• Nenhum resultado encontrado

O PROCESSO DE ASSIMILAÇÃO DA NASALIDADE DAS VOGAIS ORAIS NA FALA ANAPOLINA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O PROCESSO DE ASSIMILAÇÃO DA NASALIDADE DAS VOGAIS ORAIS NA FALA ANAPOLINA"

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

O PROCESSO DE ASSIMILAÇÃO DA NASALIDADE DAS VOGAIS

ORAIS NA FALA ANAPOLINA

Vanilda Oliveira Coelho1; Maria de Lurdes Nazário1; Shirley Eliany Rocha Mattos2

1 Pesquisadoras convidadas do Núcleo de Estudos da História Lingüística de Goiás – NEHLGO/FL/UFG.

2

Coordenadora do Projeto de Pesquisa Anápolis Centenária: como falam os anapolinos?- 2007/2008 - (UEG).

RESUMO

Este artigo analisa e discute preliminarmente o processo de assimilação da nasalidade que ocorre com as vogais orais que antecedem as consoantes nasais /m/, /n/ e /ñ/ na variedade lingüística urbana da cidade de Anápolis-GO. Sabe-se que esse processo de assimilação é comum no português arcaico e se conservou de modo geral no português falado no Brasil. Faz-se este estudo partindo dos pressupostos teóricos da Sociolingüística Variacionista, que propõe que o objeto de descrição lingüística é a gramática da comunidade de fala, que é um sistema de comunicação heterogêneo usado na interação social (LABOV, 1982, p. 18). Esperava-se, com a descrição e a análise do fenômeno da nasalidade de vogais orais, compreender seu padrão na fala anapolina. A freqüência geral confirma o caráter conservador do português do Brasil na variação lingüística analisada, que possui 69% de vogais nasalizadas.

Palavras-chave: Nasalidade. Assimilação. Vogais Orais.

INTRODUÇÃO

Este artigo analisa e discute preliminarmente o processo de assimilação da nasalidade que ocorre com as vogais orais que antecedem as consoantes nasais /m/, /n/ e /ñ/ na variedade lingüística urbana de Anápolis. Esse processo de assimilação é comum no português arcaico e se conservou de modo geral no português falado no Brasil em palavras como: cãma, dõno, mãnhã.

São assumidos aqui os pressupostos teóricos da Sociolingüística Variacionista que prevê estágios de variação entre estruturas lingüísticas que possuem o mesmo significado referencial, como em cãma x cama. A Sociolingüística Variacionista é uma abordagem de pesquisa lingüística que focaliza a linguagem em uso dentro da comunidade de fala, considerando a relação entre língua e sociedade e reconhecendo o caráter eminentemente social dos fatos lingüísticos (LABOV, 1972). Com isso, os dados de pesquisa são buscados nos usos reais da língua (escrita e oral), nesta

(2)

pesquisa, dentro da comunidade de fala de Anápolis, pois é nesse contexto sócio-lingüístico que se encontra o sistema lingüístico real – o vernáculo.

Este estudo feito com 2 informantes da comunidade de fala de Anápolis faz parte do Projeto de Pesquisa Anápolis Centenária: como falam os anapolinos?, coordenado pela professora Ms. Shirley Eliany Rocha Mattos (UEG) no ano de 2007. Esse projeto de pesquisa tinha como objetivos iniciais: documentar a fala de sujeitos com mais de 50 anos em Anápolis; descrever fonologicamente a fala anapolina dos mais idosos; depreender o padrão fonológico da fala anapolina do segmento selecionado; e identificar o sotaque dos anapolinos. Com a descrição dos traços fonético-fonológicos da variedade lingüística do cidadão anapolino, espera-se também contribuir para a formação de um futuro mapa lingüístico goiano.

Com este artigo sobre o processo de assimilação da nasalidade que ocorre com as vogais orais que antecedem consoantes nasais na variedade lingüística urbana de Anápolis, espera-se contribuir com os propósitos do projeto acima citado e fortalecer a pesquisa sociolingüística sobre o falar urbano goiano, que ainda se encontra em fase inicial.

RESULTADOS DA DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

O corpus de pesquisa constitui-se de 2 entrevistas semi-estruturas que foram realizadas na comunidade urbana de Anápolis, seguindo a metodologia de pesquisa da Sociolingüística Variacionista (LABOV, 1982; TARALLO, 2001). Os dois informantes são 1 homem e 1 mulher com mais de 60 anos.

A seleção ocorreu somente com palavras que tinham as consoantes nasais [m], [n] e [ñ] no início de uma sílaba, com uma vogal oral no final da sílaba antecedente como em [cã-ma]. Optou-se por essa seleção a partir da leitura do artigo Nasalização no Português do Brasil (2002) de Abaurre e Pagotto. Essas autoras constataram, em sua pesquisa com português urbano universitário, que o processo de nasalidade das vogais orais se circunscreve ao limite da palavra.

