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De Santa à perigosa: representações e apagamentos de corpos trans femininos nas Artes Visuais até o século XIX

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Academic year: 2021

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DAPesquisa, Florianópolis, v. 16, p. 01-28, fev. 2021.

DOI: https://doi.org/10.5965/18083129152021e0002 1

De Santa à perigosa: representações e apagamentos de corpos trans

femininos nas Artes Visuais até o século XIX

From Santa to dangerous: representations and erasure of female trans bodies in

Visual Arts until the 19th century

Megg Rayara Gomes de Oliveira

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) – meggrayaragomes@gmail.com - orcid.org/0000-0001-9203-9989

Resumo

Neste artigo problematizo a representação e apagamento de corpos trans femininos nas artes visuais até o final do século XIX. Procuro identificar personagens trans femininas em obras de arte que dialogam com o campo do sagrado e da mitologia, bem como em imagens produzidas por ilustradores que estavam a serviço de jornais e dos departamentos de polícia, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos da América. Textos que discutem história da arte, religiosidade, mitologia, homossexualidade masculina, também foram consultados, porém adoto uma postura genealógica nos moldes propostos por Ines Dussel e Marcelo Caruso (2003). Faço uso, ainda, da perspectiva parcial proposta por Donna Haraway (1995) para analisar fragmentos da História Tradicional e da História da Arte. O conceito de interseccionalidade tem importância central neste trabalho, pois permite articular questões de classe, gênero, identidade de gênero e raça de forma simultânea. Este conceito possibilita o revezamento entre diversas áreas do conhecimento. No caso deste artigo com os estudos culturais, de gênero e diversidade sexual e com as teorias estruturalistas e pós-coloniais. Para dar mais consistência às minhas reflexões, faço uso de inúmeras imagens por entender que a linguagem visual também pode ser discursiva ultrapassando os limites de leituras estéticas.

Palavras-chave: Artes e história. Transexualidade. Identidade de gênero. Imagem corporal. Abstract

In this article, I problematize the representation and erasure of trans female bodies in the visual arts until the end of the 19th century. I try to identify trans female characters in works of art that dialogue with the field of the sacred and mythology, as well as in images produced by illustrators who were in the service of newspapers and police departments, especially in England and the United States of America. Texts that discuss art history, religiosity, mythology, male homosexuality were also consulted, but I adopt a genealogical stance along the lines proposed by Ines Dussel and Marcelo Caruso (2003). I also use the partial perspective proposed by Donna Haraway (1995) to analyze fragments of Traditional History and Art History. The concept of intersectionality is of central importance in this work, as it allows articulating issues of class, gender, gender identity and race simultaneously. This concept makes it possible to take turns between different areas of knowledge. In the case of this article with cultural, gender and sexual diversity studies and with post-structuralist and post-colonial theories. To give more consistency to my reflections, I use countless images because I understand that the visual language can also be discursive beyond the limits of aesthetic readings.

Keywords: Arts and history. Transsexualism. Gender identity. Body image.

Recebido em: 19/05/2020 Aceito em: 13/11/2020

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1 INTRODUÇÃO

Sendo o corpo a substância material, a figura poderia ser explicada como a sua forma exterior, sua imagem e representação.

O corpo físico é palpável, enquanto que a imagem pertence à dimensão do simbólico e do representativo. Assim a imagem construída ganha também uma dimensão política. Temos, então, a cada época, representações visuais que correspondem a determinados códigos sociais, e ter acesso a esses códigos e convenções socioculturais de representações é reconhecê-los, identificá-los, nomeá-los e produzi-los, dando um sentido de forma contextualizada.

Nem sempre o sentido atribuído a uma imagem corresponde as expectativas de quem a produziu, uma vez que está sujeita a mediações variadas, muitas carregadas de preconceitos e estereótipos.

Embora não exista um “sistema coerente para ler imagens, similar àquele que criados para ler a escrita” (MANGUEL, 2001, p. 28)1 , é possível pensar que nas sociedades contemporâneas,

exista uma linguagem visual universalizante, por mais distintas que sejam as culturas e mais específicos que sejam muitos dos seus códigos estéticos.

Esse caráter universalizante estaria presente nos elementos que permitem que a leitura de imagens sejam acessíveis, inclusive às pessoas que não passaram por um processo formal de alfabetização visual “pois aquilo que a escrita torna presente para o leitor, as pinturas – leia-se imagens – tornam presentes para os iletrados” (MANGUEL, 2001, p. 143. Grifo meu).

Minha posição é de que antes mesmo da utilização da escrita, a imagem era utilizada para difundir determinadas formas de pensamento, podendo ser usada para reafirmar ou questionar situações de poder.

Ao longo de toda história da arte – africana, europeia, americana, etc. – a imagem mais recorrente é a da figura humana e, aqui no Brasil, as representações mais difundidas estão relacionadas à arte ocidental, em que o homem branco cisgênero heterossexual, jovem, magro, é retratado como o “eu”, ou seja, o “modelo universal de humanidade”. (SILVA, 2008).

1Por defender uma educação não sexista, além de utilizar o gênero feminino e masculino para me referir às pessoas

em geral, na primeira vez que há a citação de um/a autor/a, transcrevo seu nome completo para a identificação do sexo (gênero) e, consequentemente, para proporcionar maior visibilidade às pesquisadoras e estudiosas.

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Assim, os outros corpos, aqueles que se distanciam desse modelo, considerados inadequados pela lógica da cisgeneridade heterossexual branca imposta pelo modelo civilizador europeu, merecem e devem ser ignorados.

Se por acaso forem retratados, devem ser mostrados de maneira a confirmar sua suposta inferioridade.

Entre uma multiplicidade de corpos ignorados de forma sistemática pelas artes visuais, interessa-me neste artigo discutir os corpos trans femininos - travestis e/ou mulheres transexuais - brancos e negros.

