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UM OLHAR PARA O PAPEL DOS MUSEUS NO ENSINO DE HISTÓRIA

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Academic year: 2021

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UM OLHAR PARA O PAPEL DOS MUSEUS NO ENSINO DE HISTÓRIA Lázaro Rufino Dâmaso Neto Universidade Federal de Uberlândia

lazzaroruff@gmail.com

Lucas Cardoso de Moura Universidade Federal de Uberlândia

mouralucascardoso@hotmail.com

Resumo: O presente trabalho é produto de um Trabalho de Campo realizado no ano de 2014 pelo curso de História da FACIP/UFU, com destino a cidade de Ouro Preto. Dirigiu-se o plano de visitas a instituições de reconhecida expressividade histórica, detentoras de acervos diversificados e significativas como locais de memória. Com base nas observações nas instituições históricas - com destaque os museus -, anotações e referencial teórico. O artigo tem como objetivo refletir no papel que os museus representam para o ensino de história e o valor simbólico de cada objeto presente nos museus e a organização dos mesmos, que qualifica um discurso objetivo de determinado locutor. Partiu-se das seguintes questões: Qual (is) contribuição (ões) do museu no processo de ensinar e aprender história? Que público organizou a distribuição de salas e objetos no museu? Qual hipótese de público eles imaginaram ao organizar de tal maneira? Em busca dos autores referência no assunto, com estes questionamentos estabeleceu-se um diálogo com a autora Janice Pereira da Costa - que tem sua tese de mestrado construída na análise do Museu da Inconfidência e da localização, história e valor do mesmo para cidade de Ouro Preto. Por influência das observações realizadas e o trabalho de Janice Pereira da Costa, escolheu-se para uma análise específica das questões supracitadas o Museu da Inconfidência, que se encontra em funcionamento no edifício da antiga Casa de Câmara e Cadeia da cidade de Ouro Preto, localizado na praça Tiradentes, cartão postal da cidade. Há também, para além da análise do Museu da Inconfidência, uma leitura geral da cidade de Ouro Preto e o valor de patrimônio a ela estabelecido, como expoente autêntico de arte e identidade nacional. Conclui-se que é real a importância dos Museus para ensino de História, em relação a formação da identidade do indivíduo, trazendo elementos de uma memória local, e no caso do Museu da Inconfidência,

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além de local, uma memória nacional. Porém considera-se fundamental problematizar a memória oficial e destacar outras histórias silenciadas.

INTRODUÇÃO

Este artigo é resultado do Trabalho de Campo Realizado na cidade de Ouro Preto em 2014 pelo Curso de História da Universidade Federal de Uberlândia – UFU, Campus Pontal, e do profícuo diálogo entre docente e discentes na disciplina Patrimônio, Histórias e Memórias, ministrada no mesmo curso.

Noções de Patrimônio, museus e memória

Os primórdios de noções de patrimônio cultural surgiram na Europa, no século XIX, institucionalizados a princípio pela França em 1830, mediante a criação da Inspetoria dos Monumentos Históricos. Vários decretos e declarações a respeito foram criados a partir daí. Hugues de Varine Bohan, consultor da Unesco ressalta a conjugação feita por patrimônio histórico para memória social, dicotomizados em três principais grupos: meio ambiente, produção intelectual humana e bens culturais resultantes (PELEGRINI, 2009). O Brasil, devido à colonização europeia, recebeu influência cultural desse continente, herdando também alguns princípios epistêmicos, como o conceito de patrimônio, que, como já citado, teve seus primórdios na França.

De acordo com Costa (2005), os museus são herdeiros do costume humano de acumular, e que, mesmo reconhecendo a perenidade dos objetos, tendem a resistir em se desfazer dos mesmos, uma vez que estes passam, ao longo do tempo, a agregar valores simbólicos e de pertencimento, enfim, suporte de memórias.

O Brasil, embora possamos fazer muitas críticas ao descaso com que tratamos o nosso patrimônio, foi, segundo Pelegrini (2009), um dos primeiros países a consolidar uma legislação sobre patrimônio, possibilitando debates na comunidade acadêmica, viabilizando discutir, profissionalmente ou não, a temática da memória e patrimônio histórico, bem como implantar políticas públicas neste sentido.