Na análise das entrevistas, 298 dados foram selecionados com a realização de todas as vogais orais (a, e, i, o, u). No resultado geral, das 298 (100%) vogais, 205 (69%) se realizam nasalizadas e 93 (31%) se mantêm orais, conforme pode ser visualizado nos dados abaixo:

- Orais: cutumi (cotume) (DEAN); isquina (esquina) (DEAN); denunciá (denunciar) (DEAN); locómoçãu (locomoção) (VTAN); fundamental ( fundamental) (VTAN).

- Nasais: mẽmu (mesmo) (DEAN); tardĩa (tardinha) (DEAN); cũnhecê (DEAN); cõmemorassi (comemorasse) (VTAN); mãnhecenu (amanhecendo) (VTAN).

Com essa freqüência geral, constatou-se o estágio de variação no timbre das vogais que antecedem consoantes nasais, uma vez que ora se realizam nasais (fãmílias (VTAN)), ora se

(3)

realizam orais (famia (DEAN)). Observou-se, também, que há especificidades na realização da nasalidade que se relacionam com a tonicidade das sílabas nas palavras e com o ponto de articulação das consoantes nasais, como pode ser visto a seguir:

I- A tonicidade das palavras e a nasalidade:

A posição das vogais orais em relação à tonicidade da palavra tem ligação com a maior ou a menor freqüência de nasalidade nessas vogais (SILVA, 2003; ABAURRE & PAGOTTO, 2002).

- Sílaba Tônica:

a) oral: cutumi (cotume) (DEAN); isquina (esquina) (DEAN); custumi (costume) (DEAN); Anápolis (Anápolis) (DEAN); colunas (colunas) (VTAN); medicina (medicinas) (VTAN); fúnebre (fúnebre) (VTAN).

b) nasal: quãnu (quando) (DEAN); cũmu (como) (DEAN); tĩa (tinha) (DEAN); rodĩnha (rodinha) (VTAN); fõmu (fomos) (VTAN); natalĩna (natalina) (VTAN).

Nos dados, contabilizou-se um total de 140 (100%) sílabas tônicas, das quais 129 (92%) ocorrem com vogal nasalizada e 11 (8%) com vogal oral. Ou seja, quando a variável ocorre em sílaba tônica, há um emprego quase categórico da nasalidade.

- Sílaba Pré-Tônica Adjacente:

a) oral: cumigu (comigo) (DEAN); Remundo (Raimundo) (DEAN); minĩnu/a (menino/a) (DEAN); primêra (primeira) (VTAN); amiga (amiga) (VTAN); compromisso (compromisso) (VTAN). b) nasal: ‘rũmá (arrumar) (DEAN); capĩná (capinar) (DEAN); sĩnhora (senhora) (DEAN); jãnero ( Janeiro) (VTAN); apaxõnada (apaixonada) (VTAN); fãmílias (famílias) (VTAN).

Nos dados, contabilizou-se um total de 111 (100%) sílabas pré-tônicas adjacentes (Variável + Tônica), das quais, 57 (51%) ocorrem com vogal nasalizada e 54 (49%) com vogal oral. De acordo com Silva (2003, p. 94), quando a variável ocorre em sílaba pré-tônica a nasalidade é opcional. Já Abaurre e Pagotto (2002, p. 507), em sua pesquisa com o corpus do projeto NURC, observaram que contextos mais distantes da sílaba tônica favorecem a nasalidade, enquanto os mais próximos desfavorecem. Nos dados de Anápolis, observa-se uma variação eqüitativa entre a nasal e a oral numa posição adjacente à sílaba tônica.

- Sílaba Pré-Tônica (distante mais de uma sílaba da tônica):

a) oral: cõmunicação (comunicação) (DEAN); funerária (funerária) (DEAN); dimudadu (dimudado) (DEAN); fundamental (fundamental) (VTAN); amizades (amizades) (VTAN);

(4)

comercial (comercial) (VTAN).

b) nasal: cõmunicação (comunicação) (DEAN); cũnhicidu (conhecido) (DEAN); amãnhecê (amanhecer) (DEAN); ãnapolina (anapolina) (VTAN); Mãnuel (Manuel) (VTAN); ãnalisar (analisar) (VTAN).

Nos dados, contabilizou-se um total de 48 (100%) sílabas pré-tônicas mais distantes da tônica, das quais 22 (46%) ocorrem com vogal nasalizada e 26 (54%) com vogal oral. Ainda considerando que Abaurre e Pagotto (2002, p. 507) descreveram que contextos mais distantes da sílaba tônica favorecem a nasalidade, pode-se dizer que, no corpus aqui analisado, esse padrão não se repete, já que há até mesmo uma freqüência relativamente menor de nasalidade nas sílabas mais distantes da tônica (Variável_ Tônica; V_ _ T; V_ _ _T).