Ainda que ocupem minimamente um espaço na história das artes visuais, como tema, acredito ser importante problematizar em que situação isso acontece e destacar quais os fatores que contribuem para que fossem retratadas e/ou ignoradas.

Meu objetivo neste artigo é contribuir, ainda que de maneira modesta, para romper com a invisibilidade relativa a representação de travestis e/ou mulheres transexuais, brancas e negras, nas artes visuais, procurando identificar obras e artistas que as retrataram em períodos e culturas distintas até o século XIX.

Neste artigo vou considerar como objeto de análise obras bidimensionais – desenho, pintura, gravura, ilustração, fotografia, baixo-relevo, aquarela, etc. – e obras tridimensionais, especialmente esculturas.

Para fazer esse debate adoto uma postura genealógica (DUSSEL; CARUSO, 2003) e lanço sobre a História Geral e a História da Arte um olhar crítico e interessado.

A História da Arte guarda muitas semelhanças com o conceito de História Geral proposto por Donna Haraway (1995).

De acordo com a autora, a História pode ser definida como uma tecnologia do olhar. Um olhar esmerilhado à perfeição do capitalismo, do colonialismo e da supremacia masculina. Um saber localizado a partir dos corpos que importam e, portanto, merecem ser lembrados (HARAWAY, 1995).

Ao lançar um olhar específico, direcionado, que questiona a invisibilidade de travestis e/ou mulheres transexuais na História da Arte, a genealogia me permite fazer uma análise específica dessa situação.

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Entendo que a genealogia precisa estar associada a outras áreas do conhecimento, por isso recorro ao conceito de interseccionalidade desenvolvido pela jurista estadunidense Kimberlé Crenshaw em 1989 (VIGOYA, 2016), por permitir articular questões de classe, gênero, identidade de gênero e raça de forma simultânea.

A genealogia, o conceito de interseccionalidade aliado à perspectiva cultural, pós-estruturalista, com os estudos feministas, de relações étnico-raciais e de gênero me fornecem suporte teórico-metodológico para localizar, identificar e colocar em evidência obras e artistas que tematizam o corpo de travestis e mulheres transexuais, nas artes visuais, até o século XIX.

2 BELAS, SAGRADAS E PODEROSAS!

Ao longo da história da humandade são inúmeros os exemplos de imagens que retratam corpos trans femininos. No entanto traçar uma linha cronológica dessas obras se torna bastante complicada, dada as inúmeras lacunas observadas tanto na História Geral, quanto na História da Arte.

Entendo que essas lacunas não foram devidamente preenchidas propositadamente e estão associadas às hierarquias de raça e de gênero e operam para naturalizar a ideia da inexistência de pessoas travestis e/ou mulheres transexuais.

Os poucos trabalhos no campo das artes visuais que discutem o assunto, mesmo os mais recentes, utilizam denominações variadas, como por exemplo, hermafrodita2 e/ou andrógino.

Outros, ainda, não fazem “a distinção entre orientação sexual e identidade de gênero” (VIEIRA, 2015, online) e tratam travestis e mulheres transexuais como uma categoria específica de homossexuais masculinos.

Assim, a definição para os conceitos de andrógino e/ou hermafrodita “procura descrever pessoas que apresentavam características corporais em que os atributos culturalmente definidos como masculinos e femininos estavam integrados” (OLIVEIRA, 2019, online).

Afirmo então, que esses conceitos dizem respeito a pessoas que desafiavam a normatividade da cisgeneridade e consequentemente, “as tradicionais polaridades existentes entre 2 O termo hermafrodita, relacionado aos seres humanos, foi substituído pelo vocábulo intersexual, tanto na pela

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masculinidade e feminilidade, assim como a perspectiva essencialista que “biologisa” gênero, privilegiando dois gêneros distintos, consistentes com o sexo biológico e estáveis” (SANTOS, 2013, p. 95).

“A partir dessas reflexões, neste artigo, tomo a liberdade para usar os termos travesti, mulher transexual e/ou pessoas trans no lugar de andrógino/a e hermafrodita, propondo uma atualização de ambos os conceitos” (OLIVEIRA, 2018, p. 79), quando não se tratar de citações diretas ou indiretas.

A pesquisa me conduziu por caminhos variados e localizei as primeiras representações de corpos trans femininos no campo do sagrado nos períodos Neolítico (5.000 à 3.000 a.C.) e na Idade do Bronze (3.300 à 700 a.C.). Nesses períodos foram identificados desenhos e pinturas na região do Mediterrâneo retratando figuras humanas com seios femininos e órgãos genitais masculinos ou sem características sexuais distintas.

Essas representações, assim como a maior parte das pinturas rupestres, não eram simples elementos decorativos, havendo a possibilidade concreta de que “tenha(m) um valor religioso, com símbolos relacionados a magia” (AGUIAR, 2012).

É possível supor também que essas imagens emergiram do cotidiano daquelas pessoas, de observações do mundo real. O sentido atribuído, então, é que estaria atravessado por intenções religiosas.

Alguns pesquisadores (VERGER,1999; RODRIGUES, 2010; JONES, 2007), afirmam que tanto as práticas religiosas, quanto artísticas refletem, em maior ou menor proporção, a organização social de um povo. Assim a pluralidade de gêneros presentes nas religiões e na arte são identificadas, invariavelmente, entre as pessoas, dando a entender que o culto às divindades que escapam às normas da cisgeneridade, não compõem um capítulo menos importante na história das religiões e da humanidade.

O teólogo católico estadunidense Peter Jones (2007)

elencou uma série de divindades que apresentam características corporais nos mesmos moldes das travestis e/ou mulheres transexuais contemporâneas, com seios e pênis e que também são nominadas e tratadas no gênero feminino. Catalogou também rituais onde lideranças religiosas, biologicamente do sexo masculino, adotam gestual e vestimentas consideradas próprias do universo feminino (OLIVEIRA, 2019, online.).