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Márcia Sant’Anna (PELEGRINI, 2009), diretora do Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan, salienta que a noção de patrimônio nacional se engendrou mediante um debate que, simultaneamente, recorreu ao sentimento nacional e ao valor econômico dos referidos bens culturais, móveis ou imóveis. Ou seja, tal concepção, se encontrou no debate entre valor sentimental, representado pelo “sentimento nacional” e o valor capital, representado pela lucratividade privilegiada em relação aos bens culturais.

Tomando como referência a discussão de patrimônio cultural material, resultado das necessidades humanas (inclusive de cultura), entendemos a relação direta entre os museus e o objetivo de sua criação: guardar objetos que representem histórias de um povo, de um grupo, ou de uma comunidade, de modo a proteger memórias, identidades e valores dos mesmos, e, ainda segundo Costa (2005), que, em sua seleção e organização, representem uma determinada ordem.

A partir das considerações supracitadas, surge um questionamento que se torna recorrente: quais são as contribuições do museu para o processo de ensinar e aprender história? Tal questionamento justifica-se pelo fato de que os museus, por meio de seus acervos e programas, são detentores de valores simbólicos não somente de indivíduos, mas que são expressão de existências, identidades, culturas e histórias plurais.

O Trabalho de Campo: metodologia de análise

Um dos objetivos do Trabalho de Campo consistiu em refletir sobre a relação teoria e prática na produção de conhecimento histórico e do ensino de História a partir do diálogo com locais de produção, preservação e guarda da memória. A proposta metodológica orientou-se em estimular, com efetividade, a participação critica e o envolvimento dos estudantes nas atividades programadas com aquele objetivo. Para tanto, dirigimos o plano de visitas técnicas a instituições de reconhecida importância por seu expressivo acervo, detentoras de coleções diversificadas e significativas como locais de memória. Procedemos a leituras prévias e discussões sobre locais de memórias a serem visitados e analisados, assim como um trabalho

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de reconhecimento de linguagens historiográficas dialogando com as diferentes memórias produzidas por aqueles locais.

As atividades técnicas consistiram em: a) discussão teórica sobre temas pertinentes ao processo de povoamento e colonização do Brasil, particularmente suas formas de exploração econômica e consolidação das áreas de mineração, especificamente a cidade de Ouro Preto; b) levantamento de material relativo à formação da região de Ouro Preto ainda no século XVIII: c) estudo teórico sobre a análise de diferentes fontes e linguagens, em especial a iconográfica e a museológica; d) pesquisa prévia sobre os lugares de memória e patrimônio a serem visitados; e) orientações sobre metodologias do Trabalho de Campo, enfatizando a importância do registro sistemático das atividades realizadas; f) planejamento e apresentação sistemática dos resultados finais do Trabalho de Campo.

Trabalhamos também a produção do conhecimento sobre patrimônio e memória de forma interdisciplinar entre os vários componentes curriculares envolvidos no Trabalho de Campo: História do Brasil, Métodos e Técnicas de Pesquisa em História MTPH, Estágio Supervisionado II e IV; privilegiando, por parte das disciplinas envolvidas, estudos de conteúdos que possibilitaram articulações e diálogos com os acervos e documentos visitados e diferentes memórias por eles produzidas. Acreditamos que tal processo tenha contribuído para a formação do futuro professor-pesquisador, pois, por meio desta experiência, o mesmo poderá desenvolver tal prática em diferentes realidades de sua atuação profissional.

Ouro Preto, Museu da Inconfidência e Memória nacional

Destacamos aqui os diálogos com CASTRIOTA, Leonardo. Nas encruzilhadas do desenvolvimento: a trajetória da preservação do patrimônio em Ouro Preto (2005), em que o autor discute o processo de povoamento da região por meio de povoações, sujeitos e manifestações populares, no XVIII, processo este descartado a partir do momento em que a cidade se tornou patrimônio histórico da humanidade nos inicios do XX.