- Sílaba Pós-Tônica:

a) nasal: érãmus (éramos) (VTAN)

Nos corpus, há somente esse dado em que a vogal ocorre na sílaba pós-tônica. A vogal ocorre nasalizada.

II - O ponto de articulação e a nasalidade:

De acordo com Abaurre e Pagotto (2002, p. 514), há uma relação entre o ponto de articulação das consoantes nasais /m/, /n/ e /ñ/ e o grau de freqüência da nasalidade. As autoras postulam que pode haver uma hierarquização na assimilação da nasalidade conforme o ponto de articulação, do fonema mais posterior para o mais anterior: /ñ/ palatal > /n/ dental > /m/ labial. No corpus desta pesquisa, também se verifica essa hierarquização. Vejamos:

• A vogal oral sempre se nasaliza quando ocorre a consoante nasal /ñ/ (59 dados);

• As consoantes dentais favorecem mais a nasalidade que as labiais. Para as dentais, são 86 vogais nasalizadas para 34 não nasalizadas. Para as labiais, são 60 nasalizadas para 59 não nasalizadas.

Desse modo tem-se, então: /ñ/ palatal com 100% de nasalidade; /n/ dental com 59%; e /m/ labial com 41%.

Com essas considerações já finalizadas, faz-se, então, o cálculo da freqüência geral, retirando todas as palavras que contêm a nasal palatal /ñ/, uma vez que há um uso categórico da nasalidade nesses dados. De um total de 239 dados (com as nasais /n/ e /m/), 146 (61%) vogais se nasalizam e 93 (39%) não se nasalizam. Com esse outro resultado geral, compreende-se que o padrão de nasalidade se mantém, pois há uma freqüência maior de vogais nasalizadas, apesar de a freqüência

(5)

ter caído 8 pontos percentuais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo, pôde-se verificar o estágio de variação em que se encontra o processo de assimilação da nasalidade das vogais orais que antecedem as consoantes nasais na fala de dois informantes anapolinos. Constatou-se que a nasalidade ainda é a preferência na fala dos anapolinos pesquisados. Esse resultado confirma, então, o caráter conservador do português do Brasil na variedade lingüística em estudo, uma vez que esse processo de assimilação é comum no português arcaico. A partir dessa pesquisa preliminar pode-se considerar algumas informações importantes para a depreensão do padrão fonético-fonológico da fala anapolina. No entanto, uma pesquisa com mais informantes da mesma faixa etária e também de outras e com informantes mais e menos escolarizados possibilitará uma melhor compreensão dessa nasalidade; contribuindo, assim, para a constituição de um futuro mapa lingüístico goiano.

REFERÊNCIAS

ABAURRE, M. B. M.; PAGOTTO, E. G. Nasalização no Português do Brasil. In: KOCH, I. G. V. (Org.). Gramática do Português Falado. Volume VI: Desenvolvimentos. São Paulo: UNICAMP, 2002.

LABOV, W. Building on empirical foundations. In: LEHMANN, W. P; MALKIEL, Y. Perspectives Historical Linguistics. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 1982.

SILVA, T. C. Fonética e Fonologia do Português. Roteiro de Estudos e Guia de Exercícios. São Paulo: Contexto, 2003.

Referências

Documentos relacionados

Os intervenientes no IMI só podem proceder ao intercâmbio e ao tratamento de dados pessoais para os fins definidos nas disposições relevantes dos atos da União cuja lista consta do

The aim of this study was to determine the effect of prepartum rbST injection on the metabolic profile of pregnant ewes induced to subclinical ketosis, as well as the

Assim se inicia o poema com a iminência de uma guerra já pressagiada como ruim para os romanos, como indicam a propagação dos versos sibilinos e as outras três manifestações

Entretanto, para saber se não somos nós que estamos “produzindo” essa paz, precisamos discernir entre o que é uma “falsa paz” e a paz autêntica, vin- da de Deus.. Mais uma

Com repercussão nacional na área da saúde, promove o encontro anual de Presidentes, Provedores, Diretores e Administradores Hospitalares de Santas Casas e Hospitais

A substituição de parte do feldspato por nefelina contribuiu para o aumento da resistência mecânica em função da menor diferença do coeficiente de expansão térmica em relação

A produção pecuária foi a etapa do ciclo de vida do biofertilizante que mais contribuiu para a geração de impactos ambientais (afetando nove categorias de impacto: Mudanças

Hulley (2007) afirma que o teste piloto pode ser considerado decisivo tendo em vista que pode revelar falhas subtis na estruturação do projeto ou na implementação do estudo, sendo um