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Dentre as divindades citadas por Jones (200), algumas conquistaram grande popularidade, como por exemplo, Ardhanarishvara, fusão de Shiva e de sua companheira Parvati, que representa a união entre os dois gêneros e simboliza, para os Hindus, na Índia, o início de tudo.

Essa divindade foi retratada exaustivamente, em desenhos, pinturas, tapeçarias e principalmente esculturas, expostas em templos e espaços públicos.

Para os Hindus a arte “é um encontro de dois polos, o humano e o divino. Assim, as representações esculturais dos deuses tinham funções teológicas e narrativas” (ANDRADE, 2006, p. 7). A arte, além de agradar os olhos, devia, inevitavelmente, agradar o espírito.

FIGURA 1 - ARDHANARISHVARA, SÉCULO VI, MUSEU DO GOVERNO, RAJASTÃO, ÍNDIA3

Fonte: https://www.britannica.com/topic/Ardhanarishvara

Ainda na cultura indiana, as pessoas trans femininas eram consideradas sagradas a aproximadamente 5 mil anos. Conhecidas como Hijras, antes do contato com a cultura europeia, fortemente influenciada pelo cristianismo, desfrutavam de certa tranquilidade para expressarem sua identidade livremente. A identidade Hijra, explica Ana Lúcia Fonseca Santos (2012), tem um fundamento mítico e acredita-se que têm poderes de benção e maldição, por isso são respeitadas e/ou temidas por parte da população.

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No Tibete, Jones (2007) catalogou o culto a Avalokiteshvara divindade caracterizada pela fluidez de gênero, sendo representada, em esculturas e pinturas, tanto sob a forma masculina, com bigodes e armas, quanto sob a forma de uma bela mulher, usando vestido.

Assim como acontece na Ásia, as divindades trans também influenciaram muitos artistas africanos, tanto na arte tradicional4 , quanto na arte egípcia.

De acordo com Pierre Verger (1999) e Raymundo Nina RODRIGUES (2010) a lista de divindades trans5 africanas é bastante extensa, na qual incluem-se Obatalá, Mawu-Lisa e Nana

Buluku no reino de Daomé, Mwari na etnia Shona, Aku e Awo no reino de AKan e Hapi, deus/a do Rio Nilo, no antigo Egito.

Provavelmente Hapi, seja uma das divindades mais antigas cultuadas pelos egípcios, dada a sua relação com o Rio Nilo. Representada com seios, quadris arredondados e barba, simboliza a fertilidade trazida pela inundação.

FIGURA 2 – HAPI, BAIXO RELEVO, TEMPLO DA DEUSA HATHOR – COMPLEXO DE DENDERA, EGITO6

Fonte: https://antigoegito.org/rio-nilo-uma-dadiva/

É a arte egípcia, também, que registra um dos primeiros personagens históricos “de forma deliberadamente andrógina, Akhenaton (Amenófis IV), faraó da 18ª Dinastia7 , cujo reinado foi

caracterizado por profundas transformações tanto no campo político e religioso quanto artístico” (BERBARA; FONSECA, 2011, p. 2239).

4Arte tradicional quando se refere aos povos tradicionais, grupos culturalmente diferenciados, que possuem formas

próprias de organização social.

5 Verger (1999) e Rodrigues (2010), utilizam o vocábulo Andrógino para se referir a essas divindades. 6 Imagem disponível em: <https://antigoegito.org/rio-nilo-uma-dadiva/>

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As formas femininas observadas no corpo de Akhenaton - face alongada, o busto quase feminino, a amplidão das cadeiras, a saliência do abdômen – se relaciona ao arquétipo do deus Aton, identificado com o disco solar e considerado o pai e a mãe de todas as coisas (BERBARA; FONSECA, 2011).

Ao ser retratado com características masculinas e femininas, Akhenaton adquiria a forma de um ser absoluto, supremo, similar ao que se observa em outras culturas africanas.

Os Dogon, que atualmente vivem no Mali, por exemplo, acreditavam que um corpo com características dos dois sexos e dos dois gêneros era o corpo perfeito (OLIVEIRA, 2018 ). Os Dogon chegaram à região de Bandiagara, uma fratura geológica de aproximadamente 200 km de extensão, localizada entre a savana e a planície do rio Níger, no século XV.

Assim como os indianos, tibetanos e egípcios a maneira como os Dogon viam o mundo, era refletida na sua produção artística.

A Figura trans8 do Mestre de Yayé, atualmente exposta no Museu do Louvre em Paris,

levada para a França em 1935 pelas pesquisadoras Denise Paulme e Debora Lifchitz (GUILHERME FILHO, 2014), pode ser tomada como exemplo.

Essa escultura, em madeira, retrata uma figura nua, com pênis e seios à mostra, e reflete os padrões de perfeição propostos pela etnia Dogon.

Dentre os vários estilos de escultura Dogon que retratam corpos trans femininos, destacam-se os estilos Niongom, Tellem e Djennenké.

Uma obra, em estilo Tellem, encontra-se exposta no Metropolitan Museum de Nova York e retrata uma grande figura trans “com seu gorro, seu colar de chapas quadradas, suas pulseiras e braçadeiras, o cinto a acentuar a nudez do sexo, os dois braços erguidos como se fora um Tellem.” (SILVA, 2006, p. 651).

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FIGURA 3 – FIGURA HERMAFRODITA COM OS BRAÇOS LEVANTADOS, ESTILO DJENNENKÉ, SEC. X, MUSEU DO QUAI BRANLY, PARIS9 .

Fonte: http://docplayer.com.br/45453346-Itinerario-estudo-estetico-e-estilistico-de-uma-escultura-dogon-figura-hermafrodita-do-mestre-de-yaye.html

A respeito da arte Dogon, Hélene Leulop (2011) explica que para entendê-la, é preciso compreender que o conceito de perfeição Dogon decorre da reunião do que foi separado, e a transgressão do binarismo de gênero, é o caminho que leva a perfeição.

