sociedade brasileira, uma vez que a questão da propriedade de terras permeia desde o seu descobrimento, quando o Brasil foi invadido pelos Portugueses, passando a integrar a relação colônia-extrativista/propriedade da Coroa Portuguesa, bem como os tratados que versavam sobre a demarcação das terras do Novo Mundo, como a exemplo o Tratado de Tordesilhas, e a divisão do Brasil em Capitanias Hereditárias.

(4)

Não obstante, o Direito Brasileiro tem tratado a questão da propriedade de terras com singular importância ao longo de sua evolução, notadamente através da consolidação em sede Constitucional da função social da propriedade.

DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA X USUCAPIÃO

Com o objetivo de entender o problema efetivo no que cerne à confusão entre os institutos, há de se apresentar o marco mais importante para compreender o motivo pelo qual muitos doutrinadores confundem a prescrição aquisitiva com a usucapião.

Este marco foi o Código Justiniano, considerando o fato que o famoso Imperador de Constantinopla – hoje Istambul, capital da Turquia – conseguiu convergir diversas outras codificações em um único e consolidado texto, em 529 a.C.

Antes de Justiniano, havia diferenciação entre a usucapião, esta instrumento de aquisição de propriedade, enquanto a prescrição era simples exceção processual.

Foi à partir da Codificação de Justiniano, que o instituto da usucapião fundiu-se ao da prescrição, passando a ser tratado como uma das duas vertentes do seu exercício: a prescrição aquisitiva e a prescrição extintiva. Justiniano entendeu que, por tratar-se de instrumento de obtenção da propriedade através do decurso do tempo, nada mais era senão uma forma de prescrição.

Utilizado como alicerce sustentáculo de diversas codificações, este texto consolidado por Justiniano foi de fundamental importância para os Códigos Civis modernos. Neste sentido,

(5)

os dois principais Códigos Europeus distinguiam-se, no que cerne ao direito de propriedade, seguindo, ou não a vertente do Código de Justiniano.

O Código Civil Francês, a exemplo, preferiu por entender a que a usucapião não seria senão a prescrição aquisitiva, não havendo diferenciação entre os institutos; conquanto o Código Civil Alemão entendeu por haver distinção.

Em termos de Brasil, o Código Civil de 1916, em consonância com o Código Civil Alemão, preferiu por distinguir a prescrição aquisitiva da prescrição extintiva, analisando-as sob duanalisando-as diferentes óticanalisando-as: a usucapião - e a prescrição extintiva; tratando-analisando-as, respectivamente, em sua Parte Especial e em sua Parte Geral.

Afirma Washington de Barros Monteiro:

“Questiona-se também acerca da natureza jurídica do usucapião, havendo quem sustente ser ele a mesma prescrição, embora encarada sob outro aspecto. É o sistema do Código Civil francês dos que lhe seguiram as pegadas. O legislador pátrio pendeu, tanto o de 1916 como o de 2002, todavia, pelo sistema alemão, fundado na tradição romana e segundo o qual o usucapião tem vida própria, apresenta contornos que lhe são peculiares e é autônomo, malgrado inegáveis afinidades com a prescrição.”

O conceito da usucapião resta consolidado na doutrina, contudo, muitos autores divergem acerca da identidade de conceito entre a prescrição aquisitiva e a usucapião, por serem impossíveis de confusão, ainda que contenham elementos próximos: que é o decurso de tempo.

(6)

Neste sentido, verificam-se os conceitos de usucapião expostos por Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

“A usucapião é modo originário de aquisição de propriedade e de outros direitos reais, pela posse prolongada da coisa, acrescida de demais requisitos legais.”

Caio Mário da Silva Pereira:

“Usucapião é a aquisição da propriedade ou outro direito real pelo decurso do tempo estabelecido e com a observância dos requisitos instituídos em lei.”

Em contrapartida, alguns autores não vislumbram separação entre os institutos, como a exemplo, Antonio Macedo Campos:

“A palavra usucapião, origina-se no latim uso capere, significando tomar pelo uso, constituir prescrição aquisitiva, constitutiva ou positiva da propriedade e de certos direitos reais, mediante a ocorrência de determinadas condições previstas em lei” .

Apesar da inegável semelhança, a doutrina majoritária brasileira consolidou entendimento pela diferenciação entre a usucapião e a prescrição aquisitiva. Expoentes desta corrente estão: Tupinambá Miguel Castro do Nascimento:

(7)

“Não são conceitualmente idênticos os termos prescrição e usucapião. A doutrina tem demonstrado que, enquanto o primeiro tem como objetivo extinguir ações, o segundo objetiva a aquisição de direito real. Este critério dualista, defendido pelos juristas alemães teve aceitação de CLOVIS BEVILACQUA na elaboração do Código Civil. Com efeito, o diploma de 1916 localizou a prescrição em sua Parte Geral colocando o usucapião, topograficamente, no Direito das Coisas. E assim ficou mais clara a dualidade conceitual. Enquanto que naquela, a praescriptio, há o efeito extintivo do tempo no desestruturar as ações e, estando na Parte Geral do Código Civil, aplica-se a todas as áreas do Direito, nesta, a usucapio, prevista no Direito das Coisas, aplica-se somente nesta área. Em outras palavras, em nosso Código Civil, tratou-se autonomamente das hipóteses de prescrição e usucapião.”