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Sendo assim, discutiremos aqui a produção de memórias por meio do Museu da Inconfidência, localizado na cidade de Ouro Preto – MG, no qual desenvolvemos uma etapa do Trabalho de Campo e que embasa este artigo. Neste sentido indagamos: quais memórias se pretende afirmar na atual distribuição de salas e acervos naquele museu? Qual público-alvo pretendem atingir com tal organização? Questionamentos que se aproximam das indagações de Janice Pereira da Costa (2005), ao abordar sobre a “memória nacional” que o Museu da Inconfidência afirma em suas exposições. Pretende-se, portanto, mesmo que indiretamente,

refletir sobre as possibilidades e contribuições do Museu da Inconfidência no processo de ensinar e aprender História.

Tendo o início da sua formação no século XVIII, devido à atrativa ideia de enriquecimento por descoberta de ouro na região, a cidade de Ouro Preto se formara a partir de dois povoados de garimpeiros organizados em torno de capelas – Antônio Dias e Pilar – que se ligaram ao longo de suas expansões. Assim vemos uma cidade que surge do povoamento de mineradores aos redores dos pontos de extração do ouro, sem planejamento, não seguindo os padrões métricos próprios, como nas colônias espanholas.

Assim, o povoamento de Ouro Preto, na primeira metade do XVII, se deu sem planejamento em função do fato da cidade ter sido idealizada apenas como acampamento para garimpeiros, e, logo, a descoberta do ouro trouxe cada vez mais garimpeiros em busca de riqueza; o que levou ao aumento demográfico em um curto espaço de tempo, sendo os acampamentos transformados em moradias permanentes, surgimento de ruas, comércio e agricultores para abastecer a região, já tomando corpo de uma cidade.

A imagem 1, apresenta o mapa da autoria de Sylvio de Vasconcellos (CASTRIOTA, 2005), ilustrando a dinâmica de surgimento da cidade de Ouro Preto, a partir dos povoamentos de forma espontânea - assim como a maioria das cidades de Minas colonial. Castriota (2009) ao explanar sobre o surgimento dos povoamentos, utiliza desse recurso imagético para ilustrar sua argumentação do processo de habitação da cidade de Ouro Preto, que “ao invés de uma malha regular e ruas alinhadas, a cidade de Ouro Preto espalha-se a partir desse eixo inicial, ocupando preferencialmente as encostas, protegidas dos ventos mais

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fortes e também das enchentes comuns nas regiões mais baixas.” (CASTRIOTA, 2009). Assim, constituiu-se aumento dos povoados, urbanização acelerada para os parâmetros da época e os padrões de escolha para os locais de assentamento foram próximos a rios, uma vez que o trabalho de extração do ouro se dava pela técnica de aluvião.

Imagem 1: Esquema explicativo da evolução urbana de Ouro Preto

Com a notícia de grandes quantidades de ouro na região houve rápido e desordenado crescimento urbano e populacional da cidade na época de exploração aurífera dessa região. O que se tornou, inclusive, necessário a mudança da capital de Mariana para Ouro Preto, sobretudo em função da necessidade, por parte do governo, de exercer maior controle e taxação por meio do fisco.

Este processo foi acompanhado pela necessidade de construção de prédios públicos, principalmente o fisco, e, dentre eles, a Casa de Câmara e Cadeia, sede do poder da coroa na cidade e no qual funciona o atual Museu da Inconfidência.

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Em local estratégico, diante da praça de Santa Quitéria, atual praça Tiradentes, a Casa de Câmara e Cadeia teve construção iniciada em 1785, harmonizando com o formato retangular daquela praça, somando-se a outros prédios construídos em torno daquele local, dando caráter de arena para a mesma (COSTA, 2005).

Na imagem 2, registramos a fachada do Museu da Inconfidência, com o grande largo à sua frente que é a Praça Tiradentes, é de se notar a imponência daquele prédio, com acesso por todos os lados da praça; do lado direito do prédio temos o Largo do Coimbra e Igreja São Francisco de Assis, e do lado esquerdo, o Museu do Oratório. Embora imponente, é provável que o edifício do Museu da Inconfidência tivesse para os contemporâneos de sua inauguração uma importância também cotidiana: o relógio e o sino, a métrica temporal que se encontra no lugar mais alto e central do edifício. No primeiro andar ficava a cadeia, com as janelas gradeadas devido à sua primeira utilização, no segundo, a Câmara.