Já as máscaras utilizadas nas cerimônias de iniciação N'domo dos Bambaras do Mali, podem ser masculinas, femininas e trans. Nesse caso o gênero é indicado pelo número de chifres: máscaras com sete chifres representam a fluidez de gênero. Crianças não iniciadas, que ainda não apresentam um gênero específico ou que transitam por ambos, relacionam-se com ancestrais míticos, que muitas vezes são representados por figuras trans ou um por um par constituído por uma figura cisgênera do sexo masculino e outra do sexo feminino (OLIVEIRA, 2019, n.p.).

Essa diversidade de corpos na religiosidade africana, atrelada, de acordo com Jones (2007), a liberdade sexual e a diversidade de gênero dessas populações, é observada, ainda que em menor proporção nas culturas grega e romana.

A divindade grega mais popular que escapa a cisgeneridade hegemônica, era chamada de Hermafrodito, filha de Hermes e Afrodite e “aparece primeiramente na literatura

9 Imagem disponível em: <

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grega por volta do século IV a.C., mas são as histórias de Ovídio que efetivamente estabelecem a identidade deste mito” ( SANFELICE, 2013, p. 18).

De acordo com Aileen Ajootian (2004), Hermafrodito fora representado de quatro maneiras principais: Hermafrodito sozinha, nua ou seminua; Hermafrodito sozinha vestida; Hermafrodito dormindo e Hermafrodito na presença de outros/as.

A fusão dos gêneros masculino e feminino fazia de Hermafrodito a guardiã da fertilidade humana.

Os seios eram considerados símbolos de fertilidade, remetendo à amamentação, vinculados à potência vital feminina. Da mesma maneira, o pênis estava associado à fertilidade, fazendo referências explícitas à cópula, tendo assim, uma conotação extremamente positiva e religiosa (SANFELICE, 2013).

Por esse motivo imagens de Hermafrodito foram encontradas numa série de contextos e em diversos ambientes, tanto em forma de escultura quanto de pintura. Hermafroditos estavam presentes nas entradas das casas, como exemplo há pinturas e uma escultura encontradas na entrada da Casa dos Vetti e na sala principal da Casa do Centenário (SANFELICE, 2013), na cidade de Pompéia, soterrada pelo vulcão Vesúvio no ano 79 da era cristã.

As obras romanas, provavelmente, foram inspiradas em originais gregos.

Uma escultura grega em bronze, provavelmente do século II a.C. serviu de modelo para alguns artistas romanos, sendo que “três cópias em mármore da época roma-na chegaram até nossa era. A mais conhecida foi encontrada nas ruínas das termas de Diocleciano10 e hoje se

encontra no museu do Louvre. O corpo é inspirado nas representações de Vênus” ( LOPES, 2017, p. 62), porém com um pênis. Em tamanho natural, a personagem repousa delicadamente sobre um colchão esculpido pelo artista italiano Gian Lorenzo Bernini em 1620.

Quando a escultura foi descoberta em Santa Maria della Vittoria, em Roma, foi imediatamente reivindicada pelo cardeal Scipione Borghese e desde então passou a fazer parte de sua coleção particular. A escultura, tempos depois vendida para o exército francês e acabou no Museu do Louvre, onde está em exposição atualmente.

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FIGURA 4 – HERMAFRODITA DORMINDO, MÁRMORE, SÉCULO. II d.C., MUSEU DO LOUVRE, PARIS11

Fonte: https://www.flickr.com/photos/magerson/5151753750

Essa divindade ganhou interpretações e denominações variadas, mas ainda assim preservou as características corporais principais para que ela fosse facilmente identificada.

Um bom exemplo é a Estátua de Narciso, conhecida como O Hermafrodita Marazin ou O Gênio em Eterno Descanso, uma peça romana confeccionada em mármore no século III d.C. e que também integra a coleção do Museu do Louvre em Paris, mostra Narciso com rosto e corpo feminilizados, com seios, em desenvolvimento, e pênis.

Outra escultura que chegou até os nossos dias, mostra uma luta entre Hermafrodito e o deus Pan. A figura principal, ainda que esteja sem cabeça, segue as mesmas regras de representação, com seios, curvas e gestual femininos e genitália masculina à mostra para confirmar que se trata de um corpo trans.

Conforme relatado no catálogo da Casa Christie's de leilões

o conjunto foi esculpido durante o primeiro período do Império Romano, por volta do século I d.C., mas é baseado em um original de meados do século II a.C., quando as

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ilustrações de confrontos entre forças bestiais e uma ninfa Hermafrodita eram imensamente populares (LA ESCULTURA..., 2011, n.p.).

3 BANIDOS, ESQUECIDOS, APAGADOS: OS CORPOS TRANS FEMININOS NA ARTE EUROPEIA

Embora sejam inúmeros os exemplos de obras gregas e romanas retratando Hermafrodito, a norma da cisgeneridade operou para que ficassem de fora de galerias, museus e principalmente da História da Arte.

A partir das reflexões de Michel Foucault (1926 - 1984) presentes no texto Herculine Barbin: O Diário de Um Hermafrodita (1982), Sanfelice (2013) explica que as propostas sociais em prática na época da descoberta dessas obras [e que ainda respigam nas sociedades contemporâneas] eram de exclusão (banimento, exílio, apagamento) ou de proibição (correção, cura, monstrificação), tendo em vista que a procura da identidade na ordem sexual era praticada, cada vez mais, pela Medicina e pelo Direito12 , impondo uma norma rígida na definição e na captura do verdadeiro sexo

para os indivíduos.

Assim, era fundamental que a sociedade se mantivesse afastada desse modelo de corpo e, cabia aos responsáveis pela estética das artes visuais europeias do século XIX e XX, selecionar aquilo que era passível de admiração e aquilo que deveria ficar escondido, trancafiado em salas vigiadas (NEAD, 2001 apud SANFELICE, 2013).