Natal Nader:

“Embora inegável a existência de pontos afins entre ambas, elas se distinguem em muitos outros, sendo que, no campo do direito positivo, o nosso Código Civil optou pela orientação do direito alemão, inserindo a prescrição extintiva na Parte Geral e a aquisitiva na Parte Especial no Livro II do Direito das Coisas.”

E Caio Mário da Silva Pereira

“A nosso ver, e considerada cientificamente a matéria, a posição correta do usucapião (ou da usucapião, como prefere o Código de 2002), denominado impropriamente prescrição aquisitiva (como referem Lafayette, Ruggiero e Maroi), é entre as diversas modalidades de aquisição da propriedade, e conforme prometemos no nº 120 supra (vol.I destas Instituições) aqui promovemos o seu desenvolvimento e determinação dogmática.”

(8)

Afirmam, ainda, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:

“Clóvis Beviláqua, em sentido contrário, buscou a corrente dualista, diferenciando a prescrição da usucapião. Em sede legislativa, tanto no Código Civil de 1916 como o Código Civil de 2002 seguiram a orientação do Código Civil alemão e separaram a prescrição da usucapião, com a instalação da prescrição extintiva na parte geral e da usucapião do Livro do Direito das Coisas, como modo de aquisição de propriedade. Com efeito, veremos a seguir que é impróprio conceituar a usucapião como prescrição aquisitiva.”

Fundamentalmente, ainda que ambas as prescrições possuam o mesmo requisito, que é o tempo, sua finalidade diverge, pois, enquanto a usucapião possibilita que alguém incorpore ao seu patrimônio direito do qual usufrui há certo tempo; a prescrição extintiva, por sua vez, é a extinção da pretensão, em face do não exercício de certo direito, diante de decurso temporal – diferindo dos institutos da decadência, preclusão e da perempção .

A prescrição extintiva atinge, por sua vez, a pretensão, sendo esta a tentativa de impor, exigir ou obrigar um sujeito à subordinar-se à vontade do seu interesse; sendo necessária, para a sua configuração, a existência de ação correspondente ao direito violado, bem como a inércia do titular do direito violado através do decurso do prazo, que, em geral, é de dez anos.

(9)

“Assim, usucapião não tem o mesmo conteúdo da prescrição, embora haja ponto comum, detectável em ambos, que é o decurso do tempo. Este se reflete na natureza criativa, fazendo nascer direitos reais, e no outro para extinguir a pretensão à acionabilidade.”

Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

“Apesar da confluência entre as causas interruptivas e suspensivas nos universos da prescrição e da usucapião, não recomendamos ao operador do direito a adoção da expressão prescrição aquisitiva como sinônimo de usucapião. A prescrição é forma de extinção de pretensões reais e obrigacionais pela inércia do titular no exercício do direito sujeito pelo decurso do tempo. A usucapião é simplesmente um modo de aquisição de propriedade.”

Portanto, é equivocada considerar a usucapião como prescrição aquisitiva, tendo em vista o condão histórico e a evolução do Direito Brasileiro. A divergência entre os institutos é notória, determinada não somente por parâmetros do próprio ordenamento, mas também pelos conceitos doutrinários de ambos.

BIBLIOGRAFIA

CAMPOS, Antonio Macedo. Teoria e Prática da Usucapião. São Paulo: Saraiva, 1982.

FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2007.

(10)

HARADA, Kiyoshi. Desapropriação. Doutrina e Prática. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Vol III. Direito das Coisas. 37ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

NADER, Natal. Usucapião de Imóveis. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Usucapião. 6ª ed. Rio de Janeiro: Aide, 1992.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol IV. Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

RIBEIRO, Benedito Silvério. Tratado de Usucapião. Vol I e II. São Paulo: Saraiva, 2003.

SIQUEIRA, Aluízio Cândido de. Direito e Legislação de Terras. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1984.

*Estudande de Direito trmoreira84@gmail.com

Disponível em: <

http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1094&idAreaSel=2&seeArt=y es >. Acesso em: 13 mar. 2008.

Referências

Documentos relacionados

Para determinar se o comportamento de uma enfermidade em um lugar e período está ocorrendo na forma de uma epidemia, deve-se construir um diagrama de

O Programa Aquecimento e Arrefecimento Solar da Agência Internacional de Energia (IEA SHC) tem no presente em discussão o Programa de Trabalhos de uma nova Task, que será

Foram realizadas entrevistas com professores da rede de ensino médio, obedecendo aos parâmetros teórico-metodológicos referentes a como esses profissionais verificam

Logo, a “noção de autonomia da vontade sofre profundas modificações no âmbito do contrato”, que passa a ser entendido como “um instrumento a serviço da pessoa, sua

28 Conforme o estabelecido na primeira legislação civil brasileira o Código Civil de 1916, ou Código Clovis Bevilacqua o qual tinha por pilares a família, a propriedade e o

Com o passar do tempo à sociedade/legislador percebeu que essa não era a melhor forma de tratar da filiação e sucessão revogando assim, esse referido dispositivo

Do que se conclui: (I) que o Código Civil alemão (BGB) de 1896 define apenas a pretensão de direito material (ação material), emprestando ao conceito de “pretensão’ um sentido

de Junho Aprova o Regime Jurídico do Processo de Inventário e altera o Código Civil, o Código de Processo Civil, o Código do Registo Predial e o Código do Registo Civil,