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Desde sua construção para Casa de Câmara e Cadeia até os dias atuais, o edifício do Museu da Inconfidência já causava admiração da população pela sua opulência, visto que a maioria das casas em Ouro Preto era de construção precária, de pau a pique. Isso além do fato da posição estratégica no morro de Santa Quitéria, local privilegiado, no alto da cidade. O que fez com que a população, já nos seus primórdios, saudasse o edifício como símbolo arquitetônico local, iniciando assim a representação do mesmo como futuro lugar de memória, justificando, a posteriori, sua idealização e sua escolha por parte do governo central para o Museu da Inconfidência a partir da segunda metade do XX.

A cidade de Ouro Preto como patrimônio cultural da humanidade, da cultura e da identidade nacional, foi criação de determinada classe intelectual brasileira na primeira metade do século XX. Com movimentações acerca de patrimônio e memória nacional, os intelectuais e artistas que protagonizavam a Semana de Arte Moderna de 1922 elegeram a cidade de Ouro Preto como símbolo da memória e da identidade do país.

Estes mesmos intelectuais elegeram a arte barroca das igrejas da cidade como autêntico movimento artístico-plástico nacional. Já o movimento de restauração da memória dos Inconfidentes se dá início no Brasil República, no que se atribuiu ao movimento da Inconfidência mineira um caráter libertário e à figura de Tiradentes, um mártir.

Após o governo do estado de Minas ceder o prédio da casa de Câmara e Cadeia para a União, iniciou-se o caminho para tornar o edifício local de culto à memória dos Inconfidentes.

A mesma operação que alçou os personagens da Inconfidência Mineira a heróis, e Tiradentes como mártir, justo em um momento em que era preciso afirmar a nação (e no Brasil o Estado se forma anteriormente à esta) alçou também o Museu da Inconfidência como abrigo para os personagens da identidade nacional, símbolos da nacionalidade pretendida.

Esta opção privilegia assim, como recorte, o período colonial português, minimizando a presença de nativos anteriores à ocupação para extração de ouro. A exposição de objetos no Museu, são, assim, memórias e culto aos inconfidentes, sobretudo na

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denominada sala “Panteão”, que guarda as ossadas dos mesmos. Há nos andares superiores, pinturas e arte plástica barroca de Mestre Ataíde e outros, que têm o objetivo pedagógico de trazer ao visitante a arte autêntica formada na cidade de Ouro Preto.

Considerações finais

Há de convirmos da importância dos Museus para o ensino de História, trazendo elementos de uma memória local, e no caso do Museu da Inconfidência, além de local, uma memória nacional. Todavia, o Museu da Inconfidência, objeto de análise do presente artigo, é circundado de elementos representativos de uma elite específica, e possui discurso claro sobre o culto aos “heróis da nação”. Tais constatações coloca em questão o papel do Museu da Inconfidência no ensino de História e dos espaços de guarda da memória que desperte espírito crítico e histórias plurais e não como espaço de rememoração de personagens e feitos símbolos de determinadas identidades e nacionalismo.

Sendo assim, o Museu comunica sobre os inconfidentes “heróis”, e deixa claro que o locutor desse discurso é o Estado, que vê a memória nacional como necessária a formação da identidade nacional e de sentimentos de patriotismo. Considerando as questões problematizadas, este artigo nos desperta para questões em torno do papel do museu como espaço de guarda e afirmação de determinadas memórias, e, também sobre seu papel no ensino de História. Reflexão necessária, entre outros motivos, pelo fato de os museus serem centros de memórias, interagindo com o passado, mas não impassíveis das questões e diálogos com o presente.

Bibliografia

COSTA, Janice Pereira da. Ensinando a ser cidadão: Memória Nacional, História e Poder no Museu da Inconfidência (1938-1990). 2005. 158 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de História, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005.

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PELEGRINI, Sandra C. A.. Patrimônio Cultural: Consciência e Preservação. São Paulo: Brasiliense, 2009.

CASTRIOTA, Leonardo Barci. Nas encruzilhadas do desenvolvimento: A trajetória da preservação do patrimônio em Ouro Preto In: CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio cultural: conceitos, políticas, instrumentos. São Paulo: Annablume, 2009. 380 p.

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