FIGURA 5 – AUTORIA DESCONHECIDA, SALMACIS: NI UNO, NI OUTRO, 188513

Fonte: http://dexedrina.blogspot.com/2010/05/hermafrodito-y-salmacis.html

12 Ainda que a medicina e o direito se estruturassem como ciência, não deixaram de sofrer influência do cristianismo. 13 Imagem disponível em: <http://dexedrina.blogspot.com/2010/05/hermafrodito-y-salmacis.html>

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Essas ações, por mais rigorosas que fossem, não conseguiram impedir que algumas obras consideradas inadequadas chegassem as salas de exposições de alguns museus, dada a existência de uma lista bastante extensa de artistas europeus, a partir do século XV, que se interessaram pelo mito de Hermafrodito e o retrataram principalmente em forma de gravura e pintura.

Dentre eles é possível identificar: Maestro Flamenco, Hermaphroditus und Salmacist, sec. XV; Louis Finson, Hermaphroditus and Salmacis, óleo sobre tela, 1580 – 1585; Jan Gossaert (Mabuse), La metamorfosis de hermafrodito y Salmacis, 1520; Bartholomaus Spranger, Hermaphroditus y la ninfa Salmacis, 1580 – 82; Carlo Saraceni, Paisage com Salmaci y e Hermafrodito, 1608; Francesco Albani, Salmacis and Hermaphroditus, 1660; Jean François de Troy, Salmacis y Hermafrodito, 1708; François-Joseph Navez, The Nymph Salmacis and Hermaphroditus, 1829; Gante Giovanni Carnovali, Salmace e Ermafrodito, óleo sobre tela,1856.

Essas obras, porém, seguem regras de representações mais comedidas e raramente o mito de Hermafrodito é mostrado com a mesma liberdade narrativa observada na arte grega e romana. Ainda assim, guardadas as devidas proporções, se colocam com uma outra possibilidade discursiva a respeito do corpo.

Esse comedimento, provavelmente tenha relação com a vigilância imposta pelo cristianismo que exigia do Estado, inclusive nas colônias europeias na América e na África, a eliminação completa das pessoas trans, fosse pela recondução forçada a norma da cisgeneridade, fosse pela condenação à morte.

As ações da igreja, explica Jocélio Teles dos Santos (1997) encontrava base de apoio na Bíblia, em Deuteronômio 22:5 que diz que a mulher não se vestirá de homem nem o homem se vestirá de mulher, porque aquele que tal faz é abominável diante de Deus.

A igreja católica, que se colocava como a representante absoluta do cristianismo interferia na produção artística e estabelecia regras rígidas de representação. A arte, então, deveria contribuir para a edificação moral da sociedade e o artista produzir imagens onde se poderia “distinguir claramente os sexos e não confundir o homem com a mulher” (SEVCENKO, 1996, p. 121).

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Apesar da vigilância constante, alguns artistas desafiaram os cânones de representação impostos pela igreja católica e produziram obras onde os gêneros não estão completamente separados. Em muitas obras não é possível determinar se a figura retratada é do gênero masculino ou feminino, inclusive na iconografia religiosa.

É o que se observa na obra do italiano Rafael Sanzio (1483 – 1520), pintor renascentista, que em 1503, retratou São Sebastião como se já estivesse ascendido ao céu, sem marcas do martírio ou da violenta morte da qual foi vítima.

O retrato mostra uma personagem com características corporais que pelos referenciais contemporâneos seriam consideradas femininas, com rosto sem marca de barba, sobrancelhas finas e altas, cabelos longos cuidadosamente penteados descendo pelos ombros que seguem a mesma construção arredondada do pescoço. A mão que segura a única flecha para informar que se trata de São Sebastião, é pequena, com dedos finos e delicados.

Não apenas o rosto, mas o corpo de São Sebastião recebeu, nas mãos de vários artistas – Sandro Botticelli (1474), Alonso Sedano, Carlo Crivelli (1491), Guido Reni (1617), Lorenzo Costa (1491) - um tratamento que colocava sob suspeita sua cisgeneridade heterossexual, sendo retratado com traços que expressam feminilidade.

Michelangelo Merisi Da Caraggio (1570 – 1610), um dos pintores mais polêmicos do barroco italiano, foi mais ousado em suas produções e não se intimidou com as imposições da igreja católica.

Em uma de suas pinturas retratando Baco – o deus do vinho para os romanos - fica evidente seu interesse em questionar a cisão rígida das identidades entre masculino e feminino. O rosto do jovem Baco redondo e liso, os lábios carnudos, as bochechas rosadas, as sobrancelhas altas e cuidadosamente desenhadas, o olhar cheio de sensualidade e o penteado que lembra uma gueixa o afasta completamente do padrão de masculinidade da época.

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FIGURA 06 – CARAVAGGIO, JOVEM BACO, ÓLEO SOBRE TELA, 159514

Fonte: https://virusdaarte.net/caravaggio-o-jovem-baco/

Gradualmente o corpo trans vai se distanciando do sagrado e do mitológico e, como bem explicou Michel Foucault (1982), passa a ser inscrito no campo da monstrificação, do patológico e principalmente do obsceno, do pecado, do exótico e da criminalidade.

4 TRAVESTIS DE CARNE E OSSO

Um dos raros exemplos de estilos artísticos que evitou hierarquizar os corpos trans femininos é identificado no Japão, no século XVIII.

Chamadas de wakashu, as pessoas trans femininas, de acordo Asato Ikeda, curadora da exposição A Third Gender: Beautiful Youths in Japanese Prints(2016), (Um terceiro gênero: belas jovens em gravuras japonesas), que aconteceu de maio a novembro de 2016 no Royal Ontario

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Museum, no Canadá, explica que elas compreendiam um gênero próprio, definido pelo sexo biológico, idade, aparência externa e o papel sexual que desempenhavam (Tradução minha).

Essas jovens, biologicamente do sexo masculino, retratadas como pertencentes ao gênero feminino pelos artistas do estilo Shunga, também eram no mundo real, objetos de desejo de homens e mulheres adultos (IKEDA, 2016, n.p. Tradução minha).

As gravuras que integram a exposição, exploram uma estrutura social e um sistema cultural que não se encaixa no binarismo de gênero e na sexualidade heteronormativa (IKEDA, 2016, n. p. Tradução minha).

O estilo Shunga (1600 – 1868) se caracteriza por sua temática erótica e cenas de sexo explícito sem nenhum constrangimento.

O artista Shunga retratou cenas de sexo explícito das formas mais variadas: sexo entre homens cis; sexo entre mulheres cis; sexo entre homens e mulheres cis; sexo entre homens cis e wakashu, entre mulheres cis e wakashu, além de cenas de masturbação, sexo grupal, voyeurismo, etc.

Entre os artistas que retrataram com frequência cenas que mostram personagens wakashu, estão Kitagawa Utamaro (1753 – 1806), Ishikawa Toyonobu Folio (1711 – 1785) e Suzuki Harunobu (1724 - 1770).

Como esses artistas não faziam distinção na maneira de retratar mulheres cis e wakashu é somente nas gravuras em que os genitais estão à mostra é que se torna possível identificá-las com precisão.

Toda a estrutura corporal, o penteado, o gestual e o figurino dessas personagens, seguem a mesma lógica de representação das personagens cis, confirmando e não questionando suas identidades femininas.

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FIGURA 07 – SUZUKI HARUNOBU, SAMURAI E SEU AMOR DA JUVENTUDE, XILOGRAVURA, 175015

Fonte: https://br.pinterest.com/pin/189854940525316348/

A delicadeza da obra de Harunobu e o respeito as identidades trans, inclusive no título de suas obras, é muito diferente do que se observa na arte europeia.

Mesmo em trabalhos que retratam personalidades conhecidas, como Mademoiselle de Beaumont (1728 – 1810), é possível identificar narrativas bastante estereotipadas.

Conhecida atualmente como a travesti espiã da corte de Luiz XV, Mademoiselle de Beaumont, foi retratada por diversos artistas. Em alguns trabalhos é visível a intenção dos artistas em destacar que se trata de um corpo exótico, estranho, fora do lugar, inscrito no campo do paródico e do risível.

Entre esses artistas estão Victor Marie Picot (1744 – 1805) que a retratou (em uma gravura colorida) em 1787 durante uma duelo de esgrima em Londres, sob os olhares espantados de uma plateia que pagava para assistir aquele homem idoso, em trajes femininos, enfrentando cavalheiros da corte inglesa (PAVESI, 2018, online).

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Thomas Stewart, um artista de sucesso na Inglaterra, especializado em retratos, pintou Mademoiselle de Beaumont em 1792 com um rosto bastante masculinizado e com sinais de barba, ausência de seios, sem maquiagem e joias.

Outro artista - que preferiu não assinar seu trabalho - produziu uma imagem ainda mais depreciativa de Mademoiselle de Beaumont.

A obra, uma gravura em metal, não datada, é na verdade uma caricatura. A personagem em pé, de frente, olha diretamente para quem a observa. Do lado esquerdo, a personagem usa trajes femininos e do lado direito, trajes masculinos, dando a entender que se trata de duas e não uma pessoa.

Em todas essas representações de Mademoiselle de Beaumont, não apenas a narrativa visual conduz a uma interpretação depreciativa, mas o título que receberam também, já que informam o nome civil da personagem com a intenção, nada inocente, de demarcar um lugar social, pois aquela personagem feminina não seria real. Seria uma imitação. Uma fraude.

FIGURA 08 – HENRY R. ROBINSON, O HOMEM MONSTRO, LITOGRAVURA, 183616

Fonte: http://transascity.org/mary-jones-1836/

Formas similares de representação são identificadas em outros países. 16 Imagem disponível em: < http://transascity.org/mary-jones-1836/>

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Nos Estados Unidos da América (EUA), em 1836, uma litogravura colorida, assinada por Henry R. Robinson, foi publicada em vários jornais de Nova Iorque retratando Mary Jones, uma travesti negra, prostituta, acusada de furtar a carteira de um cliente.

Embora a imagem mostre Mary Jones elegantemente vestida, com semblante calmo e numa atitude de relativo conformismo com a situação a que foi imposta, a legenda se refere a ela como O HOMEM MONSTRO, para informar que o traje feminino, as joias, a maquiagem e a peruca eram partes do disfarce que usava para atacar homens inocentes. Como pessoa potencialmente perigosa, então, deveria ficar apartada do convívio em sociedade.

A desumanização de Mary Jones, construída sobretudo pelo sistema judicial, com a ajuda de jornalistas e ilustradores brancos, procurava destacar o fato de que “ela era alguém que a sociedade branca temia: negra, desviante de gênero, trabalhadora do sexo e, provavelmente, o pior de tudo, livre. (LYONS, 2017, n.p.).

A exposição de Mary Jones não é um caso isolado. A partir do século XIX, com a popularização dos jornais impressos e da fotografia17 , especialmente nas grandes cidades da

Inglaterra e dos EUA, aumenta a produção e divulgação de imagens de pessoas trans femininas com a intenção de reafirmar a cisgeneridade heterossexual branca como a única possível

FIGURA 09 – FANNY PARK NO JOGO DE CRÍQUETE, FOTOGRAFIA EM CHAPA DE VIDRO, 186918

Fonte: https://br.pinterest.com/pin/454441418635851414/

17 Não vou discutir neste artigo as fotografias feitas em estúdios, contratadas pelas próprias pessoas trans 18 Imagem disponível em: < https://br.pinterest.com/pin/454441418635851414/>

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Em abril de 1870, em Londres, Fanny Park e Stella Bouton, foram presas, saindo de um teatro. O oficial de polícia, que as investigava a cerca de um ano, disse: “Eu tenho todos os motivos para acreditar que vocês são homens em trajes femininos”.

Levadas a julgamento, o caso, em plena época vitoriana, causou escândalo, sendo assunto de destaque nos principais jornais da capital inglesa.

Fanny e Stella foram retratadas de diversas formas, tanto por ilustradores que trabalhavam para os grandes jornais, quanto por ilustradores que trabalhavam para o departamento de polícia.

Em algumas imagens, Fanny e Stella aparecem escoltadas pela polícia, observadas por uma multidão de curiosos. Em outras aparecem com roupas íntimas, sendo forçadas a se livrarem dos trajes femininos e substituí-los por roupas masculinas, sob a vigilância constante de policiais.

Diferentemente das imagens que mostram Mademoiselle de Beaumont, Fanny e Stella, tem seus traços femininos preservados, ainda que seus nomes civis e sua anatomia masculina fossem revelados nas reportagens.

Tanto Frances Thompson, quanto Fanny Park e Stella Bouton, tiveram suas identidades de gênero questionadas de forma violenta por uma sociedade que se esforçava para impor e normatizar a cisgeneridade branca heterossexual.

A imagem que a sociedade procurava construir a respeito delas, ganhava formas e cores pelas mãos de artistas que estavam a serviço dessa mesma sociedade.

Em contato com outras possibilidades de corpos e de existências, via de regra, as artes visuais contribuíram para monstrificá-los, patologizá-los, fosse através de leituras coisificantes e/ou caricaturais, ou simplesmente os ignorando.

5 DOIS ESPÍRITOS OU MAIS NAS AMÉRICAS

Cynara Menezes (2016), pergunta de maneira objetiva: “Em que contribuíram os europeus para a sexualidade das Américas além de nos apresentar à culpa?” (MENEZES, 2016, n.p.).

O processo de dominação imposto pela Europa, não por acaso, dedicou grande atenção às práticas religiosas. Consideradas pagãs, precisavam ser rapidamente substituídas pelo cristianismo.

Eliminar a diversidade religiosa, implicava na eliminação da liberdade sexual e da diversidade de gênero, expressa em rituais comandados por xamãs que desafiavam as normas da

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cisgeneridade, identificadas nas culturas “Asteca, Chimu, Lacke, Lubaca, Manta, Maia, Mbaya, Moche e Tupinambá”. (JONES, 2007).

Menezes (2016), vai além e afirma que pessoas trans, femininas e masculinas, eram encontradas em mais de 150 tribos, apenas na América do Norte.

Chamadas de Two-Spirit ou Berdaches, Peter Jones (2007), explica que elas realizavam tarefas especiais, sendo as responsáveis por cuidar das crianças e repassar-lhes os ensinamentos e mitos. Como viam o mundo com olhos tanto de homem quanto de mulher, podiam prever o futuro, por isso eram consideradas as mais aptas às atividades xamânicas.

Como lideranças religiosas, as Berdaches teriam a função de mediadoras “não apenas entre as mulheres e homens, mas também entre o físico e o espiritual”. (WILLAMS, 2000).

Os primeiros relatos de colonizadores sobre as Berdaches aparecem já no século XVI. O preconceito contra elas, porém, só vai surgir mais tarde, por influência do homem branco (MENEZES, 2016, n.p.).

De acordo com Stefan Zebrowski-Rubin (2009), o termo Berdache teria “uma denotação extremamente depreciativa, derivada da antiga palavra francesa bardache, que significa prostituta, gay ou sodomita passivo” (RUBIN, 2009, n.p. Tradução minha).

Apesar da postura preconceituosa com que o invasor europeu tratou a cultura Two Spirits, sendo descrita de forma negativa ou simplesmente ignorada, ela não desapareceu por completo e foi preservada parcialmente por remanescentes das etnias Navajo, Cheyenne e Cherokee nos Estados Unidos da América.

Um dos poucos artistas a registrar elementos da cultura Two Spirits foi o estadunidense George Catlin (1796 – 1872), que produziu um extenso registro iconográfico de várias populações originárias que habitavam parte do território do atual EUA.

A respeito da cultura Two Spirits, Catlin afirmou tratar-se de um dos costumes mais inexplicáveis e repugnantes que conhecera e gostaria que fosse extinto antes de ser registrado mais completamente (RUBIN, 2009, n.p. Tradução minha).

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FIGURA 10 – GEORGE CATLIN, DANCE TO THE BERDACHE SAUKIE, 1861 – 1869, ÓLEO SOBRE CARTÃO19

Fonte: https://americanart.si.edu/artwork/dance-berdash-4023

A opinião de George Catlin, por mais violenta que possa parecer, traduz o pensamento de uma época e de uma sociedade.

Em entrevista a Cynara Menezes (2016), o antropólogo e professor da Universidade de Rondônia Estevão Fernandes explica que

[...] os homens deveriam se vestir como homens, trabalhar onde os homens trabalham, ter nome de homem, e se comportar como os homens se comportam; idem com relação às mulheres. Os indígenas que não se enquadravam nesta perspectiva (r)estrita de dimorfismo sexual e heteronormatividade eram castigados –há relatos, por exemplo, de execuções, cortes de cabelo forçados, castigos físicos, etc., levados a cabo pelos colonizadores (MENEZES, 2016, n.p.).

É possível supor que a decisão dos artistas que estavam em atividades no continente americano - muitos a serviço de governos europeus - em não retratar pessoas trans estivesse

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associada às punições descritas por Fernandes (2016), justamente por tratar-se de pessoas consideradas menos humanas, sujeitas inclusive à pena de morte.

Quando esses registros eram feitos, como aconteceu com as Two Spirits no final do século XIX - fotografadas em estúdios improvisados, em poses determinadas pelo fotógrafo - deveriam reforçar a ideia de que precisavam, urgentemente, passar por um processo civilizatório nos moldes impostos pelo invasor europeu para que assim adotassem atitudes compatíveis com sua anatomia biológica.

Em outras regiões do continente americano, como no Brasil, por exemplo, o que se observa é um silêncio absoluto em relação as pessoas trans, ainda que fizessem parte do cotidiano da sociedade brasileira, especialmente entre a população negra como atestou Jocélio Teles dos Santos (1997) em Salvador e Nina Raymundo Rodrigues (2010), no Rio de Janeiro.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

As imagens, como informa Manguel (2001), permitem leituras variadas, e para além daquelas que consideram valores estéticos, tais como, equilíbrio, volume, ritmo, simetria/assimetria, contraste, tensão, linha, cores, profundidade, luz e sombra, movimento, rigidez, textura, proporção, espaço, etc., permitem outras formas de leitura e assim questionar em que medida esses mesmos valores estéticos, aliados a outros (como forma, gestual, linguagem, composição, ambientação, dentre outros) são utilizadas para construir discursos que reforçam ou questionam hierarquias, exclusões, estereótipos e/ou preconceitos (OLIVEIRA, 2020).

Analisar as formas de representação de corpos trans femininos nas artes visuais até o século XIX, em diversas culturas, nos continentes asiático, africano e americano, apontou para diversas possibilidades, sendo que a situação mais recorrente, em todas as culturas, foi o silêncio. Um silêncio que pode não refletir, exatamente, como era a produção artística desses povos antes do contato com a Europa, mesmo porque, foi o homem branco europeu cisgênero heterossexual que decidiu o que deveria ser preservado, lembrado, celebrado.

Assim, o olhar que lanço sobre as artes visuais não está isento de uma intervenção masculinista europeia, ainda que faça um esforço para olhar de outro lugar, pois “há grande valor em definir a possibilidade de ver a partir da periferia e dos abismos” (HARAWAY, 1995, p. 22).

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Esse silêncio que interfere no processo de identificação de obras que retratam corpos trans femininos, é uma das inúmeras formas de expressão da transfobia, um “dispositivos de poder” (FOUCAULT, 1982), pois opera para impor a cisgeneridade heterossexual branca como única possibilidade de existência.

De acordo com as reflexões de Peter Jones (2007), as identidades de gênero distintivas da cisgeneridade, chamadas por ele de poligênero, seriam resultantes do politeísmo: por trás das variadas escolhas20 sexuais haveria a crença na existência de inúmeros deuses, influenciando

diretamente na produção artística, como acontecia em Roma, Grécia e África antes do contato com o cristianismo.

O controle exercido pelo cristianismo, nas Europa e nas colônias, não interferiu apenas na produção artística, mas na relação que temos com a arte anterior a ele, comprometendo nossa interpretação estética e discursiva.

Não à toa, na Europa e nas Américas, a produção artística que retratava corpos e práticas sexuais consideradas pecaminosas “ficaram escondidas, trancafiadas em salas de museu até a metade do século 20” (MENEZES, 2016, n.p.), distantes do grande público.

A arte que antes celebrava os corpos considerados sagrados, como a escultura Dogon no Mali, foi utilizada para reafirmar hierarquias culturais, de raça e de gênero, quando foi classificada como primitiva e/ou pagã. Ao inferiorizar a arte Dogon, o europeu, com a ajuda da igreja, da medicina e do direito, se esforçou para inferiorizar os corpos que ela retratava. Os corpos trans femininos, então, são deslocados do campo do sagrado, para o campo do pecado, do patológico e do perigoso, necessitando ser eliminado.

A arte Shunga, no Japão, distante do controle do cristianismo, continuou a retratar os corpos trans femininos, sem aparentemente, hierarquizá-los em relação aos corpos cis.

Na Inglaterra e nos Estados Unidos da América, a situação era bastante diferente, e os poucos exemplos de imagens retratando pessoas trans femininas, especialmente no século XIX, operavam a favor da normatização da cisgeneridade.

Não se trata de responsabilizar ou isentar os artistas por produções carregadas de preconceitos e estereótipos, mesmo porque, como a pesquisa apontou, estavam inscritos em um 20 Peter Jones explicita em seu debate que a orientação sexual seria uma escolha, assim como a identidade de gênero e

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contexto onde tinham controle limitado sobre seu trabalho. Esse controle era ainda menor quando produziam obras por encomendas, como acontecia com ilustradores e fotógrafos.

Inexplicavelmente, alguns dos estereótipos identificados na produção artística do século de XIX estão presentes em trabalhos acadêmicos contemporâneos, que se negam a um revisionismo conceitual e insistem na utilização de termos que contribuem para exotificar e hierarquizar pessoas trans femininas.

Minha intenção neste artigo, ao trazer fragmentos discursivos a respeito da presença e da ausência de travestis e/ou mulheres transexuais nas artes visuais, é chamar a atenção para o poder normatizador, presente não apenas na produção artística do passado, mas sobretudo nos estudos que as tematizam no presente.

Para romper com essa situação acredito que seja necessário dialogar com outras áreas do conhecimento, como os estudos das relações étnico-raciais, os estudos de gênero e diversidade sexual e com estudos trans-feministas.

Acredito também, que debates como esse possam contribuir para que visões preconceituosas, tanto a respeito de travestis e/ou mulheres transexuais, sejam reavaliadas e combatidas, para que assim possamos construir uma sociedade heterogênea, onde a prática do respeito seja de fato, uma realidade, pautadas, como sugere Haraway (1995) na contestação, na desconstrução, nas conexões em rede e na esperança na transformação dos sistemas de conhecimento e nas maneiras de ver.

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Referências

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